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Nas últimas décadas, muitas pesquisas têm sido realizadas investigando as políticas públicas de educação ambiental e de meio ambiente. Este tem sido um campo fértil que vem se consolidando e isso se evidencia nos periódicos do campos educacional e da educação ambiental, bem como nos encontros destes campos, sendo que no Encontro de Pesquisas em Educação Ambiental (EPEA), há um Grupo de Discussão de Pesquisas (GDP) sobre políticas públicas em EA. Conforme apontei no início deste capítulo, as abordagens, leituras, referenciais teórico-metodológicos, concepções, pressupostos e objetivos das pesquisas sobre políticas públicas são bastante variados. O mesmo se aplica no caso das pesquisas sobre políticas públicas em EA.

Uma boa síntese foi reunida no artigo que compilou as discussões dos trabalhos desta temática apresentados no VII EPEA (SANTANA, 2014). Conforme o mesmo, compilando as discussões dos 21 trabalhos sobre políticas públicas em EA naquele evento, foi possível constatar a riqueza da discussão feita no GDP mediante a variedade dos temas tratados, dos objetivos propostos e das consequentes questões de pesquisas, bem como dos procedimentos teórico-metodológicos usados (ibidem, p. 159). Dentre os referenciais teórico-metodológicos explicitamente indicados nestes trabalhos, a predominância é do materialismo histórico-dialético, em quase um terço dos textos, com a maioria fazendo referência a conceitos gramscianos (Estado ampliado, sociabilidade, hegemonia, conformismo, partido e escola

174 desinteressada); as perspectivas da Educação Ambiental Crítica e da Ecologia Política também constaram entre os trabalhos enviados. No curso das discussões deste GDP, discutiu-se sobre as concepções dos autores acerca dos conceitos de educação ambiental e política pública (ibidem, p. 163).

Com relação ao primeiro, os entendimentos dos participantes apontaram para a EA como espaço de disputa; devendo ocorrer a partir do entendimento da realidade social vivida; enquanto ação política de instrumentalização dos grupos sociais em situação de vulnerabilidade socioambiental para a transformação social e reversão das assimetrias; o fato de a EA requerer uma intencionalidade, um posicionamento político claro para que se alcance o projeto político defendido; a necessidade das ações de EA considerarem o conceito de público a partir da dimensão universalista; a busca por objetivos coerentes com a proposta de uma efetiva emancipação humana; a EA devendo estar voltada para a construção da participção e do controle social das políticas públicas; a EA não devendo ser apartada do campo da educação; e, por fim, registrou-se que o conceito de educação ambiental apareceu, ainda que em poucos trabalhos, numa perspectiva comportamentalista, preservacionista e dicotômica, voltada para a sensibilização dos educandos, defendendo, contraditoriamente, a relevância da educação ambiental crítica (ibidem, pp. 164-165). Quanto ao conceito de política pública, bem como a forma de participação nelas, havia entendimentos bastante distintos entre os participantes, estando estes diretamente vinculados à compreensão da natureza e do papel do Estado. Com relação ao conceito e papel do Estado, foi apontado não se tratar de uma instituição neutra; a importância de se compreender a natureza do Estado na sociedade capitalista e a influência da classe dominante no processo de formulação das políticas públicas; considerou-se que o Estado está a serviço do privado, da burguesia, havendo subordinação do mesmo às empresas privadas, tecendo-se críticas às parcerias público-privadas; alguns trabalhos indicaram o Estado como mediador de conflitos, ora como preservador da ordem estabelecida, ora com a responsabilidade pelo financiamento das políticas públicas; outros trabalhos destacaram que a disputa é um elemento importante na compreensão do Estado, enfatizando-se as contradições internas em contraposição à visão ingênua de Estado enquanto entidade que cuida do bem comum (ibidem, p. 165).

Sobre as políticas públicas, alguns trabalhos as relacionam às garantias de direitos fundamentais à vida (alimentação, saúde, liberdade, etc), e outros, à redistribuição de benefícios sociais com vistas à diminuição das desigualdades estruturais. Além disso, houve

175 menções à necessidade de participação dos indivíduos e movimentos sociais, e controle social das políticas públicas. Os espaços de participação nas políticas públicas foram tratados como espaços de disputas, ainda que as ideias de consenso e parceria, em menor quantidade, estivessem presentes nos trabalhos. Foram tecidas críticas à proliferação das ONGs nas políticas públicas, visando, muitas vezes, a defesa de interesses privados. Por último, sobre a participação, esteve presente a questão da necessidade da assimeteria na constituição das políticas públicas e no uso de recursos (ibidem, p. 166)

Além disso, foram recuperados oito temas elencados no VI EPEA, em 2011, de modo a compor uma ampla agenda para as pesquisas sobre políticas públicas e educação ambiental nos próximos anos (ibidem, pp. 163-164):

1. Os conceitos de Estado e sociedade civil nas políticas públicas de educação ambiental.

2. Limites e estratégias para que as políticas públicas possam se constituir como políticas de Estado, políticas estruturantes, mais densas e menos instáveis.

3. As tensões indivíduo-instituição na formulação das políticas públicas.

4. O lugar das políticas públicas em educação ambiental no Estado (o quão estratégicas elas são, se são marginais... que condições têm para sair desse lugar mais marginalizado?).

5. A relação das políticas públicas de educação ambiental com outras políticas públicas, destacadamente, as de educação (reiteradas várias vezes), mas também as demais políticas sociais, de saneamento, de saúde etc.

6. Estudo das condições objetivas das políticas públicas de educação ambiental (como se constroem as equipes, orçamentos, quais são as condições de se desenvolver políticas).

7. Mais estudos de caso (pontuais e mais abrangentes - municipais, estaduais e federais) da materialização das políticas públicas de educação ambiental com vistas a traçar diagnósticos e mapeamentos.

8. Os diferentes interesses da sociedade civil em jogo na definição das políticas de educação ambiental (relação das políticas de EA com as demandas dos movimentos sociais, sobretudo, ligados à educação).

No GDP do VII EPEA, foram adicionados outros três temas:

9. Pesquisas enfocando os aspectos ambientais e educacionais, em especial aquelas que avaliam os resultados e/ou consequências das políticas públicas quanto a tais aspectos.

10. Análise dos resultados das políticas públicas (considerando a carência na divulgação dos resultados das políticas públicas pelo próprio Estado).

11. Buscar explicitar elementos resultantes da investigação que indiquem perspectivas de uma efetiva emancipação humana, evitando, com isto, a desilusão e o desânimo (tanto para o pesquisador quanto para os sujeitos das pesquisas desenvolvidas).

Em alguns momentos, devido a estas diferentes concepções teórico-metodológicas, epistemológicas e políticas no que diz respeito aos sentidos das pesquisas sobre políticas

176 públicas de educação ambiental, e sobre a natureza das próprias políticas públicas, têm sido produzidos diversos tensionamentos no campo de pesquisa em EA. Quanto a esse ponto, retomarei após recuperar os resultados das reflexões, análises e conclusões da pesquisa de mestrado (KAPLAN, 2011).

Essa pesquisa buscou conhecer e compreender os discursos presentes em alguns dos principais documentos que definem a política nacional de Educação Ambiental (EA). Dadas as muitas possibilidades de análise dos discursos desses documentos, três recortes foram feitos, partindo-se de pontos centrais que estruturam esta política: os discursos sobre as concepções de Estado e sociedade civil; a compreensão sobre a crise socioambiental nos textos dos documentos analisados; e o papel atribuído à escola dentro das políticas de EA. Os documentos analisados foram a lei federal nº 9.795/99 - Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA) –, o decreto nº 4.281/02 que institui a PNEA, o Programa Nacional de Educação Ambiental (ProNEA), o Programa Nacional de Formação de Educadores Ambientais (ProFEA) e outros textos, de autores do campo da EA ou não, que apresentam e desenvolvem os conceitos, concepções e pressupostos presentes nestas políticas.

Como objetivos da pesquisa, buscou-se elaborar uma análise crítica e integrada das principais políticas federais de Educação Ambiental, investigando, em seus discursos, quais projetos educativos, políticos e de sociedade estão presentes e associados à EA. Desta maneira, partindo da dialética materialista, o quadro teórico-metodológico englobou a Educação Ambiental Crítica e a Análise Crítica do Discurso. Assim, foi possível compreender, por meio dos elementos discursivos, as contradições e disputas entre projetos presentes no campo da Educação Ambiental.

O debate sobre a temática ambiental tornou-se público nos anos de 1970 e 1980, devido à evidência dada às tragédias ambientais. Esta resultou tanto da pressão exercida pelos diversos grupos sociais e correntes políticas que compunham o movimento ambientalista, quanto do espaço que os governos, os organismos internacionais, os meios de comunicação de massa e as empresas cederam às questões ambientais. Portanto, os problemas decorrentes da exploração da natureza só começaram a se tornar relevantes e viraram discussões e políticas públicas quando passaram a ser estratégicos para significativas frações das classes dominantes, as quais viram nessa agenda ambiental uma possibilidade de, aparentemente, conciliar uma demanda por estilos de vida mais sustentáveis ambientalmente, reivindicados pelos ambientalistas, com a permanência e a intensificação da exploração das classes trabalhadoras mundo afora. Assim, no período

177 iniciado nos anos 1960, os problemas ambientais começaram a ser evidenciados, em parte, como resultantes do crescimento da industrialização, sem, contudo, serem denunciados como expressão da crise de exploração e acumulação do capital (BATISTA, 2007, p. 53). O

desenvolvimento das forças produtivas64, das condições materiais para o desenvolvimento

de tecnologias, pesquisas, acordos internacionais, entre outras, forneceram as bases para que fosse forjado este discurso que busca conciliar capital e natureza e atender parte das reivindicações de alguns grupos ambientalistas. Nesse discurso hegemônico, não são apresentadas as incompatibilidades, as impossibilidades e as contradições antagônicas entre o capitalismo e os problemas sociais e ambientais, desvinculando tais problemas da estrutura social na qual se inserem e se aprofundam, tratando as questões ambientais de modo supostamente técnico, neutro e fruto de uma crise de valores éticos e de comportamentos individuais inadequados.

Neste mesmo contexto do pós-segunda guerra mundial, em que surge o debate público sobre as questões ambientais, estava em curso a nova divisão internacional do trabalho, como vimos na discussão sobre a Teoria Marxista da Dependência. Durante muitas décadas, o petróleo foi um dos grandes propulsores da economia mundial, chegando a representar cerca de 50% do consumo mundial de energia primária, nos anos 1970.

Justamente no momento da crise do petróleo65, levando a um extraordinário aumento de até

400% dos preços do barril de petróleo em apenas cinco meses, é que foram formuladas críticas por parte do movimento ambientalista quanto à dependência dos combustíveis fósseis e seus impactos para o meio ambiente. Neste contexto de nova divisão internacional do trabalho, diversas indústrias foram sendo transferidas para países periféricos e houve também significativo investimento ideológico em torno do papel das corporações multinacionais no sentido fazer com que fossem melhor aceitas pelos povos mundo afora. Retomarei este ponto no próximo capítulo ao tratar da siderúrgica TKCSA.

Foi apenas a partir do final dos anos 1990 que as primeiras políticas públicas federais voltadas para a Educação Ambiental foram instituídas. Na esfera federal, as principais políticas públicas de EA são a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA), lei federal

64 São os elementos que exercem na sociedade uma influência para modificar ou transformar a natureza, bem como produzir bens materiais. Compreendem os meios de produção e a força de trabalho. Neste conceito, são consideradas as habilidades, as técnicas, as tecnologias, os instrumentos e os conhecimentos que a humanidade dispõe para ter o controle das condições naturais.

65Desencadeada num cenário de déficit de oferta, com o início do processo de nacionalizações e de uma série de conflitos envolvendo os produtores árabes da OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), além de uma excessiva especulação financeira. A alta dos preços do barril de petróleo provocou um período prolongado de recessão nos EUA e na Europa, desestabilizando a economia mundial.

178 nº 9.795, aprovada em 1999; o Programa Nacional de Educação Ambiental (ProNEA), aprovado em 2005; e o Programa Nacional de Formação de Educadores Ambientais (ProFEA), aprovado em 2006. Estas políticas federais são também diretrizes para elaboração de políticas públicas estaduais e municipais. A PNEA é a lei federal que, junto com o decreto 4.281/02, regulamenta a Educação Ambiental no Brasil. Portanto, para serem formuladas quaisquer políticas públicas de EA, a PNEA deve ser tomada como base. O ProNEA apresenta as diretrizes, os princípios, os objetivos, a missão, as linhas de ação e os públicos para as ações no âmbito da Educação Ambiental. Assim, o ProNEA é a referência básica para os programas estaduais e municipais de EA. O ProFEA é um documento que materializa uma política pública voltada para a formação de educadores ambientais e que tem servido de referência básica para inúmeras ações federais e estaduais nesta direção, tanto para o universo escolar quanto para espaços não-formais de educação.

O referencial teórico-metodológico e político assumido na pesquisa de mestrado (KAPLAN, 2011) foi o materialismo histórico-dialético, que tem como desdobramentos a Educação Ambiental Crítica, no campo da Educação Ambiental, e a Análise Crítica do Discurso (ACD), dentre as teorias do discurso.

Na análise discursiva, seguindo os referenciais da Análise Crítica do Discurso, é um pressuposto tomar o contexto de produção das políticas de Educação Ambiental no que elas têm em comum com outras políticas sociais (e, particularmente, educacionais), produzidas no mesmo momento histórico, e no que elas têm de particular. Para isto, apóio-me nas contribuições de uma autora do campo (BATISTA, 2007) que se dedicou, em sua dissertação, a trabalhar a partir da explicitação desse contexto de produção das políticas de Educação Ambiental. Batista (2007, p. 52) sustenta a tese de que a Educação Ambiental foi sendo construída historicamente tanto a partir das demandas internas e diferenciadas que estavam presentes na sociedade civil, sobretudo no movimento ambientalista dos anos 1980 e com a incorporação da temática por outros movimentos sociais nos anos 1990, bem como pelas determinações pautadas pelos organismos internacionais e difundidas por meio das

conferências66 e documentos internacionais, enfatizando a relação entre meio ambiente,

educação e desenvolvimento.

66 A autora destaca, principalmente, a I Conferência das Nações Unidades sobre o Meio Ambiente Humano (em Estocolmo, Suécia, 1972), a I Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental (em Tbilisi, Geórgia, 1977) e a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (no Rio de Janeiro, 1992 – também conhecida como ECO-92, Rio-92, Cimeira ou Cúpula da Terra).

179 Em sua pesquisa de doutorado, a autora enfatiza que as políticas públicas relativas à temática ambiental em curso no Brasil, desde os anos 1980, se desenvolvem no contexto da reestruturação mundial do capitalismo, sob a ótica da globalização e do neoliberalismo (BATISTA, 2011, p. 47). Aliada a isto, a institucionalização da Educação Ambiental no Brasil se deu no contexto da reforma do Estado a partir dos anos de 1990, com fortes determinações sobre as políticas educacionais. Nesse contexto é que se processa o aparente paradoxo e o dilema entre a política do Estado mínimo e o atendimento a uma nova demanda, a educação ambiental. A retórica neoliberal, ao responsabilizar o Estado como principal responsável pelas crises econômicas por conta de uma suposta ineficiência de

gestão, reifica o mercado, locus da esfera privada, como sinônimo de eficácia, qualidade e

equidade.

Daí nasce a defesa do chamado "Estado mínimo", representando seu redimensionamento na intervenção da vida econômica e social, "despojando-se, estrategicamente, de suas funções tradicionais enquanto provedor de políticas públicas, passando a atuar como indutor e avaliador dessas políticas, exercendo função de regulação" (ibidem). No bojo das políticas neoliberais, a não intervenção do Estado na economia é defendida e efetivada quando se trata da necessidade de políticas públicas que apontem para a redução das desigualdades sociais, a partir da redução das margens de lucro. Admitir essa redução seria uma contradição com os interesses financeiros do capital. Por sua vez, quando se trata da adoção de medidas de proteção à especulação financeira e garantias de lucros cada vez mais ampliados, o Estado é máximo (ibidem). A autora traz como exemplo a crise econômica desencadeada no segundo semestre de 2008, quando tanto nos chamados países desenvolvidos quanto nos "países em desenvolvimento", o Estado assumiu importante papel para salvar essas economias, principalmente com maciças injeções de aporte financeiro. Isto nos lembra que

(...) melhor que ninguém, os representantes dos monopólios sabem que a economia capitalista não pode funcionar sem a intervençãp estatal (...) Na verdade, ao proclamar a necessidade de um "Estado mínimo", o que pretendem os monopólios e seus representantes nada mais é que um Estado mínimo para o trabalho e máximo para o capital. (NETTO; BRAZ, 2012, p. 239)

Neste sentido, não é nenhuma anomalia que tenha sido vetado o artigo 18 da Política Nacional de Educação Ambiental, que estipulava que “devem ser destinados a ações em educação ambiental, pelo menos vinte por cento dos recursos arrecadados em função da aplicação de multas decorrentes do descumprimento da legislação ambiental”. Se inserido na

180 lei 9.795/99, esse artigo possibilitaria não apenas o direito da educação ambiental existir, mas, sobretudo, os meios desta existência (LAYRARGUES, 2002). Não é nosso foco analisar as circunstâncias, argumentações e as disputas envolvidas no contexto deste veto, nem aprofundar aqui as discussões sobre outras possibilidades de financiamento das políticas públicas de educação ambiental, posto que inclusive há outros autores no campo se ocupando deste debate (SOTERO, 2008; SOTERO; SORRENTINO, 2010; SOTERO; LEME, 2010), ainda que com diferentes concepções acerca da natureza do Estado, da sociedade civil e das políticas públicas. A questão é que tal veto representou a perda da autonomia financeira e política, no que diz respeito à marginalização e à subordinação da educação ambiental a outros setores e interesses, como forma de conseguir recursos. Essa carência orçamentária é outro elemento que ajuda no enfraquecimento da educação ambiental na esfera pública estatal e na busca de projetos encampados por ONGs e empresas, em “parceria” ou não com o Estado (KAPLAN, 2011, p. 164), algo próprio das políticas públicas via parcerias público-privadas, no contexto das reformas neoliberais.

Nesse contexto de ausência de adequado financiamento público por parte do Estado, as parcerias público-privadas na educação brasileira ganharam grande impulso nos anos 2000, sobretudo, com a entrada de empresas nas escolas públicas. Desde os anos 1980, verifica-se um processo de difusão de campanhas de Responsabilidade Social Empresarial. A disseminação de instituições de mobilização empresarial no país continuou nas duas décadas seguintes. Nos anos 1990, diversas organizações surgem com o objetivo de mobilizar empresas em torno de uma nova forma de sociabilidade, refletida em projetos de Responsabilidade Social. Neste período se propagam institutos pelo país. Os dois mais importantes foram o Instituto Ethos, criado em 1998 por um grupo de empresários organizados desde a década de 1980 em reuniões na Câmara Americana de Comércio, e o Instituto Akatu Pelo Consumo Consciente (LAMOSA e KAPLAN, 2015, p. 86). O Instituto Akatu surgiu no interior do Instituto Ethos, tendo como apoiadoras a W. K. Kellogg Foundation, criada em 1930 pela indústria de cereais de mesmo nome, e a fundação Avina, fundada em 1994 pelo empresário suíço Stephan Schmidheiny. No mesmo sentido destas iniciativas, as frações associadas ao agronegócio brasileiro criaram, em 2007, o Instituto ARES (Agronegócio Responsável). O ARES se define como

uma entidade que, por meio de metodologia de engajamento, se propõe a facilitar processo de construção de diálogo e identifica- ção de agenda positiva entre todas as partes interessadas do agronegócio brasileiro67.

181 A principal entidade ligada ao ARES é a Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG) que, desde 1993, reúne diferentes frações do capital (urbanas e rurais) entre os seus associados. Em seu site oficial, a ABAG apresenta o ARES com um “centro de referência de

práticas sustentáveis ligadas ao agronegócio no Brasil”68. Estas organizações tiveram a

capacidade de organizar, nos últimos anos, milhares de empresas brasileiras, produzindo uma verdadeira reorganização do padrão de sociabilidade das classes dominantes do país, ou seja, redefiniram as formas de construção do consenso. A sociabilidade corresponde à forma com que homens e classes “produzem e reproduzem as condições objetivas e subjetivas de sua própria existência, sob media- ção das bases concretas da produção, de uma dada direção