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No pensamento cartesiano existem duas principais substâncias existentes, que são o corpo e a alma, porém distintas entre si. Dentro dessa visão o racionalismo é fundamental para provar as coisas existentes que possam ser explicadas cientificamente, desvalorizando o empírico e valorando aquilo que pode ser explicado cientificamente de forma racional.

Neste momento do balanço, o aluno B8 considera e vê o corpo como uma “máquina orgânica” que pode ser explicada cientificamente e que tem suas funções específicas na sua totalidade. “Como uma máquina orgânica que a cada dia se aprimora e evolui psicologicamente e fisicamente” (B8). O aluno vê o corpo como uma máquina, que têm funções e sofre transformações, aperfeiçoa e evolui com o tempo.

Pode-se perceber ao analisar também o conteúdo da segunda parte do balanço do aluno. Ele menciona de forma subentendida que o corpo se modifica “aprimora e evolui” tanto fisicamente, as transformações do corpo humano desde a concepção até a morte, e psicologicamente, ou seja, o desenvolvimento da personalidade que acontece desde a infância até à fase adulta.

Autores confirmam que esse desenvolvimento psicológico é importante tanto na fase da infância quanto na fase da adolescência, em que o emocional do aluno adolescente é conturbado por efeitos hormonais (BEE, 1997; D‟ANDREA, 1996).

o como máquina: “Máquina” (B2); “Máquina” (B16). Veem o corpo humano como uma representação de máquina com funções, provavelmente constituída por sistemas e órgãos que servem para manter o bom funcionamento, que também podem falhar e adoecer se não nutri-lo ou cuidá-lo, assim como é apresentado no livro didático.

Em pesquisas feitas em âmbitos locais e nacionais respectivamente com alunos e livros didáticos, verifica-se que os alunos aprendem e têm a representação do corpo que é ensinado na escola, um corpo biomédico, sem sentimentos, sem espírito, mas um corpo biológico programado para fazer as suas funções, igual uma máquina (TRIVELATO, 2005; TALAMONI, 2007).

Em Entrevistas de Grupo, os alunos veem o corpo como uma máquina “o corpo passa a ser por ele subjugado, relegado a objeto” (TALAMONI, 2007, p. 182). Os alunos têm o corpo como um objeto, máquina, um corpo separado do espírito, da mente, mas um sistema de funções orgânicas programadas para realizar tal atividade/função.

Não obstante, também faz uma ligação do divino com o corpo máquina, que produz sentimentos, um corpo metafísico: “[...] também uma máquina, uma máquina avançada tipo assim, foi a melhor máquina que Deus fez para nós” (A13); “Máquina” (A15); “Nós temos um corpo muito avançado e somos, acho que, a melhor máquina que Deus criou na vida Dele” (A9); “Então eu acho ele uma máquina, um organismo que produz tipo: produz várias coisas, substâncias e sentimentos” (A19); “E eu acho também que o corpo é uma máquina, pois tem várias funções tipo: vários combustíveis [...] aí é uma máquina mesmo. Máquina humana. Eu acho meu corpo perfeito como máquina” (A16).

Os alunos têm uma representação cartesiana de seus corpos, pois é isso que os livros didáticos e os professores ensinam (TRIVELATO, 2005). Um corpo desprovido de sentimentos, embora um aluno mencione que, o corpo, além de outras substâncias, produz sentimentos. É interessante observar que os alunos ainda ligam o corpo máquina como uma criação divina. Subentende que mesmo aprendendo na sala de aula sobre a teoria evolucionista, eles não deixam de acreditar na criacionista, que mostra ser muito forte nos alunos por ligarem o corpo máquina à criação perfeita do divino.

Na sala de aula e nos livros didáticos, o corpo humano é ensinado em partes, por sistemas, órgãos e células. Portanto, tanto os professores e alunos são direcionados a pensá-lo cartesianamente, não havendo lugar para subjetividade humana, mas é privilegiado o corpo biológico, fragmentado e sistematizado (TRIVELATO, 2005; TALAMONI, 2007).

Sobre como enxerga o outro, os alunos discutem sobre o corpo do outro considerando como uma máquina “uma máquina orgânica” A16. Vê um corpo cartesiano, que tem função, formado por sistemas, órgãos, tecidos, células, reduzidos a uma máquina fisiológica, que trabalha em função de manter o corpo no papel da normalidade (TRIVELATO, 2005; TALAMONI, 2007).

Consegue enxergar o outro (corpo) como um objeto reduzido, biológico, com funções a serem desempenhadas: “Eu vejo como uma máquina que produz vários elementos. Ele produz vários movimentos” (A21); “Eu vejo o corpo do outro como uma máquina diferente” (A18); e “Uma máquina!” (A19).

Pode compreender que os alunos percebem, reproduzem e entendem que o corpo humano, o corpo do outro, é reduzido a uma máquina orgânica, anatômica, fisiológica. Esse mesmo resultado pode ser visto em pesquisas que mostram alunos com representações de corpo da mesma forma como ele é ilustrado nos livros didáticos e assimilado juntamente com os assuntos ministrados pelo professor, valorizando um corpo desprovido de humanidade, um corpo objeto de estudo (TRIVELATO, 2005; TAMAMONI, 2007; SHIMAMOTO; LIMA, 2006).

Observa-se, então, nas visões dos alunos, a representação do corpo do outro como um corpo cartesiano, uma máquina com várias funções programadas a serem exercidas para um determinado fim. Portanto, entende-se que o corpo ensinado e aprendido nas aulas de ciências é um corpo longe do aspecto integrado, um corpo cartesiano. Shimamoto e Lima (2006) faz alusão a um “corpo mais humano e menos biológico” nas aulas de ciências. Considerando um corpo que tenha uma história, percepções, uma identidade, o corpo biocultural.

Perceber o corpo humano cartesiano é construir uma identidade sobre ele. Portanto, os alunos, nesta categoria, têm uma relação com a dimensão identitária com o saber social e epistêmico, pois trata também de um conhecimento adquirido no âmbito escolar, numa situação de sujeito cognoscente e uma reprodução que está nos livros didáticos e nas aulas de ciências.