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Capítulo III. Envolvimento com Nutrição

3.2. Definição e Dimensões do Constructo de Envolvimento

A literatura sobre envolvimento apresenta uma pluralidade de conceptualizações (Mitchell, 1981; Cohen, 1983). No entanto, e como se concluirá, a ideia central que o define é relativamente consensual.

Na sua metanálise sobre a pesquisa em envolvimento, Costley (1988) refere não haver consenso sobre o tema e considera que não há uma definição correta do conceito.

Defende que o termo não pode ser utilizado em sentido global porque os efeitos diferem, dependendo da forma como o constructo é definido.

3.2.1. Discussão sobre a Definição

Em geral, a literatura indica que o envolvimento é conceptualizado e relacionado de forma geral com “importância”, “interesse” e “relevância pessoal” (Antil, 1984; Greenwald e Leavitt, 1984; Krugman, 1966; Mitchell, 1979).

Mitchell (1979) considera que a literatura apresenta dois tipos de definições de envolvimento: um que encara o envolvimento como uma variável de estado (state) e outro como um processo, defendendo que o seu trabalho se enquadra no primeiro. As definições que veem o envolvimento como estado têm as suas raízes na psicologia social e conceptualizam-no em termos da relação entre os valores do indivíduo e um assunto ou objeto. Esta definição, que caracteriza o “ego involvement”, tem sido geralmente encarada na literatura da psicologia social como um mediador dos efeitos de persuasão. Por seu lado, as definições que encaram o envolvimento como processo englobam geralmente processos de aquisição de informação e de decisão. Aqui cabem as definições de Krugman (1966) e de Houston e Rothschild (1978). Mas Mitchell (1979) argumenta que definir o envolvimento como processo pode ser enganador. No entanto, concorda com o facto de que o nível de envolvimento pode ter um forte efeito nos processos de decisão e de procura de informação. Sherif e Hovland (1961, citados por Laurent e Kapferer, 1985) defendem que o envolvimento pode residir na importância intrínseca de um assunto, no seu significado pessoal, posição pública de um tema ou forte emoção face a um assunto. E esta definição contém, em aparente contradição, o cerne do que, na literatura não é consensual: a ideia de o envolvimento ser intrínseco ao objeto ou atribuído pelo indivíduo. Assim, nesta definição, Sherif e Hovland (1961) parece incluírem as duas ideias, ao considerarem tanto a importância intrínseca (residindo a relevância no objeto), como a forte emoção face a um assunto (residindo a relevância no sujeito, o qual a atribui a um objeto).

Por seu lado, Krugman (1966: 584) define envolvimento como “the number of

subject makes between the content of the persuasive stimulus and the content of his own life.”, situando a sua posição na atribuição de relevância ao sujeito e não ao objeto.

Orientações análogas assumem Hupfer e Gardner (1971), ao apresentarem a ideia de o envolvimento constituir um nível geral de interesse ou preocupação relativamente a um assunto, sem referência a uma posição específica e Mitchell (1981), ao definir envolvimento como uma variável de estado interno cujas propriedades motivacionais são evocadas por um estímulo particular.

Rothschild (1984) estabelece que não se deve continuar a tentar atingir uma definição perfeita de envolvimento. Mas deve-se, sim, decidir sobre uma definição genérica aceitável em termos gerais, o que permitirá prosseguir a investigação do tema. E propõe acordo sobre a sua proposta definindo envolvimento como um estado de motivação, entusiasmo ou interesse; este estado existe num processo, é conduzido por variáveis externas atuais (a situação, o produto, a comunicação) e por variáveis internas passadas (duradouro, ego, valores centrais) e tem consequências no tipo de procura de informação, no processamento dessa informação e na tomada de decisão.

Tecendo algumas críticas ao trabalho desenvolvido sobre envolvimento, Cohen (1983) sugere como definição de envolvimento um estado de ativação e, uma vez que um dos aspetos essenciais do envolvimento é a sua seletividade, a ativação é dirigida a uma parte do campo psicológico. Esta ideia de seletividade descreve o foco de atenção gerado pelo indivíduo, excluindo a atenção de outros aspetos da realidade, pelo facto de dedicar uma proporção substancial da sua atenção e de processamento de informação a essa tarefa. Assim, o envolvimento elevado refere-se tanto ao nível de ativação como ao foco de atenção gerado.

O trabalho de Zaichkowsky (1985) adota a ideia generalizada de envolvimento que foca a relevância pessoal, definindo-o como a relevância percebida por um sujeito face a um objeto, baseada nas necessidades, valores e interesses inerentes.

Em suma, a literatura sobre envolvimento centra, de forma geral, a sua definição na ideia de estado ou nível de importância percebida e/ ou interesse evocado por um estímulo (assunto) numa situação específica (Mitchell,1979; Bloch, 1981; Zaichkowsky, 1985; Nowak e Salmon, 1987). Porém, algumas conceptualizações e consequentes operacionalizações

equacionam noções de resposta ao objeto estudado, como a de Krugman, (1966). Efetivamente, apesar de as variáveis interesse, importância, utilidade, saliência, relevância ou ego-envolvimento terem uma definição específica, todas podem ser consideradas sub- conceitos do meta-conceito de envolvimento (Salmon, 1985).

A definição do conceito de envolvimento adotada na presente investigação pode considerar-se uma súmula das visões apresentadas pelos autores estudados, estabelecendo que o envolvimento, sendo variável entre indivíduos, constitui a importância ou relevância que um indivíduo atribui a um evento, tema ou estímulo assumindo-se que efetivamente se estabelece uma relação ou interação entre os dois, tal como defendido por diversos autores, e rejeitando a ideia de que esse interesse é intrínseco ao evento, tema ou estímulo. Assume-se igualmente que o nível de envolvimento influencia a aquisição e processamento da informação, tendo repercussões nos processos comunicacionais, como se verá adiante.

3.2.2. Dimensões do Constructo de Envolvimento

Uma vez que se observam divergências na conceptualização do conceito de envolvimento, a sua operacionalização traduz essa pluralidade de visões.

Assim, a revisão sistemática de Michaelidou e Dibb (2008) evidencia que a operacionalização empírica do envolvimento varia entre uma única dimensão (Hupfer e Gardner, 1971; Traylor e Joseph, 1984; Vaughn, 1980; Zaichkowsky, 1985) e seis dimensões (Bloch, 1981). Em geral, as dimensões reportadas incluem importância (Jensen

et. al, 1989; Lastovicka e Gardner 1979), prazer (Kapferer e Laurent, 1985), interesse (Van

Trijp et.al, 1996; Michaelidou e Dibb, 2008), valor de signo ou autoexpressão (Higie e Feick, 1988; Laurent e Kapferer, 1985; Rodgers e Schneider, 1993) e perceção de risco (Kapferer e Laurent, 1985). A análise de Jensen et.al (1989) a seis escalas apresenta a mesma conclusão sobre o número de dimensões empiricamente derivadas, entre uma e seis, apesar de nem todos os autores e investigações coincidirem entre estes dois estudos.

A investigação de Laurent e Kapferer (1985) revela que o perfil de envolvimento deve incluir quatro dimensões: (1) Importância do risco (Imporisk), considerando a importância percebida do produto e a importância percebida das consequências de uma má compra; (2) probabilidade subjetiva de uma má compra; (3) valor hedónico da classe de produto; e (4) valor simbólico (sign) percebido da classe de produto (Quadro 4.1).

Zaichkowsky (1985) refere que a medida de envolvimento deveria ser aplicada a três categorias: pessoal, relativo ao interesse inerente, valores ou necessidades que motivam a pessoa em relação a um objeto; físico, sobre as características do objeto que causam diferenciação e aumentam o interesse e situacional, considerando algo que temporariamente aumenta a relevância ou o interesse em relação ao objeto. E apresenta evidências para os três fatores: Wright (1974) identificou que a variação no tipo de meios de comunicação (imprensa versus audio) influencia a resposta à mesma mensagem (físico); Lastovicka e Gardner (1979) demonstraram que os indivíduos têm níveis de envolvimento diferentes face ao mesmo produto (pessoal); Clark e Belk (1978) concluíram que situações diferentes de compra do mesmo produto têm diferentes níveis de procura de informação e avaliação (situacional).

No seu estudo exploratório de escala multidimensional aplicado a catorze classes de produto, Lastovicka e Gardner (1979) descrevem o envolvimento em função de duas componentes fundamentais, a importância normativa e o compromisso. A primeira refere-se à ligação que existe entre uma classe de produto e os valores dos indivíduos; a segunda representa uma obrigação que o indivíduo sente em relação à sua escolha da marca. A terceira dimensão identificada, a familiaridade, acaba por se revelar independente das componentes de envolvimento. Com a intenção de estudar a dimensionalidade do envolvimento, Jensen et.al (1989) testam esta escala em três classes de produtos e obtém resultados diferentes, identificando cinco dimensões, não coincidentes com as de Lastovicka e Gadner (1979), sugerindo que o envolvimento, não sendo unidimensional, pode ser dominado por uma dimensão e outras mais periféricas.

A pesquisa de Bloch (1981) aplicada a automóveis propõe seis dimensões do envolvimento: satisfação de condução e utilização de automóveis, facilidade para falar com

outros sobre automóveis, interesse em atividades de corridas de automóveis, autoexpressão através do automóvel, ligação ao automóvel e interesse em automóveis.

Jensen et.al (1989) defendem uma solução de quatro dimensões como a melhor representação de envolvimento. Os resultados sugerem que o primeiro fator parece representar o envolvimento face a vários produtos enquanto outros fatores parecem ser específicos de produto. A existência de diversas dimensões indica que o envolvimento é realmente um constructo multidimensional. Mas o número preciso e a natureza dessas dimensões variam de um produto para o outro (Traylor e Joseph, 1984).

Concluindo, observa-se uma diversidade de visões sobre a definição e o constructo do conceito de envolvimento, sendo notório que essa variações aumentam quando o objeto de estudo é diferente, seja decisão de compra, classes de produto (sem risco e com risco), meios, anúncios de publicidade ou assuntos, uma vez que a sua natureza e a relação que o indivíduo estabelece com ele tendem igualmente a ser diferentes.

No contexto da presente investigação, as definições e constructos que mais se adequam ao conceito de envolvimento a estudar são as que apresentam a visão de envolvimento como uma interação entre um estímulo específico e o indivíduo, assumindo que o envolvimento não existe no indivíduo independentemente do objeto, sendo assim necessária uma relação. Esta ideia parece explicar duas situações: aquela que evidencia que o mesmo objeto é alvo de diferentes níveis de envolvimento por parte de vários indivíduos (por exemplo, classes de produto que foram identificados como de alto envolvimento, caracterizadas por serem de baixa frequência, que envolvem risco, e de preço mais elevado), e ainda a situação que evidencia que o mesmo sujeito apresenta níveis de envolvimento diferentes face a objetos diferentes. Assim, o que parece explicar o envolvimento será então a relação que cada indivíduo estabelece com cada objeto.