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3.4. Metabolismo celular dos compostos fenólicos no isolado selvagem de

3.4.4. Metabolismo celular de compostos fenólicos com substituintes metoxilo no isolado de C.oleophila

Avaliaram-se, ainda, como fonte única de carbono e energia, três compostos com substituintes metoxilo. Dois ácidos monometoxilados, ambos na posição 3 do anel, os ácidos 4-hidroxi-3-metoxibenzóico e 4-hidroxi-3-metoxicinâmico, e ainda um ácido fenólico dimetoxilado, nas posições 3 e 5 do núcleo benzénico, o ácido 4-hidroxi- 3,5-dimetoxibenzóico.

O ácido cinâmico metoxilado não permitiu o crescimento do isolado de

C.oleophila.

Quanto aos ácidos benzóicos metoxilados, a concentração testada foi de 100 mg/L. Não se apresentam resultados obtidos com concentrações superiores, pois em ensaios preliminares, o isolado de C.oleophila não cresceu na presença destes ácidos

 

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com uma concentração de 500 mg/L (dados não apresentados). Para ambos os compostos fenólicos, o isolado de Candida oleophila apresenta fases de latência idênticas. A análise dos cromatogramas obtidos permitiu inferir que o crescimento se faz com o consumo quase imediato dos compostos em análise e formação intermédia de ácido 4-hidroxibenzóico (para o ácido 4-hidroxi-3-metoxibenzóico) (Figura 5.6.) e ácido 3,4-di-hidroxibenzóico (para além de 4-hidroxibenzóico) no caso do crescimento com ácido 4-hidroxi-3,5-dimetoxibenzóico (Figura 5.7.). Estes metabolitos intermédios foram, entretanto, consumidos e convertidos em catecol no período final de incubação.

Landete e colaboradores (2008) estudaram o efeito dos ácidos 4-hidroxi-3- metoxicinâmico, 4-hidroxi-3-metoxibenzóico e 4-hidroxi-3,5-dimetoxibenzóico em espécies de Lactobacillus (i.e. L.plantarum) tendo verificado que o isolado apenas metaboliza o ácido 4-hidroxi-3-metoxicinâmico, sendo incapaz de metabolizar os outros compostos. Chtourou et al. (2004) analisaram alguns isolados de Trichosporon

cutaneum e confirmaram que também não metabolizam o ácido 4-hidroxi-3-

metoxibenzóico. Em análises efectuadas com isolados de Pseudomonas, Di Gioia e colaboradores (2001a) demonstraram a utilização pela estirpe, quer de ácido 4-hidroxi- 3-metoxibenzóico, quer de ácido 4-hidroxi-3,5-dimetoxibenzóico. Nesse estudo identificaram, ainda, a actividade da enzima 4-metoxibenzoato monoxigenase, que terá convertido o ácido 4-hidroxi-3,5-dimetoxibenzóico em ácido 4-hidroxi-3- metoxibenzóico e, posteriormente, em ácido 3,4-di-hidroxibenzóico que depois foi metabolizado.

Figura 5.6. Cromatogramas obtidos por análise de amostras do meio recolhidas durante o crescimento de Candida oleophila em meio com ácido 4-hidroxi-3-metoxibenzóico a 100 mg/L como única fonte de carbono e energia.

No caso do isolado de C.oleophila apresentado nesta tese, e com base nos resultados dos cromatogramas, a via de biodegradação destes dois compostos metoxilados decorrerá, também, pela sua conversão em ácidos benzóicos

[min.] Time 0 5 10 15 20 [mV] Vo lta ge -2 0 2 4 6 8 Ác. 4-hidroxi-3-metoxibenzóico (T0 dias) Ác. 4-hidroxi-3-metoxibenzóico (T7 dias) Ác. 4-hidroxibenzóico (T19 dias) 1,4-dihidroxifenol (T25 dias) Tempo Voltag em

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Tratamento de águas ruças por uma estirpe de Candida oleophila isolada de águas residuais  

 

 

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desmetoxilados. No caso dos ácidos 4-hidroxi-3-metoxibenzóico e 4-hidroxi-3,5- dimetoxibenzóico ter-se-ão convertido em ácido 4-hidroxibenzóico, que foi sendo metabolizado com a formação de catecol.

Os resultados obtidos com o isolado de Candida oleophila apresentam semelhanças com outros previamente publicados, permitindo, conjuntamente com estes, concluir que a actividade metabólica de compostos aromáticos entre os microrganismos é muito variável e dependente da estirpe/espécie. Esta variabilidade resulta de vários factores que incluem o isolado em análise, os compostos aromáticos utilizados, o objectivo do estudo e as condições experimentais.

O fenol é a unidade estrutural básica de uma variedade de compostos fenólicos cujos efeitos nefastos estão bem documentados, sendo um dos mais comuns poluentes de meios hídricos e gasosos (Agarry et al., 2008). A degradação deste composto é conseguida por numerosos microrganismos, desde bactérias aeróbias e anaeróbias, passando por fungos uni ou pluricelulares. As vias metabólicas de degradação do fenol foram alvo de revisão recente por Agarry e colaboradores (2008).

Figura 5.7. Cromatogramas obtidos por análise de amostras do meio recolhidas durante o crescimento de Candida oleophila em meio com ácido 4-hidroxi-3,5-dimetoxibenzóico a 100 mg/L como fonte única de carbono e energia.

O metabolismo microbiano catabólico de compostos aromáticos (fenol e seus derivados) está bem documentado no grupo dos seres vivos procariontes, particularmente no género Pseudomonas (Santos e Linardi, 2004; Stoilova et al., 2007, Stanchev et al., 2008). Outros géneros que revelaram capacidade de usar estes compostos como fonte única de carbono e energia, ou degradá-los em misturas complexas, incluem bactérias dos géneros Acinetobacter, Alcaligenes, Clostridium,

Comamonas, Lactobacillus, Ralstonia, Rhodococcus e Sphingomonas (Delneri et al.,

1995; Chamkha et al., 2001; Di Gioia et al., 2001a,b); Di Gioia et al., 2001b; Di Gioia et

[min.] Time 0 5 10 15 20 [mV] Vo lt ag e 0 2 4 6 8 Ác. 4-hidroxi-3,5-dimetoxibenzóico (T0 dias) Ác. 4-hidroxibenzóico (T4 dias) Ác. 3,4-dihidroxibenzóico (T7 dias) 1,4-dihidroxifenol (T23 dias) Tempo (min) Voltag em

 

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  al., 2002; Ahuatzi-Chacón et al., 2004; Landete et al., 2008). Algumas investigações

foram também efectuadas usando microalgas (Lovell et al., 2002; Pinto et al., 2002). A utilização de fungos filamentosos ou leveduras em tecnologias de biorremediação não está ainda considerada em detalhe, mas estes seres vivos apresentam distribuição ubíqua na natureza e capacidade de degradação de substâncias naturais complexas como a lenhina, a celulose ou a quitina. Possuem, ainda, a capacidade de se adaptar facilmente a condições extremas de crescimento, como sejam o baixo pH, o conteúdo limitado de água e nutrientes. Pelo facto de secretarem enzimas extracelulares possuem a capacidade de tolerar e degradar diversos compostos tóxicos (Stanchev et al., 2008). Várias investigações demonstraram a capacidade que fungos dos géneros Penicillium, Aspergillus,

Geotrichum, Fusarium, Graphium, Phanerochaete têm de degradar compostos

fenólicos (Garcia-Garcia et al., 2000; Sampedro et al., 2004; Santos e Linardi, 2004; Stoilova et al., 2007; Stanchev et al., 2008). A utilização de leveduras em ensaios semelhantes está menos disseminada mas pode ser encontrada alguma bibliografia sobre a capacidade que leveduras exibem em utilizar compostos fenólicos, quer como fonte única de carbono e energia, quer em misturas variadas dos mesmos compostos. As espécies utilizadas incluem estirpes de Candida tropicalis, C.cylindracea, C.

rugosa, Trichosporon cutaneum e Yarrowia lipolytica (Lee et al., 2001; Ettayebi et al.,

2003; Ahuatzi-Chacón et al., 2004; Chtourou et al., 2004; Páca et al., 2007; Gonçalves

et al., 2009).

Na bibliografia consultada, quer para procariontes, quer para eucariontes, o fenol e a sua degradação está amplamente documentada. Na presença de oxigénio, a degradação inicia-se geralmente pela hidroxilação, por uma monoxigenase fenol- hidroxilase, na posição orto do anel benzénico, levando à formação de catecol. O segundo passo consiste na clivagem do catecol por catecol-dioxigenases. Esta clivagem pode ocorrer na posição orto, sendo a reacção mediada pela catecol 1,2- dioxigenase (EC 1.13.11.1). Neste caso, o catecol é convertido posteriormente em ácido cis,cis-mucónico, que leva à formação de succinato e acetil-CoA, podendo depois ser utilizados no Ciclo de Krebs. Esta via degradativa é também designada de via do β-cetoadipato. A clivagem do catecol pode ainda ocorrer na posição meta, com formação intermédia de semialdeído 2-hidroximucónico, seguida da formação de formato, piruvato e acetaldeído (Lee et al., 2001; Ahuatzi-Chacón et al., 2004; Páca et

al., 2007; Agarry et al., 2008). Apesar de pouco descrita na literatura, Lee e

colaboradores (2001) confirmaram esta via catabólica do catecol em leveduras da espécie Yarrowia lipolytica. Existem, no entanto, publicações que indicam que a via da

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meta-clivagem não está descrita em leveduras e fungos (Santos e Linardi, 2004; Agarry et al., 2008).

A degradação de outros compostos fenólicos, distintos do fenol, é menos conhecida, pois cada grupo de investigação tem testado moléculas distintas consoante os objectivos do estudo. No entanto, em todos é consensual que ocorre a transformação dos compostos iniciais num número limitado de compostos intermédios, normalmente o catecol (simples ou substituído) e o ácido 3,4-di-hidroxibenzóico (Reineke e Knackmuss, 1988; Priefert et al., 1997; Santos e Linardi, 2004). Na maior parte dos casos descritos, estes intermediários dihidroxilados são canalizados para a orto-clivagem, via rota do β-cetoadipato, que leva à formação de compostos de rotas metabólicas cruciais como o Ciclo de Krebs.

Este esquema geral de rotas catabólicas para compostos aromáticos sugere que os microrganismos estenderam o seu intervalo de utilização de substratos, desenvolvendo enzimas periféricas capazes de converter substratos iniciais em um dos intermediários centrais. Este mecanismo pode contribuir para a adaptação metabólica de fungos ubíquos na natureza, expostos a xenobióticos e a vários compostos aromáticos, como alguns dos que se podem identificar em águas residuais de lagares de azeite (Santos e Linardi, 2004).

Os resultados acima apresentados e discutidos, revelaram pela primeira vez a utilização de compostos aromáticos derivados do fenol por uma levedura da espécie

Candida oleophila. Permitiram, ainda, verificar que compostos intermediários são

formados durante o seu metabolismo, e concluir que este isolado apresenta uma boa capacidade de crescer e de utilizar como fontes únicas de carbono e energia vários compostos fenólicos. De entre estes, o isolado de C.oleophila utiliza compostos substituídos hidroxilados e metoxilados. É ainda possível inferir que o metabolismo dos compostos fenólicos avaliados integra a formação de catecol, e/ou de ácido 3,4-di- hidroxibenzóico, o que pressupõe a existência de uma via metabólica de clivagem do núcleo benzénico por catecol dioxigenases, e por protocatequato dioxigenases, ambas levando à formação de compostos da via do β-cetoadipato. Esta rota pressupõe a formação de piruvato e acetil CoA, que entrarão noutras rotas metabólicas celulares principais, como o Ciclo de Krebs. A pesquisa da actividade destas enzimas é um assunto que se encontra já em fase preparatória de investigação.

Em resumo, pode afirmar-se que a capacidade que um microrganismo tem de usar um determinado composto, estará relacionada com o número, tipo e posição dos substituintes que entram na constituição da molécula em questão. Normalmente, quanto maior o número de substituintes, mais tóxica e menos degradável se torna a substância. Acrescenta-se, ainda, que as substituições na posição orto e na posição

 

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