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O resultado desta pesquisa se configura como uma das iniciativas de investigação deste espaço de fronteira na política pública de saúde, ou seja, consiste de um esforço científico de compreensão das relações existentes entre o campo da Atenção Primária à Saúde (APS) e o campo da Saúde Mental (SM).

Ressalta-se que esta pesquisa faz uma opção de recorte político quando se refere ao contexto da Atenção Primária à Saúde e ao contexto da Saúde Mental (SM). Vale destacar que existem diversas formas de se operacionalizar a atenção à saúde, bem como de se desenhar os modelos de cuidado na APS e na SM. A Estratégia Saúde da Família (ESF) é a opção de modelo de APS de que esta produção tratou em suas investigações pelo entendimento de que é o modelo mais adequado e eficiente9 considerando a experiência brasileira desde a estruturação do Programa Saúde da Família (PSF) nos anos 1990, para o fortalecimento de um cuidado em saúde com vistas à vinculação entre os serviços de saúde e usuários, longitudinalidade das ações, trabalho com equipe multiprofissional e enfoque na atenção à saúde da família e da comunidade de acordo com os entendimentos de Andrade, Barreto e Bezerra(2009).

No campo da Saúde Mental, esta pesquisa optou por desenvolver seu escopo teoricamente alinhada com as diretrizes da Luta Antimanicomial e os paradigmas da Reforma Psiquiátrica Brasileira. O detalhamento a respeito dos fundamentos destes recortes e escolhas da pesquisa serão melhor explicitados ao leitor na seção de referencial teórico.

Considerando o levantamento inicial dos estudos realizados sobre os campos de conhecimentos em saúde tratados neste projeto, é possível perceber que existe muito interesse de pesquisa e de intervenção na fronteira entre Atenção Primária em Saúde e Saúde Mental.

9 Considerando diversas pesquisa de caráter abrangente, inclusive os resultados apontados por Luppi, el al

(2011), tem-se que: o desempenho do PSF foi regularmente melhor do que o de serviços tradicionais, tanto no Sul como no Nordeste. Este achado coincide com a literatura e com a percepção dos gestores de que o PSF é mais adequado ao funcionamento do sistema municipal de saúde e conta com maior adesão dos profissionais de saúde do que o modelo tradicional (p 349)

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Na primeira etapa da revisão bibliográfica deste estudo, feita com a busca integrada e utilizando os descritores em saúde “Atenção Primária à Saúde” e “Saúde Mental”, nas bases de dados ligadas à Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), mais especificamente nas bases LILACS, IBECS, MEDLINE; foram encontrados 6.587 estudos no total. Este primeiro dado é demonstrativo do interesse de pesquisa que estes descritores possuem na literatura científica.

Ao refinar a busca, por meio da articulação dos descritores “Saúde Mental” e “Atenção Primária a Saúde” nos filtros da busca, nota-se que existe uma predominância expressiva de assuntos principais que versam sobre “Atenção Primária à Saúde” (3661 estudos), “Transtornos Mentais” (800 estudos) e “Serviços de Saúde Mental” (590). Este dado breve e ilustrativo de revisão chama atenção pelo fato de o interesse dos estudos na articulação da APS e SM estarem majoritariamente centrados na doença e na investigação de aspectos relativos à institucionalidade das políticas e seus serviços. Neste sentido, este trabalho busca evidenciar algumas contribuições com o intuito de trazer a saúde (em sua complexidade) para a centralidade do debate da reforma sanitária e da pesquisa em saúde.

Ainda no esforço de busca de estudos sobre o campo de fronteira, notou-se que outra fonte de referências importantes consiste nas publicações governamentais sobre a temática. Existem algumas referências de interface interessantes sobre Atenção Primária à Saúde (denominada pelo Ministério da Saúde do Brasil de Atenção Básica) e Saúde Mental, dentre elas, cita-se: o Caderno de Atenção Básica nº 34 – Saúde Mental (2013); o Caderno de Atenção Básica nº 39 – Núcleo de Apoio à Saúde da Família (2014); Caderno de Atenção Básica nº 28 – Acolhimento à Demanda Espontânea, volumes I (2011) e II (2012) e o Guia de Matriciamento em Saúde Mental (2011). Estas são publicações de referência para formação de equipes que pretendem atuar nestes campos.

Percebe-se, preliminarmente, que existe um esforço acadêmico, científico e governamental na busca de caminhos para lidar com os problemas e potencialidades da fronteira existente entre a Atenção Primária à Saúde e a Saúde Mental nos serviços e na estruturação das referidas políticas.

Destaca-se que uma das motivações para a realização desta pesquisa surgiu de inquietações do autor e de uma parte dos colegas de trabalho no sentido de compreender como

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lidar, de forma coerente, com as demandas de saúde mental percebidas no cotidiano do serviço de saúde de base territorial, em especial no contexto da Estratégia Saúde da Família. Uma das percepções iniciais consistiu em constatar que existe um incômodo entre os profissionais aos quais tive acesso no cotidiano de trabalho com a fragmentação de redes entre saúde mental e atenção primária.

Outra percepção do autor em sua rotina laboral consistiu em notar que há medo e estigma por parte dos profissionais das Equipes de Referência de Saúde da Família (EQRSF) e das equipes do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) em cuidar de usuários, ou de suas famílias, que apresentam alguma demanda de saúde mental em sua trajetória terapêutica. Estas percepções rudimentares e importantes, oriundas da experiência profissional do autor em diversos territórios, permite levantar alguns questionamentos orientadores: afinal, como as demandas de saúde mental podem ser cuidadas? Os profissionais da ESF se sentem preparados para cuidar de demandas de saúde mental em seu cotidiano de trabalho? Quais são os caminhos possíveis para se estruturar práticas de cuidado atentas à Saúde Mental na Estratégia Saúde da Família?

É possível notar que existe um campo de possibilidades em aberto tanto para a pesquisa quanto para as intervenções na temática tratada nesta pesquisa. Diante do contexto explicitado, este trabalho se insere na articulação de esforços para produção de conhecimentos com vistas à construção de um sistema de saúde orientado para a integralidade do cuidado, para o fortalecimento de políticas de caráter territorial, em especial na estreita articulação entre a Atenção Primária à Saúde (com foco na Estratégia Saúde da Família) e a Saúde Mental.

Constituiu-se enquanto objetivo principal desta dissertação “compreender as práticas de cuidado desenvolvidas pelos profissionais na Estratégia Saúde da Família (ESF) no estado do Ceará para com as demandas de saúde mental existentes nos territórios de responsabilidade das equipes”. Os objetivos específicos foram: “Sistematizar as práticas de cuidado desenvolvidas pelos profissionais na ESF para com as demandas de saúde mental existentes nos territórios adscritos pelas equipes em um contexto de capital e em um contexto de interior do estado”; “Comparar as práticas de cuidado relatadas pelos profissionais das equipes de saúde da família e as ações defendidas pelas políticas oficiais que tratam das

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demandas de saúde mental nos territórios” e “Construir síntese analítica com possíveis avanços, retrocessos e desafios da articulação do cuidado para com as demandas de saúde mental nos territórios”.

Ou seja, o delineamento do objeto de pesquisa se caracteriza por uma iniciativa de compreensão de práticas de cuidado neste campo de fronteira. Para lograr tal intento, norteou- se pelo seguinte questionamento central: quais as práticas de cuidado desenvolvidas pelos profissionais na Estratégia Saúde da Família (ESF) no estado do Ceará para com as demandas de saúde mental existentes nos territórios de responsabilidade das equipes?

Na busca de pistas para esta pergunta norteadora, o leitor será apresentado na seção de Metodologia ao caminho de investigação trilhado pelo pesquisador, considerando todos os aportes teóricos e instrumentais necessários para buscar no campo as informações para reflexão do objeto. Na seção Referencial Teórico, o leitor será apresentado aos marcos teóricos, políticos e epistemológicos que sustentam o olhar do pesquisador sobre as análises desta produção. A seção de Resultados trata o compilado dos principais achados desta pesquisa para que na seção de Análise e Discussão sejam debatidas as questões levantadas pela reflexão e confronto sintético entre o material de campo e os conteúdos da literatura. A seção Sugestão aos Profissionais: caminhos e possibilidades apresenta algumas propostas deste trabalho com base na análise crítica dos dados no sentido de permitir que algumas intervenções sejam feitas nos cotidianos dos serviços de saúde se houver interesse dos participantes. Esta seção está intimamente articulada com as Conclusões desta pesquisa com o intuito de elencar opções de mudança e ressignificação dos serviços aos trabalhadores com base na síntese analítica dos avanços, retrocessos e desafios da articulação do cuidado para com as demandas de saúde mental nos territórios.

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2 METODOLOGIA

Nesta seção, serão aprofundados as razões dos recortes e escolhas feitos nesta dissertação, bem como serão devidamente justificados os horizontes metodológicos que foram utilizados para abordar os problemas e inquietações pesquisadas.