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Da semiose interativa à midiatização dos corpos

The semioses of mediatization

6. Da semiose interativa à midiatização dos corpos

Quando a comunicação supera a dimensão linear que se registra no âmbito da técnica entendida na sua efi- ciência performática e transmissiva, observa-se que ela se concretiza pelo modo como, assumindo as potenciali- dades das características técnicas, ou talvez apesar delas, desenvolve-se enquanto midiatização de âmbito social e público. Essa dimensão constitui vetor do seu papel políti- co e lhe confere outra dimensão epistêmica.

Porém, esse vetor é também o próprio agente da lin- guagem que, no auge da sua dimensão social, ultrapassa a visualidade anterior exigida pela exclusiva característica de experiência comunicativa que caracteriza a esfera pública, para assumir aquela semiose da qualidade tátil e sensível entre corpos que confere, àquele público, sua definitiva e inalienável dimensão ambiental, pensável e política.

Uma semiose tecnicamente midiatizada que, ade- rente ao diálogo de singularidades em cumplicidade, su- pera a simples linearidade enunciativa e mediativa, para produzir-se e reproduzir-se publicamente em radical me- tamidiatização da técnica e, definitivamente, distante do ilusório ufanismo performático, centrado na epifania pro- dutiva dos meios. Uma midiatização realista que, sem se ge- neralizar, acontece na efetiva singularidade comum a todos,

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nos domínios do espaço e da ação públicos. Uma midiatiza- ção heurística, construtora de um especial lugar epistemo- lógico para a comunicação contemporânea e capaz de nos levar à evidência da irregularidade patrocinada por quali- dades de sentimentos, enquanto testemunhos exclusivos do tempo presente e distantes da contiguidade dos hábitos e/ou das normas de conduta, embora vigilantes como con- tinuidade emotiva e cognitiva (PEIRCE, C.P. 5.395).

Retomemos a hipótese que orientou esse trabalho: salientamos a diferença epistemológica que podemos en- contrar entre “processos midiáticos” e “processos comu- nicativos” e, por hipótese, a possibilidade de considerar, entre eles, uma possível inversão do crescimento das res- pectivas semioses e das suas contínuas ressignificações.

Sob a égide daquela inversão, a relação dialógica que caracteriza a metamidiatização é agente de peculiar relação entre corpos e mentes, marcados pela dimensão globalizada e planetária do espaço público. Embora decor- rente da pura qualidade de sentimentos, aquela relação é aderente à ontogênese da experiência e da troca, embora dominadas por sensações irregulares e sem determina- ções de objetivos ou metas a serem alcançadas.

Essa indeterminação faz com que aquela relação não seja aderente a um emocional subjetivo, ao contrário, é plural e coletiva, na medida em que se dispõe ao alerta de uma cognição heurística passível de ser partilhada. A percepção dessa subjetivação sem subjetividades emo- tivas é indispensável, para que seja possível a apreensão contínua da realidade vivida por mentes e corpos na mi- diatização da troca pública e coletiva; instala-se uma al- teridade ampliada da individuação em metaindividuação, disponível à experiência, embora sem previsibilidade das suas ocorrências, conforme a inferência contínua da se- miose sob a tutela da qualidade de sentimentos e aderen- te à categoria de primeiridade fenomênica proposta por Peirce (C .P. 1.305).

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Nessa midiatização de confluência entre espaços, tempos, mentes e corpos, surge outra epistemologia que precisa considerar a heurística cognitiva que se oferece na imprevisibilidade das interações ambientais públicas e coletivas. Anunciam-se processos de semioses interativas que patrocinam outro conhecimento daquela confluência cognitiva, responsável pela dimensão social de construção e descoberta do “self” metaindividual (COLAPIETRO, 2014, p. 88). Essa midiatização interativa pode ser autora de uma transformação social não expansiva, se considerada do pon- to de vista quantitativo, mas ponderável qualitativamente como semiose processual e irregular, autora de outro corpo vivo em processo de midiatização indeterminado.

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Circulação como valor: a