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1.7 LINGUAGEM, CULTURA E IDENTIDADE NO IMAGINÁRIO POPULAR

1.7.2 Cultura e sociedade

A palavra cultura, como coloca Eagleton (2011, p. 9), é uma das palavras de maior complexidade na língua (no caso dele, o inglês, mas não é nada diferente em nossa língua portuguesa). No Brasil, por exemplo, o Ministério da Cultura (no tempo do Regime Militar aglutinado à educação, logo após, retirado da pasta da Educação na retomada democrática,

aglutinado novamente no Governo Temer e, após polêmicas ocorridas sobre supostas semelhanças entre este governo e o regime militar, foi separado novamente) atende uma pasta direcionada às artes de uma forma geral: cinema, teatro, museu, cultura afro, além de outros focos em pesquisa e leis de incentivo à produção cultural. Porém, a cultura não é apenas imbricada aos processos artísticos, como comumente se relaciona.

A base morfológica latina da palavra cultura vem da palavra colere, significando desde cultivar e habitar até adorar e proteger (EAGLETON, 2011). As palavras em língua portuguesa advindas de colere são diversas: colher, cultivo, culto, colônia. Estas palavras estão, obviamente, ligadas ao pressuposto do complexo campo semântico de cultura. Observa- se, então, a pluralidade que a cultura absorve nas diversas paisagens de sociedade: desde o seu surgimento, do campo, até questões coloniais e de nacionalismo, que descreveremos posteriormente.

Cabe então, esclarecer o paradoxo existente na própria palavra cultura. Se a palavra cultura tem sua origem no campo, por que, de certa forma, apenas as pessoas civilizadas (referente à urbanização, civilização, elitização, e não de forma pejorativa) são consideradas pessoas com cultura? É natural, conforme o explicitado, que a utilização da palavra cultura seja ligada às práticas de elitização. Este conceito revela não apenas a complexidade histórica da convenção social de cultura, mas também de seu uso como ferramenta de poder.

É necessário, a partir daí, conhecer os processos históricos do conceito de cultura e suas possíveis associações à relação paradoxal. De acordo com Bauman (2013, p. 7, grifo do autor), nos dias atuais, através de uma pesquisa liderada por Goldthorpe, concluiu-se que

[...] na hierarquia da cultura, não se pode mais estabelecer prontamente a distinção entre a elite cultural e aqueles que estão abaixo dela a partir dos antigos signos: frequência regular a óperas e concertos; entusiasmo, em qualquer momento dDGRSRUDTXLORTXHpYLVWRFRPRµJUDQGHDUWH¶KiELWR GHWRUFHURQDUL]SDUDµWXGRTXHpFRPXPFRPRXPDFDQomRSRSXODURXXP SURJUDPDGH79YROWDGRSDUDRJUDQGHS~EOLFR¶

Observando esta premissa, o autor insere, dessa forma, que nos dias atuais, as pessoas, em um mundo globalizado, passam a não ter apenas conceituações culturais acerca de gostos elitizados e gostos vulgares, separadamente, mas de serem onívoros ± tendo contato e possivelmente adquirindo gosto das duas formas de gosto cultural. Pode-se, portanto, em um contexto brasileiro, por exemplo, gostar de Chico Buarque e, ao mesmo tempo, MC de funk e rappers ± considerados marginais e vulgares. Neste contexto, Bauman (2013, p. 9) insere

também outro complexo ± o do onívoro contra o unívoro, ou seja, da mistura de materiais culturais para a seletividade constante dentre uma universalidade de formações culturais.

A ideia de cultura hoje, porém, não se aproxima ao meio em que, décadas atrás, colocava questão cultural como endereçada, ou seja, todas as formações culturais seriam direcionadas a uma determinada classe social, criando, dessa forma, três efeitos: a definição de classes, a separação de classes e o pertencimento a uma classe (BOURDIEU, 2007). Definição de classes por existir tal direcionamento a classes elitizadas, de classe média e classe baixa; separação de classes pelo mesmo processo e pertencimento pela identificação (forçada?) de formações culturais, em que os três estabelecem uma relação dinâmica. As obras artísticas, portanto, estariam direcionadas à regulamentação das fronteiras para os três efeitos de construção de perspectivas de classe, formando uma das bases de divisão de classes. Bauman (2013, p. 12) afirma que esta concepção de cultura revolucionou os padrões estabelecidos até então sobre cultura, principalmente sobre o ideal iluminista de cultura.

O projeto iluminista de cultura, segundo Bauman (2011, p.13), configurou um ideal de projeto de civilização, indo de encontro ao que foi falado anteriormente: o paradoxo entre civilL]DomRHOLWHFRPR³DOWDFXOWXUD´HDVSHVVRDVGRFDPSR³GHWHQWRUDV´GRWHUPRFXOWXUDj baixa cultura. Tais processos históricos advêm de uma sequência de fatos ocorridos durante séculos, estabelecendo práticas de poder e domínio do colonizador sobre o colonizado. Segundo Bauman (2013, p. 14), o crescimento das populações mais baixas acarretou, de início, um índice de confiança ao estado-nação recém-surgido, uma vez que geraria mão-de- obra e trabalhadores e, consequentemente, uma maior soberania e poder aos chefes e classes elitizadas. Porém, com o processo de exclusão causado pela desorganização e desigualdade VRFLDOKRXYHXPDHVSpFLHGH³LQFKDPHQWR´SRSXODFLRQDOGR(VWDGR-nação, processo este que ocasionou o ideal de busca a novos territórios, ou o processo de colonização, que se perpetuou nos novos territórios, de forma implicitamente imposta, assim como posto por Foucault (1979, p. 105) sobre as relações de poder ± este, para ser efetivado, se mune de fatores e efeitos sutis, sendo, por isto, mais perpetuado e mais eficaz.

Na perspectiva atual de cultura, muito se observa a respeito de seu plano político e de poder atravessadas pelas perspectivas de classes sociais. De acordo com Eagleton (2011, p.  ³VHUFLYLOL]DGRRXFXOWRpVHUDEHQoRDGRFRPVentimentos refinados, paixões temperadas, maneiras agradáveis e uma mentalidade aberta. É portar-se razoável e moderadamente, [...] H[HUFLWDQGR D DXWRGLVFLSOLQD H VDFULILFDU RV SUySULRV LQWHUHVVHV SHOR EHP GR RXWUR´ (VWD perspectiva, segundo o próprio autor, embora pareça de boa direção, está diretamente ligada à TXHVWmR GH FODVVHV DR SDUHFHU EDODQFHDGD j FODVVHV HOLWLVWDV RX XP ³LQGLYtGXR OLEHUDO GH

WHQGrQFLDVFRQVHUYDGRUDV(DJOHWRQ S DLQGDFLWDTXH³DFXOWXUD>@QmRpSDUFLDOD nenhum interesse social específico, mas precisamente por causa disso é uma capacidade DWLYDGRUDJHUDO´FRORFDQGRGHVVDIRUPDDFXOWXUDFRPRXPDIHUUDPHQWDGHLQWHUHVVHTXHVH denuncia a partir da própria utilização como instrumento de separação, definição e pertencimento de classes, como apresentado anteriormente através da teoria de Bourdieu (2007). A palavra cultura e seu campo semântico, desse modo, é um campo de discussão histórica, política e social, repleta de conflitos.

Voltamos, então, à perspectiva de colonizador e colonizado; se a cultura é também instrumento político utilizado como ponto de conflito de classes, o poder da ideologia de colonizador sobre a ideologia do colonizado apresenta-se como um forte caráter da cultura. Para Eagleton (2011, p. 42 ³GHYHPRVQRVVDQRomRPRGHUQDGHFXOWXUDHPJUDQGHSDUWHDR nacionalismo e ao colonialismo, juntamente com o desenvolvimento de uma Antropologia a VHUYLoRGRSRGHULPSHULDOLVWD´2SRGHUGDLGHRORJLDGRPLQDQWHVREUHDLGHRORJLDGRPLQDGDp um dos grandes aportes teóricos da filosofia Marxista, incorporando a proposição de que tudo na história nasce a partir da luta de classes. A ideologia dominante, no caso, a do colonizador, e a ideologia dominada, no caso, a do colonizado, reflete a prática político-ideológica da cultura. Nos países em desenvolvimento e subdesenvolvidos, vemos constantes influências estabelecidas através do domínio e do poder. Na época em que a França era considerada o centro do mundo, muito do que se adquiriu através da perspectiva cultural se rendeu às perspectivas de país dominante imposto pelo país europeu. No Brasil, por exemplo, a França se destacou através da influência na moda, culinária, perfumaria, literatura, etc.; que ainda se encontra presente através de vocábulos (gripe, carnê, garçom, bijuteria, por exemplo). Ainda neste exemplo, é extremamente comum uma valorização de uma viagem a Paris, a compra de um perfume francês ou os estereótipos na culinária e de seus profissionais, como um chefe de cozinha. É uma marca efetivada pela história, pela linguagem e pela cultura.

Nos dias atuais, ainda é evidentemente contínua e efetiva a influência do colonizador sobre o colonizado, exercida principalmente pelo país de maior dominação do mundo: os Estados Unidos. Embora não haja neve no Brasil em tempos de natal, é muito frequente DYLVWDUPRVUHSUHVHQWDo}HVGH³QHYH´HPVKRSSLQJVHH[SRVLo}HVQDWDOLQDVHPERUDQmRKDMDR hábito de comemoração do chamado dia das bruxas no território brasileiro, é extremamente comum a criação de eventos com temática americana, incluindo abóboras e música eletrônica, típicas da festa de Halloween. O poder se exerce de cima para baixo, não permitindo ou pouco permitindo a recolocação das práticas de igualdade. Nasce, assim, uma relação que se

estabelece a partir do dominante sobre o dominado, sendo a cultura um dos meios de disseminação aparente de tal efeito. Segundo Bhabha (2013, p. 185, grifo do autor),

[...] os efeitos discriminatórios do discurso do colonialismo cultural, por exemplo, não se referem simplHVRXXQLFDPHQWHDXPDµSHVVRD¶RXDXPD luta de poder dialética entre o eu e o outro, ou a uma discriminação entre a cultura-mãe e as culturas alienígenas. Produzida através da estratégia da recusa, a referência da discriminação é sempre a um processo de cisão como condição da sujeição: uma discriminação entre a cultura-mãe e seus bastardos, o eu e seus duplos, onde o traço do que é recusado não é reprimido, mas sim repetido como algo diferente ± uma mutação, um híbrido.

Certamente, ao submeter-se à sua dominante, a perspectiva colonizada da cultura dominada acaba por sucumbir a sua própria cultura, apresentando uma mistura de referências à cultura dominante, assim como ocorre através de processos sucumbentes.

As relações políticas da cultura estão presentes, conforme o dito, através dos vieses colocados pelo Nacionalismo e pelo Colonialismo. Eagleton (2011) estabelece esta relação através dos termos Cultura e cultura. A cultura com C maiúsculo diz respeito à cultura da ideologia dominante, elitista, a do colonizador. A cultura com c minúsculo diz respeito à cultura da ideologia dominada, a do colonizado. Esta relação não diz respeito a uma relação homogênea, mas heterogênea, tensa, com contradições entre as suas respectivas formações. A cultura vive, dessa forma, como uma forma de sobrevivência incorporada através das falhas da Cultura, a sua dominante. Tais formações entre Cultura e cultura dizem respeito às formas de identidade atravessadas em cada uma destas. Ao se falar sobre as ideologias dominante e dominada, Pêcheux (2014, p. 96) apresenta a causa da falha: a ideologia dominada se constrói, se constitui e apresenta resistência a partir das falhas da ideologia dominante. As formas entre Cultura e cultura são estabelecidas através das falhas, promovendo uma relação WHQVDSROtWLFDHFXOWXUDO'HDFRUGRFRP(DJOHWRQ S ³VHD&XOWXUDpSRUGHPDLV desabrigada e desincorporada, a cultura é muito mais exageradamente ansiosa por uma KDELWDomRORFDO´,VWRVHHVWDEHOHFHSRLVDWUDYpVGDVPDUFDV históricas, dos processos sociais, das formações políticas entre uma das principais marcas da cultura (desta vez a cultura geral): o colonialismo e o nacionalismo.

Outra relação de cultura diz respeito à sua constituição sólida e líquida, como apresentada por Bauman (2013). De acordo com o autor, as relações entre cultura elitista e cultura não elitista eram provenientes das construções históricas, como já discutido neste tópico. No mundo moderno, porém, a cultura existe em outras condições. Se antes a cultura

aparecia com moldes e recortes sólidos, construídos através dos tempos e lentamente diluídos, QD PRGHUQLGDGH SDUD %DXPDQ  S   ³D FXOWXUD FRQVLVWH HP RIHUWDV H QmR HP SURLELo}HV HP SURSRVLo}HV H QmR HP QRUPDV´ (OH DSUHVHQWD SRUWDQWR o conceito de modernidade líquida para representar os processos decorrentes do atual: é líquido porque não há uma moldagem, uma construção, tudo é instantâneo, efêmero e passageiro.

6HJXQGR %DXPDQ  S   ³HP WHPSRV OtTXLGR-modernos [...] a cultura é modelada para se ajustar à liberdade individual de escolha e à responsabilidade, igualmente LQGLYLGXDOSRUHVVDHVFROKD´2SHUWHQFLPHQWRDXPDHOLWHFXOWXUDORXDXPDHOLWHGHQRPLQDGD vulgar é muito mais uma questão de escolha e de política, uma vez que os signos estão DWUDYHVVDGRVHSHUWHQFLGRVjVRFLHGDGHHPJHUDO2DXWRUDILUPDDLQGDTXH³DPRGHUQLGDGH líquida é a arena de uma batalha constante e mortal travada contra todo tipo de paradigma ± e, na verdade, contra todos os dispositivos homeostáticos que servem ao conformismo e à rotina, RXVHMDTXHLPS}HPDPRQRWRQLDHPDQWrPDSUHYLVLELOLGDGH´'HVVDIRUPDDGLVSXWDHQWUH as questões e brigas envolvendo o pertencimento à arte são cada vez mais escassas, embora haja uma constante relação política tensa entre as formas de cultura.

As formas da cultura apresentadas aqui tomam relevância por estabelecer as diversas formas de conflito existentes entre os sujeitos em interação, entre as formas culturais e identitárias na sociedade. A cultura é, assim, parte importante da constituição do sujeito, das plataformas sociais nas quais ele se inscreve, incluindo, consequentemente, a escola e os sujeitos em aprendizagem, os alunos.

A identidade, como um processo inerente às questões de formação de sujeito pelos indivíduos, é uma importante ferramenta de descoberta social e individual no que tange aos discursos, às ideologias e às formações como sujeito. Discutiremos as questões relacionadas à formação, definição e discussões sobre identidade e sua relação com o Nordeste, à formação do Nordeste e a Identidade da Cultura e do Sujeito Nordestino.

Os conceitos ligados à formação da identidade do sujeito são relacionados à sua própria formação como sujeito, suas perspectivas políticas, culturais, sociais e históricas. Os princípios da Identidade estão ligados mais à memória coletiva do sujeito, a partir das relações entre igualdade, divergência, diferença e antagonismo, do que à sua própria personalidade e relações individuais. De acordo com Silva (2015, p. 31, grifo do autor),

(P XPD SULPHLUD DSUR[LPDomR SDUHFH VHU IiFLO GHILQLU µLGHQWLGDGH¶ $ LGHQWLGDGHpVLPSOHVPHQWHDTXLORTXHVHpµVRXEUDVLOHLUR¶µVRXQHJUR¶µVRX KHWHURVVH[XDO¶ µVRX MRYHP¶ µVRX KRPHP¶ $ LGHQWLGDGH DVsim concebida SDUHFH VHU XPD SRVLWLYLGDGH µDTXLOR TXH VRX¶  XPD FDUDFWHUtVWLFD

LQGHSHQGHQWHXPµIDWR¶DXW{QRPR1HVVDSHUVSHFWLYDDLGHQWLGDGHVyWHP como referência a si própria: ela é autocontida e auto-suficiente.

É extremamente importante conceber esta teoria inicial apresentada por Silva (2015) sobre a identidade por apontarmos sempre ao caminho individual, homogêneo, quase instantâneo ao nos questionarmos sobre a nossa identidade. Porém, a identidade também se coQVWLWXL DWUDYpV GD FROHWLYLGDGH 6HJXQGR &KDUDXGHDX  S   ³QmR Ki DWR TXH realizemos, nem pensamento que exprimamos que não contenha o traço de nosso SHUWHQFLPHQWR j FROHWLYLGDGH´ RX VHMD D LGHQWLGDGH DSHVDU GH WDPEpP VHU XP IDWR introspectivo é, sobretudo, um fenômeno coletivo.

Silva (2015) explica o conceito da constituição da identidade através da diferença. É através da diferença que nos constituímos; este é, talvez, um dos principais problemas na constituição, uma vez que normalmente enxergamos no outro a relação de falta, de falha, mas não de diferença. A diferença, portanto, constitui o que somos e, consequentemente, a nossa identidade. Martino (2010, p. 36) fala sobre a relação existente entre o eu e o outro, constituindo, assim, a difeUHQoD 6HJXQGR R DXWRU ³Vy p SRVVtYHO HVWDEHOHFHU UHODo}HV GH LGHQWLGDGH D SDUWLU GH XP MRJR IRUPDO HQWUH R LJXDO H R GLIHUHQWH´ +i GHVVD IRUPD XPD constante aproximação entre os sujeitos e suas identidades, estabelecendo uma relação que ressalte os fatores de identidade presentes nos sujeitos, sendo estes os vestígios culturais, políticos e sociais que constituem os sujeitos.

Seres humanos/sujeitos são entidades complexas, múltiplas, e as definições apresentadas em uma identidade única, individual, seria essencialmente insuficiente. É através da contradição que nos constituímos, significamos e somos significados. As moldagens, através dos tempos, são também parte da formação de uma identidade. Segundo Martino  S   ³D LGHQWLGDGH VH FRQILJXUD Fomo uma estrutura dinâmica, relacionando-se dialeticamente com o cotidiano no sentido paradoxal de se mantê-ODHPSOHQDWUDQVIRUPDomR´ Uma pessoa, através dos anos, pode modificar alguns conceitos, mas ainda manter alguns. A identidade é moldada conforme o tempo, através das relações de diferença estabelecidas entre os sujeitos, regrando multiplicidade e hibridismo. É necessário, dessa forma, observar toda esta conjuntura e reconsiderar e discutir as formas híbridas da identidade. De acordo com Rodrigues (2011, p. 75),

[...] é preciso ter em mente que o conhecimento é algo em constante transformação e que ele habilita os agentes para leituras variadas, coerentes ou não com um dado momento, um dado espaço e por agentes interlocutores variados. Neste processo de interação entre tempo, espaço e sujeitos,

identidades são formadas e, cada vez mais, elas são complexas, híbridas, sincréticas.

A partir destas relações híbridas, a identidade se manifesta, estabelecendo formações responsáveis pela multiplicidade do ser humano em atividade com a linguagem, com a cultura, e consequentemente com a sua identidade. É neste jogo de relações que a identidade se transforma, se reforma e se firma.

As relações estabelecidas entre a formação de um sujeito, como ditas anteriormente, dizem respeito às relações de diferença e de oposição ± dos processos de identificação, GLYHUJrQFLD H DQWDJRQLVPR 0DUWLQR  S   DILUPD TXH ³DV GLYHUVDV KLVWyULDV TXH delimitam o campo identitário frequentemente se contradizem, se alteram mutuamente, se interpelam e dialogam em uma complexa rede de discursos vinculados ao poder dos locais RQGHHVVDVQDUUDWLYDVIRUDPFULDGDV´'HVVDIRUPDSHUFHEHPRVTXHDLGHQWLGDGHpDOJRFULDGR a partir de relações entre seres humanos/indivíduos/sujeitos em uma sociedade ou em um grupo social, acusando a perspectiva de pertencimento, e, posteriormente, à criação de signos que acusam tal pertencimento. É, portanto, uma marca de grupo, ideológica, cultural e social que constitui a personalidade de um sujeito.

Tais formações de grupo delimitam a noção de pertencimento a um grupo social, marcados pela identidade. Segundo Charaudeau (2015, p. 15),

[...] mesmo que não queiramos nos ver como indivíduos dependentes do grupo, é pelo olhar dos outros que somos marcados, etiquetados, categorizados; nossa vestimenta, nossa maquiagem, nosso penteado, nossa linguagem, nosso andar, [...], tudo isso atesta nosso pertencimento a uma categoria de indivíduos, o que nos permite aos outros classificar-nos nesta ou naquela categoria.

Esta teoria gera, consequentemente, a noção de coletividade, de memória na construção não apenas da fala do sujeito, mas na sua construção de identidade através da identidade de seu grupo. Um sujeito, naturalmente, faz parte das diversas formações culturais através de seu pertencimento à coletividade. A sua identidade é também, portanto, ligada aos seus grupos, que, juntamente com as características e os fatores sociais, constituem uma espécie de signo, de representação, de pertencimento.

Os grupos sociais se constituem a partir de uma relação em comum entre os membros. É comum, por exemplo, haver o surgimento de grupos sociais que mantém uma relação de afinidade entre os membros, tendo como base um elemento em comum. Os movimentos sociais, por exemplo, estabelecem, de acordo com Gohn (2017, p. 23), relações de semelhança

entre os membros, criando, pois, afinidades em relação à sua luta, à sua causa e às suas formações ideológicas.

A Região Nordeste, através da cultura e das relações entre Cultura e cultura (EAGLETON, 2011), estabelece um ponto em comum na construção das identidades culturais dos sujeitos: é através da relação de união cultural, portanto, que nascem as construções identitárias da região Nordeste.

A identidade, como vista anteriormente, possui como características centrais a relação estabelecida entre a diferença, promovida através da relação eu e outro, e as suas manifestações vestigiais na identidade coletiva e nas marcas individuais dos sujeitos. Tais marcas individuais entram em confronto com as marcas individuais de outras pessoas, ocasionando a tensão e a contradição entre os sujeitos, separando-os e unindo-os em grupos sociais, em que os membros possuem relações de afinidade, de construção de sentidos e relações de proximidade ideológica, estabelecida pelas lutas em comum, como afirma Gohn (2017, p. 25), possibilitando a construção de laços maiores à medida que tais elos são constituídos pelos fatores históricos, sociais, políticos e culturais.

Grupos sociais nascem, de acordo com %HWWRQQLH$QGUDGH S ³DSDUWLUGH uma relação espontânea contra a vida serial e se apresenta como uma organização livre de LQGLYtGXRV´$VVLPVHQGRRVPHPEURVVRFLDLVVHXQHPDWUDYpVGRVVLJQRVGHUHSUHVHQWDomR em comum, geralmente surgidos através de formas de opressão ou de marginalização, como os grupos sociais de sujeitos marginais, travestis, homossexuais e demais grupos LGBTQ+, entre outros grupos sociais. Através da opressão, portanto, os grupos sociais se constituem.

É de conhecimento nacional que o Brasil foi colonizado pelos portugueses, chegados em 1.500 na região onde hoje é o estado da Bahia. Todo o desenvolvimento inicial do Brasil, portanto, era no Nordeste, preferido também por haver uma maior proximidade com a Europa e com a África, de onde eram trazidos os africanos no período de escravidão. A monocultura de cana-de-açúcar, portanto, era o polo de desenvolvimento do Brasil, desenvolvida principalmente na Bahia e em Pernambuco. Além de outras monoculturas, o país em