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1. O SISTEMA DE CICLOS DE APRENDIZAGEM

2.2 A AVALIAÇÃO DO ENSINO E DA APRENDIZAGEM

2.2.6 Currículo, planejamento e avaliação

Segundo Zabala, “até hoje, o papel atribuído ao ensino tem priorizado as capacidades cognitivas, mas nem todas, e sim aquelas que se têm considerado mais relevantes e que, como sabemos, correspondem à aprendizagem das disciplinas e matérias tradicionais” (1998, p. 28).

Nesse sentido, a organização do currículo ocorre em função da organização clássica do saber acadêmico, da lógica formal de cada disciplina promovendo uma estruturação segmentada do conteúdo. É a chamada organização disciplinar dos conteúdos, na qual a lógica interna de cada disciplina é o referencial básico para a seleção e articulação dos conteúdos das diferentes unidades de intervenção.

Currículos dessa natureza valorizam os conhecimentos científicos e negam os conhecimentos produzidos em esferas “não científicas”. Tornam-se, dessa forma, isolados da esfera social e cultural na qual a escola está inserida. Os conteúdos são descontextualizados e insignificantes para quem os recebe. Assim, as disciplinas são o fim último da educação e não um meio do educando compreender a realidade para poder nela intervir.

Há uma ênfase em conhecimentos constituídos por fatos e dados, como algo externo e alheio ao sujeito. Ademais, valorizam-se, nos programas, as realizações

concretas, aquilo que é observável e imediatamente quantificável. A programação é realizada em torno de objetivos de conduta (MÉNDEZ, 2000; ESTEBAN, 2002).

É importante ressaltar que estes currículos são comumente elaborados pelos segmentos dominantes através de especialistas, sem qualquer participação dos agentes envolvidos diretamente no processo ensino/aprendizagem, ou seja, professor/aluno. Freitas (2003) considera que a organização do ensino em séries, baseado em uma articulação artificial das disciplinas, faz dos especialistas os seres pensantes, dos professores meros executores e do aluno um ser alienado, individualista e subordinado.

O currículo disciplinar é conseqüência de uma visão positivista dos conhecimentos científicos. Os conteúdos oriundos deste currículo são concebidos como verdades absolutas, do que decorre uma inflexibilidade e rigidez na sua materialização. A organização curricular, quando imersa nessa perspectiva, torna-se estagnada, isolada da esfera social e política, centrada nas capacidades cognitivas e nos conteúdos conceituais, fragmentada e linear.

Entretanto, a partir da epistemologia anti-positivista que apresenta o conhecimento como uma construção histórica, provisória, contingente e não-linear, o currículo adquiriu outro sentido no âmbito educacional. De produto construído por especialistas e aplicado em qualquer contexto indistintamente, passou a ser compreendido com um processo que deve estar relacionado a um determinado projeto político e pedagógico e que, portanto, precisa ser contextualizado, redimensionado e re-significado.

Logo, a organização dos conteúdos não é mais realizada em função da lógica interna das disciplinas, mas sim em função do educando e das suas necessidades de aprendizagem, assim como, das questões que emergem do contexto sócio-educativo. Com isso, as disciplinas deixam de ser o fim último da educação e passam a ser um meio para o aluno poder compreender a realidade e compreender-se numa realidade que se apresenta em sua complexidade e não de forma fragmentada. Nesse sentido, o currículo organiza-se em uma perspectiva integrada. Segundo Silva,

o currículo integrado se alicerça em campos conceituais que flexibilizam suas fronteiras e relativizam suas produções possibilitando intercâmbios epistemológicos entre as inúmeras áreas do conhecimento, facilitando a aproximação com a complexidade e a contingência da realidade. Essa postura permite a produção de novos saberes que se caracterizam por fomentar interpretações mais globalizadas dos cenários em que estamos inseridos e desenvolver uma ação educativa multifacetada, contaminada pela diversidade epistemológica e pela intensidade social (2004, p. 42).

A realidade constitui o ponto de partida, para que os aprendizes possam realizar mais facilmente as relações entre os conhecimentos que já possuem e o conteúdo da aprendizagem. Porém, partir da realidade não significa permanecer nela, é preciso garantir que os educandos tenham acesso aos bens culturais socialmente relevantes para que estes possam ser democratizados e cumprirem sua função de instrumentos de análise, compreensão e participação social.

A perspectiva dialética do conhecimento promove uma “desdogmatização” dos conteúdos científicos, do modo que, tanto a organização, como a materialização curricular ocorre em diálogo com os demais saberes presentes no cotidiano escolar e em relação às condições objetivas do contexto social, político, econômico e cultural no qual se inscreve. Nesse sentido, contextualizar o currículo e flexibilizá-lo consiste em diversificar suas formas de materialização e problematizar seus conteúdos a partir de necessidades sentidas pelos educandos, tornando-os, assim, significativos para quem aprende. É nesse processo que a avaliação formativa ganha sentido e significado.

No concernente ao planejamento, Luckesi considera que “agir de modo planejado significa estabelecer fins e construí-los por meio de uma ação intencional” (1998, p. 102). Logo, a intencionalidade do ato educativo, os fins pretendidos é que definem os meios para alcançá-los.

Quando alicerçado no paradigma positivista, o planejamento centra-se nos meios e não nos fins, posto que, é compreendido como uma atividade técnica e neutra que visa apenas cumprir finalidades administrativas. Luckesi enfatiza que “normalmente o planejamento escolar têm sido um modo de operacionalizar o uso de recursos – materiais, financeiros, humanos, didáticos – através de preenchimento de formulários” (1998, p. 111), tornando-se, assim, uma atividade meramente burocrática de preenchimento de formulários. Estes, por suas vezes, são preenchidos muito mais em função dos índices dos livros didáticos do que pelo próprio currículo.

Ao planejar, o professor considera a lógica disciplinar em detrimento das necessidades reais dos alunos. Sua realidade, seus conhecimentos de vida, suas experiências são desconsideradas em um planejamento pautado nesta lógica. Quando realizado desta forma, o ato de planejar volta-se mais às necessidades administrativas do que mesmo às educacionais.

Nessa perspectiva, há uma desconexão entre planejamento, intervenção pedagógica e avaliação, visto que estas são compreendidas como atividades estanques e inflexíveis. O planejamento, que é feito em função das disciplinas, muitas vezes não contempla a complexidade e a imprevisibilidade da sala de aula. Assim, a intervenção é realizada mais pela improvisação do professor do que mesmo pelo que foi previamente planejado. Por sua vez, a avaliação funciona apenas como um apêndice do ato educativo, um momento final de verificação daquilo que já ocorreu e que, por tanto, não pode ser transformado.

Por outro lado, quando o planejamento insere-se em uma perspectiva dialética do conhecimento e de uma escola que pretende contribuir para a emancipação do sujeito e para a transformação social, este passa a ser concebido como uma atividade, essencialmente, político-pedagógica que direciona a ação docente tendo em vista os fins pretendidos. Nesse contexto, os meios ocupam um papel secundário no planejamento servindo como subsídio para que sejam alcançados os objetivos educacionais.

Importa ressaltar que o ato de planejar passa a ser compreendido como uma ação coletiva que tem como referência o projeto político-pedagógico da instituição, visto que, é neste que se inscreve a intencionalidade da ação educativa, com a qual o planejamento deve estar articulado.

O planejamento é a sistematização das intenções e das intervenções docentes, porém, precisa ser compreendido como um processo dinâmico, flexível, que pode e deve ser redimensionado e redirecionado em função das necessidades sócio-cognitivas dos aprendentes e das contingências do contexto sócio-educativo.

Nessa lógica, a avaliação transversa todo o ato de planejar, informando sobre os progressos dos alunos, assim como, sobre suas dificuldades, subsidiando decisões de modificação, tanto no planejamento, como na sua execução. Silva destaca que:

a avaliação formativa-reguladora é um processo sistemático e intencional de acompanhamento da relação entre o planejamento, o ensino e a aprendizagem, para compreender as necessidades dos aprendentes com a preocupação de dar ao professor as informações para criar e recriar situações didáticas provocadora de aprendizagens (2004, p. 60)

Dessa forma, o planejamento, a intervenção pedagógica e a avaliação são processos interdependentes e indissociáveis que constituem a prática educativa.

Uma vez identificados os pressupostos teóricos que fundamentam a avaliação da aprendizagem, seja em uma perspectiva classificatória e seletiva, seja em uma perspectiva formativa, serão desvelados a seguir os aspectos práticos deste processo, são eles: seus sujeitos; objeto; objetivos; funções; e procedimentos. Para tanto, ambas as perspectivas serão abordadas separadamente, a fim de possibilitar uma melhor compreensão acerca das relações entre seus elementos constitutivos. Todavia, compreende-se que tais elementos não se apresentam de forma linear na realidade educacional, dada a complexidade e a dinamicidade do processo educativo e dos seus atores.