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CRISTO REDENTOR SIGNO METONÍMICO DA “CIDADE MARAVILHOSA” EM EXPOSIÇÃO

colônia um país onde o soberano tinha sua residência Declararam-no, então, igual às

3.6 CRISTO REDENTOR SIGNO METONÍMICO DA “CIDADE MARAVILHOSA” EM EXPOSIÇÃO

Entre os inúmeros eventos destinados à comemoração do Centenário da Independência destaca-se o projeto para a construção do Cristo Redentor estrategicamente colocado sobre o Corcovado, cuja pedra fundamental foi lançada em 4 de abril de 1922, embora inaugurado somente em 1931, construído através de doações públicas recolhidas em todo o Brasil. Uma iniciativa similar à comemoração dos Centenários da Independência dos Estados Unidos e da Revolução Francesa, resultando na Estátua da Liberdade e na “mirabolante torre metálica que o engenheiro Eiffel desenha para a exposição do centenário de 1889, emblema materializado da ideia de progresso.” (ZUCCONI, 2009, p. 176).

Assim como a Torre Eiffel, o Cristo Redentor e a magnitude de sua construção estão associados, até mesmo pela data de sua construção, à renovação urbana pela qual passou a cidade do Rio de Janeiro, obedecendo a construção de uma imagem espelhada “no mito parisiense, modelo paradigmático de cidade moderna que aprofunda um sentido emblemático e metonímico, erigindo certos marcos simbólicos que formulam a compreensão do todo.” (PESAVENTO, 1999, p. 170).

Desta forma, o Rio de Janeiro com a colocação do cristo Redentor no elevado pico do corcovado (1931), em meio à floresta urbana da Tijuca, equiparava-se a outras urbes do mundo moderno158, Nova Iorque com a Estátua da Liberdade (1886) e, principalmente, Paris com sua Torre Eiffel (1889). O Cristo Redentor, um monumento valorizado pelo glamour da paisagem natural, criava nos trópicos um panorama de modernidade. Com efeito, tanto no Rio de Janeiro, “como nos velhos panoramas de Londres e Paris, o visitante passou a ver e a

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O mundo moderno é dominado pelo artificialismo, pela imitação, pela cópia, tudo revela uma enorme preocupação com a aparência do novo, do moderno, do acompanhamento da moda. (PESAVENTO, 1999, p. 198).

compreender a síntese entre o mar, a floresta, a avenida e a história.” (PEREIRA, 2010, p. 158).

A identidade da Cidade do Rio de Janeiro, moderna por suas intervenções urbanas e marcada pela sua feição geográfica, está principalmente associada aos seus aspectos naturais, signos imagéticos, verdadeiros marcos159, destacando-se os picos elevados (Corcovado, Pão de Açúcar, Dois Irmãos, Urca, Cara de Cão, etc..), os contornos da orla e sua arquitetura histórica. O caráter atrativo destes ambientes naturais e sua capacidade de gerar lucros já os tornaram alvo de investimentos desde fins do século XIX160. O próprio Pereira Passos havia sido dos primeiros a investir, de acordo com Pereira (2010, 156), “também no desenvolvimento turístico dessas áreas, construindo a Estrada de Ferro do Corcovado (1884), para melhorar o acesso ao mirante do Corcovado, e construindo, em plena floresta, o hotel das paineiras”.

Vista do alto do corcovado, pela perspectiva do panorama que se descortina, expõe-se a dimensão das obras empreendidas para adaptar a cidade do Rio de Janeiro ao contorno natural e as intervenções sobre o território à ocupação dos espaços nesta arquitetura da cidade em expansão. Ao mesmo tempo, nesta construção da cidade valoriza-se “o saber transformar a natureza e as construções em monumentos, que, entrelaçados, definiam-na como lugar de vida coletivo.” (PEREIRA, 2010, p. 158).

Emblemático à imagem de modernidade do Rio de Janeiro adquirida no período da Primeira República, o Cristo Redentor estrategicamente colocado sobre o Corcovado, inaugurado em 1931161, apresenta, enquanto obra de arte e imagem em destaque, um diferencial por sua centralidade e valor histórico devido ao significado de sua realização, atribuição de valor e uso da paisagem. De acordo com Lamas (2004, p. 58), “toda a ação que humaniza a paisagem pode conter objetivos e valores estéticos que se comunicam através dos sentidos ou da percepção”.

159Os Marcos, “em geral, são um objeto físico definido de maneira muito simples: edifícios,

sinal, loja ou montanha. Alguns marcos são distantes, tipicamente vistos de muitos ângulos e distâncias, acima do ponto mais alto de elementos menores e usados como referências radiais”. (LYNCH, 2010, p. 53).

160Em 1883, Karl Von Koseritz destacava os investimentos na valorização da paisagem,

relatando que, “está sendo construído um elevador no Corcovado, onde igualmente deve ir ter uma linha de bondes e, pensa-se, mais tarde, em um instrumento semelhante para o Pão de Açúcar.” (KOSERITZ, 1980, p. 57).

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A pedra fundamental do monumento foi lançada em 4 de abril de 1922, cuja iniciativa original deu-se pela comemoração do centenário da independência, mas as obras somente foram iniciadas em 1926.

O Cristo sobre o Corcovado, enquanto elemento visual, além de proporcionar, através do acesso ao cume montanhoso, uma imagem de reconhecimento dos espaços da cidade, vistos de cima, possibilita também a quem está no espaço da cidade, em baixo, a localização em relação a um marco referencial, nitidamente visível pela sua forma e situação geográfica. A relação deste principal marco visual com a cidade estabelece a sua identidade, importância enquanto imagem na composição do imaginário.

O Cristo Redentor representa para o Rio de janeiro o que Kevin Lynch chama de Imaginabilidade, ou seja, sua característica, enquanto objeto físico que “lhe confere uma alta probabilidade de evocar uma imagem forte em qualquer observador dado.” (LYNCH, 2010, p. 11). Tal condição proporciona uma clara legibilidade à cidade, tendo por eixo esta condição que estabelece uma importante relação sócio- espacial, pois “para que exista imagem (como em todo o fenômeno correlacionado com a percepção), é necessária uma relação entre objeto e observador.” (LAMAS, 2004, p. 61).

A dimensão da imagem do Cristo, abarcando o alcance visual da quase totalidade do território, faz com que a imagem da cidade e do monumento se confundam, pois “este encadeamento dialético que permuta a passagem da referência de um monumento em si para a da cidade como monumento, é a raiz do significado das cidades.” (AYMOMINO, 1984, p. 11). Por outro lado, a nova forma de ver a cidade, a partir de uma dimensão estética, propulsionada pelo avanço da modernidade a partir da virada do século, fez com que “a emoção estética na contemplação da paisagem se tornasse um fator cultural.” (LAMAS, 2004, p. 66).

Figura: 42: Cristo Redentor em construção Figura 43: Inauguração do Cristo

À esquerda, o Monumento voltado à entrada da Baía da Guanabara, onde se encontra o Pão de Açúcar, monumento natural identificado à imagem da cidade, à frente deste, em destaque, os aterros do bairro da Urca em construção. O monumento em estrutura de ferro é revestido de pedra e cimento. Nas imagens observa-se o potencial do monumento associado a legibilidade urbana, enquanto objeto único e estrategicamente situado, possibilitando a identificação dos pontos da cidade em relação à sua face. O monumento destaca-se pela visibilidade em relação aos espaços da cidade.

Mais do que uma imagem em forma de Cruz, o Cristo Redentor apresenta pontos distintos e identificáveis (frente e costas, lateral direita e esquerda), que, ao mesmo tempo, remetem aos quatro pontos cardeais, distinguindo-se em meio à magnífica paisagem natural e urbana, criando um sistema de orientação no que diz respeito “a noções de acima/abaixo, esquerda/direita, horizontal/vertical, alto/baixo, longe/perto, etc., que permitem ao homem orientar-se na cidade.” (LAMAS, 2004, p. 58).

A reforma urbana, com a abertura das grandes avenidas e a elevação de magníficas edificações, teria na construção do Cristo Rendetor a coroação do período de modernização, consolidando a cidade do Rio de Janeiro como Cartão Postal. Este signo metonímico da cidade renovada projetava para a posteridade uma imagem do presente, ao mesmo tempo em que, “mesmo involuntariamente”, criava uma representação de poder, da mesma forma que outros signos metonímicos erigidos à conclusão do processo modernizador das estruturas urbanas de cidades pelo mundo. Estes signos muitas vezes se fazem representar por uma grande obra como as pontes pênseis metálicas, caso de São Francisco nos Estados Unidos com a Golden Gate Bridge e Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, com a Ponte Hercílio Luz.

4 FLORIANÓPOLIS: REPÚBLICA, MODERNIZAÇÃO