• Nenhum resultado encontrado

A criança nos Campos de ação

No documento RELATÓRIO DE ESTÁGIO DE MESTRADO (páginas 96-101)

Capítulo III – Intervenção Pedagógica na Sala da Pré II

3.5 Intervenção Pedagógica com o grupo da Pré II

3.5.1 A criança nos Campos de ação

Jean Piaget considera a criança como um ser que vai construindo o seu desenvolvimento cognitivo nas ações sobre as coisas, nas diversas situações e acontecimentos (Piaget, 1999). Estas situações educacionais devem acontecer em

campos de ação, ou, áreas onde as crianças possam transformar as explorações em

aprendizagens significativas (Hohmann & Weikart, 2003). A disposição do espaço pedagógico em áreas diferenciadas promove a ação das experiências de quem delas usufrui e aumenta a capacidade de iniciativa, autonomia e estabelecimento de relações sociais, possibilitando, portanto, uma pluralidade de aprendizagens (Kishimoto, Santos & Basílio, 2007; Oliveira-Formosinho & Andrade, 2011). Assim, quando as crianças brincam de forma ativa estão de facto ocupadas a aprender o mundo pela forma que é normal, explorando e trabalhando com pessoas, materiais e ideias. Deste modo, uma das responsabilidades mais relevantes do educador é proporcionar um ambiente físico securizante que encoraje as brincadeiras ativas das crianças (Hohmann & Weikart, 2003; Hohmann & Post, 2003).

Como alude Portugal e Laevers (2010, p.16), quando as crianças “têm oportunidade de escolher, fazem-no, em princípio, optando por aquilo que é mais favorável ao seu desenvolvimento, no prolongamento das suas necessidades de exploração e de saber.” Todo o educador que se assuma como reflexivo deve compreender que o nível de implicação das crianças está estritamente relacionada o resultado que o meio ambiente pedagógico provoca nas mesmas (Portugal & Laevers, 2010).

Conforme nos indica as OCEPE (ME, 1997) quando a criança compreende a organização do ambiente e os materiais, permite que esta se sinta autónoma na permanência nesse espaço pedagógico. Por sua vez, ao se sentir detentora de liberdade para selecionar e manusear os materiais, está a desenvolver a sua autonomia e simultaneamente a sua responsabilidade. Portanto, a primeira forma de intervenção do educador será a maneira como organiza o espaço e os materiais oferecendo um quotidiano ordenado, onde o seu grupo possa ser autónomo nas suas escolhas (Oliveira- Formosinho & Andrade, 2011). As salas de orientação construtivista apresentam diversas áreas de interesse que produzem diferentes ideais pedagógicos e fomentam ainda, vivências e experiências relacionadas com os papéis sociais, relações interpessoais e estilos de interação das crianças, (Oliveira-Formosinho,1998).

Como já anteriormente referido, o espaço da sala da Pré II está organizada em distintas áreas de interesse e a sua frequência dependia exclusivamente da escolha de cada criança, aquando o momento de chegada à sala (Ver figura 11).

Figura 11. Momentos nos campos de ação

Nos vários momentos, teve-se a possibilidade de observar uma construção arquitectónica das casas dos três porquinhos, de um menino de cinco anos, na área polivalente, através de um conjunto de blocos lógicos (Ver figura 12).

Figura 12. Momento da construção das casinhas dos três porquinhos

Quando questionada sobre a sua construção, a criança respondeu: “Eu fiz as

casinhas dos três porquinhos! (Criança, 5 anos). De modo a perceber a razão pela qual a

criança realizou a história, esta mencionou “a mãe ontem leu a história dos três

porquinhos e eu gostei” (Criança TA, 5 anos) Outra forma de compreender as ações das

crianças é ouvindo e encorajando o diálogo sobre as suas escolhas.

Conota-se ainda que se deparou nestes campos de ação conversas entre crianças que ilustravam alguns indicadores de desenvolvimento, nomeadamente, no seu campo linguístico. A determinada altura as crianças estavam a comparar as suas garagens,

qual seria a garagem maior; Criança (A): eu fazi uma garagem mais grande que a tua!

Criança (B); a minha é mais grande! (Diário de bordo, 8 de novembro de 2013). Perante as ações das crianças é fundamental que o educador esteja atento às suas diversas brincadeiras, visto que essas brincadeiras e interações revelam habilidades, interesses e inclusive necessidades, as quais são fulcrais no campo de intervenção pedagógica do educador.

Os adultos ouvem as crianças enquanto estas trabalham e brincam para poderem compreender, a partir das suas conversas espontâneas, a forma como estão a pensar sobre aquilo que fazem (…) [e] no decurso destas conversas os adultos param frequentemente para dar às crianças tempo para pensar e para pôr os seus pensamentos em palavras (Hohmann & Weikart, 2003, p. 47).

Torna-se essencial que o educador aproveite as atividades livres para “ouvir e observar o que a criança diz, e como o diz, é o meio mais eficaz para compreender como se está a processar o desenvolvimento da linguagem em qualquer criança” (Sim- Sim et al, 2008). Para poder compreender as intenções que se escondem por detrás de cada ação, os adultos devem observar “sem ideias pré-concebidas, aquilo que as crianças fazem com os materiais” e devem participar ativamente nas atividades em que

estas estão envolvidas, de modo a que sintam que o seu comportamento é valorizado e significativo (Hohmann & Weikart, 2003, p. 46). Neste sentido, desde que não se estivesse a orientar alguma atividade com algum pequeno grupo, acompanhava-se as ações das crianças, com ou sem intromissão.

Associando-se à brincadeira da criança, trabalhando com a criança para resolver um problema ou conversando com ela acerca das suas experiências, o adulto relaciona-se com a criança como se de um companheiro se tratasse, estando atento às intenções dela e ajudando-a a levar a cabo e a expandir a atividade que pretende empreender (Hohmann & Weikart, 2003, p. 51).

Importa salientar ainda que o espaço de educação pré-escolar não existe apenas, exclusivamente, em função da aprendizagem, deve ser, também, encarada pelo educador como um espaço que promove alegria, prazer e bem-estar quando as crianças usufruem dele apenas para brincar. Conforme nos diz Hohmann e Weikart (2009, p.88) os educadores que compreendem o valor do brincar “estão a apoiar o processo de aprendizagem pela acção e o desejo espontâneo da criança em aprender.”

Um outro espaço que promove brincadeiras livres é, sem dúvida, o recreio. Neste espaço a criança descobre as suas próprias habilidades, bem como desenvolve competências motoras e sociais. A figura 13 evidencia estes aspetos, contextualizados com as brincadeiras no recreio dos elementos da sala da Pré II.

Figura 13. Momentos de brincadeiras no recreio

Como tal, é no recreio que a criança tem a oportunidade de trocar experiências, brincar, competir, manter relações sociais, criar ou fortalecer laços de amizade com as demais crianças. Por vezes, canaliza-se o olhar para a criança, em contexto de sala, no entanto, é no recreio, que apresenta uma maior implicação, dado que vivencia atividades

livres que vão ao encontro dos seus interesses e motivações, proporcionando, assim, aprendizagens significativas.

O recreio possibilita ainda ao educador compreender as crianças e avaliá-las, pelo simples facto de que o seu brincar constitui a forma mais completa e genuína que estas têm de comunicar consigo próprias e com os demais indivíduos que a rodeia. Possibilita ainda, ao educador identificar possíveis problemas e comportamentos que, por vezes, não se apresentam quando estas se encontram em atividades orientadas ou livres na sala. Nesta mesma linha de pensamento, Spodek (2002, p.257) atenta para “o que as crianças fazem durante o intervalo é “educativo” na medida em que aprendem a adoptar perspectivas diferentes, a cooperar e a comunicar com os pares.”

Destaco um momento que decorreu no recreio, o jogo do lenço que emanou do interesse manifestado por uma menina, detentora de um lenço de papel, suscitando, assim, o interesse das restantes crianças, desencadeando um momento estimulador e potencializador no processo de socialização entre crianças e inclusivamente com o adulto.

(Diário de bordo, 16 de outubro de 2013) Esta situação descrita enquadra-se na área de formação pessoal e social definida nas OCEPE (ME, 1997) que apontam para o desenvolvimento de atitudes e comportamentos necessários para o sucesso individual e para a vida em sociedade, por meio da socialização e interação com os outros (Almeida, 2010). Note-se que a área de formação pessoal e social constitui uma área transversal e integradora do conhecimento de si, do outro e na relação que esta estabelece com os seus pares, baseando-se na criação de um ambiente relacional propício a desenvolver na criança a consciência de ser escutada e valorizada. Sendo assim, são tidas a desenvolver as capacidades de auto estima, de auto confiança, no sentido de conduzir à construção da sua autonomia e sobretudo fomentar o processo de socialização. Nesta linha de pensamento, Castro (citado por Almeida, 2010, p.21) alude que:

“a formação pessoal e social da criança acontece sempre que existe interacção com os diferentes atores educativos, onde ocorre o diálogo, numa sequência de estimulo- resposta-reforço e emergem novos contextos ou situações que promovem o desenvolvimento da auto-estima, competência relacionais, capacidade de resolução de problemas, responsabilidades e liderança.”

A figura 14 evidencia a realização do jogo do lenço que ilustra de que forma as interações se podem estabelecer no recreio, promovendo competências da área de Formação Pessoal e Social.

Figura 14. As crianças a realizar o jogo do lenço durante o recreio

Nos dias de hoje, o recreio no sistema educativo português tem vindo a assumir a designação de intervalo, reservado, sobretudo, à refeição e à ida das crianças à casa de banho. Não descurando da relevância destes aspetos para o bem-estar da criança, o recreio representa muito mais do que isso, assume-se como um espaço de grande carga socializadora. Tomando as palavras de Neto (2003, p.30) o recreio revela-se o “espaço mais rico da escola”, visto que, para além de desenvolver a criança, a nível motor permite que esta experiencie momentos de verdadeira descoberta, sem a intransigência do adulto. Partilhando da mesma perspetiva, Cordeiro (2007, p. 377) aponta para o facto do recreio ser um espaço de extrema relevância, momento integrado na rotina diária em educação de infância, visto que este “representa uma oportunidade diária para as crianças se envolverem em actividades lúdicas.”

No documento RELATÓRIO DE ESTÁGIO DE MESTRADO (páginas 96-101)