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CAPÍTULO 2 – DA IDEIA DE UNIVERSIDADE ABERTA BRASILEIRA NA

2.4 O movimento da Universidade Aberta na Nova República

2.4.1 Da retomada da ideia a primeira proposta de iniciativa do Estado

A ideia foi retomada pelo Conselho Federal de Educação (CFE), por meio da Indicação n. 18/1986, que “propõe a criação de uma Comissão de sete especialistas indicados pelo MEC e pelo CFE, para que se estude as virtualidades do ensino por correspondência e técnicas completas com vistas a seu aproveitamento na Universidade Aberta” (NISKIER, 1988).

Os principais argumentos que sustentam a visão do autor da Indicação encontram respaldo em torno da educação permanente. Nas palavras de Niskier (1988, p. 7), “o conceito da necessidade de educar-se continuamente é aceito universalmente, não apenas por imperativos pessoais, mas também por motivos pragmáticos impostos pela sociedade”.

Por outro lado, Niskier (1988) menciona que no Brasil, a ideia de educação permanente está contida no art. 24 da Lei n. 5.692/1971, que trata das finalidades do ensino supletivo. Além dos argumentos explicitados, aquele autor enfatiza a experiência da Universidade Aberta de outros países, com destaque para as experiências inglesa, alemã e espanhola.

Com base em tais argumentos, e considerando que a tendência de outros países era incorporar técnicas da educação de massa à educação permanente, tem-se o lançamento da UAB:

[...] Parece-nos oportuno o lançamento da ideia de uma Universidade Aberta, com a qual só teria a lucrar o sistema educacional como um todo e sob múltiplas formas, em um país que ainda não dispõe de recursos humanos qualificados em muitos setores, além de permitir a muitos a reconversão de profissão. (NISKIER, 1988, p. 10).

A referida Indicação também destaca a experiência do Brasil, com a utilização dos meios de comunicação de massa desde a década de 1950, concluindo, todavia, que os programas que existiram ou que existem não se destinam à educação superior. Assim, o documento propõe a criação de uma Comissão composta por 07 (sete) especialistas indicados pelo MEC e pelo CFE.

A Indicação, de autoria de Arnaldo Niskier, foi aprovada, e o Presidente do Conselho Federal, por meio da Portaria n. 56, de 05 de outubro de 1987, designou 07 (sete) especialistas77 para o estudo das virtualidades do ensino por correspondência e

técnicas correlatas, visando o aproveitamento na Universidade Aberta, por meio da referida Portaria. Aquela comissão teve o prazo de 90 dias para apresentar o seu relatório. No dia 10 de outubro, a Comissão deu início aos seus trabalhos, apresentando um relatório em 17 de março de 198878. O relatório contém as experiências79 que embasaram

a análise da comissão, entre as quais: o Centro de Ensino Técnico de Brasília (CETEB); o Projeto Verso e Reverso, da Fundação Educar, que se transformou no MOBRAL; o Centro de Treinamento para o Desenvolvimento Econômico (CENDEC), órgão vinculado ao Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); a EaD na UnB, a partir de 1976; a Sociedade Israelita Brasileira (ORT), que, em parceria com o MEC, promoveu a qualificação profissional para pessoas de baixa renda. Além das experiências descritas, a

77 Faz-se importante destacar que a Portaria nomeou apenas 06 (seis) integrantes, a saber: os conselheiros, Arnaldo Niskier (presidente da comissão), Lêda Maria Chaves Tjara, Walter Costa Porto e os professores, Newton Lins Buarque Sucupira, Paulo Nathanael Pereira de Souza e Rosa M.M. Pessina. A Portaria integra a publicação do Conselho Federal de Educação (CFE). Ensino a distância: uma opção. A proposta do Conselho Federal de Educação. Brasília: Departamento de Recursos Educacionais, 1988. p. 13.

78 Logrou-se o acesso ao relatório da Comissão Especial em duas publicações. A primeira publicação encontra-se na Revista de Tecnologia Educacional, v.17, no 80/81, p. 101-107, jan./fev. 1988. A segunda encontra-se publicada em livro do CFE referenciado na nota 29. Este contém, em anexo, todos os documentos que embasaram a análise da Comissão Especial.

79 Todas as experiências apresentadas estão consignadas em relatórios e constituem anexos do Relatório apresentado pela Comissão Especial, em 17 de março de 1988.

Comissão analisou o Relatório de Newton Sucupira, elaborado em 1972, como resultado de sua viagem à Inglaterra para conhecer a experiência da Universidade Aberta inglesa.

Após a análise das experiências relatadas e de outros documentos complementares80, a Comissão Especial reproduziu as indagações feitas pelo Professor

Newton Sucupira que, segundo o mesmo, a Comissão deveria se posicionar. As indagações vão desde qual nível se deveria dar início à experiência da Universidade Aberta até a quem caberia a execução do projeto (seria atribuição do MEC ou seria permitida a iniciativa a instituições privadas?).

A Comissão conclui o relatório recomendando, primeiramente, a criação de um GT que se voltasse, de forma sistemática, para a problemática do ensino a distância, além de incentivar e planejar o desenvolvimento de projetos experimentais de ensino a distância, recobrindo com prioridade as áreas da capacitação de professores leigos e do treinamento e melhoria da mão de obra81.

Segundo tal documento, o GT seria responsável pela volta à problemática do ensino a distância, promoção de trocas de experiências entre os responsáveis pelas iniciativas já existentes no País, planejamento e incentivo de projetos experimentais por meio da EaD – cuja prioridade seria a formação de professores leigos e o treinamento da mão de obra, implementação de um sistema cuidadoso de avaliação e acompanhamento, que seria acompanhado pelo CFE e, em vista dos resultados obtidos, autorizaria a expedição de diplomas (PARECER n. 263/1988).

A Portaria n. 511, de 27 de setembro de 198882, assinada pelo Ministro da

Educação Hugo Napoleão, constituiu o GT recomendado pelo Relatório da Comissão Especial e pelos estudos em curso no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas

80 Os seguintes textos também embasaram o trabalho da Comissão: Paulo Nathanael Pereira de Sousa: “Educação a distância (Ensino por correspondência) para que e para quem?”; Newton Sucupira: “Algumas questões sobre o projeto de instituição do sistema de educação a distância e sobre as quais a Comissão deveria tomar posição”; Arnaldo Niskier: “O ensino por correspondência algumas colocações”; Newton Sucupira: “reflexões sobre a educação permanente e a sociedade moderna”; “Por que o ensino a distância”? Texto elaborado pela equipe técnica do CETEB, em 1980; João Batista Araújo e Oliveira: “Universidade aberta: passado, presente e futuro”; Logos II – Registro de uma experiência, documento elaborado pelo Centro de Ensino Técnico de Brasília, CETEB, 1984.

81 Faz-se importante destacar que o Relatório da Comissão publicado na Revista Tecnologia Educacional, apresenta diferenças em relação ao Relatório da Comissão publicado pelo CFE. No documento publicado na referida Revista, tem-se consignadas 10 (dez) recomendações, entre as quais, não figura, em nenhum momento, a constituição de um GT. As recomendações são apresentadas como ações que derivaram dos estudos da Comissão Especial, entre as quais, destacam-se: realizar uma experiência piloto sob a supervisão do MEC, para a capacitação em serviço de professores de primeiro e segundo graus, através do ensino a distância, tendo como elemento integrador o curso por correspondência; expedir certificados e diplomas aos concluintes do curso, através das instituições vinculadas; e, conceder diploma de licenciatura aos candidatos que apresentaram o segundo grau completo, como pré-requisito (NISKIER, 1988).

Educacionais (INEP), para elaborar a política de EaD e formular propostas de cursos a distância por correspondência e técnicas correlatas.

Além disso, a mencionada Portaria também instituiu no INEP a Coordenadoria de Ensino a Distância83, ligada diretamente à direção geral do Instituto. Segundo tal ditame,

o GT teria 60 dias para apresentar a proposta, podendo o período ser prorrogado por mais 30 dias. Em seu § 1º, art. V, declara que o GT deveria consultar segmentos da sociedade interessados em EaD, a fim de estabelecer uma proposta de cunho participativo.

Tem-se aí, portanto, o quarto GT constituído no campo do Estado brasileiro para estudar a implantação da Universidade Aberta no Brasil. Os integrantes do GT para a EAD foram designados por meio da Portaria n. 418, de 10 de novembro de 198884. O GT

foi coordenado pelo representante do CFE, Arnaldo Niskier. Como foi indicado pela Portaria n. 511/1988, que o GT consultasse segmentos da sociedade interessados em EaD, o mesmo, segundo a professora Cardoso (1990a, mimeo. p. 6)85, ouviu os seguintes

especialistas: “professor Silveira Lobo/ABT, Arnon de Andrade/IRDEB, a professora Rosa Pessina/CETEB, o professor Sadi Dal Rosso/Andes, o professor Juan Bordanave entre outros”.

Conforme as várias reuniões que se seguiram, pelas observações apontadas nas atas das reuniões, o GT entregou ao então Ministro Carlos Sant`Anna, o documento Por

uma Política Nacional de Educação Aberta e a Distância (1989). Na apresentação deste,

tem-se consignada como primeira afirmação que a EaD carece de reconhecimento e apoio por parte das autoridades e da sociedade em geral. Ainda segundo o documento, a EaD não é uma novidade em nosso sistema, pois a Lei n. 5.692/1971, em seu art. 26, recomenda o uso dos meios de comunicação de massa nos processos educativos. Todavia, no entendimento dos signatários do documento, tais meios são empregados de forma tímida na Educação brasileira (INEP, 1989)86.

83 Therezinha Maria Abranches Félix Cardoso foi designada para responder pela Coordenadoria de Ensino a Distância do INEP (Portaria n. 16, de 04 de abril de 1989, situada no Dossiê sobre a educação a distância. Brasília: Arquivo Histórico INEP, série 350, caixa 14, mimeografado).

84 O Secretário Geral do MEC, Luiz Bandeira da Rocha Filho, é quem assina a Portaria que designa os seguintes integrantes do GT: Arnaldo Niskier, do CFE; Therezinha Maria Abranches Felix Cardoso, do INEP; Maria de Lourdes Marquez Bittencourt, da Fundação Nacional para Educação de Jovens e Adultos (EDUCAR); Anna Rosa Bogliolo de Siqueira, da Secretaria da Educação Superior (SESu); Jane Maria Fantinelli Tomasini, da Secretaria de Ensino Básico (SEB); Inês Berttoni, da Fundação de Assistência ao Estudante (FAE), Marly Gonet Mourão Branco, da Secretaria de Ensino de Segundo Grau (SESG). A Portaria apontada encontra-se no Dossiê sobre a educação a distância. Conferir nota 36.

85 O documento encontra-se no Arquivo Histórico do INEP, série: 350, educação a distância, caixa 14. Mimeografado.

Em seguida, tem-se a síntese das linhas de ação da proposta, mas, antes, é apresentada uma breve justificativa da necessidade do Brasil em ter uma ‘política nacional de educação aberta e a distância’. Esta pode ser resumida em dois aspectos, a saber: primeiro, o imperativo urgente de elevar o nível educacional da população; e, segundo, a precisão de incentivar a educação do povo, ou seja, a oferta de condições para a autoformação, para a participação na organização da sociedade e para a sua identificação cultural de homem brasileiro. Para a superação de tais aspectos, o documento registra que a oferta de alternativas diversificadas poderia ser de grande valia (INEP, mimeo. 1989).

São previstas diretrizes e linhas de ações para a educação formal (Ensinos Fundamental, Médio e Superior; a capacitação/habilitação de professores leigos como parte integrante da educação formal) e não formal/educação continuada na área de alfabetização e educação popular e formação para o trabalho.

No âmbito dos Ensinos Fundamental e Médio, a EaD é relacionada à ampliação da oferta de vagas e pode ser utilizada em caráter complementar, uma vez que se trata de uma “metodologia” que não concorre e nem exclui os métodos tradicionais.

No âmbito do Ensino Superior, ainda segundo aquele documento, a EaD também permite ampliar as oportunidades de acesso, tanto no que se refere ao ensino técnico de terceiro grau, quanto da graduação e pós-graduação.

Por outro lado, a educação superior deve dar especial atenção à formação inicial de professores leigos e à formação continuada dos professores habilitados para os Ensinos Fundamental e Médio. Além disso, compete à universidade formar quadros especializados na área de EaD.

Como ação no âmbito da educação superior, tem-se a criação da Universidade Aberta, como medida para assegurar o acesso ao ensino de terceiro grau àqueles que não puderam frequentar os estudos superiores por diferentes razões (INEP, 1989).

O documento consigna 26 estratégias de implantação, acompanhamento e avaliação, onde se destacam 05 (cinco) estratégias que se relacionam diretamente com o objeto de estudo, a saber:

Promover a articulação entre os sistemas federal, estadual e municipal de ensino, no sentido de garantir a descentralização e execução de programas e projetos de ead [...]. Incluir a metodologia de ead nos currículos dos cursos de educação e de comunicação [...]. Oferecer, nas universidades, cursos de especialização em metodologia de educação a distância [...]. Realizar estudos que visem, a médio ou longo prazo, a implantação da Universidade Aberta brasileira [...]. Utilizar a metodologia de ead, em caráter complementar, nos cursos de nível fundamental, médio e superior [...]. (INEP, 1989 pp. 21, 22).

Como resultado, o Ministro Carlos Sant`Anna, ao aprovar o documento, transformou o GT em Grupo de Assessoramento por meio da Portaria n. 117, de 13 de março de 198987. A instituição do Grupo de Assessoramento consubstanciou a

necessidade de se adotarem providências sistemáticas e, em curto prazo, da implantação da EaD nos 03 (três) níveis de ensino, como metodologia alternativa “para minimizar o descompasso existente entre a demanda e o crescimento da rede oficial de ensino” (DOU, 1989, p. 3956).

Foi a partir das reuniões do Grupo de Assessoramento88 que se deu o PL

Complementar n. 4.592/1990, que dispõe sobre a Universidade Aberta no Brasil e dá outras providências. O referido ditame foi encaminhado à Câmara dos Deputados (CD) pelo Presidente da República, José Sarney, através da Mensagem n. 86/199089. Convém

destacar que se tem aí o primeiro Projeto de iniciativa do Poder Executivo, que propõe a criação da Universidade Aberta.

O Projeto seguiu acompanhado por uma Exposição de Motivos assinada pelo Ministro da Educação, Deputado Carlos Sant`Anna. Os argumentos da Exposição fundamentavam-se, sobretudo, na eficácia comprovada mundialmente do ensino aberto e a distância e na possibilidade de permitir o acesso à educação superior a grandes contingentes populacionais. Além disso, a educação aberta e a distância é relacionada a metodologias modernas adequadas à realidade brasileira, tendo em vista a existência, no Brasil, de amplo parque editorial, inúmeras emissoras de rádio e TV e uma rede de comunicação social consolidada.

Além das condições materiais apontadas, o documento explicita a carência educacional brasileira e a inserção da Universidade Aberta como forma de amenizar tal realidade, porque oferece oportunidade aos cidadãos adultos que, por razões alheias às suas vontades, não puderem frequentar a educação formal na idade adequada. “A criação

87 Publicada no Diário Oficial da União. Brasília, DF, 14 mar. 1989. Seção I, p. 3.955-3.956.

88 A composição do grupo de assessoramento foi instituída pela Portaria n. 161, a saber: Arnaldo Niskier, (CFE), Therezinha Maria Abranches Felix Cardoso, (INEP), Maria Adete Peixoto Wanderley – Secretaria Geral (SG), Siglia Zambrotti Doria, Secretaria de Ensino de 2º. Grau, (SESG), Jane Maria Fantinelli, Secretaria de Ensino Básico (SEB), Maria de Lourdes Bitencourt, (EDUCAR), Inês Bettoni, Fundação de Assistência ao Estudante (FAE) e Marlene Montezi Blois, Fundação Brasileira de TV Educativa (Funtevê).

Diário Oficial da União. Brasília, DF, 27 abr. 1989. Seção I, p. 1.765.

89 A Mensagem do Presidente encaminhada a Câmara dos Deputados encontra-se no Diário Oficial da

União. Brasília, DF, 19 fev. 1990. Seção I, p. 3.309. Cópia da Mensagem; bem como cópia da Lei

Complementar e da tramitação da matéria foi adquirida na própria Câmara, por meio do atendimento ao cidadão. Após pesquisas percebeu-se também que a exposição de motivos do Ministro Carlos Sant`Anna integra o livro de ALVES, João Roberto Moreira. A educação a distância no Brasil. Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação, 1994, p. 104-106.

dessa universidade se inscreve no esforço do país de superar seus insuficientes e alarmantes índices educacionais” (SANT`ANNA, 1990, p. 3).

Na Exposição, a Universidade Aberta é apresentada também como alavanca para acelerar o desenvolvimento socioeconômico do País, e a forma de se operacionalizá-la é coerente com o momento histórico de rápidas e profundas mutações no campo da Ciência e da Tecnologia. O referido Documento ainda destaca que a principal preocupação da Universidade Aberta é oferecer oportunidade de educação superior a todos e contribuir para a democratização da educação superior. O Ministro finaliza o mesmo afirmando que a criação da Universidade Aberta não acarretará aumento de despesa, uma vez que serão utilizados recursos do próprio MEC (SANT`ANNA, 1990).

No subitem exposto a seguir, tem-se a apresentação da proposta de regulamentação da Universidade Aberta do Poder Executivo e como esta foi alterada pelo substitutivo proposto pelo Deputado Jorge Hage (PMDB). Vale destacar que a proposta de regulamentação responde às indagações de Sucupira, vinculando a Universidade Aberta ao MEC, mas com abertura desta à iniciativa privada.