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A Constituição portuguesa consagra o entendimento no sentido de que são inconstitucionais as normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados.

O ordenamento jurídico português também adotou um sistema misto de fiscalização de constitucionalidade das normas, reconhecendo expressamente tanto o concentrado quanto o difuso. Entretanto, ao contrário do que ocorre no Brasil, a Constituição Portuguesa em vigor prevê apenas o controle jurisdicional e não mais o político.

O controle difuso deve ser realizado por todo e qualquer tribunal, na medida em que o art. 204 da Constituição da República Portuguesa (C.R.P) é expresso no sentido de que “nos

feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados”.

Dessa orientação constitui corolário que, além das partes, o juiz pode e deve, de ofício, proceder à fiscalização da constitucionalidade de qualquer lei que seja invocada para a solução de um caso concreto, submetido à sua apreciação.

Nesse mesmo sentido, foi a decisão proferida pelo Tribunal Constitucional no acórdão 200/98, ao apreciar caso em que o Supremo Tribunal de Justiça suspendeu a análise de um caso concreto para aguardar a decisão daquele Tribunal em demanda de controle concentrado. Nessa decisão o Tribunal Constitucional entendeu que a suspensão do processo pelo STJ viola o dever de o tribunal analisar a adequação da norma à Constituição. 156

156 “10. Por outro lado, e, decisivamente, tendo presente que o sistema de controlo da constitucionalidade

normativa é difuso na base e concentrado no topo, os juízes têm o poder-dever de fiscalizar a constitucionalidade das normas nos casos que lhes são submetidos a julgamento (artigo 204º da Constituição), independentemente de

O ordenamento jurídico português prevê a fiscalização de constitucionalidade no sistema difuso apenas de forma repressiva e não a preventiva, como, a contrassenso, ocorre com o mandado de segurança no Brasil, tema já apreciado no item 6.3.2 supra.

O controle difuso, embora possa ser realizado por qualquer tribunal, somente pode chegar ao Tribunal Constitucional por intermédio da via recursal, nas hipóteses expressamente previstas na Constituição.

Nesse particular, o ordenamento português também diverge do brasileiro, tendo em vista que neste a matéria constitucional pode ser apreciada, como competência originária, diretamente pelo Supremo Tribunal Federal, a exemplo do que ocorre tanto no mandado de segurança quanto no mandado de injunção, institutos já referidos nos itens anteriores.

Por outro lado, ao contrário do que ocorre em outros sistemas jurídicos em que se instituiu Corte Constitucional (Alemanha, por exemplo), o constituinte português não admitiu a remessa de ofício (reenvio necessário), por intermédio do qual se facultaria ao juiz enviar a questão constitucional alegada no caso concreto para apreciação da Corte Constitucional.157

Em linhas gerais, Canotilho elenca diversos elementos com pressupostos processuais para que se possa suscitar um incidente de constitucionalidade, elementos esses que podem ser sintetizados como sendo: a questão constitucional deve ser suscitada em um processo que analise um caso concreto, perante um tribunal com atividade jurisdicional, pelas partes, Ministério Público ou pelo próprio juiz; a questão constitucional deve ser prévia, incidental, relevante e necessária para a solução do caso concreto.158

Embora o controle difuso possa ser realizado por qualquer tribunal, encontra no Tribunal Constitucional o seu grau máximo de realização, o qual o fará apenas pela via recursal.

só a decisão proferida pelo Tribunal Constitucional, em processo de fiscalização abstracta sucessiva, ter efeito sobre a vigência da norma (artigo 282º da Constituição). Assim, a interpretação normativa realizada pelo Supremo Tribunal de Justiça esvazia de conteúdo o referido poder-dever dos tribunais de apreciarem a conformidade à Constituição das normas aplicáveis aos pleitos submetidos a juízo e subverte verdadeiramente o sistema de fiscalização de constitucionalidade desenhado pela Constituição portuguesa”. Proc. Nº 256/97,

Plenário, Rel.: Consª Maria Fernanda Palma, disponível no sítio

http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/19980200.html. Acesso em: 29 nov. 2016.

157“Na verdade, o artigo 280º da Constituição prevê com clareza, em sede de fiscalização concreta da

constitucionalidade de normas, a existência de um recurso para o Tribunal Constitucional e não de uma espécie de mecanismo de reenvio a título prejudicial para este Tribunal, para resolução de questões de constitucionalidade que surjam na pendência de processos judiciais.“Proc. n.º 549/03, 1ª Secção, Relatora: Maria Helena Brito, disponível no sítio http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20030596.html, consultado em 29/11/2016.

Em linhas gerais, o controle de constitucionalidade vigente no ordenamento jurídico português, conforme se analisará nos tópicos seguintes, admite um sistema misto, com quatro possibilidades, quais sejam: fiscalização preventiva de inconstitucionalidade por ação, de competência exclusiva do Tribunal Constitucional em sede de controle abstrato; a fiscalização sucessiva concreta, cuja competência é atribuída a todos os Juízes e Tribunais do país, sendo a do Tribunal Constitucional por intermédio da via recursal, por iniciativa das partes envolvidas na discussão do caso concreto ou mesmo de forma oficiosa pelo julgador; a fiscalização sucessiva abstrata de qualquer norma, cuja competência também é exclusiva do Tribunal Constitucional, sendo ainda possível a conversão de um procedimento de controle concreto para o abstrato. Há ainda a possibilidade do controle concentrado de inconstitucionalidade por omissão, de exclusiva competência do Tribunal Constitucional, cujos efeitos se limitam a reconhecer a omissão e a certificar ao órgão competente, como ocorre com a decisão proferida em ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão adotada no Brasil.159

No mesmo sentido, Jorge Barcelar Gouveia160 chama a atenção para as características primordiais do sistema de controle de normas portuguesas, ressaltando que é um sistema jurisdicional e não político; é um sistema misto, na medida em que a constitucionalidade pode ser submetida a todos os tribunais (difuso) o especificamente ao Tribunal Constitucional (concentrado); é um sistema que admite tanto o controle preventivo quanto o repressivo (sucessivo); com alcance tanto quando ocorrer ação quanto omissão do poder competente. Esses institutos serão abordados nos tópicos seguintes, mas sempre priorizando a análise das amplitudes dos efeitos da decisão, matéria central desta pesquisa.