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B O contrato de Franquia Empresarial

No documento FLÁVIO LUCAS DE MENEZES SILVA (páginas 53-76)

III – FORMAÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DO CONTRATO

III. B O contrato de Franquia Empresarial

É pacífico na doutrina moderna que contrato é um instituto jurídico do Direito Privado, celebrado por duas ou mais partes112, cujo sentido amplo assenta na celebração de negócio jurídico formado pelo concurso da vontade dos contratantes. Ainda se pode dizer, stricto sensu, que o contrato se forma pelo concurso da vontade dos contratantes produzindo, em sua perfeição, efeitos obrigacionais, onerosos ou não, para as partes que o celebram113. Pacífica ainda é a doutrina que diz que o contrato é o instrumento jurídico, por excelência, da vida econômica moderna, dado que, conforme ensina Enzo Roppo, reflete sempre uma realidade exterior a si próprio114; isto é, está em consonância aos variados aspectos culturais em uso e não se configura um reflexo exclusivo do universo jurídico.

Deverá, outrossim, o contrato referir-se ao entorno social e econômico no qual se encontra inserido, respondendo-lhe as solicitações e demandas. Em entrevista datada de 17 de setembro de 2001, o saudoso Professor Miguel Reale considera que o valor é uma expressão do dever ser115; daí que a integralidade do conhecimento só seja possível quando se leva em consideração a historicidade do objeto estudado116. Por isso a necessidade do perfeito ajuste entre o instrumento jurídico e a sociedade, na forma em que a Teoria Tridimensional do Direito prevê, também no que se refere ao Direito dos Contratos.

112 Contratos bilaterais ou plurilaterais.

113 GOMES, Orlando. Contratos. Op. Cit. p. 19-21.

114 ROPPO, Enzo. O contrato. Coimbra: Ed. Almedina. 1888. p. 7.

115 Conforme entrevista concedida a este pesquisador em 17 de setembro de 2001. 116 Idem, ibidem.

Segundo Fábio Ulhoa Coelho, nos tempos que hoje correm e em função da reliberalização117 da economia, os contratos de colaboração – entre os quais, os de franquia empresarial – representam distintas formas de atendimento da demanda por mercadorias, no plano da economia globalizada e da mundialização da cultura; e, no plano da evolução do direito dos contratos, uma retomada do prestígio da autonomia da vontade, desde que salvaguardada a igualdade de condições econômicas, sob a influência da socialização do Direito. Com efeito, no transcurso do século recém-encerrado, havia um maior dirigismo contratual por parte do Estado que se punha muito além da tutela dos interesses de hipossuficientes118.

A análise que se faz da Lei Especial n° 8.955/1994 leva em conta este novo estágio da economia e da sociedade, ao qual o direito dos contratos deverá reportar-se, para cumprir com aquilo que Miguel Reale chamou de Teoria Tridimensional do Direito e que, cerrando o foco, Enzo Roppo entende ser o reflexo da realidade externa presente no contrato119. Destarte, estuda-se as características do Contrato de Franquia Empresarial, sempre considerando a franquia de negócio formatado, quanto à previsibilidade deste instrumento contratual; bem como, as obrigações de cada uma das partes quanto aos benefícios patrimoniais, exigências formais, cumprimento do contrato ao longo do tempo e obrigações autônomas.

III.B.1. O contrato preliminar

Há na doutrina diversas denominações para o instituto do contrato preliminar, tais como pré-contrato, promessa de contrato, compromisso ou contrato preparatório120, este adquirindo maior relevância nos últimos anos, principalmente com o advento do Código Civil de 2002. Por certo período, doutrinadores de peso chegaram a afirmar que se tratava de um contrato supérfluo, eis que seu objeto apenas cria uma obrigação de celebrar o contrato

117 Entenda-se “reliberalização econômica” como sinônimo do termo “flexibilização econômica”, mais usual

no campo da terminologia econômica atualmente.

118 ULHOA COELHO, Fábio. Curso de direito Comercial. Op. cit. pp. 3-18. 119 ROPPO, Enzo. O contrato. Op. cit. p. 7

120 GOMES, Orlando, atualizado por JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antonio e CRESCENZO MARINO,

definitivo. No entanto, a prática de alguns negócios jurídicos vem demonstrando que o contrato preliminar tornou-se hoje uma figura indispensável.

Conforme ensina Orlando Gomes são duas as principais teorias que explicam a natureza do contrato preliminar:

Para a primeira, é o contrato que tem por fim obrigar as partes a celebrar outro contrato. Para a segunda, o contrato de execução subordinado à vontade de um ou dos dois contratantes, para que outro produza seus normais efeitos121

De acordo com a primeira teoria, o contrato preliminar é um pactum de contrahendo – como é designado no Direito Público Internacional – isto é, o tratado firmado. Tal como registra Hildebrando Acióli,

A designação de pacta in contrahendo aplica-se a acordos que estipulam para as partes a obrigação de negociar uma convenção ulterior sobre o objeto determinado, embora não comportem, necessariamente, a obrigação de se chegar ao resultado previsto e nem sequer a de se chegar à conclusão de um acordo qualquer122.

Desta forma, aquele que firma contrato preliminar obriga-se a emitir a necessária declaração de vontade e a praticar os indispensáveis atos de conclusão de outro contrato que projetou realizar123. Orlando Gomes, examinando esta teoria, aponta duas críticas que, em sua opinião, explicam a sua fragilidade, uma delas, aliás, já antecipada neste trabalho. Admitindo-se que a função do contrato preliminar é a celebração do contrato definitivo, alguns doutrinadores entendem que ele nada mais é do que uma “entidade supérflua” e sua estipulação não passa de desnecessário rodeio124. Entretanto, alguns institutos jurídicos já comprovaram a indispensabilidade do contrato preliminar para que o negócio jurídico principal se efetue, dentre os quais o exemplo clássico é a promessa de compra e venda, especialmente útil para possibilitar à parte compradora um período necessário para a averiguação da regularidade do imóvel e da situação do vendedor mediante certidões, evitando-se a configuração de fraude à execução ou contra credores.

121 Idem. Ibidem. p . 160.

122 TRATADO DE DIREITO PÚBLICO INTERNACIONAL, I, 861. 123 GOMES, Orlando. Op. cit. p. 160.

No caso do Business format franchising, o contrato preliminar também é fundamental. Isto porque durante a vigência do contrato preliminar o franqueador terá reais condições para avaliar a compatibilidade do promissário franqueado à rede, assim como sua aptidão para a operação do negócio. Fica evidente que o franqueador deverá, muito antes da assinatura do contrato preliminar ou de qualquer outro instrumento que venha a produzir maior vinculação, avaliar o perfil do candidato. Mas, a experiência tem demonstrado que os resultados dessas avaliações preliminares, em alguns casos, não chegam a se confirmar na prática. Além disso, essa etapa que antecede a assinatura do contrato definitivo servirá para a localização de ponto comercial compatível com a atividade da rede, para a construção ou adaptação do imóvel escolhido, para a constituição da empresa franqueada e, em especial, para dar início à transmissão do know-how mediante treinamentos, entre outras providências preparatórias.

A segunda crítica diz respeito à inexistência de interesse prático do contrato preliminar pela aplicação da regra nemo praecise cogi potest ad factum para a eficácia das obrigações, ou seja, a recusa do devedor de determinada obrigação não cumprida deve ser convertida em obrigação de indenizar, não podendo ser o devedor compelido a cumprir especificamente o prometido125. Entretanto, esta teoria acabou sendo superada com a vigência do Código Civil de 2002, cujo artigo 464 passou a possibilitar a supressão da vontade da parte inadimplente, tornando o contrato preliminar definitivo126.

Já para os partidários da segunda teoria que explica a natureza do contrato preliminar, considera-se que o contrato definitivo já está compreendido no contrato preliminar e, conseqüentemente, não há a necessidade de nova oferta ou nova aceitação. Assim, explica Orlando Gomes,

...a segunda teoria vê no pré-contrato o acordo de vontades que subordina a conclusão do contrato definitivo à condição meramente potestativa. Dependeria este da condição si volet, concluindo-se somente se as partes o quiserem127.

125 Idem. Ibidem. 160 - 161.

126 Art. 464. “Esgotado o prazo, poderá o juiz, a pedido do interessado, suprir a vontade da parte

inadimplente, conferindo caráter definitivo ao contrato preliminar, salvo se a isto se opuser a natureza da obrigação”.

Entende-se desnecessária a somatória do contrato preliminar ao contrato definitivo, pois, quando da celebração do contrato preliminar, todos os elementos necessários ao estabelecimento do vínculo contratual definitivo já estão estipulados. Por conseqüência, caso haja recusa de uma das partes em cumprir a obrigação, o juiz não suprirá a manifestação da vontade da parte e determinará a execução específica do pré-contrato.

Esta teoria é reforçada pela previsão legal de que o contrato preliminar deverá conter as obrigações principais e condições do contrato de franquia, para, ad fidem, estabelecer liame com o Código Civil que em seu artigo 462 estabelece: O contrato preliminar, exceto quanto à sua forma, deve conter todos os requisitos essenciais do contrato a ser celebrado. Assim, os requisitos de validade do contrato preliminar são, nos termos do artigo 104 do Código Civil em vigor, exatamente os mesmos exigidos para a validade de qualquer ato jurídico, isto é, agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita e não defesa em lei.

Apesar da segunda teoria ser menos difundida no Brasil, parece acertada a sua aplicação para os contratos de franchising, justamente pelas características singulares das relações de franquia. Com efeito, tem-se que a Circular de Oferta de Franquia deverá, nos termos do inciso XV do art. 4º da Lei n º. 8.955/1994, manter o modelo padrão de Contrato de Franquia Empresarial, de maneira que o candidato antes de assinar o contrato preliminar terá ciência de todas as condições e obrigações a serem assumidas.

Portanto, nas situações em que as partes, por qualquer motivo que seja, não celebrarem o contrato definitivo, bastará o início de operação da sua unidade franqueada para que o franqueado tenha a sua vontade externada. E tal situação, de ausência de contrato definitivo, é mais recorrente do que se imagina, pois é bastante comum no dia-a-dia que as partes acabem adiando a celebração do Contrato de Franquia Empresarial em razão de diversos outros compromissos que aparentam maior urgência para a inauguração da unidade franqueada.

Por outro lado, o reconhecimento por parte do franqueador do início do funcionamento da unidade franqueada, mediante a divulgação da unidade aos demais membros da rede ou da inserção do endereço da nova unidade na página de internet da rede de franquia, ou ainda, mediante a cobrança de royalties e o

fornecimento de mercadorias exclusivas da rede, é suficiente para manifestar a sua vontade. Desta maneira, a partir do momento que as partes cumprem as obrigações previstas no contrato preliminar e tem inicio a operação da unidade franqueada, um novo contrato só servirá para conforto das partes, pois as obrigações e os direitos de ambas as partes já estarão seladas.

III.B.2. Natureza jurídica do contrato de franquia empresarial

No capítulo anterior abordou-se a diversidade de definições de franchising encontradas na doutrina e na legislação e, em muitas delas, inclusive naquela trazida pelo legislador brasileiro128, vêem-se inúmeras referências à expressão “sistema”, o que é suficiente para provocar dúvidas sobre o franchising: Seria ele regido por um sistema ou por um contrato?

Na opinião de Adalberto Simão Filho, apoiado no conceito adotado pela Lei n º. 8.955/1994, o franchising se enquadra como um sistema, sendo que para este autor:

Ao conceituar o instituto de franchising, o legislador optou, acertadamente, a nosso ver, não por apresentá-lo como um simples contrato (...) mas como verdadeiro e absoluto sistema de franquia empresarial129.

Parece, no entanto, que o legislador pátrio procurou imprimir características práticas do instituto ao elaborar a definição de franquia empresarial; mas, dada a natureza jurídica imbuída nas relações de franquia é inegável que estas constituem natureza contratual. Nesse sentido, Adriana M. T. de Mello explica que o sistema instituído pela Lei n º. 8.955/1994 nada mais é que seu objeto, ou seja, o conteúdo econômico que a relação obrigacional instrumentaliza, haja vista que

128 Art. 2º. da Lei n º. 8.955/1994: Franquia empresarial é o sistema pelo qual um franqueador cede ao

franqueado o direito de uso de marca ou patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou semi- exclusiva de produtos ou serviços e, eventualmente, também, ao direito de uso de tecnologia de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvido ou detido pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem que, no entanto, fique caracterizado vínculo empregatício. (grifo)

129 SIMÃO F°, Adalberto. Franchising, Aspectos Jurídicos e Contratuais. São Paulo: Editora Atlas, 2000. p

é a função econômica130 que predomina na determinação da definição do

franchising131.

Com efeito, os contratos de franchising são negócios jurídicos cuja função predominante é econômica ou, nas palavras de Orlando Gomes, são aqueles “praticados para que a vida econômica flua na multiplicidade de suas vicissitudes”132. Com razão, é a compulsão pelo crescimento de seu negócio que leva o empresário a optar pelo sistema de franquia133, pois

El otorgamiento de franquicias permite a los negocios crecer con mayor rapidez que de cualquier otra manera. Y en eso radica su mayor recompensa. El sistema de comercialización permite a las compañías pequeñas expandirse más allá de sus mercados locales y regionales [...] El otorgamiento de franquicias brinda a las compañías las herramientas legítimas para el crecimiento y el desarrollo del negocio. Las cuotas iniciales por franquicia generan ingresos que pueden regresarse a la matriz de la franquicia y emplearse para inversión, diversificación, mercadotecnia, publicidad, investigación y desarrollo y muchas funciones más, esenciales para el éxito en los mercados de hoy. Es más, al transferir los costos de la expansión a los franquiciatarios, se libera el capital propio para inversión o desarrollo134.

Por sua vez, o franqueado busca obter no franchising uma vantagem competitiva no mercado que não obteria sem o amparo da figura do franqueador e da rede. O franchising surgiu como um novo método de distribuição e comercialização para incentivar e facilitar a venda de certos produtos135, além de uma oportunidade para que empresários inexperientes tenham o seu próprio negócio, aproveitando-se da experiência administrativa e empresarial do franqueador e de uma marca já consolidada no mercado136.

Disso decorre a natureza jurídica bastante complexa do contrato de franquia empresarial, haja vista a proximidade que mantém com outros institutos jurídicos, devendo ser analisado como um amálgama de outros modelos

130 Sobre função econômica dos contratos ver: GOMES, Orlando. Contratos.Op. cit. p. 103 e ss.

131 THEODORO DE MELLO, Adriana M. Franquia Empresarial. Responsabilidade Civil na Extinção do Contrato. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2001. p. 58.

132 Orlando Gomes, atualizado por Antonio Junqueira de Azevedo e Francisco Paulo de Crescenzo Marino

sob a coordenação de Edvaldo Brito, Contratos, 2007, p. 104.

133 SAAVEDRA, Thomaz. Op. cit. p. 23.

134 RAAB, Steven S. e MATUSKY, Gregory. Franquicias: como multiplicar su negocio. P. 107-108. 135 MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. Rio de janeiro: Forense, 1986, p.566. 136 ULHOA COELHO, Fábio. Curso de Direito Comercial. Op. cit. vol I, p. 125.

contratuais. A doutrina é unânime ao reconhecer nele uma figura autônoma,

porém híbrida137, conforme ensina Orlando Gomes:

O franchising é um contrato que se aproxima da concessão exclusiva, da distribuição, do fornecimento e da prestação de serviços. Não é, outrossim, locação nem mandato, mas, sim, figura autônoma, embora híbrida138.

Nesse mesmo sentido, Waldirio Bulgarelli reconhece no franchising uma figura [...] .decorrente de novas técnicas negociais, no campo da distribuição e venda de bens e serviços139. Para Fran Martins, o contrato de franquia compreende uma prestação de serviços e uma distribuição de certos produtos140. E o mesmo autor explica:

A prestação de serviços é feita pelo franqueador ao franqueado, possibilitando a esse a venda de produtos que tragam a marca daquele. A distribuição é a tarefa do franqueado, que se caracteriza na comercialização do produto. Os dois contratos agem conjuntamente, donde ser a junção de suas normas que dá ao contrato a característica de franquia141.

Além da prestação de serviços e da distribuição, outros autores identificam no contrato de franchising elementos dos contratos de compra e venda, licença de marcas, mandato mercantil, comissão mercantil, concessão comercial, sociedade, know-how e até representação comercial, entre outros142.

Na opinião de Fábio Ulhoa Coelho, o contrato de franchising é resultado da conjugação de dois elementos essenciais: a licença de uso de marca e a prestação de serviços de organização de empresa. E explica:

Segundo a estrutura básica do negócio, o franqueador autoriza o uso de marca e presta aos franqueados de sua rede os serviços de organização empresarial [...] o elemento indispensável à configuração do contrato é a prestação de serviços de organização empresarial, ou, por outra, o acesso a um conjunto de informações e conhecimentos, detidos pelo

137 No mesmo sentido ver: MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. Rio de janeiro: Ed. Forense,

1986, p.572.

138 GOMES, Orlando. Op. cit. p. 578.

139 BULGARELLI, Waldirio. Contratos Mercantis. Op. Cit. p. 591. 140 MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. Op. cit. p.572. 141 Idem. Ibidem. p.572.

142 Nesse sentido, ver comparativos entre os institutos nas seguintes obras: FERNANDES, Lina. p. 62 e ss.;

LOBO, Jorge. p. 1 e ss.; PROENÇA FERNANDES, Marcelo Cama. p. 51 e ss.; SIMÃO F°, Adalberto. p.36 e ss; RIBEIRO, Ana Paula. p. 66 e ss.

franqueador, que viabilizam a redução dos riscos na criação do estabelecimento do franqueado143.

Além disso, Fábio Ulhoa Coelho prossegue explicando que os serviços de organização empresarial normalmente são desdobrados em três outros contratos:

...o management, relacionado com os sistemas de controle de estoque, de custos e treinamento de pessoal; o engineering, pertinente à organização do espaço (layout) do estabelecimento do franqueado; e o

marketing, cujo conteúdo diz respeito às técnicas de colocação do

produto ou serviço junto ao consumidor, incluindo a publicidade144.

Na opinião de Américo Luís Martins da Silva, o contrato de franchising “é um conjunto de atos e contratos consolidados dentro de um único ajuste e cada um desses atos e contratos dá origem a obrigações específicas”. Ainda, o mesmo doutrinador identifica nele a existência de seis contratos:

- um contrato de engineering (projeto e execução do design e funcionamento do estabelecimento franqueado);

- um contrato de management (treinamento do pessoal contratado pelo franqueado);

- um contrato de marketing (divulgação padrão dos produtos franqueados);

- um contrato de licenciamento comercial da propriedade industrial (utilização de marca, invenção e outros direitos sobre propriedade industrial);

- um contrato de fornecimento de mercadorias (entrega constante e ininterrupta de determinado produto para revenda) e;

- um contrato de assistência técnica e/ou comercial (prestação de assistência técnica e/ou comercial ao comprador)”145.

Sem dúvida, considerando a evolução do instituto até chegar no atual modelo, Business Format Franchising, não se trata mais de uma simples distribuição de produtos ou uma simples licença de uso de marca. Como bem

143 ULHOA COELHO, Fábio. Curso de Direito Comercial. Op. cit. p. 125- 126. 144 Idem. Ibidem. p. 126.

observou Fábio Ulhoa Coelho, a transmissão da forma de organização de empresa tornou-se indispensável nas franquias modernas e, conseqüentemente, estão implícitos os contratos de engineering, management, marketing, licenciamento de bens e direitos de propriedade intelectual, eventual fornecimento de mercadorias e de assistência técnica citadas por Américo Luís Martins da Silva. Mas o contrato de franchising é ainda mais amplo. Ele compreende, nas palavras de Gladston Mamede, a exploração mercantil do aviamento, da vantagem (ou benefício) de mercado146 do franqueador pelo franqueado, ou seja, o empresário ou a sociedade empresária, em lugar de desenvolver um aviamento próprio147, contrata por meio do franchising, a cessão do aviamento de terceiro

(franqueador), mediante o pagamento de retribuição (royalties)148.

Mas é Luiz E. A. Bojunga quem melhor traduz a real compreensão de cada um dos elementos do franchising, conferindo a cada qual o seu exato valor, e alçando o “management” (que aqui guarda a mesma compreensão que know- how) ao status de principal elemento. Deveras, explica,

Não obstante a licença para utilização da marca ser de vital importância para caracterização da franquia, na aplicação do management pelo franqueador pode-se verificar a existência ou não do franchising. O management na franquia importa no fornecimento do segredo ou processo de produção do produto ou serviço, propiciando que o franqueado não atue no mercado como simples intermediário entre o titular da marca e o público consumidor. No franchising, o franqueado além de ser empresário autônomo, possui o processo ou segredo de produção (bens) ou dos serviços (métodos) que elevaram a marca ao nível de interesse suficiente à própria formação da rede franchising149.

Assim, fundamentalmente, os contratos de franchising são contratos mistos, ou seja, resultantes de um apanhado de variados modelos contratuais, mas cujo resultado deve proporcionar aos franqueados uma vantagem de mercado, independentemente de dispositivo contratual em tal sentido. E essa vantagem, conforme se apresentará de modo extensivo em capítulo adiante, é obtida graças à transmissão do know-how do franqueador ao franqueado; esse

No documento FLÁVIO LUCAS DE MENEZES SILVA (páginas 53-76)