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O homem tem a mão livre para empunhar a espada, a mulher vê-se obrigada a usar a sua para impedir os cetins de lhe descaírem dos ombros. O homem olha de frente para o mundo [...] A mulher deita-lhe um olhar enviesado. Se usassem os dois as mesmas roupas, é possível que a sua visão do mundo fosse a mesma. (WOOLF, 2007, p. 133)

Como não usavam as mesmas roupas, não tinham os mesmos direitos, e na parte dos deveres eram também muitas distinções, homens e mulheres estavam em uma sociedade que fazia do gênero um organizador da estrutura social. A metáfora que atravessa a vestimenta é emblemática para situar os sujeitos no tempo e espaço em que viviam. O homem empunha a espada e a mulher ajeita-lhe a camisa. A pele de cada um também é a primeira vestimenta e o primeiro modo de distinguir os sujeitos. A sociedade estava assentada numa lógica heterossexual, branca e desigual. As demais peles, gostos, afetos, hábitos e sexualidades viviam à margem.

Virgínia Woolf (2007, p. 133) entendia e tinha sensibilidade para perceber os meandros de uma organização social desigual que privilegiava o patriarcado. Por isso, a metáfora da espada, dos cortes de cetim, da costura e de olhares que veem o mundo, mas desfrutam-no diferentemente e desigualmente, cabe como uma luva para falar da pedagogia social que estava envolta na imprensa destinada às mulheres.

Longe das dicotomias, mas compreendendo as interfaces que compõem esse jogo, quer-se inventariar as especificidades da imprensa católica voltada para as mulheres. O objeto principal desse item será o Jornal Novidades e sua coluna feminina. A emergência de um novo olhar para o passado proporcionou eleger um objeto, que nunca antes fora estudado, como um dos coadjuvantes do regime. As matérias deixadas pelo passado permitem adentrar em um campo que é muito parecido com o que Durval Muniz escreveu acerca dos seus objetos de estudo e da obra de Michel Foucault.

Durval Muniz Albuquerque Júnior (2007, p. 151) credita a Michel Foucault um legado que modifica a visão acerca do passado, que historiciza a matéria humana, que humaniza a ciência, confrontando as muitas percepções de um mesmo objeto. Por isso, ele diz ter aprendido a elaborar a sua história e a pensar seus objetos e também, referindo-se a Foucault, enfatiza:

Com ele aprendi a olhar para o desenho de bordas, de limites, de fronteiras, que marca e demarca cada corpo, cada pensamento, cada prática, cada discurso. Com ele aprendi que o passado se configura, adquire forma, é desenhado na incessante batalha que os homens travam no presente, buscando dar a ele uma consistência, uma estabilidade, uma memória que sirvam de suporte para projetos, estratégias, astúcias, que apontam para a construção de verdades possíveis sobre o ser do homem no tempo. (ALBUQUERQUE JUNIOR, 2007, p. 151)

Com esse enunciado – e, porque não, aprendizado – que Albuquerque Júnior tão bem sintetiza, acerca do modo como se instrumentaliza teoria e método em Foucault, pode-se olhar esse passado, esse tempo, com duas premissas: as mulheres foram pensadas e descritas pelo patriarcado, que compreendia todos os estudiosos, todos os discursos e todos que escreveram sobre as mulheres. As mulheres que escreveram estavam em um campo iminentemente masculino e isso, na maioria das vezes, determinou a escrita. Poucas tiveram a autonomia que Virgínia Wolff tivera. Há um forte elemento que consubstancia o discurso da mulher para a mulher: elas absorvem o discurso masculino e o naturalizam. As mulheres pensam as mulheres através do olhar do outro e na maior parte dos casos em que há escritoras, isso é patente. Por suposto, um olhar colonizado é o outro que escreve sobre elas, as fundam, definem e redefinem. Todavia, quando há mulheres escritoras, elas ainda experimentam e estão impregnadas desse olhar (LOURO, 2000).

“Os contornos dos corpos”, como observa Durval Muniz, estarão marcados por essa premissa principal a de que mulheres que escrevem para mulheres – nesse caso específico, o periodismo católico como base dos discursos – são lidas a partir de uma raiz patriarcal, portanto sua escrita também estará, em maior ou menor grau, condicionada a esses

pensamentos e modelos discursivos cristalizados. Portanto, mesmo as mais vanguardistas e que tinham algumas leituras e conhecimentos sobre movimentos femininos internacionais estavam inseridas em uma cultura extremamente conservadora e que privilegiava o binarismo dos sexos. Todavia, isso não exclui o caráter subversivo que muitas mulheres tiveram a partir de uma interlocução com grupos feministas de outros países, inclusive dos núcleos católicos.

Com a hipótese fundamentada nos grupos femininos que escreviam e pensavam as mulheres, através de uma cultura patriarcal, empreende-se a historicização dessa coluna. Parte-se da pauta voltada para as mulheres e centra-se a análise na disposição dos temas que integraram essa coluna desde 1934 até 1969. Escolheu-se esse recorte temporal, por ser mil novecentos e trinta e quatro o ano em que o Chefe dá permissão às mulheres sob condições, de votar, e mil novecentos e sessenta e nove, por ser o fim do governo de Salazar. Um fim controverso, é imperativo dizer, pelos resquícios de seu projeto voltado para as mulheres e também pela maneira como nunca depuseram-no. Por conta de sua doença, os membros do governo ficaram unidos na farsa da manutenção de um governo fictício para Oliveira Salazar. Como parte da análise, também incursiona-se para pensar nas devotas de António Oliveira Salazar (MOTA-RIBEIRO, 2005), pois parte das mulheres católicas que escreviam tinham uma forte ligação com o líder católico.

O problema que se coloca é perceber a sincronia das questões do Estado Novo com as questões que a Igreja impusera às mulheres. Como parte desse processo de análise, foram analisadas as diagramações, imagens, textos e publicidades que formaram a coluna, durante todo o período, perfazendo um total de aproximadamente mil oitocentos e vinte colunas. A conta não é exata, pois houve alguns períodos em que a coluna ocorria de forma quinzenal, isso já no final dos anos sessenta. As primeiras incursões no Jornal Novidades e na sua coluna feminina favoreceram a hipótese inicial da criação de um sujeito feminino católico, devoto a Deus e à Pátria.

A imprensa em Portugal acompanhava um fenômeno que ocorria simultaneamente em outros lugares, a substituição do jornalismo de opinião pelo jornalismo noticioso. Desse modo, muitas publicações contavam com páginas destinadas a públicos específicos, como eram os casos das colunas destinadas às mulheres (RIBEIRO; COELHO, 2005). A coluna feminina do Jornal Novidades estava sobre essa égide e “grandes órgãos de imprensa criaram espaços dedicados à mulher, a denominada página da mulher”. (GOMES, 2011, p. 5)

Por isso, à medida que o mercado voltado à beleza, ao comércio e às modificações no vestuário avança, as mulheres passaram a ser o alvo ou um deles, mas indiscutivelmente o que terá mais apelos. Isso se observa nos modos, na iniciação à civilidade, na moral sempre

presente nos discursos que referenciam o feminino. Outro dado importante é a mudança nas relações de consumo e a aparição das novas ferramentas domésticas, o uso de utensílios criará uma outra relação da mulher com o espaço privado. Nas revistas femininas não faltavam referências às muitas utilidades domésticas, criadas para a satisfação da mulher.

Ao costurar a relação entre as mulheres e a imprensa, os aspectos das novas tecnologias domésticas e o mercado da moda serão elementos que estarão invariavelmente interligados, não só pelo sistema econômico, mas há aí algumas mudanças na cultura que serão vistas nos comportamentos femininos.

Tânia Vanessa Araújo Gomes (2011, p. 1), ao analisar a Revista Eva como formadora da mulher, assevera:

Os periódicos femininos visavam a autoformação das mulheres, sugerindo modelos comportamentais, instruindo-as para a vida no lar e para a melhor maneira, cada vez mais científica, de educarem os filhos. Paralelamente ensinava-lhes a arte de se embelezarem e permitia-lhes suspirar com as páginas de literatura, muitas vezes de caráter moralista.

O tropo “Página da Mulher” ensejava alguns aspectos da divisão versada no gênero dos indivíduos, conforme o tema que lhes cabia ler. Sublinha-se a exclusão de identidades de gênero, pois múltiplas identidades são marginais em sociedades conservadoras católicas no início do século XX, que pressupõem que há dois mundos: um masculino, outro feminino (GOMES, 2011). O lugar para outra identificação inexiste, pelo menos na imprensa oficial.

Desse modo, num mundo assentado em arquétipos femininos e masculinos, os jornais inserem em suas publicações uma página destinada ao universo feminino (VAQUINHAS, 2011, p. 15-16). Foi assim que o Jornal Diário de Notícias divulga mais uma revista feminina que estreia na imprensa, fazendo alusão à Revista Eva que acabara de nascer. A propaganda e divulgação são emblemáticas e merecem citação. Na revista Eva:

vão encontrar as nossas leitoras os mil segredos desses pequenos nadas que fazem completa e brilhante a educação da companheira do lar. Foi a elas, as mulheres, que o destino confiou a missão de transformar e embelezar a vida; mas, para que esse desejo se torne realizável e prático, será indispensável educar-lhes as tendências naturais e ensinar-lhes como é possível em todos os lares, por mais humildes que sejam, fazer arte e criar beleza. É este o trabalho que a revista pretende realizar ‘tratando proficiente e minuciosamente todos os assuntos que devam interessar ao espírito feminino’. (GOMES, 2011, p. 5)

E os assuntos que “interessam” ao público e ao espírito feminino, segundo a divisão “natural” dos universos femininos e masculinos, não estão distantes daqueles que foram

abordados no capítulo dedicado à educação feminina católica. No entanto, se não se distanciam completamente, também produzem alguns discursos diferentes no que concerne às questões ligadas ao divino e às práticas religiosas. Nas revistas conservadoras, o discurso acerca do feminino e suas intersecções raras vezes estava articulado a Deus, como percebe-se com frequência nas revistas católicas, o que não quer dizer que as raízes da sujeição feminina não estejam justamente no discurso religioso, cuja prerrogativa é que a mulher seja submissa ao homem, e isso é elemento similar em ambas as publicações.

Por certo que a maioria dos periódicos voltados à mulher e a atender as questões de ordem feminina – dentro dos binarismos e com as devidas divisões do gênero, que atinge o status de organizador do social – estava afinada, fossem eles católicos ou não católicos. Foi com esse viés que o Jornal Novidades divulgou a Coluna Feminina que saía semanalmente, sempre às segundas-feiras:

As novidades interessam a mulher

Porque na página feminina, publicada todas as segundas-feiras sob a proficiente direção da senhora Maria de Carvalho, as leitoras encontrarão, ao lado da cuidada parte literária, seções de culinária, modas e bordados. (NOVIDADES, ago. 1939)

A senhora Maria de Carvalho fora proficiente, conforme expressão usada na publicidade do Jornal Novidades, na qual a citação dá a conhecer em temas relacionados às mulheres e os lugares que deveriam ocupar na sociedade (VAQUINHAS; GUIMARÃES, 2011). Seus editoriais prometiam tratar os aspectos mais comezinhos da vida da mulher e dar- lhes resposta. Fora uma das mais antigas editoras da coluna destinada às mulheres e também uma das que mais tempo esteve à frente dessa seção no Jornal Novidades, sendo substituída apenas em situações em que a justificativa passava pela saúde. Sousa (2005, p. 642-643) a descreve:

Maria de Carvalho

v. Maria de Carvalho Ferreira: Escritora, poetisa e jornalista. Nasceu na Chamusca, em 1889, filha de Antonio de Andrade Basto Ferreira, português, e de Ana Marques de Carvalho Ferreira, brasileira. Escreveu em quase todos os jornais e revistas da sua época. Foi conferencista em Portugal e no estrangeiro. Publicou no Almanaque das Senhoras. [...] Em janeiro de 1917, foi publicada uma poesia sua no Jornal A Semeadora, órgão da Associação de Propaganda Feminista. Posteriormente, será considerada pelo Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas como uma “intransigente antifeminista”, devido aos seus artigos e à resposta dada ao inquérito promovido pelo Diário de Lisboa em 1929. Segundo Américo Lopes de Oliveira, “manteve durante meio século uma página feminina no diário católico Novidades e diversas secções destinadas a mulher e à criança, no Diário de Lisboa, A Voz, etc. Também colaborou na Emissora Nacional e nos periódicos ABC, Civilização, O comércio do Porto, Correio da Manhã, Diário de Notícias, Ilustração, Modas e Bordados, Portugal Feminino e Stella. Faleceu em 1973.

Como reconhecida antifeminista, trabalhou alguns aspectos do termo feminismo em seus textos, também publicando textos dos seus convidados com essa perspectiva, colaborando para criar o discurso do feminismo relacionado com a masculinização da mulher. É assim que escreve a carta dirigida às mães:

Às mães

Aparece nebulosa a hora que passa, porque desapareceu o sol a iluminar a vida da mulher. Virão mais trevas ainda para o dia de amanhã? Mães portuguesas, desviai as vossas filhas dessa corrente eléctrica que, electrizando a mulher, fez dela alvo de tantos comentários, tantos risos dos trocistas e suspiros dos sensatos. Se a vós ainda rege aquele puro espírito que deve inspirar o sexo da graça e do encanto, da ternura e do amor, criai e educai as vossas filhinhas nesse ambiente de paz e conformidade com aquilo que são e não aspirando ao que Deus não quis que fossem. Dizei às vossas filhas que não queiram fazer como a borboleta que se deixa queimar pela chama que a seduziu. Sim, dizei-lhe isto, porque se as mulheres que algum dia sonharam com a emancipação feminista pudessem e quisessem contar as suas desilusões; o acréscimo de dores morais e físicas e como a sua pretendida masculinização agravou o domínio do homem sobre elas, oh! se elas quisessem contar tudo isto, que belo ensinamento, que proveitosa lição. (NOVIDADES, 23 abr. 1934)

O termo feminismo (SILVA, 1983) será veemente combatido e atrelado às piores adjetivações para a mulher. Ainda que o feminismo português tenha sido formado nos idos da primeira república, com personalidades notáveis (TAVARES, 2011) na luta pela reivindicação de direitos, com nomes como os de Ana de Castro Osório, Adelaide Cabete, Carolina Beatriz Ângelo, ou mesmo as mais contemporâneas – Maria Lamas e Elina Guimarães –, nem assim adquiriu outros contornos. O principal prestígio do feminismo nos jornais católicos era seu caráter subversivo em relação à ordem e o lugar do sujeito, acabando por desestruturar as mentes femininas. Foi calcada nessa perspectiva que algumas matérias explicavam os efeitos nefastos do feminismo de cariz comunista:

Esta prosápia moderna faz acreditar que as mulheres eram mantidas na ignorância e na incultura, só porque os meios e métodos de ensinar eram diferentes. Toda ciência julgada essencial a vida lhes era transmitida na grande escola de preparação que era o lar e no convívio interfamiliar intensivamente cultivado. As filhas aprendiam vendo, ouvindo, fazendo. Aprendiam a ser mulheres e, sobretudo a ser esposas e mães. E por isso exerciam na família e na sociedade uma influência profunda e salutar que as modernas emancipadas, ou desfeminizadas, estão bem longe de conseguir. (NOVIDADES, 26 jul. 1948)

Desse modo, o feminismo cristão assenta sua teoria no padrão “natural” das coisas. Nos textos publicados era patente a ideia de que o cristianismo trouxera à mulher a dignidade que ela era merecedora, mas nem todas as formas e sistemas de organização social a

brindavam com tamanha legitimidade e reconhecimento, o qual se estruturava ancorado nas diferenças e atribuições de cada um. Por isso, a matéria intitulada “feminismo” assim enfatiza: “Por outras palavras, é aceitável todo o feminismo que eleva e fortifica a mulher; é falso e comunizante todo o feminino que tende a desfeminizá-la ou a revoltá-la contra o seu sexo. E há muitos destes casos por aí, infelizmente” (NOVIDADES, 26 jul. 1948).

Dona Maria de Carvalho foi a diretora da Coluna Feminina do Jornal Novidades durante todo o período do Estado Novo. A coluna que tinha sua supervisão contava com algumas seções fixas e outras que eventualmente integravam-na. Quase sempre os textos levavam sua assinatura, todavia havia uma colaboradora que, vez por outra, assinava algumas seções, era o caso da escritora Bertha Leite. Também pode-se assinalar o convite a personalidades célebres – dentro do paradigma das “mulheres de bem”, da senhora Maria de Carvalho e da redação do matutino – a assinarem textos e exemplo disso são os convites feitos às dirigentes dos organismos católicos femininos ou mesmo às mulheres com forte militância no beatismo.

“Toda alma que se eleva, eleva o mundo” trazia um texto com fundo religioso, priorizando as questões marianas e a caridade. Em datas comemorativas cristãs, como o Natal e a Páscoa, privilegiava histórias que remetessem a esses eventos dentro da Bíblia. A coluna trazia ainda um “editorial”, texto de opinião não muito extenso versando sobre os principais temas referentes às mulheres, segundo a revista, os quais, não raras vezes, estavam circundados pelas polêmicas, pois as questões do trabalho, do divórcio, da educação dos filhos, da educação das raparigas e das normas sociais para as raparigas eram bastante evocadas nesses editoriais. Ele era quase regular, mas é imperativo pontuar que a coluna, durante sua existência, sofreu algumas alterações de diagramações, formas e tamanhos, por isso algumas seções, às vezes, eram suprimidas.

Com algumas mudanças no seu design e no seu nome, a coluna feminina mescla os títulos da página. “Da mulher”, “Página da Mulher”, “A bem da Mulher”, “A Mulher” e “Página Feminina” intercalam-se no período de 1934 a 1969. A coluna feminina também tem uma seção destinada “as gravuras”, que acompanham as receitas para colecionarem-se os bordados, além da seção “coisas úteis”, direcionada a pequenos problemas domésticos do cotidiano cuja resolução era de competência das mulheres. As coisas úteis também poderiam dar receitas para a higiene e dicas de beleza, como é o caso da receita do dia:

Para lavar a cabeça é aconselhada a seguinte mistura: duas porções iguais de rum e água de rosas e uma gema de ovo batida. Passa-se depois a cabeça com água morna em que se deita um pouco de sumo de limão e um golpe de água de colônia. Deve-se

enxaguar bem a cabeça com a toalha turca. (Seção Coisas Úteis, NOVIDADES, jan. 1948)

Observou-se que na década de trinta, a coluna feminina era mais voltada a bordados e receitas, um quadro voltado à religiosidade, e isso irá mudando à medida que o regime avança e se consolida. Com o passar dos anos, há a necessidade de um maior controle, como forma de executar uma severa manutenção de poder. O combate ao divórcio e a maternidade como ideal serão temas que figurarão a partir dos anos quarenta, com maior frequência.

Outras seções formavam a coluna feminina e estavam mais ligadas ao “entretenimento”. As anedotas e os contos da página formavam esse núcleo mais voltado ao passatempo da mulher. Como a pedagogia para o feminino atuava em todas as esferas, os contos e anedotas privilegiavam aspectos que enalteciam o ser mulher, perpetuando finais em que a maternidade, o casamento e a vida no lar fossem referenciados. É o caso dessa anedota:

A mulher do Calino: - A velhota que morava ali defronte, e que morreu na semana passada, deixou uma fortuna de mais de mil contos. Não gostavas de ser viúvo dela? Calino (extremoso pela mulher)

Oh meu amor! Que ideia! Como se eu gostasse de ser viúvo de alguém a não ser tu. (NOVIDADES, jun. 1947)

A perspectiva do final feliz para o casamento, para a maternidade e para as questões ligadas à vida doméstica eram os elementos motrizes dessa seção. A página também tinha um espaço dedicado aos conselhos para as mulheres. “O que digo a Manuela, serve também a ti Manuelita” perfazia a parte de histórias e, com uma certa moral, pretendia dizer às mulheres conselhos sobre a vida em sociedade. Essa seção não era fixa, aparecendo eventualmente no conjunto de fontes analisadas, porém, sempre que aparecia, tinha a narrativa do ensinamento acerca de costumes femininos.

“Coisas portuguesas” e “Mulheres portuguesas” fora uma seção que preencheu alguns números da coluna. O texto que constituía essa seção era voltado para os aspectos ligados aos costumes portugueses, profissões femininas portuguesas e profissões humildes, como chamavam a cozinheira, a bordadora, a costureira.

“La première décennie du XX siècle est riche pour les féministes et pour les femmes catholiques, riche par l’organisation de congrès, par la création de nouveaux groupes et par

la parution de nouvelles publications”117. Anne Cova (2000), ao analisar as mulheres

católicas na França, busca evidenciar o quanto as associações e congregações criadas no seio

117 Em tradução livre: “A primeira metade do Século XX é rica para as feministas e para as católicas, pois