• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 2 A PÓS-GRADUAÇÃO E AS PESQUISAS SOBRE PRODUÇÃO E EDUCAÇÃO

2.1 O CONTEXTO DA PÓS-GRADUAÇÃO NO BRASIL

Para falar sobre pós-graduação, faz-se necessário mencionar a importante diferenciação indicada por Saviani (2006) entre pós-graduação lato sensu e stricto sensu. Ele explica que a primeira tem a forma de aperfeiçoamento e especialização, com foco na formação profissional, enquanto que a segunda, agrega os programas de mestrado e doutorado, com foco na formação acadêmica, para a formação de pesquisadores. Assim:

A pós-graduação lato sensu tem como elemento definidor o ensino, já que é este que determina o objetivo a ser alcançado, entrando a pesquisa como mediação, certamente necessária, para se atingir o objetivo preconizado. Em contraposição, o elemento definidor da pós-graduação stricto sensu é a pesquisa, a qual determina o objetivo a ser alcançado para o qual o ensino concorre como uma mediação destinada a dispor e garantir os requisitos para o desenvolvimento da pesquisa que será a pedra de toque da formação pretendida. (SAVIANI, 2006, p. 137).

Dessa forma, o autor prefere o termo programa para a pós-graduação stricto sensu e curso para a lato sensu, em função de o foco ser diferenciado. Um centra na pesquisa e o outro no ensino. Essa diferença foi indicada também na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9394/96, no artigo 44.

Severino (2006) corrobora a ideia acima quando destaca a centralidade da pesquisa na pós-graduação, sendo este objetivo tanto dos doutorandos como dos professores,

pois segundo ele, não se ensina a pesquisar sem realizar pesquisa. Severino (2006, p. 69) afirma que:

A realização de uma pesquisa científica está no âmago do investimento acadêmico exigido pela pós-graduação e é o objetivo prioritário dos pós-graduandos e seus professores. Até mesmo o processo de ensino-aprendizagem nesse nível é marcado por essa finalidade: desenvolver uma pesquisa que realize, efetivamente, um ato de criação de conhecimento novo, um processo que faça avançar ciência na área. Pouco importa se as preocupações imediatas sejam com o aprimoramento da qualificação do docente de 3º grau ou do profissional. Em qualquer hipótese, esse aprimoramento passará necessariamente por uma prática efetiva da pesquisa científica. Aliás, é preparando o bom pesquisador que se prepara o bom professor universitário ou qualquer outro profissional.

Tanto Saviani (2006) quanto Severino (2006) concordam que a pesquisa é o ponto central da pós-graduação, devendo ela guiar tanto a construção dos projetos dos discentes quanto a prática docente dos orientadores. No entanto, Saviani (2006) faz uma importante distinção no que se entende por pós-graduação lato sensu e pós-graduação stricto sensu, apontando as justificativas para cada um:

A pós-graduação lato sensu se proporá a garantir a assimilação dos procedimentos ou resultados do avanço da pesquisa, por parte dos profissionais da área em referência, ajustando o seu perfil às mudanças operadas no perfil da sua profissão. (SAVIANI, 2006, p. 138).

Continua:

Os programas de pós-graduação stricto sensu, por sua vez, se justificam não apenas em razão da necessidade de assimilação dos procedimentos e resultados da pesquisa, mas tendo em vista o próprio avanço do conhecimento, isto é, o desenvolvimento das pesquisas numa área determinada, contribuindo diretamente para essa finalidade. (SAVIANI, 2006, p. 138).

Com a centralidade da pesquisa na pós-graduação stricto sensu, o papel do professor e sua inserção enquanto pesquisador configura-se como crucial. Severino (2006) enfoca a necessidade da formação do professor universitário e a imprescindível prática não só da docência, mas da pesquisa como atividade contínua e sistematizada, não devendo, desse modo, os docentes serem apenas “conferencistas, precisam atuar prioritariamente como docentes pesquisadores, ou melhor ainda, como pesquisadores docentes”. (SEVERINO, 2009, p. 16).

Destaca que pesquisar é construir o objeto, a partir da busca em fontes primárias e com o auxílio de fontes secundárias, mediante instrumentos epistemológicos e técnicos, que vão caracterizar a pesquisa especializada, que irá construir novos conhecimentos. Afirma que a pesquisa inicia-se a partir da inserção do pesquisador em um contexto problematizador, disponibilizado por meio das aulas, leituras e participação em grupos de estudos e eventos científicos, que irão subsidiar a construção da pesquisa e de sua sistematização técnica metodológica.

Severino (2009) indica ainda a importância das linhas de pesquisa nos programas de pós-graduação, para a construção de referências e núcleos de estudos, apontando a especialidade e o foco de pesquisa dos docentes, organizados de forma coletiva, constituindo o que ele chama de “sujeito coletivo”, que irá consolidar as pesquisas e publicações das produções.

Saviani (2006) faz um breve resgate da consolidação da pós graduação no Brasil, indicando que a preocupação em criar universidades no Brasil, iniciou-se a partir do final do Império e que até o final da Primeira República os projetos não vingaram. Destaca que com as Reformas Francisco Campos, a partir de 1930, foi “instituído o regime universitário no Brasil através do Decreto nº 19.851, de 11 de abril de 1931”, com cursos no nível de graduação. A formação dos professores para as universidades ocorria de modo “espontâneo” pela absorção de alunos recém-formados que se destacassem em seus estudos, sendo convidados para trabalharem nas disciplinas como auxiliares ou assistentes, preparando-se assim, para assumir a cadeira. Aliado a esse “estágio”, eram oferecidas bolsas para a realização de doutorado no exterior, assim como havia também a contratação de professores do exterior para atender às demandas da universidade. Depois disso, foi instituída a defesa pública de tese diante de uma banca constituída pela administração da universidade, tendo o orientador como presidente. (SAVIANI, 2006, p.139 e 140).

Saviani (2006) divide a trajetória histórica da pós-graduação em períodos, são eles: 1) heroico e 2) fase de consolidação e expansão. O primeiro período é marcado pela fase de implantação da pós-graduação no Brasil e o autor designa esse momento de heroico “porque foi necessário criar as condições praticamente a partir do nada”. Nesse período, os professores eram do exterior ou foram formados no exterior. Os professores disponibilizavam seus livros pessoais como apoio aos alunos, devido às precárias estruturas das bibliotecas, assim como havia acúmulo de funções para poder realizar o trabalho. Com o tempo, os critérios de avaliação e acompanhamento foram sendo estipulados e fiscalizados pela CAPES e os cursos foram surgindo e sendo reconhecidos. As instituições pioneiras foram: PUC-RJ, criada em 1965; PUC-SP, criada em 1969, com a área de Psicologia Educacional; Programa de Mestrado em Currículo, da UFSM, criado em 1970. A expansão teve ênfase em 1971, no qual foram criados quatro programas, em 1972 foram criados mais seis programas, continuando a ampliação nos anos subsequentes, sendo que em 1976, tem início a criação do nível de doutorado, marcando o início da consolidação da pós-graduação.

A CAPES com o objetivo de incentivar o crescimento da pós-graduação estimulou a criação de Associações Nacionais por área de conhecimento. Na área da educação

foi criada a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação (ANPED), cuja primeira reunião foi realizada em 1978, em Fortaleza. Outro marco importante foi a criação do PICD (Programa Institucional de Capacitação de Docentes), criado pela CAPES, em 1976, para oferecer bolsas de estudos a professores universitários, com salário integral, em instituições renomadas no país.

A fase da consolidação foi marcada pela criação do mestrado em educação da UFSCar e da UFPR, em 1976. Surgem também os programas de doutorado da PUC-RJ e da UFRGS. Há uma crescente ampliação dos programas de mestrado e doutorado, que irá se desacelerar em 1980, quando ocorre um lapso de 5 (1979-1984) e 7 (1982-1989) anos sem abrir nenhum programa de mestrado e de doutorado, respectivamente. Sendo retomada a expansão do mestrado apenas em 1984 e do doutorado em 1989.

Atualmente, apesar de ter havido um crescimento no número de programas, por outro lado, ocorreram: uma proliferação de instituições privadas, assim como convênios com instituições estrangeiras para a oferta de mestrados e doutorados a distância; aumento dos centros universitários, com foco para o ensino, em detrimento da pesquisa, tendo para isso, o aval da legistação (Decreto nº 2.306/1997) do MEC (Plano Nacional de Educação) e da Constituição Federal de 1988. Outras consequências para a pós-graduação foi a busca por diminuir o tempo do mestrado e doutorado, com proposta inclusive, de extinção do mestrado e a criação do mestrado profissional.

Saviani (2006) afirma que a pós-graduação no Brasil, em sua estrutura organizacional tem inspiração americana, no entanto, a implantação dos programas é de influência da Europa continental, conforme explica:

É interessante observar que nos Estados Unidos prevalecia na educação básica, sob influência do ideário da pedagogia nova, o objetivo de socialização das crianças e jovens justificado pelo discurso do incentivo à autonomia e iniciativa dos alunos, ficando em segundo plano o domínio dos conhecimentos sistematizados; em contrapartida, no nível superior, os alunos tendiam a ser postos diante de uma organização bastante definida que implicava tarefas de orientação e direção a serem exercidas pelos docentes. Inversamente, na Europa, os sistemas de educação básica foram organizados ainda sob a égide da concepção tradicional herdada do Iluminismo que colocava como objetivo principal o domínio dos conhecimentos sistematizados; em consequência, tendia-se a se esperar dos alunos que ingressavam na universidade um grau de maturidade e de autonomia intelectual que dispensava, por parte dos professores, uma direção ou mesmo uma orientação mais direta. E, especialmente na pós-graduação, que era constituída fundamentalmente pelo doutorado, esperava-se que os candidatos concebessem e realizassem por si mesmos o próprio trabalho, sendo o orientador mais um examinador e o presidente das bancas de exame do que alguém que dirigia e interferia diretamente na definição e desenvolvimento do tema de estudo do doutorando. Assim, enquanto a experiência universitária norte-americana põe uma certa ênfase no aspecto técnico-operativo, na experiência europeia a ênfase principal recai sobre o aspecto teórico. (SAVIANI, 2006, p. 151-152).

Como no Brasil há uma forte influência europeia na formação dos professores, entende-se a exigência ou a pressuposição de conhecimentos básicos de mestrandos, sendo dada certa autonomia aos mesmos nas definições do objeto e no encaminhamento da pesquisa. Esse fator acarretava em muito tempo para a realização do mestrado, já que a pressuposição de autonomia, não se concretizava. Por conta disso, houve uma pressão pela redução do tempo de realização do mestrado no Brasil.

Kuenzer (2005) destaca a política de avaliação da CAPES, afirmando ter esta, fatores positivos e negativos tanto para a ampliação quanto para a qualidade da pós- graduação. Como aspectos positivos: centralidade que passa da docência para a pesquisa; consolidação de programas ao invés de cursos; relação das disciplinas com as linhas de pesquisa; produtos da pesquisa como teses e dissertações; as linhas de pesquisa definindo: o percurso curricular, os seminários e os orientadores previamente. Por outro lado, como aspectos negativos: surto produtivista; redução do tempo de duração dos cursos, principalmente de mestrado; diferenciação de oferta de bolsas e tempo de duração dos cursos conforme conceito dos programas.

A autora considera que a consolidação da pós-graduação como lócus de pesquisa e de produção de conhecimento, nos leva a indagar que tipo de conhecimento está sendo produzido nos programas de educação?

Destaquei as pesquisas sobre produção em educação, educação especial e educação de surdos, a fim de indicar, de forma breve, o que tem sido produzido nesses campos temáticos, visando situar o objeto de pesquisa analisado na presente pesquisa.