• Nenhum resultado encontrado

Crescimento Econômico, Desigualdade e Pobreza em uma Perspectiva

Alguns estudos empíricos já partem da hipótese de que o ambiente macroeconômico não afeta homogeneamente todos os agentes econômicos, e procuram relações de crescimento econômico e de desigualdade e pobreza sobre determinados grupos demográficos, tais como o gênero, a raça ou o nível de educação do chefe familiar. Segundo Bradbury (2000), os diferenciais de impacto dos ciclos macroeconômicos sobre o bem-estar pessoal entre grupos sociais reflete diferenças de acesso e de sucesso no mercado de trabalho, mensurado, por exemplo, em diferentes taxas de desemprego por grupo.

3.4.1. Desempenho Macroeconômico e os Diferenciais de Bem-Estar por Sexo

Os diversos estudos empíricos já citados no presente trabalho que abordaram o papel da estrutura familiar sobre as condições de pobreza, tais como Cutler & Katz (1991), Blank & Card (1993), Freeman (2001) e Hoynes et al. (2005), chegaram à conclusão que as famílias chefiadas por mulheres são mais propensas à situação de pobreza, mas não apresentam rigidez em relação ao impacto do crescimento econômico sobre o seu bem-estar.

Um estudo mais específico sobre o impacto dos ciclos macroeconômicos sobre o bem- estar das famílias, controlando por suas características demográficas (como a sua estrutura e a sua raça) e regionais, foi elaborado por Gundersen & Ziliak (2003). Os autores utilizaram dados em painel da Current Population Survey de 1981 a 2000 para obter informações sobre o bem-estar familiar, e dados do Bureau of Labor Statistics para obter informações sobre o comportamento do mercado de trabalho ao longo do período em cada estado norte-americano. Os autores obtiveram os mesmos resultados encontrados pelos estudos anteriores, isto é, de que nos anos noventa o crescimento econômico nos Estados Unidos contribuiu para reduzir a magnitude e a intensidade da pobreza, mesmo com efeito diferenciado para famílias de diferentes raças e estruturas. Por outro lado, os efeitos das políticas sociais e transferências focalizadas ao longo dessa década ajudaram a reduzir a pobreza das famílias chefiadas por mães solteiras mais do que proporcionalmente em relação às famílias de outras estruturas.

Abordando casos de economias internacionais sobre desigualdades de sexos, cabe destacar o trabalho de Dollar & Gatti (1999). Os autores procuraram estudar as desigualdades econômicas por gênero, partindo da observação empírica de que, nos países mais pobres, as mulheres recebem menos investimento no seu capital humano do que os homens. Foram formuladas três hipóteses teóricas para procurar justificar esse fato:

a) O impacto da educação feminina sobre o bem-estar econômico das famílias e sobre o crescimento macroeconômico é inferior ao da educação masculina nos países em desenvolvimento, de modo que essa situação de desigualdade por gênero ao acesso a investimentos em capital humano é economicamente eficiente;

b) As desigualdades de gêneros nos diferentes países representam preferências culturais e religiosas de seus indivíduos residentes, que valorizam mais o conhecimento e o trabalho masculino do que o feminino;

c) Os menores investimentos na educação das mulheres representam falhas de mercado, que tendem a se reduzir conforme a economia do país cresce.

Essas três hipóteses apresentam importantes implicações em termos de políticas públicas. Se a desigualdade de investimentos em educação entre homens e mulheres é uma decisão econômica eficiente, qualquer política que altere essa situação será ineficiente. Se a

desigualdade representa preferências culturais pela população, as políticas que forem de encontro a essas preferências reduzirão o bem-estar dos indivíduos. Porém, se a desigualdade meramente refletir conseqüências de falhas de mercado, nesse caso políticas de incentivo ao investimento no capital humano tornam-se não apenas desejáveis, mas também necessárias para o desenvolvimento econômico.

As evidências empíricas encontradas pelos autores apontam que o capital humano feminino é importante para o crescimento macroeconômico dos países, e, portanto, é um investimento economicamente eficiente. Por outro lado, as preferências culturais e religiosas são fundamentalmente importantes para explicar a desigualdade de gêneros, sendo, por exemplo, mais importantes em países muçulmanos e hindus do que em países cristãos protestantes. Por fim, o crescimento econômico contribui para reduzir a desigualdade de gêneros, sobretudo em países de nível de desenvolvimento econômico mediano. Isso indica que falhas de mercado podem ser importantes para determinar a desigualdade de gêneros. Contudo, os autores ressaltam que o seu estudo não permite que se obtenham conclusões a respeito de, mais especificamente quais falhas de mercado, no sentido microeconômico do termo, causam essas desigualdades. Segundo Dollar & Gatti (1999, pg. 21):

… there is strong and consistent evidence that increases in per capita income lead to improvements in different measures of gender equality. To answer the question in our subtitle, apparently good times are good for women. The implication of this finding is not that growth is all that is needed to eliminate gender inequality. The findings on religious variables, regional effects, and civil liberties suggest that there is considerable scope for direct action on gender issues. However, it is important to know that the country-wide policies that support rapid growth are also indirectly contributing to gender equality.

3.4.2. Desempenho Macroeconômico e os Diferenciais de Bem-Estar por Raça

De acordo com Bradbury (2000), o desempenho (entendido tanto em termos de salário, como em termos de acesso a empregos) dos negros no mercado de trabalho é inferior ao dos brancos – principalmente, de acordo com seu estudo, em termos de maiores taxas de desemprego – devido a quatro fatores.

Primeiro, como os negros apresentam menores níveis de escolaridade do que os brancos, são associados pelos potenciais empregadores a baixos níveis de habilidade e de treinamento, isto é, são vistos como trabalhadores de menor produtividade. Isso faz com que o

salário de reserva oferecido no mercado de trabalho seja inferior para os trabalhadores negros em relação aos brancos.

Segundo, os negros podem ser prejudicados por um aspecto espacial. As famílias compostas por negros tendem a residir em regiões urbanas com menor acesso aos melhores empregos. Nesse caso, a separação física dificulta o encontro da oferta com a demanda por mão-de-obra.

Terceiro, devido à importância do capital social, entendido como redes de contatos sociais e de informações que auxiliam os indivíduos a progredir em suas atividades produtivas. Devido à segregação residencial e social das famílias negras, seus integrantes acabam sendo excluídos dessas redes, de modo que o acesso aos melhores empregos se torna mais difícil.

Quarto, por fim, existe a questão da simples discriminação de raça no mercado de trabalho, que ocorre quando os empregadores preferem trabalhadores brancos, mesmo quando apresentam as mesmas características em termos de produtividade (tanto em termos de educação como de experiência), de relações sociais e de residência em relação aos negros.

3.4.3. Desempenho Macroeconômico e os Diferenciais de Bem-Estar por Idade

Empiricamente, observa-se que os indivíduos mais jovens apresentam pior desempenho no mercado de trabalho, como, por exemplo, obtendo menores salários e maiores taxas de desemprego do que os demais trabalhadores. Segundo Bradbury (2000), as maiores taxas de desemprego observadas para os trabalhadores jovens ocorrem tanto por causa de sua maior flexibilidade frente ao mercado de trabalho, já que muitas vezes são recém-entrantes ou trabalham em meio-expediente, conciliando com o progresso de seus estudos, como também por estarem associados a menores níveis de educação e de experiência do que os demais trabalhadores.

Por outro lado, em relação à população idosa, destaca-se que, como ela é menos dependente economicamente do mercado de trabalho, a relação de seus níveis de bem-estar com o desempenho macroeconômico é menor do que para os mais jovens e os adultos. Um estudo sobre isso foi realizado no estudo por Brady (2004). O autor buscou evidências

empíricas que explicassem a divergência entre as taxas de pobreza dos idosos, das crianças, e da população em geral, partindo da observação de que tanto os idosos como as crianças são mais prováveis de serem pobres do que a população adulta trabalhadora. Utilizando uma amostra de dezoito países democráticos ocidentais, concluiu-se, por meio de uma análise empírica descritiva de dados sociais, de que as taxas de pobreza para os três grupos, na verdade, convergem. O autor também encontrou uma correlação positiva entre os três indicadores de pobreza. Contudo, essa correlação é mais forte particularmente entre as taxas de pobreza infantil e de pobreza geral da população, de modo que ambos tipos de pobreza parecem referir-se a um mesmo problema social.

3.4.4. Desempenho Macroeconômico e os Diferenciais de Bem-Estar por Nível de Instrução

A educação, sempre entendida como um determinante fundamental da produtividade da mão-de-obra, tem se mostrado um determinante cada vez mais importante do desempenho individual no mercado de trabalho. De acordo com Cutler & Katz (1991), o aumento da desigualdade salarial nos Estados Unidos durante os anos oitenta decorreu de uma maior demanda por mão-de-obra qualificada em relação aos trabalhadores de menor nível de instrução. Isso aconteceu devido a dois fatores. Em primeiro lugar, devido a um processo de mudança tecnológica desencadeado pelo desenvolvimento da computação, que elevou a demanda de mercado por trabalhadores com habilidades cognitivas flexíveis, em detrimento dos postos de emprego intensivos em força física. Em segundo lugar, conforme é ressaltado por Tobin (1992), de acordo com a evolução da divisão internacional do trabalho, a demanda por trabalhadores menos qualificados vem sendo afastada para países no quais a mão-de-obra é mais barata, como na Ásia, em detrimento dos postos de emprego existentes nas economias desenvolvidas.

Contudo, a visão de que o crescimento da desigualdade de renda nos Estados Unidos ocorreu devido ao crescimento dos diferenciais salariais de remuneração à qualificação foi testada empiricamente e questionada pelo estudo de Howell et al. (1995). Os autores utilizaram, como banco de dados, um painel rotativo de dados mensais da Current Population Survey (CPS) de 1970 a 1997. A amostra incluiu trabalhadores de 16 a 64 anos, que trabalharam de dez a 79 horas por semana, não empregados por conta própria e com salário de pelo menos meio salário mínimo. As medidas de qualificação do trabalhador foram estimadas

não só pelos anos de escolaridade, como na maior parte dos demais trabalhos empíricos, mas também por índices de habilidades cognitivas no ambiente de trabalho e de capacidades individuais de leitura.

O estudo chegou a três conclusões principais. Primeiro, de fato, os empregos com maiores ganhos salariais e de horas trabalhadas ao longo do período estavam associados a uma crescente demanda por trabalhadores qualificados. Contudo, essa relação é muito sensível ao grau de agregação de diferentes atividades em tipos de emprego. Segundo, por outro lado, não se verificou uma relação entre crescimento salarial e elevação das horas trabalhadas entre diferentes empregos, uma vez que muitos empregos de baixos salários também passaram por crescimento das horas trabalhadas. Por fim, a relação entre nível de qualificação e o salário do trabalhador se enfraqueceu na década de noventa. Isto é contrário ao que seria esperado com base em estudos anteriores, uma vez que se o crescimento da desigualdade salarial fosse conseqüência da demanda por mão-de-obra capacitada a operar com novas tecnologias e no contexto da globalização, essa relação deveria ter se reforçado ao longo do tempo. Por isso, os autores formularam novas hipóteses para o crescimento da desigualdade, como, por exemplo, relacionadas ao papel da desregulamentação do mercado de trabalho, da imigração, e da migração das indústrias norte-americanas para os países em desenvolvimento.

3.5. Alternativas Políticas para o Controle dos Efeitos dos Choques