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4.2 A HISTÓRIA DA FUNDESTE DE CHAPECÓ

4.2.1 Primeira fase: a implantação da FUNDESTE (1970 a 1975)

4.2.1.1 Descrição na percepção dos entrevistados

Conforme Bellani (1997), nos idos dos anos 60 o oeste catarinense começava o processo de desenvolvimento agro-industrial, tendo como expoente o município de Chapecó. No entanto, a região tinha pouquíssima comunicação com a capital do estado e com as regiões litorâneas. Para estimular a integração do oeste, chamado de celeiro catarinense, no contexto estadual e por pressões das lideranças políticas oestina, o Estado criou em 1963 a Secretaria dos Negócios do Oeste.

Sucedendo Serafin Enoss Bertaso, em 1970 assume esta Secretaria o líder político e empresário Plínio Arlindo de Nês, um dos fundadores da Sociedade Anônima Indústria e Comércio Chapecó – SAIC, que posteriormente deu origem às organizações Chapecó.

Por convocação de Plínio de Nês, em março de 1970, se reúnem em Chapecó os prefeitos municipais, deputados estaduais e federais da região, para participarem da reunião pró-desenvolvimento regional. Na pauta da reunião constava a conclusão da BR-282, aparelhamento de escolas, postos de saúdes e delegacias e a implantação do ensino superior.

Tais reivindicações decorriam de anseios das comunidades oestina, ou pelo menos de sua elite. Segundo Bellani (1997), neste período, a imprensa dava ampla cobertura ao movimento em prol do ensino superior, do qual se engajavam alunos secundaristas, professores e empresários. Um fato que retrata este movimento ocorreu em março de 1970, quando, participando de um seminário sobre educação, o então reitor da UDESC, professor Celestino Sachet, em um debate com alunos do colégio São Francisco, ouviu reivindicações da juventude, que inclusive portava cartazes clamando por universidade. Este movimento institucionalizou-se, sendo amplamente discutido e recebendo o apoio da Assembléia Legislativa do Estado.

Em 04 de julho de 1970, em reunião realizada no Clube Recreativo Chapecoense, sob a presidência de Plínio de Nês, que contou com a participação dos prefeitos da região oeste, deputados estaduais e federais da região, do Bispo Diocesano Dom José Gomes, dos representantes das Coordenadorias Regionais de

Educação de Chapecó e São Miguel do Oeste, dos presidentes de clubes de serviços, dos empresários, da imprensa e de outras lideranças, foi constituída juridicamente a FUNDAÇÃO UNIVERSITÁRIA DO DESENVOLVIMENTO DO OESTE – FUNDESTE. Neste ato os prefeitos municipais entregaram as leis municipais aprovadas, o que colocava 33 municípios na condição de co-mantenedor da FUNDESTE, comprometendo-se a repassar 1% (um por cento) das suas receitas para a manutenção da instituição. Apenas o município de Chapecó, por sediar a FUNDESTE, assumiu repasse da ordem de 2% (dois por cento).

A primeira diretoria eleita foi assim constituída: na presidência, Plínio de Nês; vice-presidente Dom José Gomes; secretário Vinicius Tortato; Hélio Wassun, Paulo Rescke e Antônio Pompermayer como membros; e João Destri, Gilberto Goercke e José Ebling para o conselho fiscal.

O principal objetivo da criação da FUNDESTE era oficializar o interesse da sociedade oestina na implantação do ensino superior, incentivar sua mobilização, bem como permitir a arrecadação de recursos, que advinham de cotas dos municípios e de doações diversas.

Neste ínterim, Bellani (1997) menciona que, no plano de governo de Colombo Sales (1971 a 1975), denominado de Ação Catarinense de Desenvolvimento, o ensino superior representava uma prioridade, expressa em um de seus objetivos: a formação de recursos humanos necessários ao desenvolvimento cultural e científico da sociedade catarinense.

Criada a FUNDESTE, sua diretoria assinou convênio com a UDESC, para que a mesma elaborasse um estudo de viabilidade técnica e financeira para instalação de curso de nível superior em Chapecó, o qual foi concluído em janeiro de 1971.

O ESTUDO DE VIABILIDADE (1971) continha ampla explanação sobre os avanços e projetos para o ensino em geral, após o golpe militar. Também apresentava uma radiografia do ensino superior no estado, com fundações já criadas em Blumenau (FURB), Joinville (FUNDAJE), Itajaí (FEPEVI), Lages (UNIPLAC), Tubarão (FEESC), Rio do Sul (FEDAVI) e Criciúma (FUCRI), bem como projetava a expansão, na qual Chapecó se inseria.

Um fato curioso, descrito por Bellani (1997), é que, naquela época, existiam poucas escolas de segundo grau no oeste catarinense, quais sejam: os colégios São Francisco (Marista) e o Bom Pastor em Chapecó, o Colégio La Salle em Xanxerê e o

Colégio Peperi (Lasallista) em São Miguel do Oeste. É possível supor que as reivindicações em prol do ensino superior visavam atender a uma elite, bem como fazia parte de um plano político estadual do qual o oeste não queria ficar de fora.

Para implantar o ensino superior foi indicado, em reunião do dia 23 de abril de 1971, o professor da UDESC Altamiro Morais de Mattos. A Pedagogia foi escolhida como primeiro curso a ser implantado em função da necessidade de capacitação de professores para atuar no ensino fundamental e médio, que se encontrava em precária situação, onde apenas 4,5% dos professores (de um total de 832) estavam habilitados para o exercício do magistério (IOP, 1997).

O processo solicitando autorização para o funcionamento da Faculdade de Ciências da Educação - FACIE, com o curso de Pedagogia, foi assinado em 15/10/ 1971 e aprovado pelo Conselho Estadual de Educação em 7/12/1971.

O convênio assinado com a UDESC previa que tal instituição ficaria responsável pelos processos de seleção dos professores e pelo concurso do vestibular, que selecionaria as duas primeiras turmas de alunos (uma vespertina e outra noturna), cujo edital para abertura das inscrições ocorreu em 27 de dezembro de 1971.

No dia 21 de fevereiro de 1972 o Prof. Altamiro de Moraes Matos foi nomeado Diretor-Implantador da Faculdade de Ciências da Educação da FUNDESTE, juntamente com os 11 professores que atuariam no primeiro semestre (IOP, 1997).

O professor Altamiro de Moraes Mattos transferiu-se de Florianópolis para Chapecó, juntamente “com um grupo formado por seus ex-alunos da UDESC”, que na FACIE/FUNDESTE tornaram-se professores e colaboradores da direção. O professor Altamiro assumiu “cumulativamente as funções de Diretor Administrativo e de Diretor do Centro de Ensino Superior”, assessorado na parte acadêmica pelas professoras Sueli Petry da Luz e Lourdes Alves, então secretária acadêmica (entrevistado H-8).

Um destes colaboradores menciona que:

A gente saiu daqui para ir lá [...] abrir a primeira faculdade de ensino superior no oeste [...] Só Chapecó é que tinha e em seguida começou em Joaçaba. A gente começou um curso superior num local onde ninguém sabia o que era ensino superior [...] E todas as dificuldades que a gente enfrentou [...] para estruturar tudo isso, quando até para se deslocar para outros centros, na época não tinha a 282, [...] a gente vinha pelo lado do Rio Grande do Sul (entrevistado J-10).

Faculdade de Ciências da Educação da FUNDESTE, no prédio do Seminário Diocesano Nossa Senhora da Assunção. Nesta primeira turma, o empresário e presidente do Conselho Deliberativo, Plínio de Nês, ingressou como acadêmico de Pedagogia, via vestibular, justamente para estimular a procura pelo curso superior. Ele cursou e conclui Pedagogia, mesmo tratando-se de uma área na qual não atuava, devido aos seus compromissos como empresário e líder comunitário.

Tal episódio é evidenciado na fala do entrevistado E-5:

Curiosamente quando criou-se aqui o primeiro curso, de Pedagogia, na busca de alunos, ele, como um grande empresário, bem sucedido e entusiasta, tendo sido inclusive secretário de negócio do oeste, ele fez o vestibular, se matriculou, fez e concluiu o curso de Pedagogia, como estímulo para os demais [...]

O professor Altamiro era tido como uma pessoa formal e um tanto fechado, que agia com pulso firme e que procurava manter-se alheio às questões externas à instituição. Tratava-se da pessoa certa para conduzir a implantação de uma instituição de ensino superior que sofria forte influência do regime militar, o que ficou evidente no projeto de viabilidade elaborado pela UDESC, sob sua coordenação.

O professor Altamiro sempre fez questão de afirmar que sua posição na FUNDESTE era transitória, já que desejava voltar para Florianópolis. Tanto que ele e sua equipe eram denominados de estrangeiros (quem vem de fora). O entrevistado O-15 lembra dele ter dito o seguinte: “eu estou aqui como Diretor Geral e implantador dos cursos, mas minha intenção é voltar para Florianópolis”.

A FACIE/FUNDESTE era pequena, com poucos alunos, poucos professores, não havendo uma maior complexidade. Tudo se resolvia em reuniões face a face. O grupo de professores era inexperiente (apenas quatro já haviam lecionado no ensino superior e alguns destes nem residiam em Chapecó, ministrando aulas em regime concentrado). Conforme Bellani (1997), o professor Altamiro priorizou muito o acompanhamento do que acontecia em sala de aula, já que a maioria dos professores não tinha experiência. A professora Suely Petry da Luz era a Coordenadora Pedagógica da Faculdade. Ocorriam reuniões periódicas com a direção e corpo docente. Em uma reunião o professor Altamiro (apud Bellani, p. 73) falou o seguinte: [...] “os professores em conjunto deverão fazer seus planejamentos de aula em cada quinze dias, e cada dois meses entregarão uma síntese das atividades desenvolvidas” [...].

O ano de 1974 foi um ano de mudanças. Houve alterações estatutárias, regimentais e estruturais. Isto resultou na criação do Centro de Ensino Superior – CES, na extinção da FACIE, na criação de duas direções, a Geral, para a qual foi mantido o professor Altamiro (para um mandato de mais quatro anos), e a de Ensino Superior, que foi inicialmente acumulada pelo Diretor Geral. Verificou-se a ampliação das vagas para 410, com a implantação de mais três cursos: Administração, Ciências Contábeis e Estudos Sociais (IOP, 1997).

Foi também em 1974 que o então Diretor Geral, professor Altamiro, passou a ser alvo de críticas, principalmente em relação ao excesso de burocracia, gastos desnecessários, constantes viagens, pouca abertura e ausência na comunidade, que se estenderam até a sua saída.

O professor Santo Rossetto, em 1975, fugindo de perseguição política por sua militância de esquerda no centro do país, durante o regime militar, passou a lecionar filosofia e a prestar serviços à FUNDESTE naquele mesmo ano, trazido com o apoio do empresário Plínio de Nês, por indicação de influentes membros da igreja católica. Próximo do final de seu mandato, o professor Altamiro teria confidenciado que iria indicar o professor Santo como substituto. Dias depois, em contato com o professor Santo, voltou atrás, pois seu nome não havia sido aceito, em função de informações recebidas de sua militância no Rio de Janeiro em grupos de esquerda, contrários ao regime militar. No entanto, o professor Altamiro garantiu que o professor continuaria a atuar como docente.

Neste período, o empresário Plínio de Nês continuou sendo figura destacada, pois, além de empresário bem sucedido, era influente junto ao governo estadual e lideranças da comunidade. Ele era consultado sobre qualquer decisão que devesse ser tomada, ainda como presidente da FUNDESTE. Mas o empresário Plínio de Nês não era influente somente na FUNDESTE, ele influenciava o município inteiro e a região. Era uma liderança inquestionada. O entrevistado E-5 o descreve como:

[...] uma pessoa extremamente bem humorada e em qualquer situação ele sempre tinha uma palavra de estímulo muito concreta. [...] É comum dizer que a política é a arte de engolir sapos, mas na forma dele, dizia “olha até concordo em engolir sapo, mas contando que me deixem arrotar”.

A gestão do professor Altamiro durou até o final de 1975. Nesta época, a FUNDESTE encontrava-se em péssima situação financeira, com salários, encargos e tributos atrasados, decorrentes da elevada inadimplência dos alunos e da falta de

repasse dos valores devidos pelos governos dos municípios co-mantenedores. Em reunião tensa do Conselho Deliberativo, presidida por Plínio de Nês em dezembro daquele ano, a direção foi duramente criticada, tendo sido criada uma comissão de verificação para auditar a gestão do professor Altamiro, que se sentiu ofendido.

O entrevistado H-8 disse que “o professor Altamiro se fechou para a comunidade. Ele se colocou num pedestal, era o Reitor”. Já o entrevistado B-2 menciona que “o Altamiro (Miro), me parece, se incompatibilizou com muitos Prefeitos e lá pelas tantas ele resolveu deixar a FUNDESTE”. Diz o entrevistado A-1 que:

Bom eu lembro [...] que havia rumores de desentendimento entre [...] o Diretor da época e as autoridades [...] concentrado em duas pessoas que era o Prefeito Wagner e o presidente da mantenedora o Seu Plínio Arlindo de Nês.

Esta situação culminou com o seu afastamento. Ele deixou a instituição sem conseguir dar início ao processo de reconhecimento do curso de Pedagogia, já começado há quatro anos e as vésperas de formar a primeira turma.