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Caracterização microbiológica das águas residuais de um lagar contínuo de três fases

CAPÍTULO 3 

3.4. Correlações estatísticas entre parâmetros microbiológicos e parâmetros físico-químicos

Efectuou-se uma análise estatística de forma a identificar possíveis correlações entre as variações verificadas nas abundâncias dos grupos microbianos estudados, e os parâmetros físico-químicos medidos, nos diferentes pontos de amostragem.

Considerando uma distribuição normal das amostras, uma análise de variância (ANOVA) dos parâmetros microbiológicos mostra que apenas o ponto de amostragem

água de lavagem (AL) pode ser discriminado em relação aos outros dois locais de

amostragem (Figura 3.1).

Nas contagens efectuadas, apenas os heterotróficos apresentaram diferenças significativas, enquanto as efectuadas para os outros dois grupos se sobrepõem nos três locais. A significância estatística não é a mesma, isto é, para heterotróficos as diferenças são muito significativas (p <0,01) e para leveduras e fungos, apenas significativas (p <0,05). A abundância relativa de fungos e leveduras é muito semelhante quer em DEC, quer em AR.

Efectuou-se ainda uma Análise de Componentes Principais (ACP), considerando as contagens dos microrganismos, tendo-se verificado que estes não são capazes de distinguir nem os pontos de amostragem, nem as datas de amostragem (dados não

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apresentados). Testou-se ainda o efeito dos parâmetros físico-químicos nas contagens microbianas, com o objectivo de identificar, qual ou quais os que mais afectavam o tamanho das populações microbianas. Também neste caso os resultados obtidos não se mostraram conclusivos.

Figura 3.1. Representação da distribuição dos parâmetros microbiológicos Heterotróficos, Fungos Filamentosos e Leveduras nos pontos de amostragem considerados AL, DEC e AR no conjunto das duas campanhas de amostragem (2003/2004 e 2004/2005).

É, no entanto, importante ressalvar que, apesar do aumento da toxicidade ambiental, já analisada no capítulo anterior, e que se revelou essencialmente pelo aumento dos teores em matéria orgânica, em gordura e polifenóis e nutrientes, e diminuição do pH, os heterotróficos pareceram ser o grupo mais afectado, já que em média as suas contagens desceram de 9,1x108 UFC/mL nas AL para 7,2x106 e 3,3x10e7 UFC/mL no DEC e AR, respectivamente. Já no que se refere aos fungos e às leveduras,

A L D E C A R 5 E 6 5 E 7 5 E 8 5 E 9 H e t e r o t r ó f i c o s T o t a i s︵ U F C / m L︶ ︵ e s c a l a l o g a r í t m i z a d a︶ M e d i a n a 2 5 % - 7 5 % M i n - M a x O u t l i e r s E x t r e m o s A L D E C A R 5 E 6 5 E 7 5 E 8 5 E 9 F u n g o s F i l a m e n t o s o s ︵ U F C / m L︶ ︵ e s c a l a l o g a r i t m i z a d a︶ M e d i a n a 2 5 % - 7 5 % M i n - M a x O u t l i e r s E x t r e m o s A L D E C A R 5 E 6 5 E 7 5 E 8 5 E 9 L e v e d u r a s ︵ U F C / m L︶ ︵ e s c a l a l o g a r i t m i z a d a︶ M e d i a n a M i n - M a x 2 5 % - 7 5 % O u t l i e r s E x t r e m o s

 

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a diminuição da abundância das populações não foi tão marcada, levando a crer que estes organismos apresentam maiores capacidades de adaptação a estes ambientes.

Resultados semelhantes foram já publicados por vários autores que usaram isolados de fungos dos géneros Pleurotus, Phanerochaete, Aspergillus, Geotrichum,

Penicillium, Trichoderma, Pycnoporus, Coriolopsis e Lentinula (Robles et al., 2000;

Fontoulakis et al., 2002; Tsioulpas et al., 2002; Aggelis et al., 2003; Fadil et al., 2003; Jaouani et al., 2003; Dias et al., 2004; Dhouib et al., 2006a,b), ou isolados de leveduras dos géneros Candida e Yarrowia (Ettayebi et al., 2003; Fadil et al., 2003; Giannoutsou et

al., 2004; Lanciotti et al., 2005; D’Annibale et al., 2006; Martinez-Garcia et al., 2007;

Papanikolaou et al., 2008; Peixoto et al., 2008) para procederem a tratamentos ou pré- tratamentos de águas ruças. Apesar destes trabalhos não terem tido como objectivo caracterizar os ambientes de onde foram obtidos os isolados estudados, reflectem a existência de diversas espécies de microrganismos com capacidade de se desenvolverem em ambientes stressantes. No trabalho que aqui se apresenta, foi possível também obter contagens significativas de vários grupos microbianos a partir das águas de lavagem, águas da centrífuga vertical e águas ruças da CAOM, reflectindo mais uma vez as capacidades adaptativas dos microrganismos.

A maior parte da literatura disponível refere que a toxicidade destas águas residuais, para além da sua elevada carga orgânica, resulta, essencialmente, da presença de elevados teores de compostos fenólicos e ácidos gordos livres (Sayadi et

al., 2000; Sassi et al., 2006). Os fungos da podridão branca estão entre os

microrganismos capazes de degradar fracções dos compostos fenólicos, nomeadamente as de baixo peso molecular, referenciadas como as mais tóxicas. Conseguem metabolizá-las recorrendo à acção de enzimas lenhinolíticas como a peroxidase da lenhina (LiP) ou a peroxidase dependente do manganésio (MnP) (Sayadi

et al., 2000). Apesar da acção dos fungos, o efeito de toxicidade não desaparece das

AR tratadas. Este facto resulta, provavelmente, da formação de compostos mais tóxicos como os radicais fenoxi, ou ainda porque as enzimas lenhinolíticas referidas acima são inibidas pelas fracções fenólicas de elevado peso molecular (Sayadi et al., 2000), que continua recalcitrante mesmo após o tratamento com os fungos.

A determinação do(s) factor(es) de toxicidade destas águas residuais é ainda pouco consensual, e até em parte desconhecido. Num trabalho efectuado em Portugal, Paixão e colaboradores (1999) provaram a elevada toxicidade destas águas, independentemente do processo de extracção do azeite utilizado. No mesmo estudo, que tinha como objectivo determinar parâmetros físico-químicos responsáveis pela toxicidade das AR, ficou clara a dificuldade na sua determinação. Efectivamente, este grupo de trabalho encontrou correlações entre a toxicidade para espécies como

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Tamnocephalus platyurus ou Daphnia magna e parâmetros como a CQO, sólidos,

compostos de azoto, taninos e lenhinas, mas não encontrou correlações significativas com parâmetros vulgarmente referidos na bibliografia, como os fenóis ou óleos e gorduras. Outras publicações referem, também, que estirpes de fungos (Sayadi et al., 2000) ou leveduras (Peixoto et al., 2008) usadas para pré-tratar AR revelaram que a diminuição da concentração de taninos diminui o seu efeito inibidor, enquanto outros mostraram ainda que a diminuição na concentração de fenóis não diminuiu o efeito tóxico das águas tratadas (Tsioulpas et al., 2002). Ainda Hamdi et al (1992) apresentaram conclusões similares, referindo que os compostos fenólicos apresentam pouca toxicidade mas não são biodegradáveis, em oposição aos taninos, que são altamente tóxicos, mas biodegradáveis.

Os resultados encontrados nesta tese aproximam-se dos referidos no parágrafo anterior, já que a variação do conteúdo em polifenóis não foi acompanhada por variações correlacionadas das contagens de UFC em nenhum dos grupos microbianos analisados, ou em qualquer dos pontos de amostragem. Por outro lado, o aumento da carga orgânica, principalmente CQO, COD, sólidos totais e óleos e gorduras, a diminuição do pH e teor em OD, pareceram afectar as contagens.

Devido às elevadas contagens de microrganismos encontradas, particularmente no que se refere aos grupos fungos filamentosos e leveduras, é de supor que estes microrganismos apresentam maior resistência às condições de toxicidade destes meios.

Das publicações consultadas, apenas se encontraram referências a caracterizações microbiológicas de efluentes de lagares de azeite em três artigos. Destas, duas referem-se a lagares de azeite que fazem a extracção em contínuo e de forma tradicional (Mouncif et al., 1993; Sassi et al., 2006) e a terceira analisa o microbiota encontrado na lama proveniente de um lagar de duas fases (ecológico) (Giannoutsou et al., 2004). O trabalho de Sassi e colaboradores (2006) apenas faz uma caracterização da abundância média de microrganismos encontrados em vários lagares, mas não procedem a nenhuma identificação das espécies. Os resultados destes investigadores mostram, que à semelhança do que se obteve neste trabalho, a abundância microbiana é elevada e inclui bactérias (aeróbias), leveduras e fungos filamentosos. Também fica evidente que as colónias contabilizadas são maioritariamente dominadas por leveduras e fungos.

O trabalho de Mouncif e seus colaboradores (1993) mostra que a contagem de colónias é bastante elevada, e também se obtiveram quer bactérias, quer leveduras e fungos filamentosos. Este grupo identificou alguns isolados de leveduras, tendo encontrado indivíduos pertencentes aos géneros Pichia e Debaryomyces (os mais abundantes), Saccharomyces, Candida, Schizosaccharomyces e Rhodotorula. Estas

 

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identificações foram, contudo, realizadas com base apenas em testes fisiológicos e bioquímicos.

Das lamas resultantes da extracção em duas fases Giannoutsou e colaboradores (2004) apenas procuraram conhecer a diversidade em leveduras não tendo efectuado estudos para determinar a abundância dos diferentes grupos do microbiota.

4. Conclusões

Este trabalho revelou uma elevada abundância de microrganismos nos três pontos de amostragem de águas residuais, sendo o seu número particularmente e significativamente elevado nas águas de lavagem.

A campanha de extracção não influenciou a abundância dos grupos microbianos amostrados. O período da campanha em que as amostras foram recolhidas afectou as contagens de formas distintas.

No início das campanhas, as populações estavam presentes em números elevados que decrescem a meio da mesma, como consequência provável da laboração nesse momento ser mais intensiva. As populações de heterotróficos, fungos filamentosos e leveduras, tendem a mostrar uma recuperação no final das campanhas de extracção, como resposta adaptativa ás condições do meio ambiente.

As populações de leveduras e fungos filamentosos revelaram maior capacidade de resistir ao ambiente menos favorável, uma vez que as suas abundâncias, relativamente à população de heterotróficos, se mantiveram mais elevadas, dominando as contagens dos heterotróficos.

Não foi possível estabelecer correlações com significância estatística entre as populações microbianas investigadas, e os parâmetros físico-químicos medidos. No entanto, o aumento da carga orgânica, diminuição do pH e teor em oxigénio dissolvido, foram identificados como os factores físico-químicos que mais contribuíram para a diminuição das populações microbianas, e determinaram os diferentes equilíbrios entre elas.

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