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4 O ARQUIVO HIPERTEXTUAL DA OBRA DE JUREMA PENNA

4.2 CRITÉRIOS DE EDIÇÃO

Nessa seção, trataremos da estrutura do arquivo hipertextual e discutiremos os critérios utilizados para elaborar as edições que o integram, a saber: fac-similar, sinóptica, crítica. Na figura 19, ilustramos a capa do volume 2 desta tese50. Ao se clicar sobre “Arquivo Hipertextual”, o leitor é direcionado à página inicial, conforme disposto na figura 20.

Figura 19 - Acesso ao arquivo hipertextual a partir da capa do volume 2

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Da página inicial, temos acesso às edições de cada um dos textos que compõe o arquivo hipertextual. Nessa mesma página temos ainda um link para os critérios de edição, com um resumo dos critérios ora apresentados e uma nota biográfica sobre Jurema Penna, a fim de dar a conhecer a vida e obra da dramaturga. Ao clicar sobre um dos textos, abre-se uma página de onde se pode ter acesso aos três tipos de edição, acima citados, para cada peça. Há também uma segunda possibilidade de acessá-los, via menu horizontal no topo da página (cf. figura 20, letra a). Nesse menu, reunimos as peças pelo tipo de edição, cabendo ao leitor optar por ler as diferentes edições do mesmo texto ou ler o mesmo tipo de edição dos diferentes textos.

Figura 20 – Página inicial do arquivo hipertextual e página inicial da edição

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

50 O volume 2 encontra-se disponível em suporte digital, no endereço eletrônico: http://www.juremapenna.com/inicio.html

A elaboração de uma edição fac-similar tem como objetivo dar a conhecer a materialidade em que o texto foi produzido. Acreditamos que, assim, será possível aproximá- lo dos modos de leitura realizados na época de sua construção, a partir da interpretação dos dados oferecidos pelo suporte. Para a produção dos fac-símiles, capturou-se a imagem com o uso de máquina fotográfica digital, marca Sony, modelo Alpha SLT-A35, 16.2 MP, sem o flash. As imagens foram editadas por meio do programa Microsoft Office Picture Manager, para ajustes no brilho, no contraste, no meio-tom, a fim de tornar a imagem mais nítida, e na intensidade da cor, na tentativa de corrigir o tom avermelhado. Não foi feito nenhum tipo de correção que suprimisse as marcas do suporte.

Vale ressaltar, ainda, que as folhas encontravam-se levemente onduladas em sua porção inferior, em decorrência do armazenamento: os textos são dispostos em pastas plásticas, com 40mm de espessura, ficando soltos dentro delas; por ação da gravidade, as folhas tendem a se curvar. Tal fato traz como consequência, para os fac-símiles, a presença de ondulações, o que pode gerar sombras na parte inferior da folha. As imagens geradas possuem alta resolução e, devido ao tipo de lente da câmera, é possível ampliá-las sem perder o foco.

Para a presente edição, propõe-se que os fac-símiles sejam disponibilizados, acompanhados da sua descrição física (Cf. figura 21). A fim de torna-la mais dinâmica, utilizou- se o recurso de tooltip, no qual, ao se passar o mouse sobre as informações destacadas em azul, aparece, no detalhe, um recorte da imagem a que se refere (Cf. figura 22). Com o intuito de tornar mais clara as intervenções manuscritas, recorremos ao uso de operadores para descrevê- las, conforme listamos:

[ ] Acréscimo

[ ←] Acréscimo à margem direita [ →] Acréscimo à margem esquerda

[↑] acréscimo na entrelinha superior <> Supressão

<>/ \ substituição por sobreposição / supressão por sobreposição <> [↑] Substituição por riscado e acréscimo na entrelinha superior

Esclarecemos que a descrição física dos testemunhos folha a folha foi realizada apenas para os textos editados nesse trabalho. Para Negro amor de rendas brancas e Bahia livre exportação, faremos apenas uma descrição geral, uma vez que a materialidade destes já foi objeto de estudo da dissertação de mestrado desta pesquisadora.

Figura 21 – Arquivo hipertextual: Fac-símile e descrição (visão geral)

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Figura 22 – Arquivo hipertextual: Fac-símile e descrição (visão do detalhe)

Fonte: Elaborado pela pesquisadora.

No intuito de possibilitar uma leitura paralela das versões do texto, trazemos uma edição

sinóptica, construída por meio do aplicativo Juxta Commons (cf. figura 23). Para ter acesso a

essa edição, o leitor deverá utilizar o login: “izzalmeida@gmail.com” e a senha: “157913”. Fizemos uso da estrutura do software para realizar uma leitura dinâmica e descentrada do texto, a partir das diferentes formas de visualização disponibilizadas: heat map, com os comentários

da edição, disponíves no botão User annotations (Cf. figura 24, letra a) e side-by-side view (Cf. figura 25), conforme apresentado da seção 4.1 desta tese.

Figura 23 – Tela inicial da edição sinóptica

Fonte: JUXTA, 2014

Figura 24 - Edição sinóptica disponibilizada, no aplicativo Juxta Commons, modo de visualização heat map

Fonte: JUXTA, 2014

Figura 25 – Edição sinóptica disponibilizada, no aplicativo Juxta Commons, modo de visualização side-by-side

Fonte: JUXTA, 2014

Para a construção da edição, realizamos a transcrição dos testemunhos, por meio do software Free Online OCR. Mantivemos a lição dos testemunhos, procedendo à normalização nos casos relacionados a seguir:

- Usar devidamente as letras maiúsculas em nomes de personagens, lugares e após a

pontuação, conforme a norma padrão da língua portuguesa:

(PENNA, 1980, p.20)

CAZUZA – ‘Tá ficando maluca, mulher? (Transcrição de T80)

- Manter as maiúsculas em caso de destaque; - Indicar as rubricas em caixa baixa:

(PENNA, 1976, p.20)

NARRADOR – E uma pequena cantora que gravou muito samba deste (Slide de Caimi jovem) jovem mulato, o moço Cahymi, vestiu-se de baiana e rompeu as fronteiras do Brasil - A Pequena Notável – CARMEM MIRANDA! (Transcrição T76).

- Respeitar o seccionamento do texto em fala;

- Retirar as barras inclinadas, hifens e apóstrofes que se destinam à estética do texto

datiloscrito, mantendo apenas os signos destinados à pontuação;

- Utilizar travessão antes do texto das réplicas:

(PENNA, 1975, p.20)

ATRIZ I – (Voltando a narração) Vocês podem perder tempo, mas ganham amigo, o que pra nós, é muito importante. E esse calor humano, este dengue, essa maliomolência, essa falta de pressa, como tambem a capoeira, a candomblé, (Transcrição T75a)

- Incorporar as intervenções manuscritas que se destinam a revisão do texto; - Retirar a separação de sílaba da palavra ao fim da linha;

- Marcar as modificações textuais (intervenções manuscritas), valendo-se dos operadores

anteriormente relacionados:

PÉ-MOLHADO – (Percebendo que Pedrão está estranho) Viu alma do outro mundo companeiro? [(Pedrão não ouve)] (Transcrição de T80)

- Não registrar as intervenções manuscritas que indiquem as marcações cênicas:

(PENNA, 1991, p.2)

QUICO – (Que entrou com flores de Tia cota durante o pregão de D.Maria)

Ôi, gente! Ô Dona Maria, porque é que se enfeita a casa no Natal com folhas51 de pitanga?(Transcrição de

T80)

- Para os textos não numerados, indicar o número da folha do testemunho entre colchetes.

Realizamos essas intervenções a fim de evitar que o aplicativo as reconheça como modificações textuais, uma vez que dizem respeito apenas à forma do texto datiloscrito. No que tange às intervenções que documentam as marcações cênicas, preferimos incorporá-las à edição crítica, na aba Construção do texto, pois se configuram como uma nova camada textual e registram a encenação.

Se a edição sinóptica traz o texto como testemunho da escrita dramatúrgica de Jurema Penna em sua dinâmica, a edição crítica proporciona a atualização deste a partir da leitura de seu editor. Nesse intuito, preparamos edições críticas tendo em vista a sua divulgação como objeto de leitura e de encenação. Para a elaboração deste tipo de edição em meio digital, tomamos os princípios do método filológico, conforme os seguintes procedimentos metodológicos definidos por Santos (2008b, p. 2666-2667):

a) Levantamento de todos os dados e testemunhos conhecidos, tanto na tradição direta (constitui-se de cópias ou edições do texto: manuscritos, datiloscritos, digitoscritos, impressos) como indireta (todo e qualquer documento que possa auxiliar na leitura e interpretação do texto: comentários, citações, traduções etc); b) Expurgo das cópias coincidentes […];

c) Confronto de todos os testemunhos úteis ao estabelecimento do texto crítico, definindo o texto de base ou exemplar de colação, aquele que mais se aproxime do original, isto é, ou o manuscrito (testemunho) autógrafo ou a edição impressa mais recente em vida do autor, salvo os casos que exigem, amparado o editor em critérios seguros, outro texto de base, conforme a história particular de cada conjunto de textos;

d) Classificação e organização dos testemunhos considerados no processo de estabelecimento do texto crítico, […] a partir do exame das variantes (lições divergentes em relação ao texto de base);

51 Nesse caso, optamos por manter “folhas”, pois entendemos que a supressão do “s” trata-se de uma atualização

e) Correção do texto, neste caso, é importante diferenciar erro (contra-senso ou deslize do autor) de variante. A correção poderá realizar-se através do cotejo dos testemunhos reunidos ou por conjecturas; no primeiro caso, considera-se o predomínio numérico das variantes; no segundo, busca-se o fundamento para a ação do filólogo em informações a respeito do texto, do autor e da época em que tal texto fora escrito.

Assim, utilizamo-nos das transcrições realizadas para a edição sinóptica e, a partir daí, fizemos a colação dos testemunhos, por meio do aplicativo Juxta Commons, que gerou as lições diferentes entre testemunhos para a composição do aparato crítico. Na construção da arquitetura digital para a apresentação da edição crítica, foi nosso objetivo dispor de um texto pouco carregado visualmente, mas que desse conta de mostrar todas as modificações textuais realizadas durante seu processo de produção, circulação, transmissão e recepção. Nesse intuito, optamos por dividir a edição crítica em três espaços paralelos, onde encontramos as três propostas que compõem o texto editado (cf. figura 26):

Figura 26 - Edição crítica de O bonequeiro Vitalino...

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

O primeiro é o texto crítico resultado do trabalho interpretativo do editor a partir do conjunto documental. Não possui aparato ou outras marcas e se destina à leitura, bem como à encenação. Esse texto proporciona uma experiência de leitura mais próxima aos impressos, nesse sentido, também reproduzimos esta versão no volume impresso da tese.

O segundo espaço da edição crítica é denominado revisões ao texto. Nele, expomos o texto crítico acompanhado das modificações textuais concernentes às interferências realizadas no sentido de adequá-lo à norma padrão da língua portuguesa. Incluímos, nessa categoria, as revisões da ortografia e da pontuação, correção de erros de datilografia, além das interferências do autor na atualização da grafia do texto. A leitura dessas revisões interessa por permitir observar a maneira como Jurema Penna revisava seus textos, de um testemunho a outro, sua

percepção sobre a norma linguística e a representação de língua popular que evidencia na fala de seus personagens.

A aba construção do texto traz as modificações textuais concernentes aos movimentos de escritura, assim, apresentamos no aparato os acréscimos, supressões, deslocamentos empreendidos pela autora, as inscrições manuscritas realizadas pelos atores e os documentos da recepção do espetáculo. Incorporamos ao aparato crítico as marcas dos diversos sujeitos que participam da cena, registradas em documentos de ordem diversa, como canções, vídeos, fotografias, matérias de jornal e recortes do fac-símile do texto datiloscrito.

Todas as modificações textuais são apresentadas no aparato crítico que aparece dentro do próprio texto crítico, com o uso do recurso tooltip do Dreamweaver CS5. Ao passar o mouse sobre a palavra destacada aparece, abaixo do ponteiro do mouse, a modificação textual realizada de uma versão à outra, conforme ilustrado na figura 27. Encontramos nesse recurso um espaço producente para a disposição do aparato crítico, pois permite evidenciar as modificações textuais dentro do texto e não à sua margem. Entendemos que, assim, é possível trazer as modificações textuais no mesmo nível hierárquico que a lição do texto de base. O recurso possibilita também dispor outros tipos de texto nesse mesmo espaço, tais como imagens e vídeos. O menu localizado no rodapé da página da edição (figura 27, letra a) permite ao leitor passar de um texto ao outro, clicando sobre o número da página desejada. Pretendemos, com isso, facilitar a alternância de entre os textos, de forma simples e acessível, ao mesmo tempo em que buscamos integrar os três textos, como três faces da mesma edição crítica.

Figura 27 - Aparato crítico da aba construção do texto

Fonte: Elaborado pela pesquisadora a

Como ilustrado na figura 27, em que uma intervenção manuscrita altera o texto, optamos por mostrar, no aparato, a transcrição desta, acompanhada pelo recorte do fac-símile correspondente. Na aba Construção do texto, interessa-nos também apresentar o texto do ator que, como anotação da cena, suplementa a leitura do script (Cf. figura 28). Nessa mesma aba, fazemos uso dos documentos da recepção, que cotejados com o texto, proporcionam outras leituras. Ilustramos essa opção crítica uma fotografia do momento em que o cangaceiro Pé-de- Vento aponta seu punhal para Seu José, a foto foi disposta no texto ao lado do trecho “MANÉ– cabra, não fale, não entoe / tu já viu o meu punhal?” (Cf. figura 29).

Figura 28 - O texto do ator como suplemento da leitura

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Figura 29 - Os documentos da recepção como suplemento da leitura

Quanto aos critérios para intervenção no texto da edição crítica, assumimos aqueles já elencados para a edição sinóptica, acrescidos de outros que permitem atualizar o texto:

- Manter a numeração do texto de base, indicando-a no ângulo superior direito;

- Expor o título da peça em negrito, caixa alta e centralizado, incorporando imagens

ilustrativas.

- Caso não haja numeração de página, indicar o número da folha do testemunho entre

colchetes, no ângulo superior direito;

- Manter a divisão do texto crítico em folhas, de acordo com a divisão do texto de base; - Manter as notas explicativas, presentes no texto, que digam respeito à sua construção e

à sua circulação;

- Atualizar o texto conforme a ortografia vigente;

- Normalizar o uso dos vocábulos em iorubá, conforme Castro (2001);

- Utilizar operadores para registro no aparato crítico das intervenções dos atores no texto; - Disponibilizar o texto crítico no volume impresso dessa edição;

- Apresentar as informações da rubrica entre parênteses e em itálico.

- Indicar com [...] as falas que foram bipartidas ou repartidas de uma versão do texto a

outra.

O uso dos recursos informáticos descritos, aliados à perspectiva crítica do editor, permite a realização de inovações na forma da apresentação das edições. Acreditamos, nesse sentido, que propusemos critérios coerentes para a edição dos textos de Jurema Penna, privilegiando a diversidade de documentos, temáticas e textos, disponibilizando-os de forma acessível, integrada e dinâmica para os leitores. Passamos, na próxima seção, a discutir as questões atinentes à situação textual das peças Iemanjá – rainha de Aiocá e O bonequeiro Vitalino ou Nada é impossível aos olhos de Deus e das crianças.

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