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“DECIFRA-ME OU TE DEVORO”

No documento O texto teatral (en)cena (páginas 53-73)

O TERRITÓRIO

“DECIFRA-ME OU TE DEVORO”

A estamparia desse território é buscar conhecer. O fragmento da peça de Caio Fernando Abreu16, nos dita encontros de quereres entre as multiplicidades humanas – que constituem o homem – no caso, dentro de uma casa, para que convivam confinados, até antes do amanhecer...

Os territórios estão aí, para serem descobertos. Para tanto, é preciso pisar; a questão em si não é saber pisar, mas se permitir pisar em campos desconhecidos intentando conhecê- los. Conhecer também não se dá assim, de um pisar para o outro, é preciso andança, de passos de antes e dos que virão. Conhecer está mais bem dito na ideia de reconhecer, de criar, configurar um mapeamento territorial que se constrói ao tempo em que se pisa. Os territórios virão, e cabe aos pés as novas permissões.

Ao buscar conhecer, ou melhor, reconhecer os caminhos possíveis do trabalho com o texto teatral em sala de aula, tem-se firmada a ideia de que o fato de adentrar o território

15 Trecho do texto teatral “Pode ser que seja só o leiteiro lá fora” (ABREU, C. 2009: 64,65).

16 Jornalista e escritor brasileiro, autor do fragmento citado acima, extraído da obra “Pode ser que seja só o

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escolar com esse tipo textual, adentra-se em uma nova história, em uma nova busca de olhos que passeiam pelas linhas desse universo amplo que traz o texto teatral, universo dotado de interpretações tantas que podem nascer através da leitura do mesmo, e, assim, a necessidade de buscar novas maneiras de trabalhar com tal gênero textual no ambiente escolar.

Algum modelo pronto e acabado de leitura e interpretação não cabe nessas questões, isso falando-se não apenas da leitura do texto dramático, mas da leitura de qualquer gênero textual; o conceito não pode ser universal, ele se reconstrói na história do tempo. É sempre processo de acoplamento do que já foi com o devir, então, ao ler, lemos com nossos olhos e com olhos de outrem.

Deleuze e Guattari (2012), em seus escritos sobre o pensamento e a produção de, ilustram a ideia de “pensamento rizomático”, que, se transferirmos para a prática da leitura de um texto, seria este (o texto) a raiz central, e nossas interpretações as ramificações dessa raiz: de qualquer lugar pode nascer algo. Se se possibilita leituras frente a pensamentos estratificados, filia-se a um suporte interpretativo de representação, e não de criação, sendo que é no encontro (no caso, do texto com seu leitor) que se produz uma outra cartografia, um outro caminho, talvez ainda desconhecido, mas que merece ser percorrido, pois traz em sua trajetória vivências históricas de seu leitor. Seria isso o intento em desterritorialização para territorialização que nunca termina: eu me aproprio de algo que existe e ressignifico frente meus gestos de leitura, pela interpretação. Busca-se, assim, uma reorganização disso mesmo. A única coisa que se repete na vida é a diferença.

Ter sempre o pedaço de nova terra (DELEUZE, 2012). A “nova terra” é conquistada a cada linha lida, a cada texto concluído, a cada vida nova que se tateia em si mesmo pelas interpretações que nascem de nós mesmos. Ao interpretar, somos organização a pensar a diferença sobre um modelo e, se todos os modelos são possíveis no plano da consciência; portanto, não há modelos. Não terminamos, e não terminaremos de experimentar o que podem nossas interpretações.

O texto de teatro passeia pelos seus, seus ditos aqui “os leitores”. Utilizar o pronome possessivo “seus” não é em vão. Afinal, tem-se a percepção de captura, de pertença: ler uma peça de teatro e pegá-la para si, ter com ela uma relação de relações que não se finda e que se transmuta de leitor para leitor. Ora, um espetáculo teatral é formado de atores, diretor, produtores, técnicos, cada qual com seu olhar sobre a obra; afinal, são antes de serem o que são, leitores da obra, que significam seus olhares para darem vida à mesma.

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Artaud (1984) em sua obra “O teatro e seu duplo” nos coloca a questão durante toda a leitura (ao menos a mim, leitor de territórios) “O que é uma obra de arte?”, e indagar sobre tal questão nessas linhas desse momento, certamente, oferece a você, leitor do agora, a suscitação pelo mesmo questionamento, pois, afinal, “O que é uma obra de arte?”. Tal indagação vem acoplada também do que é considerado arte, pois cabe um esclarecimento de antemão que está imbricado à coluna dorsal dessa dissertação: ler é uma arte, interpretar é uma obra de arte. Porém, “O que é uma obra de arte?” mantém-se em suspensão de respostas para os novos olhos que hão de vir (em relação a questões relacionadas à prática de leitura) após passeios sinuosos em tímidos pareceres de um leitor de territórios, pois é preciso sempre criar um terreno. Colocar seus gestos de interpretação, potencializando-os.

Os terrenos são formados por micro-percepções, assim, de grão em grão, teremos sempre novos terrenos. Porém, o terreno não precisa estar construído para ser pisado: são ações concomitantes – construir e pisar, para que se tenha possibilidades e permissões de olhar e não apenas de ver.

Ver e olhar não são a mesma coisa. GIL (2004) nos concede (ver ou olhar) a ideia de que ver é uma síntese da consciência – ao ver, percebe-se o mundo; olhar já está relacionado à ideia de compor, de ser atravessado – ao olhar, cria-se com o mundo. Desconstruir e construir o novo sob o decompor/ recompor. Aquilo que já é passa a ser pela forma como o olho. Mais uma vez, tal situação sobre a ótica da prática de leitura significa como as permissões de interpretações que damos e que nos damos, pois interpretar com seus olhos é presentear-se a cada descoberta e sentir-se descobridor que busca sentidos. Qualquer tipo de busca de organicidade é experimentar relações e a única forma é experimentar com técnica qualquer, pois experimentar é dar tempo à própria experiência. Querer foge da relação de receber e receber é uma abertura para si mesmo.

Não se sabe quantos grãos precisa-se para pisar pelos territórios, os territórios não são precisos, porém precisamos deles. Para tanto, seguem pontuações e reflexões que buscam “cartografar” territórios no campo das práticas de leitura, mais precisamente da leitura do texto teatral nas escolas, suas possibilidades e ofertas. Assim, questões da Hermenêutica e de Gênero à luz de Paul Ricoeur (1977), Coreth (1973) e Bakhtin (2003) serão trazidas a fim de possibilitar maior firmeza no terreno em construção.

“Territorializemos” ou “desterritorializemos”, talvez.

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Território desconhecido é difícil de ser pisado. Vai-se tateando pelas beiradas até sentir-se pronto para estar em completude, porém a completude nem sempre é alcançada, tendo em vista que a cada passo dado, novo território é traçado, e assim é sempre: iludimo- nos do alcance para atingir um novo alcance, e os alcances se dão à medida que aceitamos e acreditamos onde estamos pisando.

Ao buscar trazer as questões da hermenêutica para o quadro que compõe a sustentação teórica dessa dissertação, deparamo-nos com a filosofia da linguagem, ao ponto em que a linguagem passa a ser para nós, “pisantes” de territórios a serem descobertos, um lugar de filosofar. Ser alguém em um território é ter consciência e possibilidades de acessar esse território. Paul Ricoeur (1977) é um dos “pisantes” que acredita que a filosofia está imbricada aos caminhos de ser do ser. O discurso filosófico está sob múltiplas possibilidades, ainda que os limites de finitudes estejam postos sobre a perspectiva sobre o que se pretende. Paul Ricoeur assim, ao debruçar-se sobre a linguagem, nos coloca a sensação de querer desvendá- la em totalidade.

Reconhecer a Hermenêutica como uma teoria da compreensão frente à interpretação de textos é o ponto de partida para nossa intenção em explaná-la (dentro de minhas limitações de leitor de territórios) a fim de encontrar interfaces plausíveis que balizem questões da interpretação e o trabalho com o texto teatral em sala de aula.

A linguagem é algo efetivo nos vieses da interpretação, e assim, a hermenêutica possui relações fortes relacionadas à linguagem (RICOEUR, 1977). Relações de imediatismo não estão ligadas à linguagem, que, ao contrário, traz pelas palavras a polissemia. O mediador da linguagem e de seu(s) sentido(s) é quem interpreta e participa - como leitor ou falante - e percebe, e coloca “univocidade de um sentido através da polissemia das palavras” (SANTOS, 160: 2004).

Para Ricouer (1977), a linguagem nasce e está em funcionamento desde os diálogos corriqueiros e informais, porém, quando se dá corpo textual a esses diálogos, tornando-se texto, está aí a necessidade de uma teoria da compreensão, e assim, pode-se dizer que a hermenêutica se dá como uma teoria do texto, como uma “teoria das regras que presidem a

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uma exegese, isto é, à interpretação de um texto singular ou de um conjunto de signos suscetível de ser considerado como um texto”. (RICOEUR, 19: 1977)

Todavia, e é o esperado, que um texto ao ser lido expresse-se de formas diferentes para seus leitores, pois cada leitor traz consigo suas bagagens leitoras que são ativadas e dão sentido ao tempo que significa o que se lê, e os sentidos postos também não são perenes. Eles oscilam até mesmo na significação de um único leitor, que pode gerar novas interpretações daquilo que lê em determinado tempo, espaço e circunstância. Portanto, a linguagem interpretada está à margem do duplo sentido e a “interpretação é a inteligência do duplo sentido” (RICOEUR, 18:1977). Portanto, se é o duplo sentido, a possibilidade de não isto para o aquilo, que circunscreve o debruço do campo hermenêutico, parece que interpretar vem acarretado do problema dos símbolos. “(...) o símbolo é uma expressão linguística de duplo sentido que requer uma interpretação; a interpretação é um trabalho de compreensão visando a decifrar os símbolos”. (RICOEUR, 19:1977)

Se o símbolo é a figura do duplo sentido que necessita de interpretação, então a sua função no texto atribui ao leitor dizer algo que não é o dito, que é diferente do esperado, do que se lê sobre as linhas, mas sim que está nas entrelinhas.

Em todo signo um veículo é portador da função significante que faz com que ele seja válido para outra coisa. Contudo, não direi que interpreto o signo sensível quando compreendo o que ele diz. A interpretação se refere à estrutura intencional de segundo grau que supõe que um primeiro sentido seja construído onde algo é visado em primeiro lugar, mas onde esse algo remete a outra coisa visada apenas por ele. (RICOEUR, 21:1977)

A linguagem é constitutiva e se dá por aproximação, buscando sentidos mais próximos das experiências pessoais. Paulatinamente, vai ela, a linguagem se impondo e construindo-se natural e convencionalmente. Por esse meio Ricoeur busca a racionalidade do fundamento do símbolo que se configura como algo difícil de ser atingido, pois se concretiza pela aproximação e não pelo que se está acostumado a usar. Assim, a construção do símbolo se dá de forma diferente, pois funciona diferente do modelo convencional de interpretação, o que dá a ele, o símbolo, o caráter enigmático que faz pensar. (SPERBER, 2011)

Ainda conforme Sperber (2010), o caráter enigmático do símbolo está na vida, em expressar, compreender como se foi afetado por algo.

O teatro é feito de símbolos textuais, corporais, cênicos, enfim, é composto de um amálgama de símbolos que nascem de experimentações e de olhares que criam com o mundo inserido durante o processo de construção de um espetáculo, pois elencado um texto para

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montagem, os envolvidos imergem em outro mundo, dando vida às vidas presentes no texto. Pois bem, se estamos falando de símbolos e das nascentes de interpretações por eles, cabe aludir à forma de chegada de um texto teatral para um grupo de teatro. Atores leem e significam, diretor lê e significa, e assim se vai, significando caminhos e encontrando símbolos dentro de símbolos. Se assistirmos a uma peça de Tchekhov, teremos traços de um clima cinza, chuvoso, onde os barulhos de goteiras não nos surpreenderão (símbolos cênicos), ou ainda, se assistirmos a uma peça de Nelson Rodrigues, mulheres passivas e andando de quatro com suas nádegas apontadas para o ar fazem parte do universo do autor (símbolos corporais) e serão símbolos presentes para uma montagem. Todavia, esses símbolos nascem dos sentidos (duplos) que o texto traz em si. Ao ler um texto de teatro se passeia pelas entrelinhas, ativando possibilidades que o verticalizem para a interpretação cênica. O caminho das páginas para o palco é revestido de símbolos, estes que tocam os espectadores com, e também, seus duplos sentidos, e assim se vai encadeando símbolos que criam símbolos e tornam-se sentidos pelas interpretações de univocidade. Sempre haverá símbolos enquanto se produz signos para o sentido, que se cansa do mesmo sentido e produz novos que só serão atingidos pelo enfoque de cada um.

A hermenêutica nasce para restaurar sentidos destinados. O movimento que me conduz ao sentido segundo, que não é o explícito, mas o implícito, relaciona-me ao dito. A interpretação não é só descobrir o segundo sentido das coisas, mas universalizar também esse sentido para a reflexão. Uma interpretação advém de várias interpretações que se reúnem substancialmente para a reflexão. Temos, assim, que é a própria hermenêutica e a situação de interpretar interpretações que possibilita a reflexão.

Levar à compreensão pelos caminhos singulares (que são tão plurais) de cada ser. A singularidade da caminhada dita aqui não se estreita à ideia de um único sentido, mas do que te faz sentido. Se somos a história que nos forma, trazemos em nós traços que significaram durante nosso percurso e ressignificamo-nos ao ato que interpretamos aquilo que no momento está em nossas mãos, “(...) porque precisamente não se alcança o verdadeiro sentido, quando se quer separá-lo do fato histórico” (CORETH, 17: 1973). O fato histórico que é o que dialoga com o texto que estamos lendo e que dialoga com nossas formações.

Emerich Coreth (1973) atenta à questão da compreensão apresentada por Heidegger analisando-a na ideia de um “círculo hermenêutico” e conduz a ideia de que

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Toda compreensão apresenta uma “estrutura circular”, visto que só de dentro de uma totalidade já dada de sentido uma “coisa” se manifesta como uma “coisa”, e uma vez que toda interpretação – como elaboração da compreensão – se move no campo da compreensão prévia, pressupondo-a portanto como condições de sua possibilidade. (CORETH, 23:1973)

Para produzir compreensão, a interpretação deve saber o que vai interpretar. Ao termos um texto em mãos, no caso, de gênero teatral, temos muitas possibilidades de interpretação, porém, a compreensão fica instável até se firmar em uma ideia coesa. Se tomarmos por exemplo a estreia de um espetáculo teatral, nela poderá haver cenas, textos, situações que apareçam e que já no segundo dia de apresentação não estejam mais, isso porque, a partir do momento em que se coloca uma interpretação para outras interpretações, se recebe de volta essa interpretação com outros olhares passados por ela; então, pode ocorrer de determinada cena ter surtido um efeito outro, no caso, nos espectadores, ou, ainda, não ter surtido efeito nenhum, daí se compreende de outra forma, e assim o é sempre... Um espetáculo teatral não é acabado em si, ele está sempre em mudança, pois sempre está à prova de outras compreensões que o vão formando e modificando. Se uma peça teatral se engessa, daí surgirá um erro; afinal, um espetáculo estanque não está em funcionamento, está em reprodução, e ao reproduzir, não se recebe, tampouco se passa interpretações e/ou compreensões. Não há imediatismos em interpretações, estas estão em constante mutação.

A constante da interpretação advém do fato de que ao significarmos, na tentativa de interpretar, acionamos o subjetivo e o objetivo que não são propriamente puros; eles vêm arraigados de toda uma trajetória já vivida e que se mantém viva a ponto de podermos encontrá-las e torná-las existentes para nossa compreensão no ato de interpretar. A compreensão age junto, atua com, na tentativa de apreender o sentido da “coisa”. (CORETH, 1977)

Compreensão pela perspectiva da hermenêutica se funda pelo pensamento racional (mediação) e pela visão intelectual (imediatez). Coreth (1973) se ancora em Hegel e explicita que dentro da hermenêutica compreender significa a imediatez, que apreende o sentido, enquanto interpretar seria a mediação, que se enquadra como uma imediatez de compreensão prévia. Há “coisas” que devem ser explicadas, porém outras que devem ser compreendidas. Explicar seria uma retomada do que já é, enquanto compreender se estreita em ter acepção à “coisa” que ultrapassa o sentido que já é dela. Ao afirmamos a compreensão de algo que fora ouvido ou lido, estamos apreendendo o seu sentido. “Compreender significa apreensão de sentido”. (CORETH, 50, 1973)

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A formação do sentido pode nascer pelo homem, que sustenta o sentido com intenções perante algo, objetivo este de mediar para a compreensão. Porém, a formação do sentido também pode nascer em si, pois o sentido pode se desvincular daquele que o cria e tornar-se independente (CORETH, 1973). Por exemplo, tomemos a questão que muitas vezes aparece em livros didáticos: o aluno em sua posição de leitor lê um texto proposto pelo livro didático e, junto ao texto segue um questionário onde aparece muitas vezes a pergunta “O que o autor quis dizer com esse texto?” Ora, se somos nós sujeitos ativos, interpret(ativos), que mediamos nossa leitura para a compreensão pela apreensão do sentido, deveríamos ter a liberdade de ler com nossos olhos, e não preocupados com os olhos de quem escreveu.

Claramente, os símbolos estão presentes no texto (como discorremos acima) e eles oportunizam o acionamento de recursos exequíveis ao que se está lendo no momento, porém, o sentido, ganhando independência, está à mercê de tantas possibilidades de existência, e questionar “o que o autor quer dizer” torna-se um tanto quanto errôneo, na perspectiva de que o dizer pode dizer tantas coisas e tantas “coisas”.

Os significados estão para serem usados ou, ainda, para serem inventados, e, porque não, para serem reinventados. Vagando pelo mundo os significados procuram encaixe para significarem, e o mundo está para o homem em total relação, “não há para o homem auto- realização sem realização do mundo, auto-experiência sem experiência do mundo, nem autocompreensão sem compreensão do mundo” (CORETH, 62:1973), é do ser humano ser e ter o/ um mundo.

Experimentar o mundo é essencial. Criar relações e vivenciar com o mundo abre caminhos às significações de sentidos e valores, e a experiência humana se realiza em grandiosidade. Experienciar o mundo é um ato teórico-prático, é preciso vivê-lo para interpretá-lo. Para interpretar trazemos à tona nosso mundo e mundos outros que talvez não tenhamos vivido, mas já ouvimos falar, porém, a assimilação de nosso mundo vivido com o mundo ouvido se torna presente que passamos a ter a sensação de que outros mundos também são nossos e assim compreendemos por nós através de outros. Uma constante troca de nós com nós mesmos para compreender mundos.

A compreensão é um acontecimento de muitas camadas que vai se edificando por nós e pelos outros que estão em nós. “(...) nunca posso colocar-me dentro do outro, mas estou circunscrito a suas palavras, seus gestos, seu comportamento, pelos quais se faz entender” (CORETH, 58:1973). Colocar-se no outro é uma questão que tange a várias outras ditas até

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então. Eu sou eu mais o que o outro me constrói, então, por mais que não me coloque no outro, há traços do outro em mim que possibilitam à construção interpretações muitas vezes vistas de primeira instância como não possíveis, ou ainda, vistas primeiramente como alguma “coisa”, mas com sentido transferido após outra “coisa”.

O outro preenche as . É como se estivéssemos em um assentamento instável. A cada momento somos um, somos um outro e falamos de posições diferentes por aquilo que falamos. Um padre ocupa um lugar na sociedade, diferente de um professor, diferente de um ator, diferente de um mecânico, porém, um padre pode dar aulas de Teologia, um professor pode ler uma peça teatral, um ator pode trocar um pneu, um mecânico pode ler a bíblia, cada qual com suas formações, capacitações e limites, porém, para isso, acionam vivências vividas ou ouvidas para se fazerem melhores na “coisa” que se propõem fazer. Um ator lerá o texto de teatro com um fim, diferente da finalidade do professor, porém, não com menos ou mais interpretação, mas com seus gestos próprios diante de seu interesse sobre aquilo.

O texto de teatro dentro das escolas não precisa tornar-se sempre que lido uma montagem de espetáculo. A questão é outra! O texto de teatro é lido a ponto de verticalizar-se, sair das páginas para os palcos, virar uma montagem de espetáculo, porém, não são todas as pessoas que têm formação, ou se arriscam para de fato montarem um peça teatral, e isso não

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