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Contextualização acadêmica da Proposta Curricular para o Ensino de Ciências e Programas de

Além da contextualização histórica, é fundamental situar academicamente os Documentos curriculares oficiais focalizados no presente estudo, realizando uma revisão bibliográfica das teses e dissertações que também se ativeram a alguma característica da PCC-SP. Considerando a ocorrência de grande diversidade nos objetivos e enfoques desses trabalhos, a contextualização visará uma rápida caracterização de cada um e a identificação de indícios que revelem, por parte dos respectivos pesquisadores, o reconhecimento da existência de duas Versões da PCC-SP, bem como alguma afinidade especial com a temática ambiental.

Como referência para detecção desses estudos acadêmicos, adotou-se o documento O

ensino de Ciências no Brasil: catálogo analítico de teses e dissertações: 1972-1995

(MEGID NETO, 1998). Além dos trabalhos identificados a partir desse Catálogo, foram localizados no CEDOC22 outros, defendidos após o período por ele abrangido (dezembro de 1995).

22Centro de Documentação em Ensino de Ciências da FE-UNICAMP, vinculado ao Grupo de Estudo e Pesquisa em Formação de Professores da Área de Ciências (FORMAR-Ciências). Para maiores esclarecimentos acerca do catálogo ver MEGID NETO,

Todas as teses e dissertações localizadas, dentro dos critérios de escolha e condição de busca estabelecidos, encontram-se discriminadas no Quadro 2.3.

Quadro 2.3 Teses e dissertações que abordam a Proposta Curricular para o Ensino de Ciências e Programas de Saúde – São Paulo.

ANO DADOS DA PESQUISA

1989 João Cardoso PALMA FILHO. A reforma curricular da Secretaria da Educação do Estado de são Paulo para o ensino de 1º grau (1983-1987): uma avaliação crítica. São Paulo - SP : PUC-SP, 2v.

254p; 94p. (Dissertação de Mestrado)

1991 Clarice Sumi KAWASAKI. O professor e o currículo de Ciências - 1º grau - concepções de ensino em debate. Campinas - SP : Faculdade de Educação, UNICAMP, 309p. (Dissertação de Mestrado)

1992 Mariley Simões Flória GOUVEIA. Cursos de Ciências para professores de 1º grau: elementos para uma política de formação continuada. Campinas - SP : Faculdade de Educação, UNICAMP, 283p.

(Tese de Doutorado)

1992 Célia Lusia Martinelli JOAQUIM. Estudando a experimentação no ensino de Ciências. São Carlos - SP

: Centro de Educação em Ciências Humanas, UFSCar. 264p. (Dissertação de Mestrado)

1994 Maria Ivanil Coelho MARTINS. Interferências no trabalho do professor de primeira a quarta série segundo sua ótica - destaque para o ensino de Ciências. Campinas - SP : Faculdade de Educação,

UNICAMP, 255p., (Dissertação de Mestrado)

1995 Ivan Amorosino do AMARAL. Em busca da planetização: do ensino de Ciências para a Educação Ambiental. Campinas - SP : Faculdade de Educação - UNICAMP. 2v, 650 p. (Tese de Doutorado).

1995 Antónia Luísa MIORIM. Proposta curricular para o ensino de Ciências: ações e revelações. São

Carlos -SP : Centro de Educação e Ciências Humanas, UFSCar, 152p. (Dissertação de Mestrado)

1998* DINIZ R.E.S. As concepções dos professores e a proposta curricular para o ensino de Ciências e programas de saúde - 1º grau: possibilidades de inovação. São Paulo - SP : Faculdade de Educação,

USP, 1998. (Tese de Doutorado)

1999* Jorge CHINEN. O ambiente e o ensino de Ciências: a fala do professor como um dos elementos de sua formação continuada. Campinas - SP, Faculdade de Educação, UNICAMP (Dissertação de

Mestrado)

2001* Ana Maria Brito AIRES. Contribuições da disciplina Elementos de Geologia para a formação da concepção de ambiente do professor de Ciências: o caso da FAFIPE-SP. Campinas - SP : Faculdade

de Educação, UNICAMP, 164p. (Dissertação de Mestrado)

* Pesquisa defendidas após a data limite para a coleta e inserção no catálogo O ensino de Ciências no Brasil: catálogo

analítico de teses e dissertações: 1972-1995 (MEGID NETO, 1998), dezembro de 1995.

Foram, pois, identificadas sete dissertações de mestrado e três teses de doutorado que contemplam, com diferentes ênfases, aspectos relacionados à PCC-SP, sendo que apenas uma delas centra seu estudo na questão do ambiente.

As duas mais antigas não têm seus focos temáticos exclusivamente sobre a PCC-SP, sendo direcionadas para concepções de currículo, em termos de fundamentos e estrutura. A pesquisa de PALMA FILHO (1989) envolve as Propostas Curriculares de Português, Matemática, Ciências, Geografia e História voltadas para o ensino fundamental, produzidas na década de 80 a pedido da SEE-SP. O autor centrou sua busca na identificação dos paradigmas curriculares que estariam fundamentando as diferentes Propostas. Sua base teórica assenta-se em um esquema conceitual

proposto por James MACDONALD (1975)23, sustentado, por sua vez, nas idéias de Habermas sobre a relação entre as ações humanas e os interesses que as fundamentam. O pesquisador conclui que a PCC-SP localiza-se próxima ao paradigma dinâmico-dialógico24, por apresentar-se mais aberta ao trabalho do professor e objetivar a emancipação do cidadão. Palma Filho refere-se à Versão de 1988.

A outra pesquisa, realizada por KAWASAKI (1991), direciona-se para a investigação das concepções e práticas dos professores de Ciências da rede pública estadual da região de Campinas-SP, procurando compará-las com as concepções de ensino de Ciências, tanto do currículo oficial vigente desde a década de 70 até meados da década de 80 – o GCC-SP – quanto da PCC-SP. Conclui que as concepções de Educação, Ciência, Currículo e Ensino de Ciências dos professores tendem a ser inovadoras, porém, sua efetivação no trabalho em sala de aula, ainda guarda características pertencentes ao Ensino Tradicional. A bibliografia indica que a pesquisadora baseou-se na Versão de 1988 da PCC-SP.

Dois estudos, bastante distanciados no tempo, focalizam suas atenções em duas das concepções básicas da PCC-SP. O primeiro deles, desenvolvido por JOAQUIM (1992), toma como referência o uso da experimentação no ensino de Ciências pelos professores das escolas oficiais de primeiro grau da cidade de São Carlos – SP. Aproxima-se do enfoque de KAWASAKI (1991) ao comparar as práticas dos professores com as concepções de experimentação do GCC-SP e da PCC-SP, novamente detectando descompasso entre o discurso e sua efetivação no trabalho pedagógico.

Uma das peculiaridades da pesquisa desenvolvida por JOAQUIM é o resgate da concepção de Ciência apresentada pela PCC-SP – entendida como uma atividade humana, integrada e comprometida com a sociedade – e a influência dessa opção na construção dos fundamentos epistemológicos e metodológicos sobre a visão da experimentação da Proposta Curricular de Ciências. Todavia, a pesquisadora não faz qualquer menção à existência de duas Versões do Documento. A bibliografia traz a data de 1987 para a PCC-SP em questão.

23 Segundo Macdonald, existiriam basicamente três paradigmas de desenvolvimento de currículo: o técnico-linear, o circular

consensual e o dinâmico-dialógico. Tais paradigmas são muito bem apresentados e discutidos em um artigo de DOMINGUES (1986).

24 Esse paradigma curricular apoia-se nas teorias neo-marxistas, propagadas principalmente pelos filósofos da Escola de Frankfurt,

que propõem três premissas básicas para que o currículo seja classificado como fundamentado nesse paradigma: (...) a) o currículo

não pode ser separado da totalidade do social, deve ser historicamente situado e culturalmente determinado; b) o currículo é um ato inevitavelmente político que objetiva a emancipação das camadas populares; c) a crise que atinge o campo de currículo não é conjuntural, ela é profunda e de caráter estrutural. (DOMINGUES, 1986, p.360)

O outro estudo, realizado por CHINEN (1999), representa o caso particular que adotou como temática o ambiente e o ensino de Ciências, tendo como elemento norteador a PCC-SP, Versão 199225. À primeira vista muito próxima da presente pesquisa, na realidade CHINEN enveredou por um caminho bem diferente: tentar modificar a concepção de ambiente de um conjunto de professores da rede estadual de ensino de Mauá-SP, tomando como referência a correspondente concepção da PCC-SP e avaliando a influência de diversos fatores nos resultados obtidos. O autor menciona brevemente no texto a existência de duas Versões da PCC-SP, justificando haver escolhido a de 1991 por ter sido a mais divulgada.

Três pesquisas buscam discutir acerca das dificuldades de implementação da PCC-SP. MARTINS (1994) investigou fatores intervenientes na prática pedagógica de professores de 1ª a 4ª séries do ensino fundamental de Capivari-SP. No tocante especificamente ao ensino de Ciências detectou, ao lado de outros fatores de caráter genérico, a influência negativa do que as professoras consideram a grande extensão do conteúdo sugerido pela Proposta, mas, em contrapartida, identificou a aceitação para a realização de experimentos. Mais uma vez não há qualquer menção no texto acerca da existência de duas Versões da PCC-SP, sendo que a bibliografia indica a de 1988.

MIORIM (1995), por sua vez, apresenta um relato de sua participação como monitora de Ciências no processo de construção e implementação da PCC-SP/88. Sua pesquisa estrutura-se a partir de entrevistas com alguns membros da equipe técnica de Ciências da CENP e com o assessor do Documento, a fim de discutir sobre as dificuldades de implementação, por parte dos professores, dos princípios metodológicos e epistemológicos da Proposta. Não especifica a existência de duas Versões desse Documento, embora seu foco seja explicitamente o processo de constituição da PCC-SP/88.

Bem mais recentemente, DINIZ (1998) procura captar diretamente junto aos professores de Ciências de 3º e 4º ciclos do ensino fundamental, quais suas dificuldades em relação à PCC-SP. Como a investigação desenvolveu-se junto a professores de uma Escola-Padrão, envolveu a Versão de 1991, pois na sua bibliografia o ano da publicação é 1992, apesar de nada explicitar a respeito. Além disso, o autor da pesquisa não menciona, em qualquer local de seu texto, a existência da Versão de 1988.

Como essa tese é estritamente direcionada à PCC-SP, é preciso deter-se um pouco sobre os comentários tecidos por DINIZ a respeito desse Documento. Na página 43 o autor comenta especificamente sobre a organização da estrutura das Sugestões Programáticas apresentada pela PCC-SP/91, que as classifica em Enfoques subdivididos em Conteúdos. Quando, uma das professoras26 entrevistadas realiza um comentário acerca da divisão dos conteúdos da Proposta em quatro temas centrais: energia, matéria, Terra como planeta e seres vivos, o pesquisador não faz nenhuma ressalva de que essas considerações só fazem sentido quando endereçados à Versão de 1988.

O mais recente dos estudos identificados nesta revisão foi realizado por AIRES (2001). A autora, ao resgatar episódios de sua formação profissional responsáveis pelo desenvolvimento de sua concepção de ambiente, destaca dois momentos: encontros e textos promovidos pela CENP/SEE-SP voltados para a difusão e implementação da PCC-SP, no período de 1985 a 1990, quando a autora atuava como monitora de Ciências junto à CENP; e participação em projetos de capacitação de Assistentes de Apoio Pedagógico (AAP), junto à FDE (Fundação para o Desenvolvimento da Educação), vinculada à SEE-SP, voltados para a implementação da Proposta junto ás Escolas-Padrão, no período de 1992 a 1996. Curiosamente, apesar dos referidos períodos abrangerem, respectivamente, as épocas de vigência de cada uma das Versões, o texto não faz qualquer menção a respeito e a bibliografia inclui unicamente a PCC-SP/88.

Para concluir, há dois estudos históricos relativos ao desenvolvimento do ensino de Ciências nas últimas décadas. Aquele realizado por GOUVEIA (1992) centra-se nos processos de formação continuada no contexto dos movimentos de inovação no ensino de Ciências, no período de 1960 a 1990, a partir de suas experiências como educadora especialista na área. Confere especial destaque aos processos de elaboração e implementação inicial da PCC-SP, como um período raro de especial envolvimento dos professores na inovação educacional. As descrições, depoimentos e período abrangido pela pesquisa permitem inferir tratar-se da Versão de 1988.

Finalmente o trabalho de AMARAL (1995), entre outras discussões, realiza o resgate histórico mais completo disponível sobre a produção da PCC-SP, fazendo-o sob o ângulo de assessor da equipe técnica de Ciências da CENP durante a preparação e início da implementação do Documento, compreendendo o período de 1985 a 1995. Nessa reconstituição do processo, toma como referência a concepção curricular de Ciências, assentada em três eixos: concepções de

educação, ciência, ambiente e respectivas relações com a sociedade. O pesquisador destaca, entre outras, duas características principais da PCC-SP que a distingue do Guia Curricular: a escolha do ambiente como tema programático central, gerador e unificador de todo o currículo de Ciências e a integração dos currículos de Ciências e Programas de Saúde. As características são de especial interesse para o presente estudo.

Com relação à especificação da existência de duas diferentes Versões, AMARAL explicita a modificação ocorrida em 1991, identificando uma desfiguração do Documento original. Destaca que, além de substituir os Ciclos pela seriação, a “nova” PCC-SP altera os temas unificadores e extingue os enfoques na forma como haviam sido originalmente propostos. É importante ressaltar literalmente a opinião do pesquisador em questão (e, também assessor da PCC-SP/88), que assim se expressa acerca da PCC-91:

(...) assumia um caráter paradoxal: na sua 1º Parte (histórico, fundamentos teóricos e diretrizes programático-metodológicas), mantinha-se praticamente intacta a Versão anterior; na sua 2ª Parte (operacionalização programático- metodológica), eram introduzidas as novidades mencionadas. A um leitor atento e arguto, passaria a provável sensação de estar diante de duas propostas diferentes e equivocadamente justapostas. (AMARAL, 1995, p.323-324).

Resumidamente:

ð Sete pesquisas baseiam-se na PCC-SP/88, duas na PCC-SP/91 e apenas uma leva em consideração as duas Versões. Estes dados tornam-se ainda mais significativos quando são identificadas que oito pesquisas foram encerradas a partir de 1992, ou seja, após a publicação da 2ª Versão da Proposta, sendo que esta só é tomada como referência em duas das pesquisas mais recentes (DINIZ e CHINEN).

ð Oito pesquisas sequer mencionam, no texto ou na bibliografia, a existência de duas Versões da Proposta. As duas que reconhecem a existência de duas Versões têm como autores AMARAL, assessor da PCC-SP/88 e a outra, um monitor/AAP de Ciências (CHINEN), tanto do período da CENP, quanto da FDE. Outra monitora/AAP de Ciências (AIRES), com exercício também nos dois referidos períodos, não faz qualquer referência à Versão de 1991. MIORIM, também monitora/AAP, nada comenta sobre a existência de duas Versões.

ð Apenas três pesquisas (MIORIM, DINIZ e CHINEN) tomam a PCC-SP como seu foco central ou objeto de estudo.

ð Somente três pesquisas (AMARAL, CHINEN e AIRES) abordam explicitamente a concepção de ambiente da PCC-SP. Coincidentemente as três foram desenvolvidas por pesquisadores que haviam envolvido-se na elaboração e/ou implementação da Proposta. Destas, apenas a de CHINEN adota o ambiente como um dos seus objetos de estudo, investigando-o sob a ótica da mudança de concepção dos professores investigados.

Estes fatos levam inevitavelmente a inquirir se resulta da desinformação da maioria dos pesquisadores acerca da existência de duas Versões oficiais da PCC-SP, ou da não percepção de diferenças significativas entre ambas, seja porque seriam irrelevantes ou muito sutis. Qualquer que seja o motivo, justifica-se o interesse de uma investigação comparativa entre ambas as Versões e que tome como objeto de estudo o ser humano e suas relações com os demais componentes do

CAPÍTULO 3

AS ESPECIFICIDADES DA ESPÉCIE

HUMANA PERANTE OS DEMAIS

COMPONENTES DO AMBIENTE:

CONSIDERAÇÕES VARIADAS SOBRE O

TEMA DA PESQUISA

Ou a angustiante e fascinante descoberta de que não basta

ser, é preciso também se tornar humano.

Homem vem de humus que significa terra fecunda. Adão, Adam, em hebraico, ‘criatura humana feita da terra’, provém de adamá que quer dizer mãe Terra. O ser humano é filho e filha da mãe-Terra. Ele é a Terra em seu momento de consciência, de responsabilidade e de amor. Estas palavras, Homo-humus, Adam-adamá, já apontavam para a estreita relação do ser humano para com a Terra e por meio da Terra para com os seres vivos e todo o universo.

No Capítulo 1 ficou esclarecido que as relações entre os seres humanos e os demais componentes do ambiente seriam tomadas como objeto de estudo do presente trabalho. Neste Capítulo, buscar-se-á caracterizar as especificidades das ações/reflexões humanas perante o ambiente, bem como situar este tema no âmbito da produção acadêmica brasileira.