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CAPÍTULO 2 RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

2.2 CRIAÇÃO DE UMA RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Na instituição de uma RDS é necessário observar os requisitos legais que antecedem o ato de criação, para conferir legitimidade e legalidade ao fato jurídico, por isso é de fundamental importância conhecer as exigências da Lei nº. 9.985/00 e do Decreto nº. 4.320/02.

Antes de criar uma RDS deve ser realizada consulta pública. Neste processo, o poder público é obrigado a fornecer informações adequadas e inteligíveis à população local e a outras partes interessadas. Além disso, o órgão ambiental que irá propor a criação da UC deverá realizar estudos técnicos que permitam identificar a localização, a dimensão e os limites mais adequados para a UC.

A consulta pública constitui um progresso na instituição de UCs no Brasil, permitindo que os residentes e usuários da unidade de conservação e do entorno, além dos demais interessados tomem parte da situação e possam participar do processo decisório, que anteriormente, era concentrado apenas na Administração Pública.

O conceito de consulta pública pode ser entendido como uma exigência legal (Lei nº. 9.985/00 e Decreto nº. 4.320/02) para assegurar que as populações locais, ambientalistas,

pesquisadores, profissionais liberais, empresários, organizações da sociedade civil sejam informados e opinem sobre as propostas de criar, ampliar e mudar a categoria das UCs, segundo Palmieri, Veríssimo & Ferraz (2005)65. Ainda, Palmieri, Veríssimo & Ferraz (2005) alertam que a população local deve ser previamente esclarecida sobre a criação da UC para evitar que a informações distorcidas possam influenciar negativamente, como exemplo é utilizado o caso da RDS Uatumã, no Amazonas, que a população local era contrária à criação da UC, devido a informações falsas alardeadas por exploradores irresponsável dos recursos ambientais daquela área.

A informação é um elemento fundamental no processo democrático, neste sentido, a legislação impõe que seja clara e de fácil compreensão, para que possa ser entendido o objeto da consulta. Significa, portanto, transparência da Administração Pública para garantir um processo decisório democrático, conforme preceitua Benjamin (2003)66:

Transparência ambiental significa exatamente isso: conhecimento público daquilo que dispõem os órgãos governamentais e os degradadores potenciais, permitindo aos cidadãos, num segundo momento, intervir eficazmente no sentido de proteger sua saúde, propriedade e o próprio ambiente, fiscalizando, a um só tempo, aqueles e estes. Daí resulta que a transparência não é fim em si mesmo; tem um caráter instrumental, garantindo a realização de outros objetivos, como a democratização dos processos decisórios, na medida em que a participação pública só faz sentido quando opera num contexto de livre circulação de informações.

A consulta pública representa um significativo avanço, decorrente de princípios constitucionais, como o princípio da informação, da participação, da precaução, inseridos na Constituição Federal de 1988, no artigo 225, que garantam a participação de todos os interessados sobre as questões referentes ao meio ambiente.

65

PALMIERE, Roberto. VERÍSSIMO, Adalberto. & Ferraz, Marcelo. Guia de consultas públicas de unidades de conservação. Piracicaba: Imaflora. Belém: Imazon, 2005. Disponível em <http://www.imazon.org.br > acesso em 27 de dezembro de 2005.

66

BENJAMIN, Antônio Herman. Objetivos do Direito Ambiental. In: BENJAMIN, A. H. & SÍCOLI, José Carlos Meloni. (orgs.). O Futuro do controle da poluição e da implementação ambiental. Anais do 5º Congresso Internacional de Direito Ambiental. São Paulo: IMESP, 2001.p. 57-78.

Destaca-se que a consulta pública é requisito legal previsto na Lei nº. 9.985/00 e o Decreto nº. 4.320/02, portanto, precisa ser obedecido para que ocorra a legitimidade e a eficácia jurídica do ato de criação da UC.

A criação da UC é respaldada pela consulta pública, conferindo legitimidade na decisão que repercutirá na vida dos residentes e usuários da UC e em seu entorno. A consulta pode ser feita por meio de reuniões, ou outras formas em que o órgão ambiental competente possa propiciar a participação da população local e os demais interessados. Assim, a audiência pública poderá ser um procedimento de consulta às populações locais.

A audiência pública é um instrumento que deveria possibilitar e garantir um espaço democrático para os atores locais e interessados na proteção do meio ambiente. Outros meios também podem ser utilizados na consulta pública, desde que consigam ter uma representatividade da população local. Contudo, por vezes, estes meios são utilizados de maneira inadequada e não conseguindo alcançar a primordial finalidade de propiciar a participação daqueles que anteriormente a Lei do SNUC eram excluídos no processo de criação de uma UC.

Dessa maneira, a consulta pública, em determinadas circunstâncias, é usada apenas para o cumprimento da exigência legal. Neste sentido, podemos lembrar do caso do Parque Nacional do Tumucumaque, no Amapá, criado por ato do Poder Executivo Federal, as vésperas da Conferência Rio + 10, que realizou a consulta pública por meio eletrônico, ensejando polêmica em torno da sua criação.

A consulta pública é também prevista na transformação de categoria de UC de uso sustentável para proteção integral, de forma total ou parcial, e na ampliação dos limites da área, sem modificação dos seus limites originais, exceto pelo acréscimo proposto, e poderá ser feita por instrumento normativo do mesmo nível hierárquico do que a criou a Reserva.

A redação do dispositivo legal que prevê a consulta para ampliação dos limites da área, sem modificação dos seus limites originais é confusa, melhor dizer, inapropriada, porque é impossível aumentar o tamanho da área sem modificar a sua dimensão original.

Outra questão é o instrumento normativo que poderá ser utilizado na ampliação e na transformação da UC, podendo ser do mesmo nível hierárquico do que a criou. Este dispositivo parece conflitar com o texto Constitucional, que dispõe que a alteração ou supressão dos limites da UC deverá ser feita por lei (art. 225, § 1º, III, CF). Silva (2004, p. 251) reforça esta assertiva ao declarar que:

É certo também que uma ampliação por instrumento normativo inferior à lei esbarra com o disposto no art. 225, § 1º, III, da Constituição, que exige lei para a alteração e supressão de Espaços Especialmente Protegidos, como são as unidades de conservação.

Assim, o posicionamento do referido autor nos permite afirmar que o dispositivo legal previsto na norma infraconstitucional fere a Constituição Federal.

Esta situação pode ser ilustrada, com o caso do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, que além de ampliar os limites da UC sem realizar consulta pública adequada, teve como instrumento o decreto, ato do presidente da República, em 2001, que ensejou um Mandado de Segurança junto ao Supremo Tribunal Federal67.

Benjamin (apud Pedreira, 2005) ao analisar a alteração e supressão dos limites da UC, afirma que somente será feito por lei o caso de supressão, ou ato que ameace a existência de UC, distinto da ampliação que poderá ser feita por instrumento da mesma hierarquia da criação da área protegida. Nesta interpretação, Benjamin (apud Pedreira, 2005) entende que não há conflito de normas, apenas o legislador Constitucional visa proteger a existência da UC, e a ampliação dos limites da área não tem por finalidade colocá-la em risco.

67

Cf. PEDREIRA, Rodrigo Bulhões. Legalidade do decreto de ampliação do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. Jus navigandi, Teresina, a. 9, n. 654, 22 abr., 2005. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6612. Acesso em 06 de fevereiro de 2006.

Além disso, Silva (2004, p. 251) argumenta que a Lei nº. 9.985/00 não definiu a natureza do ato de criação das unidades de conservação. Todavia, entende que seria mais apropriada a criação por lei de UC, por impor obrigações e restrições de direitos .

No Amazonas, o instrumento usado para criação de UC geralmente é o decreto. Todavia, as Reservas apresentadas neste trabalho foram constituídas mediante lei. É necessário que no ato de criação de uma UC deva constar a denominação, a categoria de manejo, os objetivos, os limites, a área da unidade, o órgão responsável por sua administração e a população tradicional beneficiária. Tendo em vista esses itens, constata-se a imprescindibilidade da realização de estudos técnicos anteriormente a criação da UC.

Em síntese, a consulta pública e os estudos técnicos prévios são requisitos essenciais na criação de uma UC, portanto, precisam ser rigorosamente cumpridos, para garantir o exercício do direito à informação e à participação, principalmente, da população local, que terá sua vida afetada pelas propostas que serão apresentadas em relação à UC.