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Da apatia racional ao ativismo

2 AS VÁRIAS REALIDADES DE MINORIAS

2.3 OS NOVOS ACIONISTAS MINORITÁRIOS

2.3.1 Da apatia racional ao ativismo

Historicamente, a doutrina nunca se preocupou em analisar o comportamento do acionista minoritário no seio da sociedade, uma vez que, em princípio, cabe ao acionista majoritário implementar a política societária.78 O majoritário é quem, em tese, tem o poder interferir na esfera jurídica alheia e abusar de sua posição.

76 A classificação é de OLIVEIRA, Ana Perestrelo de. Manual de governo das sociedades. Coimbra:

Almedina, 2017. (Manuais Universitários). p. 50.

77 OLIVEIRA, Ana Perestrelo de. Manual de governo das sociedades. Coimbra: Almedina, 2017.

(Manuais Universitários). p. 50.

78 Segundo Bernard S. Black “shareholders don’t care about voting” De acordo com ele, os acionistas institucionais são prejudicados por uma complexa teia de regras legais, que torna difícil, caro e legalmente arriscado possuir grandes participações percentuais ou realizar esforços conjuntos. Ver

Sob esta perspectiva, não haveria razão para se preocupar com a propensão opressiva de pessoas que não dispõem de poder para implementar qualquer política perante a sociedade.79 O minoritário seria, portanto, mero investidor alheio à gestão da sociedade. Destaca-se que a regra no Direito norte-americano de que o acionista minoritário pode votar como quiser (vote as you please) foi estabelecida pelas Cortes no contexto em que seu voto não era decisivo.80

Outra razão para que não tenha sido dada atenção ao minoritário decorre da crença de que um comportamento mais ativo por parte dessa espécie de sócio tende a beneficiar todos os sócios. Eles teriam como interesse tornar a sociedade a mais lucrativa possível, com a intenção de maximizar o valor de suas ações.81

Essa passividade do minoritário na sociedade fundamenta-se numa análise de ponderação de custo-benefício em relação à sua intervenção na sociedade, concluindo-se pela ausência de vantagens substanciais, especialmente quando se está diante de um pequeno investidor82.

Os custos envolvidos no exercício do direito de voto e a reduzida participação no capital, que impede uma influência direta sobre o resultado da deliberação, desestimulam a participação desta categoria de sócio, comportamento este que se traduz por uma “apatia racional”.83

Assim, o sócio minoritário sempre foi percebido não apenas como passivo, mas também como um grupo de acionistas que apresentam interesses homogêneos.84

BLACK, Bernard S. Shareholder Passivity Reexamined. Michigan Law Review, v. 89, p. 520-608, 1990. p. 523.

79 “There is no need for concern about the oppressive propensities of persons who lack the power of implementation.” (HETHERINGTON, J.A.C. The Minority’s Duty of Loyalty in Close Corporations.

Duke Law Journal, p. 921-946, 1972. p. 933.).

80 HETHERINGTON, J.A.C. The Minority’s Duty of Loyalty in Close Corporations. Duke Law Journal, p. 921-946, 1972. p. 934.

81 ANABTAWI, Iman; STOUT, Lynn A. Fiduciary Duties for Activist Shareholders. Stanford Law Review, UCLA School of Law, v. 60, Law-Econ Research Paper No. 08-02; 2008. p. 18. Ver também: HETHERINGTON, J.A.C. The Minority’s Duty of Loyalty in Close Corporations. Duke Law Journal, p. 921-946, 1972. p. 934.. Segundo o autor, a presunção era de que o minoritário sempre vota interessado em promover o interesse da sociedade e o valor do investimento representado pela ação.

82 OLIVEIRA, Ana Perestrelo de. Manual de governo das sociedades. Coimbra: Almedina, 2017.

(Manuais Universitários). p. 63.

83 “From an economic perspective, the cost of trying to influence corporate policy has typically outweighed the individual value of any single shareholder’s interest, leaving dispersed shareholders in public companies “rationally apathetic”.” (ANABTAWI, Iman; STOUT, Lynn A. Fiduciary Duties for Activist Shareholders. Stanford Law Review, UCLA School of Law, v. 60, 2008. p. 5.).

84 ANABTAWI, Iman; STOUT, Lynn A. Fiduciary Duties for Activist Shareholders. Stanford Law Review, UCLA School of Law, v. 60, 2008. p. 21.

Contudo, mudanças no mercado, nas práticas de negócios institucionais, leis corporativas e de seguridade alteraram essa presunção de que o investidor é passivo e não dispõe de poder para influenciar a sociedade.85 Com efeito, a situação mudou drasticamente com o surgimento do investidor institucional, especialmente fundos de pensão e fundos mútuos de investimento. Esses investidores, embora minoritários, podem exercer uma posição de destaque nas sociedades que o investidor individual jamais poderia exercer.

Os fundos hedges, por exemplo, são pools de investimentos pouco regulamentados que atendem investidores abastados, e por isso estão isentos da maioria dos requisitos de divulgação e outros ônus legais arcados por fundos mútuos de investimento do público em geral. Esses novos minoritários podem apresentar uma postura agressiva na sociedade.

O alvo do ativismo ofensivo ou agressivo entende que, se a sociedade seguir sua orientação, os lucros serão maximizados, a performance da sociedade será melhorada, o valor da ação será incrementado etc.86 Esse ativismo é distinto do chamado ativismo defensivo (defensive shareholder activism), que se refere aos investidores institucionais que detêm blocos de ação, mas que só defendem mudanças quando o desempenho da sociedade está em declínio.87

Os fundos de hedge ativistas88 ocupam grandes posições em apenas duas ou três sociedades e exigem o pagamento de dividendos especiais, lançam programas maciços de recompra de ações, vendem ativos, ou até mesmo bloqueiam a operação de venda para adicionar “sharehold value”89.

O ativismo orientado para o desempenho, geralmente instigado por fundos de hedge, concentra-se em defender mudanças significativas na estratégia corporativa para aumentar o preço de mercado das ações de uma empresa. O ativismo de governança corporativa, por outro lado, concentra-se nas mudanças nos arranjos de

85 ANABTAWI, Iman; STOUT, Lynn A. Fiduciary Duties for Activist Shareholders. Stanford Law Review, UCLA School of Law, v. 60, 2008. p. 26.

86 ROSE, Paul; SHARFMAN, Bernard S. Shareholder Activism as a Corrective Mechanism in Corporate Governance. Brigham Young University Law Review, v. 2014, n. 5, 2014. p. 2014.

87 ROSE, Paul; SHARFMAN, Bernard S. Shareholder Activism as a Corrective Mechanism in Corporate Governance. Brigham Young University Law Review, v. 2014, n. 5, 2014. p. 1034.

88 “Shareholder activists as investors, who dissatisfied with some aspect of the company’s management or operations, try to bring about change within the company without a change in control.” (GILLAN, Stewart L.; STARKS, Laura T. The Evolution of Shareholder Activism in the United States, 28 Jan. 2007.).

89 ANABTAWI, Iman; STOUT, Lynn A. Fiduciary Duties for Activist Shareholders. Stanford Law Review, UCLA School of Law, v. 60, 2008. p. 31.

governança de uma empresa pública, na remuneração dos executivos e na política social.90

Assim, essa nova classe de investidores institucionais pode se revelar

“agressivo, abastado e disposto a desempenham um papel da política empresarial”.91 A partir desta realidade, o sócio minoritário pode exercer tanto o papel de vítima como o de vilão.92 Esses acionistas investidores são muito mais propensos a desempenhar um papel ativo na sociedade do que o investidor individual disperso.