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DESIGN E PRODUTOS INFANTIS

6. MÉTODOS DE COLETA DE DADOS COM CRIANÇAS E CONDUTAS METODOLÓGICAS APLICADAS EM PROJETOS DE DESIGN

6.3. O DESENHO E PINTURA

Com objetivos semelhantes ao uso dos brinquedos, o desenho ou pintura podem aparecer como funcionais ferramentas de coleta de dados junto ao público infantil. Arfouilloux (1980, P.148) afirma que “as crianças desenham em todas as idades, pelo menos enquanto essa atividade continuar a trazer-lhes prazer suficiente”. Alguns autores (ARFOUILLOUX, 1980; GOBBI, 2005), se debruçam para observar o desenho infantil como forma de abordagem e ferramenta de pesquisa entre as crianças. Araújo e Silva (2008, p. 7) reforçam que “o desenho é também uma linguagem e uma forma de expressão da criança”. Para Gobbi (2005), embora exista a presença de crianças quaisquer que sejam as idades, raças e nacionalidades há muito tempo em pesquisas, ainda seria necessário aprimorar metodologias passíveis de observar crianças com idades entre zero e seis anos, objetivando coletar dados a partir de seus olhares. A autora relata em funcional artigo a relevância do desenho infantil como instrumento que, conjugado à oralidade, auxilia na recepção e observação das informações cedidas pelas crianças.

O desenho e a oralidade são compreendidos como reveladores de olhares e concepções dos pequenos e pequenas sobre seu contexto social, histórico e cultural, pensados, vividos, desejados (GOBBI, 2005, p. 71).

Ao concordar com esse pensamento, Greenspan & Greenspan (1993) afirmam que não só os contextos aos quais as crianças estão inseridas importam, as questões relacionadas também ao desenvolvimento infantil são fundamentais para uma aproximação eficiente das crianças. Para os autores, o desenho contém características que são capazes de representar as fases do desenvolvimento no qual a criança se encontra. O uso desse desenho para a representação para a criança deve, portanto, estar condicionado a essas características quando produzido por um adulto, bem como considerar as diferenças entre as diversas faixas etárias na interpretação das mensagens, quando produzidas pelas crianças.

Cruz (2008) oferece uma nova ferramenta como um eficaz recurso para coleta de dados de crianças pequenas: a bricolage. A técnica caracteriza-se pelo uso de materiais alternativos, como embalagens de produtos, materiais de costura, da natureza para que o pesquisador possa observar,

123 registrar e interagir com a crianças a partir da “construção, renovação e expansão das funções e

significados dos espaços e das experiências do cotidiano” (CRUZ, 2008, p. 114). A partir de sessões que promovem uma imersão da criança nas atividades, a família, a escola, o cotidiano das crianças são trabalhados de forma que estimulam os aspectos afetivos, cognitivos e sociais dos sujeitos para aquisição de informações. Para Leonhardt (1990, p.372) apud Cruz (2008, p. 114) ao estabelecer a bricolage como ferramenta de observação desses sujeitos, torna-se possível observar que “a criança se torna capaz de movimentar-se nos dois universos, com maior flexibilidade – o sensível e o racional, o imaginário e o real, classificando a vida com critérios mais ricos e, ao mesmo tempo, mais fundamentais”. A técnica apresenta-se como um aporte a mais na experimentação e observação de resultados a partir de pesquisas que utilizam o público infantil como sujeito. Em virtude de seu perfil lúdico, pode ser apontado com eficaz na consulta às crianças, com o propósito de se obter dados precisos.

Uma técnica difundida no processo de coleta e apropriação de dados da pesquisa qualitativa caracteriza-se pela entrevista. Para Lakatos & Marconi (1993, p. 196-201) na técnica a interação representa a principal relação desenvolvida entre pesquisador e entrevistado, “havendo uma atmosfera de influência recíproca entre quem pergunta e quem responde”.

6.4. A ENTREVISTA

A entrevista nos seus moldes convencionais, por sua vez, não parece ser o melhor instrumento para coleta de dados de crianças ainda pequenas, devido às particularidades que esses sujeitos oferecem quando da troca de informações. Por caracterizar-se por um público que carece de um olhar diferenciado tanto na coleta, quanto na interpretação das informações obtidas, a entrevista voltada à criança deve ser articulada de modo que apure os dados de maneira precisa, sem necessariamente influenciar a partir do instrumento de coleta nos resultados da investigação. Para tanto, faz-se necessário adotar um formato seguro para a criança e para o pesquisador, que condicione uma troca de saberes eficaz e que atenda às necessidades da pesquisa em questão.

Saramago destaca que:

Uma estratégia de pesquisa no terreno que pretenda realizar trabalhos empíricos com crianças depara-se com um conjunto de preocupações específicas, tendo em conta as características particulares destes observáveis. É importante que a construção das técnicas seja elaborada com base em ferramentas metodológicas que procurem ser permeáveis às especificidades do grupo social da infância e às particularidades de cada criança enquanto ator social pleno (SARAMAGO, 2008, p. 13).

124 Para tanto, a autora divide a investigação da criança enquanto sujeito de pesquisa em dois

formatos: abordagens de caráter intensivo e extensivo. A abordagem extensiva pode ser representada pelos textos ilustrados e legendados, recolhendo as informações qualitativamente. Observando à luz da investigação intensiva, a entrevista-conversa posiciona-se como uma técnica de observação dos dados de forma empírica.

A entrevista-conversa, proposta por Saramago, apresenta-se diversa da entrevista estruturada em especial por estar orientada por

[...] grandes blocos temáticos intercomunicáveis que permitem uma deambulação temática que se afigura constantemente pertinente e lógica, porque todos os temas planeados têm pontos de comunicabilidade, mais menos evidentes e mais ou menos fáceis de conduzir e orientar (SARAMAGO, 2008, p.14).

Para a autora, a técnica figura como uma abordagem com severo rigor científico, em especial pelas preocupações adicionais relacionados à preparação do experimento, desenvolvimentos e aplicação durante a abordagem dos sujeitos.

Diante da diversidade de questões a serem observadas ao considerar o público infantil – e as observações pontuais de cada grupo de estudo – a entrevista-conversa pode ser modulada para adequar-se a diversas investigações, cada uma com seu objetivo principal, uma não invalidando a outra. Dentre as modalidades, a quantidade de sujeitos abordados pode ser adaptada de forma flexível, levando-se em conta as relações anteriormente estabelecidas entre os investigados ou outro valor relevante à pesquisa. Sendo assim, Saramago (2008, p. 17) estabelece três modalidades:

 Entrevista-conversa singular – que condiciona a técnica aplicada a uma criança apenas;  Entrevista-conversa relacional – caracteriza-se pela observação de duas ou até quatro

crianças, e;

 Entrevista-conversa de grupo – representado pelo grupo de crianças de até oito elementos.

O objetivo geral de cada investigação definirá a escolha da modalidade da técnica mais eficaz para obtenção dos dados de pesquisa. Para tanto, faz-se necessário traçar o delineamento da entrevista durante a estruturação da técnica, para garantir a abordagem eficiente. Para a autora, alguns fatores são relevantes durante o processo de organização e escolha da modalidade da entrevista-conversa.

A entrevista-conversa singular destina-se para tratar em profundidade temáticas de caráter mais íntimo e pessoal, que dificultam a participação de outros sujeitos na abordagem. Saramago (2008, p. 18)

125 afirma que essa modalidade requer um conhecimento prévio da temática da entrevista por parte do

entrevistador ou uma aproximação de amizade com a criança, favorecendo a eficácia da entrevista. A modalidade relacional, por sua vez, “adéqua-se a blocos temáticos diretamente relacionados com situações de interação privilegiada desenvolvidas entre pares, tais como fortes laços de amizade e/ou parentesco” (SARAMAGO, 2008, p. 18).

Por fim, a autora apresenta a entrevista-conversa de grupo, que se caracteriza pela abordagem de temas de abrangência mais ampla no universo infantil. A estruturação da entrevista dessa modalidade tem deve desprender uma atenção extra devido ao número de sujeitos ser maior e, com isso, existe a probabilidade das indagações e interferências do grupo serem maiores, superdimensionando o banco de dados do investigador.

A técnica da entrevista-conversa proposta por Saramago carece de que determinados procedimentos sejam aplicados com o propósito de atingir resultados satisfatórios junto aos sujeitos. Para a autora, faz-se necessário que:

Sejam definidos com clareza o bloco temático principal, o tema central, os temas adjacentes e o seu encadeamento interno, estruturando as questões de cada bloco temático e planeando cuidadosamente as possíveis vias de convergência entre os diversos blocos, de forma a tornar operacional a intercomunicabilidade dos assuntos (SARAMAGO, 2008, p. 14).

Tal organização do procedimento deve ser aliada a uma condução orientada da técnica, mais uma vez favorecendo que os dados comumente difíceis de serem coletados das crianças com segurança, assegurem a eficácia da técnica. A escolha do local de coleta de dados, a forma de captação e registro das informações e a condução da entrevista-conversa são fundamentais para que a técnica funcione da forma adequada.

A partir do exposto, embora muitos autores compartilhem a dificuldade de se coletar dados de crianças pequenas, já existe hoje uma vasta lista de formas ou procedimentos eficazes para observar tais sujeitos. A escolha de qual técnica aplicar para coletar dados ou metodologia adequada conferindo informações precisas e seguras está diretamente relacionada ao objetivo da investigação e os sujeitos que serão observados. A questão que deve ser mantida em qualquer que seja a metodologia aplicada relaciona-se com a ética na pesquisa, que condiciona que além da apreensão adequada dos dados, ela esteja alicerçada na garantia de manutenção dos direitos das crianças investigadas e negação de questões que coloquem em risco sua segurança e liberdade.

126 A partir dos conceitos vistos até então se faz possível dar início ao desenvolvimento de produtos –

ou estruturação para tal – destinados ao público infantil. Os capítulos a seguir conduzirão para os experimentos propostos para observar a relevância das características de gênero impressas na linguagem visual destinada ao público infantil por meio do vestuário. A seguir serão definidos os procedimentos para aplicação do experimento junto às crianças com o objetivo de tentar responder à pergunta principal dessa investigação.

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CAPÍTULO 7