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H Teorias patrimonialistas

No documento FLÁVIO LUCAS DE MENEZES SILVA (páginas 146-151)

PARTE II – O ESTABELECIMENTO FRANQUEADO

II – NATUREZA JURÍDICA

II. H Teorias patrimonialistas

O estabelecimento e as universalidades de direito348 carecem do

346 BARRETO F°, Oscar. Ibidem. p. 94. 347 BARRETO F°, Oscar. Ibidem. pp. 95 a 98.

348 UNIVERSALIDADE. Do latim universalitas, de universalis, gramaticalmente, universalidade é a

generalidade, a totalidade, ou toda a composição, conjunção, ou reunião de várias coisas, congregadas, reunidas, justapostas, coletivadas, para que cumpram certos objetivos. Assim, a universalidade não somente revela o acervo de coisas, a massa de bens e de direitos, o patrimônio, como, no seu conceito de ajuntamento, coleção, concentração, união, traduz o sentido de corporação, colégio, companhia, associação e sociedade. Há, por isso, que se distinguirem as universalidades de coisas e as universalidades de pessoas, como há universalidades de idéias, de princípios e de regras. No direito, ou juridicamente, somente se cogitam das universalidades de coisas (universitates rerum) e universalidades de pessoas (universitates personarum). UNIVERSALIDADE DE COISAS. Nesta hipótese, universalidade sem se afastar do sentido originário, é utilizada para designar o conjunto, ou a coletividade de coisas, consideradas em seu todo, ou na composição, que formaram. Na universalidade de coisas, mesmo que as coisas simples e compostas, que a integrem, não percam a própria individualidade e possam ser tratadas, de per si, mantendo o próprio regime e formando um objeto de direito, a totalidade de coisas universalizadas, por seu lado, adquire uma individualidade própria,

reconhecimento jurídico das universalidades, que dependem do preenchimento de duas condições essenciais: (a) previsão legal no sentido de um tratamento jurídico diferenciado para a soma dos elementos do estabelecimento, quando considerados os elementos diversos na sua individualidade; e, (b) reconhecimento da validade da realização de negócios jurídicos relativos a esse conjunto de bens, considerado como um todo, diversos dos negócios efetuados com os bens isolados.

Tal como define o código civil em vigor, percebe-se que o estabelecimento empresarial preenche os dois requisitos considerados, concomitantemente; daí decorrendo a universalidade. O ordenamento jurídico tutela dois tipos de universalidade: as de direito e as de fato. Portanto, seria necessário verificar em qual das duas o estabelecimento se insere. O art. 91 do código civil preconiza que “constitui uma universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico”.

Não é necessário alongar a discussão quando são examinados os elementos essenciais das referidas universalidades. A de direito é de natureza econômica e é submetida, por lei, a um regime especial e distinto. A de fato corresponde a um conjunto de objetos de direito, sendo que nesta última o caráter

que se submete a trato e regime especial. Por vezes, mesmo, como ocorre na herança, ou na massa falida, atribuem-lhe uma personalidade jurídica, que se mantém enquanto o acerco de bens e de direitos, ou o patrimônio, a que se referem, não tem cumprido o destino legal que lhe foi imposto. Na terminologia jurídica, a universalidade de coisas é manifestada sob as mais variadas denominações. São, assim, universalidades, o patrimônio, ou fundos patrimoniais, a herança, ou massa hereditária, os acervos de várias naturezas, a massa falida. Onde quer que exista um conjunto, ou uma massa de bens e de direitos, trazendo destino econômico e jurídico preestabelecido ou imposto, há uma universalidade. Para formá-la, basta a reunião de bens ou de coisas autônomas, a que se atribuam valores próprios, assim unidas, para que cumpram, ou realizem, um objetivo econômico. E não importa a natureza ou a espécie de cada uma dessas coisas. Na universalidade, a reunião não visa, propriamente, à justaposição ou à conjugação das coisas, mas à somação, ou à totalização dos valores de cada coisa universalizada. Praticamente, pois, a universalização constituidora da universalidade resulta numa composição da ordem meramente econômica, embora sujeita a regime jurídico especial. A universalidade, a rigor, é um complexo de coisas, mesmo heterogêneas. Nela, tanto se integram móveis como imóveis, bens materiais, como imateriais, isto é, coisas corpóreas e incorpóreas, desde que a cada uma delas se possa atribuir, legitimamente, um preço, ou um valor comercial. é princípio, aliás, consagrado pelo direito civil brasileiro: ‘O patrimônio e a herança constituem coisas universais, ou universalidades, e, como tais, subsistem, embora não constem de objetos materiais’ (Cód. Civil, art. 57). A universalidade de coisas distingue-se em universalidade de fato e universalidade de direito, conforme se deriva da vontade ou de ato do homem, ou se deriva da imposição legal. A universalidade de direito (universitates juris) é aquela em que a universalização de coisas é estabelecida pela própria lei, que a submete a regime especial e distinto a que estão sujeitos, individualmente, os bens e direitos, que a compuseram. Nesta espécie, encontramos a herança, a massa falida. A universalidade de fato, ou universalidade do homem (universitates facti ou universitates hominis), é a que resulta da vontade das pessoas, firmada em ajustes, ou convenções. Desta espécie são as universalidades que se firmam nos estabelecimentos comerciais, ou nas aziendas. Firmadas pela vontade das partes interessadas, têm conteúdo traçado por elas, consoante o destino econômico que lhes atribui”. In: Plácido e Silva.Dicionário Jurídico.

unitário decorre da vontade do sujeito, quando dá aos bens que a compõem um destino determinado.349 Silvio Rodrigues salienta essa distinção existente entre as universalidades de fato e de direito, nos seguintes termos:

Quando se trata de um agrupamento de coisas (objeto de direito), (...) fala-se em universalidade de coisas, ou universalidade de fato ou

universitas rerum. Quando a universalidade é composta de um

conjunto de direitos (relações ativas e passivas), tem o nome de

universitas juris.”350

Diz Vicente Rao que

...a chamada universalidade de direito consiste em uma união puramente ideal, que só pela lei pode ser criada, pois somente a lei – e jamais a vontade dos titulares – poderia despojar cada unidade, que desta união participa, de sua peculiar qualificação jurídica para considerar o todo sob um só e novo aspecto, isto é, como um

universum jus.351

Dessa forma, verifica-se que o estabelecimento empresarial não pode ser incluído entre as universalidades de direito e sim entre as de fato. P.R. Tavares Paes sintetiza o quanto segue:

A doutrina nacional se inclina a considerá-lo como universalidade de fato, não obstante corrente significativa o veja como universalidade de direito. Esta não pode ser, pois a universitas juris só se constitui por força de lei. Insta nesse passo repisar os dois conceitos. A universalidade de fato é um conjunto de coisas autônomas, simples ou compostas, materiais ou imateriais, formada pela vontade do sujeito e para uma destinação unitária. Já a universalidade de direito é um complexo orgânico, criado por lei, de relações jurídicas ativas e passivas, como são exemplos o patrimônio, a herança, a massa falida. 352

349 A nota distintiva entre as duas correntes doutrinárias verifica-se nas hipóteses de alienação do

estabelecimento. Isto porque, para os adeptos da teoria da universalidade de fato, em caso de alienação do estabelecimento, seriam transferidos apenas bens, ou seja, um ativo; ao passo que para os adeptos da universalidade de direito, em caso de alienação do estabelecimento, seriam alienados não somente bens, mas também dívidas, em razão de defenderem que o estabelecimento seria formado por relações jurídicas patrimoniais, as quais, por definição, podem atribuir ao seu titular não somente posições jurídicas creditícias e de propriedade, mas também posições de dívida. Com efeito, reconhecer-se no estabelecimento uma universalidade jurídica; e isto é o mesmo que reconhecer que o estabelecimento é formado pelo direito sobre determinados bens, mas que também o é, por sujeição a determinadas obrigações.

350 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil – Parte Geral, 26 ed. v. 1. São Paulo: Saraiva, 1996. p.128. 351 RAO, Vicente. O Direito e a Vida dos Direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991. p. 769. 352 TAVARES PAES, P. R. Curso de Direito Comercial, p. 13.

De acordo ao estabelecido por Modesto Carvalhosa353, uma das

conseqüências de se reconhecer o estabelecimento como uma universalidade de fato é a de que é irrelevante o fato de o empresário seu titular ser proprietário dos bens que o integram. Basta que possua a livre disponibilidade sobre esses bens, ou sobre o próprio estabelecimento, assegurada por um direito real ou contratual. Isso é suficiente para que o empresário possa organizar e empregar esses elementos da forma que considerar mais conveniente à exploração da empresa. Por bastar para o exercício da empresa essa disponibilidade dos bens e do estabelecimento, já se admitia – antes mesmo de ser expressamente previsto no art. 1.143 – que o estabelecimento pudesse ser objeto de negócios jurídicos de transferência, e sob os mais diversos títulos.

O estabelecimento empresarial compreende, portanto, uma universalidade de fato, decorrente da reunião de um complexo de bens materiais e imateriais, organizados pela empresa para o exercício da atividade; e que, quando organizado, tal complexo compõe o patrimônio da empresa. Por ser universalidade, não há necessidade de que os bens integrantes sejam de propriedade do empresário, bastando que detenha – a título de contratos de locação, de arrendamento mercantil e etc – a titularidade desses elementos para o exercício da sua atividade.

Neste sentido, alude Oscar Barreto Filho que o estabelecimento possui características específicas e intrínsecas: (a) que o estabelecimento é o centro da organização da atividade produtora do empresário; (b) tem existência real, e não abstrata, como no caso do patrimônio; (c) sua criação depende da vontade do empresário; (d) é formado exclusivamente por elementos do ativo (bens materiais ou imateriais), dele não fazendo parte elementos do passivo do titular.354 Ainda

que a doutrina compreenda de forma majoritária ser o estabelecimento empresarial uma universalidade de fato em razão da dupla proteção que possui o estabelecimento: a proteção de seus elementos individualmente considerados e a proteção oferecida ao conjunto de bens. A fixação da natureza jurídica atribuída ao estabelecimento empresarial, entre as classificações inicialmente expostas, mostra-se absolutamente pertinente, até mesmo para permitir o ingresso no tema

353 CARVALHOSA, Modesto. Comentário ao Código Civil: parte especial: do direito da empresa (artigos 1.052 e 1.1195). Op. cit. p. 634-635.

principal do presente estudo; qual seja, a apresentação de uma nova espécie de estabelecimento, formado a partir do instituto do franchising.

Nesta linha de raciocínio e considerando o conceito de estabelecimento anteriormente fixado, põe-se em evidência a natureza de direito real presente no instituto do estabelecimento empresarial, tal como definido no artigo 1.142 do código civil. Destarte, o capítulo que se segue será dedicado à apresentação de uma nova espécie de estabelecimento, à sua conceituação e, ainda, à apresentação do regime jurídico que lhe é aplicável.

III - ESTABELECIMENTO FRANQUEADO, UMA NOVA ESPÉCIE DE

No documento FLÁVIO LUCAS DE MENEZES SILVA (páginas 146-151)