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Nesse ponto do presente trabalho, apresenta-se a instrumentalização de alguns dos princípios, anteriormente estudados, de proteção ao devedor, como o princípio da menor onerosidade e a cláusula geral da dignidade da pessoa humana. É em respeito a esses princípios que o legislador criou as inúmeras regas de proteção patrimonial, optando pela

56 DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; BRAGA, Paulo Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria. Curso de direito processual civil. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2010. v. 5. p. 255.

57 DINAMARCO, 2009, p. 354. 58 DINAMARCO, 2009, p. 351.

proteção da dignidade do devedor e mitigando a efetividade da execução e a satisfação do credor.

Conforme mencionado anteriormente, pela inteligência do art. 591 do CPC, o devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para a satisfação de suas obrigações. Ocorre que, ao contrário do que induz a leitura fiel do supramencionado artigo, nem todos os bens do devedor respondem pela execução. Alguns deles não podem ser penhorados.

Impenhorabilidade é o nome que se dá à restrição de penhora que a lei estabeleceu para certos bens, com o fim de evitar que a execução levasse o devedor a um estado de penúria.

A penhora é o ato através do qual certo bem será apreendido e, posteriormente, colocado em depósito, para ser empregado de forma direta ou indireta na satisfação do crédito. Em outros termos, tem-se que:

A penhora satisfaz diretamente a pretensão do exequente, quando o bem penhorado for por ele adjudicado como pagamento da dívida; satisfaz indiretamente, quando o bem penhorado for alienado, e o produto da venda for entregue ao exequente.59 De acordo com a classificação estabelecida por Assis, a impenhorabilidade pode ser dividida em duas, observando o conteúdo dos arts. 649 e 650 do CPC, a saber: impenhorabilidade material absoluta e impenhorabilidade material relativa. Nesses termos:

Objetivamente, na leitura dos arts. 649 e 650 se identificam duas classes: existem bens que jamais admitem a constrição, constituindo o grupo da impenhorabilidade absoluta (v.g., o seguro de vida, art. 649, VI); e há bens que, preenchidos alguns requisitos, voltam à regra da penhorabilidade, a exemplo da retribuição pecuniária do trabalho humano, penhorável na execução do crédito alimentar (art. 649, IV e § 2º, na redação da Lei 11.382/2006), formando o grupo mais numeroso da impenhorabilidade relativa.60

Os artigos 649 e 650 do CPC assim dispõem:

Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:

I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução; II - os móveis, pertences e utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida;

59 DIDIER JR. et al., 2014, p. 46. 60 ASSIS, 2013, p. 245.

III - os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor;

IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por

liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3º deste artigo;

V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão;

VI - o seguro de vida;

VII - os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas;

VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;

IX - os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social;

X - até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança.

XI - os recursos públicos do fundo partidário recebidos, nos termos da lei, por partido político.

§ 1º A impenhorabilidade não é oponível à cobrança do crédito concedido para a aquisição do próprio bem.

§ 2º O disposto no inciso IV do caput deste artigo não se aplica no caso de penhora para pagamento de prestação alimentícia.

Art. 650. Podem ser penhorados, à falta de outros bens, os frutos e rendimentos dos bens inalienáveis, salvo se destinados à satisfação de prestação alimentícia.61

Conforme aduz Dinamarco, impenhorabilidade absoluta significa que o bem não pode ser levado à execução em hipótese alguma, competindo ao juiz o dever de impedir a penhora e subsequente expropriação do bem, a requerimento da parte ou de ofício. Já a impenhorabilidade relativa, nas palavras do doutrinador, consiste em condicionar a concreta responsabilidade patrimonial de um bem à extrema necessidade decorrente da inexistência de outros livremente penhoráveis.62

Existe, ainda, a impenhorabilidade trazida pela Lei nº 8.009 de 29 de março de 199063, do chamado bem de família, que em seu primeiro artigo declara impenhorável o “imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar”. O legislador declara ainda que “a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados” são impenhoráveis. É importante ressaltar que a referida Lei inclui tanto residências urbanas, quanto residências rurais.

No entanto, mesmo para o legislador, existem exceções para essa regra, como é o caso da penhorabilidade dos rendimentos da poupança acima de 40 salários mínimos, art. 649,

61 BRASIL, 1973.

62 DINAMARCO, 2009, p. 381.

63 BRASIL. Lei nº 8.009 de 29 de março de 1990. Dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8009.htm> Acesso em: 10 set. 2014.

inciso X, do CPC64, e a penhorabilidade das figuras do inciso IV em caso de prestação de alimentos, § 2º, do art. 64965, que será debatida posteriormente. Essas exceções demonstram que o legislador, mesmo optado pela proteção ao devedor, enxerga um limite no qual haverá maior prejuízo para o credor que para o devedor, caso a impenhorabilidade fosse mantida.