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Definição de condutas de policiais militares nos casos de abordagens policiais,

CAPÍTULO 3. AS REGRAS DO JOGO E A ARQUITETURA INSTITUCIONAL

3.3. NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS QUE DESENHAM CONDUTAS,

3.3.3. Definição de condutas de policiais militares nos casos de abordagens policiais,

Um dos mais importantes instrumentos jurídicos a tratar do uso da força letal pela polícia no Brasil é a Portaria Interministerial n. 4.226, de 31 de dezembro de 2010, editada pelos Ministro de Estado da Justiça e o Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, que estabelece diretrizes sobre o uso da força pelos agentes de segurança pública.

A referida portaria leva em consideração a necessidade de orientação e padronização dos procedimentos da atuação dos agentes de segurança pública segundo os princípios internacionais sobre o uso da força e tem por objetivo reduzir gradual e paulatinamente os índices de letalidade oriundas de ações envolvendo policiais militares e outros agentes de segurança pública (BRASIL, 2010). Para isso, ela se baseia em alguns instrumentos legais elaborados na esfera internacional60, conforme previsto na primeira diretriz do anexo que compõe a referida portaria interministerial.

Entre as condutas que devem ser observadas pelos policiais estão: a necessidade de obediência aos princípios da legalidade, necessidade, proporcionalidade, moderação e conveniência por agentes de segurança pública para uso da força, sendo que estes não deverão disparar armas de fogo contra pessoas, exceto em casos de legítima defesa própria ou de terceiro contra perigo iminente de morte ou lesão grave, conforme diretriz 2 e 3, de acordo com o art. 1º da Portaria Interministerial n. 4.226/2010 . Ademais, não é legítimo o uso de armas de fogo contra pessoa em fuga que esteja desarmada ou que, mesmo na posse de algum tipo de arma, não represente risco imediato de morte ou de lesão grave aos agentes de segurança pública ou terceiros, segundo a diretriz 4, conforme art. 1º da mesma portaria (BRASIL, 2010).

Determina ainda a referida portaria na diretriz 5 que, em regra, não é legítimo o uso de armas de fogo contra veículo que desrespeite bloqueio policial em via pública. A exceção fica

60 1. Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, adotado pela Assembleia Geral

das Nações Unidas na sua Resolução 34/169, de 17 de dezembro de 1979; 2. os Princípios orientadores para a Aplicação Efetiva do Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, adotados pelo Conselho Econômico e Social das Nações Unidas na sua resolução 1989/61, de 24 de maio de 1989; 3. os Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, adotados pelo Oitavo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, realizado em Havana, Cuba, de 27 de Agosto a 7 de setembro de 1999; 4. a Convenção Contra a Tortura e outros Tratamentos ou penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em sua XL Sessão, realizada em Nova York em 10 de dezembro de 1984 e promulgada pelo Decreto n.º 40, de 15 de fevereiro de 1991.

72 por conta da hipótese em que o ato represente um risco imediato de morte ou lesão grave aos próprios agentes de segurança pública ou terceiros (BRASIL, 2010).

Cabe ainda destacar que a Portaria Interministerial n. 4.226/2010, proíbe o ato de apontar arma de fogo contra pessoas durante os procedimentos de abordagem de forma rotineira e indiscriminada e determina que, caso o uso da força venha a causar lesão ou morte de pessoa(s), o policial envolvido deverá facilitar a prestação de socorro ou assistência médica aos feridos, além de realizar ações que promovam a correta preservação do local da ocorrência, com a incumbência ainda de comunicar o fato ao seu superior imediato e à autoridade competente, dentre outras ações, conforme a diretriz 10 mencionada no art. 1º (BRASIL, 2010).

Ao lado da Portaria Interministerial n. 4.226/2010, outras normas disciplinam as condutas de policiais em relação ao tema. Segundo Tania Pinc (2007), a Polícia Militar de São Paulo foi pioneira na criação do Método de Tiro Defensivo61 (PMESP, 1999, apud PINC, 2007) e do Guia de Procedimentos Operacionais Padrão – POP (PMESP, 2002, apud PINC, 2007), o primeiro consiste numa técnica de tiro defensivo, introduzido em 1999, que tem por objetivo condicionar o policial por meio de treinamentos práticos de tiro, a se preparar “para oferecer uma resposta racional, em uma circunstância que envolve tensão e medo, e que sua conduta seja capaz de proteger sua vida e de terceiros, preservar a integridade da instituição policial” (PINC, 2007, p. 13) e, o segundo, em disposições administrativas que determinam os procedimentos operacionais padrões (POP), que são disposições que disciplinam as ações policiais quando estes agentes de segurança têm suas ações condicionadas pela percepção do policial sobre a pessoa com quem ele interage (PINC, 2007).

Os procedimentos operacionais padrão eram de acesso público até o ano de 2013, quando a Portaria do Comandante Geral da Polícia Militar, datada de 22 de maio de 2013, dispôs sobre a classificação dos Procedimentos Operacionais Padrão (POP) da Polícia Militar do Estado de São Paulo, em virtude da Lei 12.527/2011 (Lei de acesso à informação) e determinou a classificação no grau de sigilo secreto dos Procedimentos Operacionais Padrão (POP) da Polícia Militar do Estado de São Paulo, estabelecendo prazo de quinze anos de restrição de acesso, contados da data de sua produção. Por consequência, o referido instrumento legal inviabiliza a produção de pesquisas a respeito de como a polícia militar de São Paulo orienta os policiais em abordagens a pedestres, motoristas, vistoria de veículo, busca e apreensão domiciliar, policiamento com motocicleta, dentre outros. Informações fundamentais a qualquer cidadão, tendo em vista os parâmetros legais de um estado democrático de direito.

73 Por fim, ainda funcionam como normas que disciplinam o comportamento de policiais no que concerne a abordagens a deontologia policial-militar, uma espécie de código de ética profissional do policial militar, presente na lei complementar n. 893, de 09 de março de 2001, que instituiu o regulamento disciplinar da Polícia Militar do estado de São Paulo, capítulo II, arts. 6º ao 8º; o art. 23, 25 e 121 do Código Penal, que tratam respectivamente da hipótese de legítima defesa e do homicídio, enquanto tipo penal, e os arts. 186 e 188 do Código Civil, a respeito dos ilícitos civis, itens já discutidos ao longo deste texto.

3.3.4. Processos de responsabilização e consequências legais aos comportamentos desviantes