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CRIME DE MAUS-TRATOS A ANIMAIS E PENALIDADES

De acordo com Cunha (2016), citando o Código Penal de 1940, é sabido que quem [...] concorre para a prática dos crimes “incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como aquele que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la”. Dessa forma, o autor destaca que “o artigo 2º da Lei 9605/98 segue tal desiderato”, afirmando que “o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica que praticar crimes ambientais, sabendo da conduta criminosa, ou omitir-se, quando podia agir para evitá-la, será corresponsável”. Ademais, conforme a lei 9605/98, em seu art. 32: “[...] é crime punido com pena de detenção de três meses a um ano, e multa, praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos” (BRASIL, 1998).

Diniz (2018) destaca uma classificação quanto ao tipo de crime cometido presente no art. 32 da Lei 9.605/98:

[...] o art. 32 da Lei n. 9605/98 abrange quatro tipos de crimes intencionais contra animal (silvestre, doméstico, domesticado, nativo ou exótico): ato de abuso (p. ex. submeter animal a trabalho excessivo, como puxar carroça com peso acima de suas forças); de maus-tratos (p. ex. causar sofrimento a animal lesando a sua integridade física); ferir (p. ex. machucar) e mutilar (amputar partes de seu corpo)” E nesse ponto,

destaca o autor, “o ato de matar o animal está inserido nesse artigo, pois o agente antes de causar sua morte irá feri-lo, ou maltratá-lo. (BRASIL,1998, grifo nosso).

Muitas são as práticas violentas praticadas contra animais, que Cunha (2016) exemplifica como rinhas, rodeios e vaquejadas, e posteriormente Diniz (2018) aponta estas e outras situações violentas, por exemplo, carreira de boi, farra de boi e touradas:

a) Rinha: que é a briga de galos, passarinhos, cachorros que são levados a um confronto, deixando-os feridos ou cegos, podendo até matá-los b)Carreira de “boi cangado”: comum no Rio Grande do Sul, consistente em colocar uma peça de madeira que se encaixa no cangote do animal, sendo presa sob o pescoço por uma tira de couro, traçando sobre dois animais que é presa no chão. Os animais são estimulados com o guizo, espetados por uma lança pontiaguda até ficarem violentos, partindo para a disputa, que só termina quando um deles cair sangrando no chão. c)Farra do boi: prática brasileira, portuguesa e espanhola consistente em submeter o animal a fobia pública, soltando-o no meio de uma multidão, que o persegue e o machuca, durante o trajeto, para depois ser sacrificado. A farra do boi em Santa Catarina se dá durante o ano todo se caracteriza pela tortura animal. d)Tourada, oriunda da Espanha, na qual há disputa entre animal e o homem, até levar o touro à morte, que se dá de forma lenta, fazendo com que o animal sangre até cair ao chão. e)Vaquejada, do nordeste brasileiro, elevada pela Lei n. 13.364/2016 (BRASIL, 2016) à condição de manifestação cultural nacional e de patrimônio cultural imaterial, consiste no ato de dois vaqueiros (o puxador e o esteireiro), montados em cavalos, perseguirem o boi desde a saída do box até a faixa de julgamento, devendo laçá-lo, tombá-lo e arrastá-lo até que mostre as quatro patas para cima, provocando hemorragias internas e luxações. f) Rodeio é uma manifestação cultural nacional, considerada como patrimônio cultural imaterial (Lei n 13.361/2016) e é disciplinado pela Lei n. 10.519/2002, cujo art. 1º o considera como uma atividade de montaria ou de cronometragem e as provas de laço, nas quais são avaliadas a habilidade do atleta em dominar o animal com perícia e o desempenho do próprio animal. Tais atividades são nocivas aos animais, podem provocar lesões no crânio, na coluna cervical e rompimento de órgãos. As práticas que se dão nos rodeios por provocarem estímulos dolorosos aos animais, podem ser considerados, diante do art. 225, §1º, VII, da CF, inconstitucionais. (CUNHA, 2016, p. 100-101; DINIZ, 2018, p. 105-106, grifo nosso).

Por trás de todos esses espetáculos cruéis, existe um grande problema, segundo Cunha (2016), já que “sabe-se do imenso potencial econômico das empresas que organizam tais Vaquejadas e Rodeios, parecendo-nos que foram criadas e utilizadas de forma não apenas preponderante, mas única, com o fim de facilitar a prática de crime previsto na Lei 9605/98”, e dessa forma o autor entende ser o caso de aplicação do art. 24 do mesmo diploma normativo, ou seja, “ter decretada sua liquidação forçada bem como seu patrimônio ser considerado instrumento do crime e como tal perdido em favor do Fundo Penitenciário Nacional” (CUNHA, 2016, p. 99). Dito de outro modo, todas essas empresas que patrocinam esses grandes eventos que utilizam animais com a finalidade de proporcionar prazer aos espectadores também merecem ser enquadradas criminalmente.

Assim, segundo Cunha (2016, p. 99), deve ser verificada a “participação e culpabilidade das empresas patrocinadoras das Vaquejadas e Rodeios no crime previsto no art. 32 e suas consequências penais”, pois é sabido que para que ocorram esses “espetáculos há grande movimentação empresarial e apoio logístico envolvido”. Ou seja, segundo o autor, tais patrocinadores deveriam ser incriminados e penalizados com multas (CUNHA, 2016).

No caso das rinhas, ou brigas de galo, “não se quer, ao se realizar vários maus-tratos a diversos animais, praticar uma só ilicitude de modo prolongado no tempo”, posiciona-se Cunha (2016, p. 108). Pelo contrário, “relatam diferentes ideias e desígnios, cada um destinado à prática de diferentes delitos, pois diversos e individualizados os seres envolvidos”.

Não há, pois, essa unidade psicológica de que fala a doutrina. O que ocorre é apenas simples reiteração delitiva. Assim deve ser rejeitada a tese de continuidade delitiva entre as condutas, confirmando-se a ocorrência de concurso material, ou seja, a pessoa que possui vários animais para rinhas, pratica, mediante mais de uma ação ou omissão, dois ou mais crimes, pelo que devem ser aplicadas as penas cumulativamente a cada um dos crimes de maus tratos e guarda de animais. (art. 69 do Código Penal) (BRASIL, 1940, grifo nosso).

Outrossim, dos animais que servem para consumo humano, não é concebível a aceitação de tamanhas crueldades em sua criação e abates, já que:

[...] animais (aves, porcos, vacas) destinados a produzir alimentos à população são tratados como máquinas produtoras, ficando apinhados, em gaiolas ou galpões sem luz e ventilação natural, e alimentados por equipamentos automáticos em quantidades pré-estabelecidas. As aves, destinadas à produção de ovos, vivem sob luz intensa e permanente para que se alimentem e coloquem ovos, o tempo todo. Para a produção de foie gras, patos e gansos são forçados a ingerir bastante ração e gordura mediante tubos introduzidos pela garganta (método gavage de engorda), que pode causar perfuração e rompimento de órgãos, hipertrofia do fígado. Diante dessa prática cruel, Reino Unido, Irlanda, Austrália proibiram a produção de foie gras. No Brasil, o Decreto 24.645, art. 3º, XXV, considerou maus-tratos a engorda de aves por meio mecânico. Nos abatedouros a agonia do animal é imensa. Novilhos são afastados de suas mães e ficam confinados em baias escuras, recebendo alimentação líquida, para não desenvolverem musculatura, para que suas carnes fiquem claras e macias. São mortos entre 2 e 6 meses de idade, sem sensibilização prévia. (DINIZ, 2018, p. 113).

Espera-se que haja brevidade no agir dos órgãos de proteção animal brasileiros e, principalmente, fiscalização no cumprimento das leis já existentes, para minimizar ao máximo o sofrimento animal na pecuária.

Castro Júnior e Vital (2015) ressaltam que “o Decreto n. 6.514/08 (BRASIL, 2008) de 22 de julho de 2008 revogou o Decreto n. 3.179, de 21 de setembro de 1998, passando então a regulamentar a Lei de Crimes Ambientais, precisamente os dispositivos que tratam das sanções administrativas ambientais”. O decreto repete o caput do art. 32 da Lei 9.605/98 (BRASIL,

1998), dispondo sobre o valor das multas a serem aplicadas, que tiveram grande acréscimo de valores: “R$ 500,00 (quinhentos reais) a R$ 3.000,00 (três mil reais) por indivíduo que praticar ato de abuso, maus tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, nativos ou exóticos” como uma das penalidades a serem aplicadas na tentativa de minimizar a prática delitiva.

4 MAUS-TRATOS CONTRA ANIMAIS: PERFIL DAS DECISÕES DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA

O presente capítulo apresenta a pesquisa realizada junto à jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina acerca da prática do crime de maus-tratos contra animais da lei 9.605/98 (BRASIL,1998), a lei de crimes ambientais, e seu posicionamento quanto à percepção da senciência animal detalhada em suas decisões.

A natureza da pesquisa é de caráter documental no que concerne ao uso da pesquisa nos acórdãos do Tribunal e de natureza exploratória, buscando conhecer o entendimento jurisprudencial do TJSC.

Foram selecionados julgados de setembro de 2017 a setembro de 2019, utilizando como critério de busca as palavras-chave “maus-tratos” e “animais”, diretamente no site do TJSC, para o tipo de decisão “acórdão”, “decisão monocrática” ou “despachos”, com âmbito somente nas turmas recursais ou de 2° grau.

Foram encontrados 32 acórdãos com os critérios de busca, embora tenham sido selecionados 17 acórdãos para esta pesquisa, aqueles que faziam referência ao crime de maus- tratos a animais. Importante enfatizar, nesse caso, que os outros 15 acórdãos encontrados, embora trouxessem algumas das palavras-chave pesquisadas, não condiziam com a prática de maus-tratos a animais, ou seja, foram utilizados para fundamentar jurisprudências de outra natureza, que não tipificavam o crime aqui em análise.

Assim, a partir dos 17 acórdão selecionados, foram identificados o tipo de recurso, a legislação aplicada ao caso, a espécie animal, a pena gerada, a localidade, o denunciante e o denunciado, identificando também os acórdãos que mencionam os artigos 926 e 927 do Código de Processo Civil (CPC).

Para a análise dos resultados, foram criadas as seguintes categorias de análise: a) Perfil geral dos recursos e b) Legislação aplicada, pena e menção aos artigos 926 e 927 do CPC.

Com base nos parâmetros de inclusão mencionados, durante a leitura dos julgados foram extraídas e catalogadas as variáveis citadas, conforme modelo do formulário de coleta de dados apresentado no “Apêndice A”.

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