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Definição da monografia de acordo com as capacidades de linguagem

No documento laurasilveirabotelho (páginas 110-114)

3 PESQUISA E ENSINO: ESCRITA DA MONOGRAFIA COMO PRODUÇÃO DE

3.5 Monografia e as capacidades de linguagem mobilizadas em sua produção

3.5.2 Definição da monografia de acordo com as capacidades de linguagem

Considerando as capacidades de ação, discursivas, linguístico-discursiva e de significação, no processo de construção do gênero, é importante levar o aluno a conseguir entender as condições de produção da monografia na instituição e no campo disciplinar (no caso, Pedagogia/Educação). Dessa forma, importa discutir o significado do desenvolvimento de uma pesquisa em nível de graduação e as responsabilidades éticas que envolvem esse processo. Além do mais, evidenciar ao aluno que a monografia tem como um de seus objetivos apresentar resultados de uma pesquisa, seja de campo, seja de revisão bibliográfica. É necessário, então, levar o estudante a pensar no seu papel social na produção da monografia. Esses textos são escritos visando a alguns interlocutores como o próprio orientador, professores da banca de avaliação e possíveis leitores, como alunos em processo de construção de monografia ou interessados no tema (mais restrito). Quando há o rito de defesa, embora o público não tenha acesso ao texto em si, pode ser parte da audiência, pois entrará em contato com os resultados da pesquisa. Embora a defesa seja um outro gênero, ela é parte constitutiva deste evento (produção da monografia), sobretudo porque é requisito para sua aprovação. Portanto, como também defendemos que “o oral se ensina” (DOLZ; SCHNEUWLY, DE PIETRO, 2004, p. 247), principalmente os gêneros de instâncias públicas formais, a defesa deve ser parte das atividades de ensino-aprendizagem.

Como parte do processo de ampliação dos letramentos acadêmicos do aluno, a discussão em torno das formas de circulação dos gêneros acadêmicos em geral e da monografia especificamente também se faz relevante. Como é fruto de uma pesquisa, a monografia pode ser apresentada em congressos, feiras científicas ou até mesmo, com as devidas adaptações, como um projeto na escola. Isso torna a prática de escrita “real”, situada histórica e socialmente. De acordo com Dolz e Schneuwly (2004, p.), “trata-se de levar o aluno ao domínio do gênero, exatamente como este funciona (realmente) nas práticas de linguagem de referência”.

Usualmente, o texto monográfico circula menos que um artigo, ensaio, resenha – gêneros publicáveis em periódicos de maior alcance. As monografias ficam, portanto, restritas às bibliotecas da própria instituição, sendo consultadas por alunos e professores com interesse no tema ou servindo como modelo para futuros trabalhos. Certas faculdades publicam esses textos em sites institucionais, criando, assim, um banco de dados. Há alguns poucos concursos que premiam melhores monografias de determinadas áreas.

Em termos de extensão, normalmente, é um texto maior que um artigo, mas menor que uma dissertação de mestrado ou tese de doutorado (que também são considerados textos monográficos). Como é um gênero que é solicitado como trabalho de final de curso, tanto de graduação como de pós-graduação latu sensu, é mais elaborado que um trabalho de final de disciplina, pois requer um orientador, que acompanha o processo durante um período maior de tempo (em média um ou dois semestres).

Espera-se do autor da monografia uma maior capacidade de selecionar referências bibliográficas relevantes para a área, além de conseguir delimitar um problema para ser analisado ao longo do trabalho. Essas não são tarefas fáceis de serem feitas, por essa razão, precisam de mediação: quais são as fontes legitimadas socialmente na área do conhecimento? Como delimitar o escopo da pesquisa diante de tantas publicações? São perguntas que para membros menos experientes não são fáceis de serem respondidas.

São legítimas, também, monografias de revisão bibliográfica, principalmente no nível de graduação, em que se busca relacionar, discutir e analisar informações anteriormente publicadas, conforme discutido por Costa (2008). Muitas vezes, as monografias servem de uma “iniciação” à escrita acadêmica mais densa e podem transformar-se em um projeto para futuros trabalhos, como um projeto de pesquisa ou uma dissertação de mestrado. Dependendo do interesse do autor e das condições de produção, a monografia pode, ainda, desdobrar-se em um artigo, reduzindo-se o seu tamanho e fazendo adaptações necessárias para a publicação em periódicos.

Os propósitos comunicativos são muitos, desde o requisito final para a formatura, como a comunicação de um resultado de pesquisa, contato com a escrita acadêmica mais aprofundada, a experiência de pesquisa, um relato de experiência, uma solução para estudo de caso, análises das mais diversas (leis, ações governamentais, livro didático, obra literária etc). Esses objetivos variam de acordo com o lugar e a comunidade discursiva em que esse gênero circula, além da área do conhecimento, evidentemente. De uma maneira geral, são os membros mais experientes que direcionam os tipos de pesquisas em cada campo do conhecimento. Na instituição pesquisada, no curso de Pedagogia, boa parte dos trabalhos era de revisão bibliográfica, a partir de um tema de interesse do aluno, entretanto, muitos se enveredavam para um estudo de campo, que emergia de uma vivência no estágio supervisionado, no trabalho docente ou de uma disciplina, ou ainda de uma experiência de sua história pregressa de letramento.

Em relação ao plano geral do texto é importante elucidar diversos aspectos. Na introdução, temos desde a delimitação do tema, a formulação das perguntas de pesquisa, a

justificativa, os objetivos gerais e específicos e o escopo metodológico, indicativo do escopo teórico usado e a apresentação do trabalho de forma sintética. Uma maneira de fazer isso é ler com o aluno textos modelares, fazendo um mapeamento desses elementos que constituem o corpo do trabalho, evidenciando todas as partes constitutivas do gênero. A fundamentação teórica também requer atenção para várias práticas de textualização e retextualização (MATÊNCIO, 2002), além do gerenciamento de vozes (mecanismos enunciativos) e dos operadores argumentativos e de referenciação (mecanismos de textualização) (BRONCKART, 1999).

O uso da linguagem formal é obrigatório nesse gênero, e as características do discurso científico predominam: vocabulário técnico, objetividade, uso da voz passiva, predomínio de verbos no presente, uso terceira pessoa do singular, primeira do plural (mais raramente, primeira do singular). Por isso, as escolhas lexicais, o uso de modalização (ou não), diferença entre citação direta e indireta são fatores que devem ser explicitados aos aprendizes.

Não vamos discorrer sobre todas as especificidades do gênero em questão, pois isso fugiria aos nossos objetivos. Mas uma importante etapa da construção da monografia é a parte de metodologia de pesquisa. Por essa razão, é importante abordar conceitos como a diferença entre os paradigmas de pesquisa quantitativa e qualitativa, as diferentes modalidades metodológicas como grupo focal, análise de conteúdo, pesquisa-ação, pesquisa colaborativa, etnografia, análise documental etc.

As formas de apresentação dos resultados como gráficos, tabelas, quadros ou uso de programas específicos de pesquisa são itens ensináveis. Outro aspecto que não pode ser ignorado é evidenciar ao aluno o “movimento” do texto da análise que envolve categorização, descrição dos dados, articulação com a teoria e uma reflexão sobre o que está sendo apresentado.

A formatação e edição do texto são itens obrigatórios, mas quase nunca mediados pelo professor/orientador. Portanto, saber usar editor de texto e consultar as normas (e aplica- las) é uma atividade que também faz parte da promoção dos letramentos acadêmicos.

Já os elementos pré-textuais e pós-textuais também devem ser mostrados e, no caso da Instituição, as regras eram aquelas indicadas pela ABNT e pelo Manual de confecção de trabalhos acadêmicos. A produção do resumo, do sumário e das referências bibliográficas também devem ser abordadas em uma prática de ensino do gênero.

Por fim, na busca de evidenciar aspectos mais amplos da produção do gênero como uma forma de ação social (BRONCKART, 1999), acreditamos ser inescapável que o

aluno consiga relacionar a prática de pesquisa com aspectos de sua vida (seja profissional ou pessoal) e que consiga ser autor do próprio texto, construindo representações de sua escrita e de sua identidade.

Como podemos notar, as contribuições do Interacionismo Sociodiscursivo, para abordagens com gêneros, são inúmeras. Nesta proposta de caracterização da monografia, destacamos ainda, acompanhando Cristovão (2015), quatro dimensões que devem ser consideradas para um trabalho didático com o gênero: a) a dimensão psicológica, que inclui motivações e interesse dos estudantes; b) a dimensão cognitiva, que considera o estatuto do conhecimento dos alunos e a complexidade do tema a ser abordado; c) a dimensão social, que envolve as potencialidades do tema a ser trabalhado com os alunos, e por fim, d) a dimensão didática que “comporte o apreensível”, isto é, que seja algo relevante ao processo de ensino- aprendizagem.

As características aqui elencadas não esgotam a discussão, por terem um caráter provisório e até algumas especificidades da área. Ainda sim, consideramos relevante porque, como pondera Motta-Roth (2008, p. 372), “a pedagogia do gênero prevê um debate sobre as situações de produção, distribuição e consumo do texto, os textos em si e seus efeitos”.

4 ABORDAGEM METODOLÓGICA

„Ele [o pesquisador] percebe como está implicado pela estrutura social na qual ele está inserido e pelo jogo de desejos e de interesses de outros. Ele também implica os outros por meio do seu olhar e de sua ação singular no mundo. Ele compreende, então, que as ciências humanas são, essencialmente, ciências de interações entre sujeito e objeto de pesquisa. O pesquisador realiza a sua própria vida social e afetiva está presente na sua pesquisa sociológica e que o imprevisto está no coração da sua prática” (RENÉ BARBIER, 2007, p. 14).

Neste capítulo, pretendemos discutir os pressupostos metodológicos assumidos na pesquisa, além de elucidar os passos realizados para a geração de dados para análise.

No documento laurasilveirabotelho (páginas 110-114)