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Desarticulação Normativa entre Saúde Mental e Atenção Primária à Saúde: desafios para formação de Redes.

Figura 16 – Nuvem de Palavras da Terceira Categoria.

Fonte: elaboração própria

A terceira grande categoria temática a ser apresentada consiste em Desarticulação Normativa entre Saúde Mental e Atenção Primária à Saúde: desafios para formação de Redes. Dentro desta categoria, estão as seguintes unidades temáticas de análise (ou unidades temáticas que sustentam esta categoria): Reivindicação de Fluxos e Protocolos Claros, O

Matriciamento como Potência e Saída para Impasses e Descontinuidades das Ações e Ausência de Estrutura. Segue abaixo matriz sintética dos conteúdos encontrados e que fazem

parte deste arranjo da categoria:

Tabela 15 – Matriz Sintética de Descrição da Categoria Desarticulação Normativa entre Saúde Mental e Atenção Primária à Saúde: desafios para formação de Redes

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Categoria: Desarticulação Normativa entre Saúde Mental e Atenção Primária à Saúde: desafios para formação de Redes

Definição: Esta categoria se configura enquanto representação das narrativas e conteúdos em que prevalecem as evidências de que existe desarticulação de fluxos e comunicação entre as políticas de Saúde Mental e Atenção Primária, impondo desafios relevantes aos profissionais para o funcionamento de cuidado em rede

Temas Exemplos de Conteúdos Temáticos Significativos

Sujeito 01 Sujeito 02 Sujeito 10

Reivindicação de Fluxos e Protocolos

Claros O Matriciamento

como Potência e Saída para Impasses

Descontinuidades das Ações e Ausência

de Estrutura.

Análise e Síntese dos dados com a Legislação e Literatura da Área Fonte: elaboração própria, com adaptações de Câmara (2013) e Assis (1998) apud Pinto (2008)

A respeito do detalhamento da unidade temática “Reivindicação de Fluxos e

Protocolos Claros”, esta é caracterizada pelos conteúdos e discursos que versam a respeito da

necessidade expressa pelo conjunto de profissionais que sentem uma certa confusão sobre qual seu papel no estabelecimento de práticas de cuidado em saúde mental no campo da saúde da família. Esta categoria, em especial, esta unidade temática está interconectada com as evidências enunciadas na categoria que tratava das deficiências de formação. No entanto, esta unidade temática em si traz as angústias dos profissionais e saber como lidar com a Rede de atenção Psicossocial (que inclui a saúde da família entre seus componentes). Neste sentido, nasce um imperativo de haver alguma orientação mais precisa de estabelecimento de cuidado em rede:

S4: A minha bagagem de conhecimento, eu faço minha avaliação, durante à visita ou então ao atendimento. Mas não tenho nenhum instrumental, nem um protocolo. Foi até uma coisa que a gente discutiu com os residentes da saúde mental, em uma roda integrada justamente essa falta, assim não tem um protocolo que você possa seguir para poder orientar o que é que caso de CAPS. Por que as vezes a gente encaminha o paciente pro (sic) CAPS, aí lá

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dizem que não é o perfil, não é paciente de CAPS.

S2: Como eu te digo a gente é muito leigo nessa parte. Eu não sei como tratar, é diferente de eu te dizer o que pode ser feito para combater o mosquito, a dengue a gente sabe o que tem que fazer. Tuberculose, aí a gente sabe.

Este debate suscita, inclusive, outra discussão pertinente em função da falta de clareza no manejo das situações: afinal, de quem é o paciente? É do CAPS? É da Saúde da Família? Ou será que são todos com alguma parcela de responsabilidade do cuidado? Este debate, por mais que pareça trivial, não o é na realidade dos serviços de saúde. A fragmentação e normatização é tão elevada para dar conta de diversas tarefas que é preciso orientar especificamente qual o papel de cada um. Estes achados de dado de realidade possuem vertentes positivas e negativas para se pensar o cuidado. O fato é que tal debate é real e angustia os profissionais, mesmo havendo pistas sobre o que compete a cada serviço nas políticas oficiais.

S12: [...] porque ainda há aquela coisa é o paciente do CAPS ou é o paciente da unidade básica de saúde, e não que aquele paciente é da rede de serviço e tem que está sendo acompanhado pelos dois. [...] Tratar o paciente como se fosse ou do CAPS ou da Atenção básica, e não de que esse paciente é da área tal ou da rede e do serviço. Era como se fosse algo quebrado, sai de um, sai de outro.

S7: Quando há necessidade, a gente conseguiu ter resposta. Mas como não é uma rotina, então não há muito vinculo. Uma das coisas que eu sinto carência, na verdade assim...é complicado. Na verdade, assim, o ideal é que alguns transtornos que a gente acha que podia controlar a gente pode não ter a mão, as medicações, os medicamentos disponíveis no CAPS.

Uma das descobertas desta pesquisa consistiu no fato do que será apresentado a seguir: o matriciamento tem conseguido ser uma saída interessante para boa parte destas falhas de rede, bem como para prestar auxílio diante do sentimento de desamparo técnico e de assistência por parte de boa parte dos profissionais entrevistados.

A respeito do detalhamento da unidade temática “O Matriciamento como Potência e

Saída para Impasses”, esta é caracterizada pelos conteúdos e discursos que versam a respeito

do reconhecimento por parte dos profissionais que o matriciamento é uma ferramenta que amplia possibilidades de estabelecimento de projetos de cuidado e articulação de rede, apesar das fragilidades apontadas até o presente momento.

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S16: A gente ainda tem uma certa facilidade por conta do matriciamento que a gente acompanha nas outras unidades, dá pra (sic) tirar aquele mistério, a questão do bicho de sete cabeça que é lidar com paciente de saúde mental. Lá a gente tem estudo de caso, que vai deixando a gente mais confiante para saber como agir.

S1: Apesar de que, não ser uma área que eu me encante tanto. Mas devido as necessidades, eu passei por um matriciamento, que foi muito bom pra (sic) mim. Hoje eu tenho bem mais facilidade, depois do matriciamento. Antes não, antes se eu desconfiasse que o paciente talvez, tivesse com algum problema nesse sentido, eu já encaminhava para o especialista. Depois que eu fiz o matriciamento que foi um curso todo o curso com preparatório de teoria e durante 6 meses com a psicóloga e a psiquiatra me acompanhando dentro do consultório. Eu atendendo e elas dando suporte.

S3: E a gente tá (sic) tendo matriciamento com o psiquiatra do CAPS aqui, que ele vem de quinze em quinze dias. E tem esse apoio pra (sic) gente. A gente aprende bastante, tanto eu, quanto a médica e as agentes de saúde. Ele às vezes acompanha o caso, quando é um caso mais assim, a gente fala e ele vai, faz a visita junto com a equipe. Tá (sic) sendo muito importante mesmo, a gente tem melhorado bastante.

Ou seja, o matriciamento tem sido uma estratégia bastante elogiada e potente no sentido de permitir uma conexão real entre os campos da saúde mental e atenção primária. Há evidências em todas as unidades pesquisadas que esta ferramenta é o que tem “salvado” (palavras dos entrevistados) as equipes do colapso no cuidado com pacientes e familiares dos pacientes com alguma questão de saúde mental. Apesar da potência dos momentos de encontro para fazer matriciamento, há um problema central que se relaciona com a próxima unidade temática: a descontinuidade das ações e a falta de estrutura de rede.

A respeito do detalhamento da unidade temática “Descontinuidades das Ações e

Ausência de Estrutura”, esta é caracterizada pelos conteúdos e discursos que versam a

respeito dos sentimentos de frustração que os profissionais expressão ao ver ações importantes serem descontinuadas ou por perceberem que muitas ações não podem ser feitas por falta de estrutura básica.

S12: Essa questão que S14 citou agora é seguinte, já houve aqui em Iguatu um início dessa questão do matriciamento em outras unidades. Até iniciou de certa forma bem, mas começou a desandar e eu vejo os profissionais reclamando que não deu certo, não tá (sic) mesmo havendo. O pessoal da saúde mental, se reuniu com a gente a pouco tempo para sugerir...

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financeiramente aquilo. Nós profissionais bancamos para que a gente faça alguma coisa melhor. Porque o serviço não oferece. Então, fica muito difícil de você levar a coisa para frente.

Neste sentido, os processos de descontinuidade e o sucateamento influenciam diretamente o desestímulo das poucas ações de resistência que os profissionais sustentam no cotidiano dos serviços. Esta é uma face cruel do serviço público de saúde, em especial dos contextos de trabalho na saúde da família. O profissional é forçado a trabalhar sem estrutura básica e ainda tem sabotas as iniciativas de inovação, de recriar os possíveis caminhos do cuidado. Apesar deste cenário, existe uma aposta relevante que os momentos de encontro ainda são os fundamentais que sustentam a proposta de rede.

Um elemento curioso e interessante que fez parte das descobertas do campo de pesquisa, consiste em constatar que nas unidades de saúde investigadas, as equipes de apoio (NASF) ou as ações de saúde mental possuem tamanha invisibilidade estratégica que sequer constam na placa de serviços declarados à população. Se partirmos do princípio de que imagens, por vezes, dizem mais que mil palavras, pode-se concluir que estas abaixo dizem muita coisa a este respeito:

Figura 17 – Serviços existentes na Unidade Flávio Marcílio - Fortaleza

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Figura 18 – Serviços existentes na Unidade Matheus Fernandes Morero (Cohab e Novo Iguatu) - Iguatu

Fonte: material de campo

Quando esta pesquisa se refere à desarticulação normativa, no título desta categoria, entre os campos da saúde mental e a atenção primária, está se referindo a uma certa “esquizofrenia normativa” entre as duas políticas. Este fator perpassa todas as unidades temáticas acima citadas. Um exemplo ilustrativo desta tese consiste no seguinte: verificou-se que existe certa invisibilidade da temática Saúde Mental nas legislações que versam sobre Atenção Básica ou Atenção Primária.

O mesmo acontece quando se faz o cruzamento contrário entre as legislações. Quando as temáticas aparecem nas legislações, estão permeadas de fragmentação e sentido vago. Para esta categoria foram analisadas as legislações de saúde mental de 1990 até 2004, as legislações da Política Nacional de Atenção Básica e os Relatórios de Gestão em Saúde da Prefeitura de Iguatu e da Prefeitura de Fortaleza, sendo todos os relatórios do ano 2014, bem como outras legislações pertinentes.

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É possível perceber outro dado interessante ao analisar o documento instrutivo do PROGRAMA NACIONAL DE MELHORIA DO ACESSO E DA QUALIDADE DA ATENÇÃO BÁSICA (PMAQ), uma das principais iniciativas de reorientação dos cuidados da atenção primária com vistas à melhoria da qualidade e do acesso, no quesito saúde mental, tem-se o seguinte com conjunto de marcadores:

Tabela 16 – Quadro Síntese dos Indicadores do PMAQ

Fonte: Ministério da Saúde

Um olhar mais atento do leitor, será possível perceber um dado importante: a saúde mental não possui indicadores de desempenho na Estratégia Saúde da Família. Isto diz muito das contradições sistêmicas que o poder público tem a respeito da articulação entre os campos de fronteira da APS e da SM. Não existir indicadores de desempenho para uma temática tão importante quanto a Saúde Mental é no mínimo uma afronta sanitária, pois epidemiologicamente já há evidências suficientes que os transtornos mentais e a produção de condições para estabelecimento de saúde mental é uma das prioridades da atualidade segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS).

Importante se faz destacar que, esta “esquizofrenia normativa”, somada às dificuldades acima relatadas contribuem para a fragilização de qualquer proposta de rede de cuidados em saúde. A efetivação de ações de rede tem ficado a cargo e resistência dos profissionais que insistem em buscar alternativas diante dos impasses, principalmente pela via do matriciamento.

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4.4 Conjunto de Discursos e Práticas de Cuidado em Saúde Mental com Tendências