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2. ADENTRANDO NA RELAÇÃO COM O SABER E O CORPO HUMANO

2.1. O saber como objeto de desejo

É uma questão chave para a psicanálise, o saber como objeto de desejo (CHARLOT, 2005; SILVA, 2009). Desejo esse que tem e leva ao gozo, pode tornar-se um desejo de aprender este ou aquele saber, que pode ser uma disciplina, um assunto que não precisa levar exatamente ao gozo, mas não deixa de ser um, não obstante um desejo de uma atividade intelectual de aprender, seja sobre o corpo humano, sobre

ciências, sobre o seu próprio funcionamento como ser humano, que tem órgãos e sistemas, desejos de aprender coisas que tenham sentido para si e para a sua vida.

Segundo Charlot (2005, p. 37) “[...] todo desejo é “desejo de” [...] o desejo de saber não tem nenhuma relação com o saber”. Cabe, então, compreender esse desejo de saber como ele se passa ao desejo de aprender, aprender sobre qualquer coisa ou sobre coisas da escola, do que se estuda. Sair do desejo de saber para o desejo de aprender, aprender sobre si, sobre o outro e sobre o mundo.

Isso leva a pensar no sentido de estudar tal assunto ou disciplina e na questão do prazer em saber e aprender. Eu posso ter desejo de saber, mas não tenho desejo em aprender. Lembrando aqui que aprender também gera um prazer, mas aprender exige esforço e, contanto que tenha sentido, deve-se estudar para aprender. Pode-se fazer uma analogia desse discurso ao aluno que deseja passar em um vestibular concorridíssimo ou um candidato para passar numa vaga num concurso público. Ambos têm o desejo de passar no vestibular e no concurso, mas o problema está no esforço, para aprender exige esforço e prazer ao mesmo tempo, mas isso só ocorre quando faz sentido para ambos, que é passar no vestibular e na vaga do concurso público. Mais especificamente um atleta, que faz todos os esforços físicos e intelectuais possíveis para chegar à perfeição na sua modalidade e sente prazer em fazer aquilo. O que se revela de ruim, neste contexto, é quando não tem sentido todo esse esforço, se ele for só para preencher algo ou obedecer a regras a serem cumpridas e que não fazem sentido para o sujeito, torna-se inútil e leva-o ao fracasso (CHARLOT, 2005).

Isso se observa em vários relatos e pesquisas de Charlot (2000; 2001; 2005; 2009). Os alunos estudam várias coisas na escola que não fazem sentido ou não têm significado algum para eles. É uma violência dentro da própria sala de aula, com uma aula considerada sem sentido pelo aluno, na qual fica horas ouvindo o professor falar e passar conteúdos que não trazem nenhuma contribuição para o que ele vivencia, no seu cotidiano, trazendo consigo uma violência simbólica e uma aula quase que sufocável e sem sentido.

É visto em pesquisas de Charlot (2009), principalmente nos Liceus com alunos da França, o que os alunos mais aprendem e fazem sentido para eles são as coisas que eles aprendem com suas famílias, valores e atitudes que os levam a serem pessoas boas ou ruins. Os mesmos consideram a escola um lugar de encontro com amigos e não um local de aprendizagem para as “coisas que levarão para vida”, não obstante, eles aprendem a ler, escrever, contar e ficar na escola com o objetivo de terminar os estudos

e ter um emprego bom no futuro, um diploma que os levem a ter um bom trabalho para que possam sustentar sua família, quando casarem. Todos esses relatos são adquiridos através de balanços de saber com alunos em suas pesquisas (CHARLOT, 1996).

É daí que se entra o conceito de mobilização na Relação com o Saber. Segundo Charlot (2005, p. 19 – 20):

A mobilização é um movimento interno do aluno, é a dinâmica interna do aluno que, evidentemente, se articula com o problema do desejo [...] e a dinâmica do desejo é analisada sob o ponto de vista social e também pessoal [...] o sujeito do desejo é um sujeito que interpreta o mundo.

Numa outra ótica, a mobilização é uma ação interna que faz sentido para o sujeito que, provavelmente, interpreta o mundo no que se refere à vida pessoal e do que acontece com os outros. Esse sentido, no qual nos referimos, é subjetivo e acontece de forma individual.

Propõem-se aos alunos, nas escolas, nas disciplinas e assuntos, sentidos que não têm nenhuma relação ao que eles vivem em seu cotidiano. Esse sentido ou sistema de sentido da escola torna a aula, as disciplinas e os assuntos um “discurso vazio” (CHARLOT, 2005, p. 137), considerado irritante e que causa estranheza, desconforto, aborrecimento e com certeza os levarão ao fracasso escolar, ao atraso e à exclusão do aluno. Referimos à exclusão do aluno estar intelectualmente fora da escola, mas com o corpo físico presente na sala de aula, que apenas irá decorar ou não o que foi passado pelo professor na aula e repetirão na prova ou esquecerão o assunto, o famoso “branco”. Fazem uma avaliação, prova, sem ter um objetivo pelo professor, para uma tomada de ação posterior, ou seja, verificar o que o aluno aprendeu e o que deve ser observado no que o aluno errou para possíveis correções ou retificações na didática do professor, uma autoavaliação da sua prática, professor reflexivo, para que o aluno aprenda efetivamente (LUCKESI, 2010).

Sendo assim, os alunos provavelmente reprovarão ou passarão de série/ano sem aprender nada, direcionados ao fracasso. Lembrando que um aluno fracassado é um ser humano e todo ser humano tem sua dignidade, que deve ser respeitada e levada em conta dentro e fora do ambiente escolar.

Portanto, aprendo aquilo que faz sentido, saberes com melhor “sentido de mundo, da vida humana, das relações com os outros, das relações consigo mesmo” (CHARLOT, 2005, p.140).

2.2. O Corpo humano como desejo na aprendizagem dos alunos na Relação com o