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A descoberta do âmbito translógico a partir da Lógica objetiva de E Lask Aspectos centrais da doutrina de Lask haviam de impressionar profundamente o jovem

POSICIONAMENTO DO JOVEM HEIDEGGER FRENTE À PROBLEMÁTICA TRANSCENDENTAL

1. O desenvolvimento inicial da posição heideggeriana frente à problemática nuclear do neokantismo

1.1 A descoberta do âmbito translógico a partir da Lógica objetiva de E Lask Aspectos centrais da doutrina de Lask haviam de impressionar profundamente o jovem

Heidegger. De tal modo que “Ser e Tempo” ainda apresentaria traços dessa influência 16. Por isso, a importância de aqui destacarmos a contribuição de Lask no desenvolvimento da tendência à facticidade na filosofia de Heidegger. Visto que, será precisamente Lask que fornecerá a indicação para a ascensão da vitalidade na tese de habilitação. A releitura das obras de Duns Scotus, a partir de uma perspectiva da filosofia transcendental de Kant, operada por Heidegger, encontra em Lask a mecanicidade conceitual necessária para uma reafirmação da metafísica no contexto da filosofia transcendental. A tentativa de reafirmar a metafísica em meio aos desafios postos pela Modernidade é impulsionada intimamente pela problemática pessoal que inquietava o jovem Heidegger – a unidade do ser na pluralidade de suas significações.

Lask abre um caminho para às pretensões de Heidegger por meio de sua Lógica objetiva, que surge como proposta a partir de seus debates com Rickert sobre a natureza da “verdade e valor”. Rickert acreditava que “verdade e valor” se dão nos atos judicativos que compõem a subjetividade. Lask, porém, opunha-se a tal opinião, e prescindindo do sujeito, acreditava que a verdade vem à tona nas formas e categorias do objeto mesmo da realidade. Lask não negava a existência da subjetividade assim como havia sido concebida na Modernidade, nem tão pouco a ovildava como fazia a Escolástica, concedendo-a como mera natureza espiritual. De fato, a argumentação de Lask se dá em meio à bipolaridade transcendental sujeito-objeto, tal como a entendia Kant. Sua contribuição, porém, revela-se no argumento de que o objeto em sua dualidade de matéria e forma precede a subjetividade. Isto, ele expressa em sua teoria da “supercontrariedade”, que preconiza que antes de qualquer ato

16 Macdowell confirma esta influência, ao afirmar que: “Traços das concepções de Lask são claramente visíveis

em certas posições básicas de Sein und Zeit. O realce que ele dá à dupla forma e material terá aberto o caminho para a distinção fundamental entre ser e ente, ôntico e ontológico, obscurecida no Neokantismo ortodoxo.” (MACDOWELL, 1993, p. 68).

judicativo – verdade e falsidade, afirmação e negação – o objeto já está presente na consciência como conteúdo significativo enquanto tal. (MACDOWELL, 1993, p. 63).

Com isso, a dimensão Lógica torna-se imanente à própria realidade; valor e realidade já não são mais dimensões autônomas, mas a forma do objeto que se eleva na consciência é o que determina a eclosão da verdade. O conhecimento é, de fato, conhecimento do objeto material em sua forma necessária. Lask força a argumentação visando suprimir a inacessibilidade da consciência à coisa-em-si, isto ele faz pela recuperação das teorias platônico-aristotélicas para o contexto da Lógica transcendental de Kant. Sendo assim, para Lask, se existe alguma bipolaridade, esta só pode ser descrita em termos de forma sensível e material experimental, que é, respectivamente, um retratamento da oposição platônica entre mundo inteligível e mundo sensível. Já a concepção aristotélica de síntese entre forma e matéria, funciona para Lask como a efetiva possibilidade das verdades como os próprios objetos concretos.

Mas esse estreitamento entre realidade e Lógica é apenas a preparação de Lask para um mergulho mais profundo, que despertaria sobremodo o interesse de Heidegger – o salto para a dimensão das forças vitais. O material sensível é o material de uma vivência que por meio de sua forma manifesta-se teoreticamente na consciência. Deste modo, é a vida que é elevada ao plano lógico; e mais, “Lask anuncia o princípio da especificação das formas pelo material” (MACDOWELL, 1993, p. 66), ou seja, a Lógica expressa na totalidade das categorias – as quais possibilitam a inteligibilidade – não provém do próprio plano Lógico, mas do material vivido. A forma é o produto de uma estabilização em caracteres universais do riquíssimo material da vida, que não se exaure na forma, possibilitando, assim, o conhecimento.

A ideia de que a vida antecede as estruturas lógicas, iria impressionar profundamente o jovem Heidegger. Porém, procurando esquivar-se da possibilidade de um idealismo intenso e fechado, visto que o material se impõem absolutamente à consciência em sua forma dada, Heidegger procura, em sua tese de habilitação, um meio termo entre Lask e Rickert. Para Heidegger, Lask havia prescindido “demais” da subjetividade. Heidegger procurara manter os resultados de Lask, mas realçando as inferências dos atos judicativos – preconizados por Rickert – no conhecimento, e, portanto, garantindo a posição determinante do sujeito transcendental. Heidegger aceita o movimento objetivo através do qual as categorias são estendidas ao ser. Pois, tal ideia favorece decisivamente o projeto de recuperação da

metafísica em meio ao contexto da filosofia transcendental. Mas, inexoravelmente, a verdade vem à tona no juízo, e, portanto, pela elevação do ser no plano lógico. Não se pode simplesmente abdicar da consciência e seu comportamento, a verdade é detonada pela estrutura lógica que compõe a subjetividade transcendental.

A força vital que determina a estrutura lógica é um pressuposto do qual Heidegger não quer abrir mão, se, de fato, pretende levar a cabo o projeto de reestabelecer a metafísica. Porém, como fazer coincidir a ideia de categorias que se originam do ser com a doutrina do juízo? O idealismo de Rickert, com sua noção de valor absoluto, imobiliza a riquíssima profusão do ser na vida subjetiva. Por outro lado, Lask introduz o elemento vital, mas se fecha num idealismo absoluto. Para garantir a interferência do sujeito, bem como manter a subjetividade em imediata relação com a vida, Heidegger recorre a teoria husserliana da intencionalidade. Segundo esta última, o objeto do conhecimento é resultante da “intenção” do sujeito que é determinada pela situação concreta da vida. Uma mesma matéria pode apresentar na consciência uma diversidade objetiva, que será determinada pelos atos intencionais. Husserl mantém, portanto, o sujeito em sua função constituinte do ente, mas eleva a vida para o nível da consciência.

1.2. Invocação da intencionalidade da consciência transcendental na obra de

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