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Das chances reais de ganhar a aposta na borboleta: a voz dos discursos oficiais

No documento Línguas Estrangeiras e outras áreas (páginas 180-184)

VOICES FROM THE VALLEY: AN ENGLISH TEACHER’S TRANSDISCIPLINARY EXPERIENCE IN JEQUITINHONHA

6. Das chances reais de ganhar a aposta na borboleta: a voz dos discursos oficiais

Durante a disciplina, analisaram-se as recomendações pertinentes aos textos destinados ao ensino médio e à educação de modo geral; avaliou-se a tônica do discurso contida nas Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Lei nº 9.394/96, nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – os PCNs, no Relatório da Comissão Internacional sobre a Educação no Século XXI para a UNESCO -

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As escolas, na visão de Bruno (1996; 1997) figuram-se numa das esferas de produção da capacidade de trabalho ao lado da família e do meio social.

181 especialmente o texto intitulado Os Quatro Pilares da Educação31, de Jacques Delors e no Parecer CEB nº 15/98. Os textos evidenciam a importância da educação na nova conjuntura e apontam seu papel nesse contexto; ainda, instigam a adesão dos professores na educabilidade de seus alunos e no auxílio à aquisição de habilidades relacionais e técnicas desejáveis para o trabalho, suscitando sua participação no projeto da pedagogia das competências (Bruno, 2006; Maués, 2009).

De acordo com Van Dijk (2008a, p.33), “a maioria das nossas ideologias são formadas discursivamente” e, por isso, fez-se necessário analisar os textos oficiais para que fosse possível verificar qual o tom do seu discurso político. Seu papel persuasivo fica evidente, pois atrai os professores para a empreitada de se lançarem ao novo projeto que se configura para a educação. Os textos buscam, dessa maneira, o sancionamento dos professores e sua adesão para a legitimação do discurso político como verdade (Foucault, 1996).

No corpo do texto da LDB verifica-se a orientação para a educação escolar vinculada ao mundo do trabalho e à prática social (artigo 1º, § 2º). O pleno desenvolvimento dos educandos, o seu preparo para o exercício da cidadania e a sua qualificação para o trabalho são mencionados no artigo 2º. O artigo 22º assegura aos educandos uma formação comum, indispensável para que progridam no trabalho. O artigo 27º estabelece que os conteúdos curriculares devam, de igual modo, orientar para o trabalho. No texto da LDB, o ensino médio trata da preparação para o trabalho e da adaptação flexível dos alunos às novas condições de ocupação; além de tocar no domínio dos princípios científicos e tecnológicos da produção moderna.

Os PCNs analisados em sala formam a carta de intenções do governo para o ensino médio e possuem um discurso híbrido ao citar às diretrizes curriculares para a educação e ao recomendar, simultaneamente, a inserção no mundo produtivo (Lopes, 2002), citando, inclusive, a revolução informática. Lopes (2002) salienta que os PCNS têm embutido, assim, um discurso que se quer instrucional e regulativo, pois funciona dentro de um território de influências sobre a produção do conhecimento e das práticas escolares como todo discurso oficial geralmente opera.

“O discurso pedagógico oficial formado pelos documentos oficiais é capaz de regular a produção, distribuição, reprodução, inter-relação e mudança dos textos pedagógicos legítimos, suas relações sociais de transmissão e

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Os quatro pilares da educação foram definidos neste relatório da UNESCO em 1996 e esteve sob a coordenação de Jacques Delors. A inclusão do texto na discussão em sala de aula deveu-se ao fato do Parecer 15/98 conter a base teórica deste relatório.

182 aquisição e a organização de seus contextos, redefinindo as finalidades educacionais da escolarização” (Lopes, 2002, p. 388).

No caso em questão, o texto dos PCNs é lido e interpretado nas escolas e ressignificado para o contexto atual. Este documento possui uma “série de mecanismos de difusão, simbólicos e materiais” (Lopes, 2002, p. 390) com o intuito de criar uma retórica discursiva favorável à sua implementação e de submeter a educação ao mundo produtivo. Logo, transforma os professores em executores de políticas públicas; já os alunos leva-os a atitudes em que se “auto-regulam e mobilizam seus conhecimentos de acordo com as performances solicitadas pelo mercado de trabalho” (Lopes, 2002, p. 394).

“Pensar um novo currículo para o Ensino Médio coloca em presença estes dois fatores: as mudanças estruturais que decorrem da chamada “revolução do conhecimento”, alterando o modo de organização do trabalho e as relações sociais; e a expansão crescente da rede pública, que deverá atender a padrões de qualidade que se coadunem com as exigências desta sociedade” (PCNs – ensino médio, 2000, p.6). (Grifos meus).

“O novo paradigma emana da compreensão de que, cada vez mais, as competências desejáveis ao pleno desenvolvimento humano aproximam- se das necessárias à inserção no processo produtivo. Segundo Tedesco, aceitar tal perspectiva otimista seria admitir que vivemos “uma circunstância histórica inédita, na qual as capacidades para o desenvolvimento produtivo seriam idênticas para o papel do cidadão e para o desenvolvimento social”. Ou seja, admitindo tal correspondência entre as competências exigidas para o exercício da cidadania e para as atividades produtivas, recoloca-se o papel da educação como elemento de desenvolvimento social” (PCNs – ensino médio, 2000, p. 11). (Grifos meus).

Percebe-se pela retórica do texto que se trata das competências requeridas do trabalhador, no caso específico dos alunos, para sua inserção no mercado produtivo, itens reafirmados tanto nos PCNS para o ensino médio quanto na LDB. Os quatro alicerces citados referem-se aos quatro pilares da educação apresentados no texto do Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI, coordenada por Jacques Delors, destacado adiante.

“É importante destacar, tendo em vista tais reflexões, as considerações oriundas da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, incorporadas nas determinações da Lei nº 9.394/96: a) a educação deve cumprir um triplo papel: econômico, científico e cultural; b) a educação deve ser estruturada em quatro alicerces: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver e aprender a ser” (PCNs – ensino médio, 2000, p. 14). (Grifos meus)

183 Os Quatro Pilares da Educação, propostos por Delors (2003), destacam os princípios de aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser. Aprender a conhecer significa dotar os educandos de uma cultura geral, contribuindo para a sua formação humana. Aprender a fazer conjuga a qualificação profissional com a participação em tarefas e em atividades que estimulem tomadas de decisão e a organização de eventos, criando competências para que se tornem aptos a enfrentar desafios e a trabalhar em equipe. Aprender a viver juntos refere-se à capacidade de compreender o outro, de criar respeito mútuo e de realizar projetos comuns; o que os instrumentaliza a gerir conflitos e a respeitar os valores do pluralismo e da diferença. Aprender a ser desenvolve suas personalidades e suas capacidades de autonomia, de discernimento e de responsabilidade pessoal e social perante sua comunidade e a sociedade.

Ao longo do Parecer 15/98, evidencia-se uma preocupação com a formação geral dos educandos e a sua formação para o trabalho, ou seja, com suas habilidades em se adequarem às exigências tecnológicas e produtivas. O texto inicia-se aludindo à inquietação presente na sociedade em relação ao ensino médio. Declara que o Parecer foi fruto de uma consulta a variadas fontes e conselheiros, sendo, portanto, de cunho democrático. Para isso, aponta a participação de instituições educacionais e produtivas no debate como, as universidades, o Fórum dos Conselhos Estaduais de Educação e o SENAI, demonstrando, assim, o amplo foro de discussão em que a elaboração do documento esteve envolvida. Também delineia diretrizes para que as escolas se adaptem às novas formas de organização do trabalho e a urgência de preparação dos educandos para esta nova demanda; isto se coaduna ao que Villarta-Neder (2009, p. 257-258) indica: “o significante ‘Diretrizes’ sugere de que lugar o documento enuncia. O das normas a serem seguidas”.

De acordo com o Parecer o quadro da situação de desigualdades sociais e de atraso do país pode ser superado pela via educacional quando esta favorecer a inserção mais qualificada de seus alunos ao mercado. No transcurso do texto faz-se uma convocação aos agentes educacionais e afirma-se o dever imperativo destes contribuírem para tal projeto, mesmo diante de condições precárias de trabalho docente. Aqui divisa-se a imagem vocacional e missionária que sempre se destinou ao magistério (Chamon, 2005). Como reforço a esse discurso que convoca ao sacrifício e à participação, o Parecer ressalta três itens essenciais para que a prática pedagógica esteja coerente com as demandas que se fazem: a estética da sensibilidade, a política da igualdade e a ética

184 da identidade, itens que também constam no Relatório da Reunião da Educação para o Século XXI da UNESCO e nas bases dos Quatro Pilares da Educação de Delors.

“O esforço doutrinário se justifica porque a superação desse estado crônico de carências requer clareza de finalidades, conjugação de esforços e boa vontade para superar conflitos, que só a comunhão de valores pode propiciar” (Parecer 15/98). (Grifos meus).

A estética da sensibilidade estimula a criatividade e a afetividade e valoriza a leveza, a delicadeza e a sutileza, contrariamente ao período produtivo em que eram exigidas habilidades manuais para operar maquinários. A política da igualdade significa o “reconhecimento dos direitos humanos e o exercício dos direitos e deveres da cidadania, como fundamento da preparação do educando para a vida civil” (Parecer 15/98). A ética da identidade se faz pelo reconhecimento e respeito pelo outro.

O Parecer usa a metáfora da borboleta para referir-se à aposta incisiva que os professores têm que fazer relativo a seus alunos como potenciais humanos: “Ignorando que será uma borboleta que pode ser devorada pelo pássaro antes de descobrir-se transformada. O mundo vive um momento em que muitos apostam no pássaro. O educador não tem escolha: aposta na borboleta ou não é educador”. Este, segundo o Parecer, é o papel da educação como mediadora para a aquisição de conhecimentos e competências por parte dos educandos para o mundo do trabalho.

“Não é por acaso que essas mesmas competências estão entre as mais valorizadas pelas novas formas de produção pós-industrial que se instalam nas economias contemporâneas. Essa é a esperança e a promessa que o novo humanismo traz para a educação, em especial a média: a possibilidade de integrar a formação para o trabalho num projeto mais ambicioso de desenvolvimento da pessoa humana. Uma chance real, talvez pela primeira vez na história, de ganhar a aposta na borboleta” (Parecer 15/98). (Grifos meus).

7. Das Vozes Advindas do Vale: o fio discursivo dos professores-alunos nas teias

No documento Línguas Estrangeiras e outras áreas (páginas 180-184)