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Desenvolvimentistas do setor público “nacionalistas”

2.8 O PENSAMENTO ECONÔMICO BRASILEIRO

2.8.2 A corrente desenvolvimentista

2.8.1.3 Desenvolvimentistas do setor público “nacionalistas”

Os desenvolvimentistas do setor público nacionalistas têm vertente nas agências e órgãos criados pelo ESTADO a partir dos anos 1930, com vistas a promover o desenvolvimento nacional. Junto com os neoliberais formaram o grupo de maior expressão e difusão de ideias sobre o desenvolvimento nacional. A ideia

basilar – comum aos demais desenvolvimentistas - era de constituir no Brasil um moderno capitalismo industrial. Contudo, os desenvolvimentistas nacionalistas diferenciavam-se sobre os meios de alcançar esse desenvolvimento. Nas suas ideias, o mais seguro para o desenvolvimento do país era ampliar a ação do ESTADO. Isso seria feito com planejamento estatal para o estabelecimento de políticas públicas de apoio à industrialização e com investimentos públicos em setores considerados estratégicos.

A atuação do ESTADO era vista como importante, pois entendiam que não havia qualquer tipo de previsão sobre o tempo que o país teria que esperar pela intenção da iniciativa privada e/ou do capital estrangeiro decidir investir no Brasil. O atraso, a pobreza e a miséria não poderiam esperar. O ESTADO deveria ser o catalizador da industrialização.

Importante referir que os desenvolvimentistas não negavam a presença do capital estrangeiro em nossa economia; pelo contrário, a presença era bem-vinda em todo os setores, com exceção apenas daqueles considerados estratégicos (mineração, petróleo, energia, transportes, telecomunicações e indústrias de base90). O estabelecimento da indústria

automobilística no Brasil, que contou com empresas internacionais, é um dos exemplos apontados da interação dos desenvolvimentistas nacionalistas do setor público com o capital internacional privado91.

A partir da CEPAL e de Celso Furtado, as ideias cepalinas de transformações estruturais incorporam-se definitivamente no pensamento desenvolvimentista do setor público nacionalista. A concepção da substituição das importações, política monetária subordinada ao planejamento e medidas econômicas de cunhos sociais eram medidas defendidas por eles como os meios para suplantar o subdesenvolvimento.

2.8.1.3.1 O destaque para o pensamento de Celso Furtado

Celso Furtado foi um economista brasileiro de enorme destaque especialmente por ser um dos responsáveis pela perspectiva teórica do estruturalismo. É classificado pela literatura histórico-econômica com um keynesiano estruturalista.

90 SOUZA, Washington Peluso Albino de. Op.cit. 2012, p 171. 91 BIELSCHOWSKY, Ricardo. Op.cit. 2004, p. 128.

O keynesianismo de Furtado provinha da importância que dava ao ESTADO na tarefa de promoção do desenvolvimento. Mas diferente de Keynes (que visava o pleno emprego), Furtado visava o mercado interno92. O estruturalismo é o resultado prático das pesquisas

iniciais da CEPAL, na qual se construiu uma escola de pensamento econômico baseado nas realidades latino-americanas. Celso Furtado, através de sua mais famosa obra “Formação Econômica do Brasil”93, deu amparo ao posicionamento teórico da CEPAL sobre a

necessidade de se interpretar as realidades dos países subdesenvolvidos de forma diferente dos países desenvolvidos.

No livro, Furtado aponta que a formação histórica do Brasil, suas estruturas sociais e econômicas são bem diferentes das dos países desenvolvidos - diferente também dos Estados Unidos que, embora tenha sido colônia da Inglaterra nos seus primórdios, as consequências dos seus fatos históricos lhes renderam caminhos diferentes dos submetidos e experimentados pelo Brasil.

Por isso, na concepção de Furtado, subdesenvolvimento não é uma etapa pela qual todos os países devam passar para se tornarem desenvolvidos94, e que, para ultrapassá-la,

bastaria aplicar as teses das economias desenvolvidas. O fato de o subdesenvolvimento ser a realidade de um resultado histórico de conjunturas econômico e sociais pelos quais foram submetidos os países que outrora foram colônias de países centrais (desenvolvidos), e que ainda continuam servindo de base exportadora de matérias-primas aos países desenvolvidos, torna a realidade dessas economias subdesenvolvidas singular.

Ao mesmo tempo em que existem estruturas modernas voltadas à exportação, há estruturas arcaicas95 (atrasadas). Essa coexistência do moderno com o atrasado Furtado chama

de sistema híbrido heterogêneo96. Portanto, subdesenvolvimento é o reconhecimento de uma

realidade política e cultural - não apenas econômica - e que acontece ao mesmo tempo com o desenvolvimento. O objetivo então do desenvolvimento é homogeneizar essa sociedade. Esse objetivo deve ser alcançado, segundo Furtado, através da industrialização, que seria

92 BIELSCHOWSKY, Ricardo. Op.cit. 2004, p. 136.

93 FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. 32. ed. São Paulo: Companhia Nacional, 2003. 94 FURTADO, Celso. Op.cit. 2009, p.161.

95 Idem, p.171.

a responsável pela criação de um mercado interno, o qual se tornaria o centro dinâmico do desenvolvimento97.

Para a realização da industrialização do Brasil, era necessário identificar os problemas e programar medidas para solucioná-los. Essa tarefa caberia ao planejamento. Por conta das estruturas estanques de uma economia capitalista subdesenvolvida, cumpriria ao ESTADO fazer o papel de planejador. Os desafios do planejamento seriam: aplacar as diferenças geográficas regionais de desenvolvimento e as diferenças interpessoais de renda.

Da observação de que a concentração de renda impedia o crescimento, Furtado, ao longo de pensamento, apresentou: balizas para uma reforma tributária, planos de desenvolvimento regionais [a criação da SUDENE (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste) foi o resultado das suas ideias] e defendeu a reforma agrária como indispensável para a superação do subdesenvolvimento98.

Celso Furtado foi um democrata (tendo inclusive participado da redemocratização nacional) e um economista que pautava sua obra baseado na economia de mercado (nunca abraçou o comunismo como quiseram fazer crer os militares em 1964 quando lhe expulsaram do Brasil). Suas ideias executadas transformaram realidades nacionais e a importância de sua apresentação nesta dissertação traz consigo a relação de que os temas por ele defendidos têm atualmente dimensão constitucional: vide os artigo 3º (...constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil...), especialmente os incisos II (garantir o desenvolvimento nacional) e III (erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais), o artigo 170 (A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:), notadamente o inciso VII (redução das desigualdades regionais e sociais;) e o artigo 219 (O mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio- econômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos termos de lei federal) de nossa Constituição Federal.

97 FURTADO, Celso. Op.cit. 2003, p. 242.

98 Importante registrar que reforma agrária era vista por FURTADO de forma técnica, entendia que deveria ser

necessária feita no Norte e no Nordeste brasileiro – onde havia grande latifúndio improdutivo. No Sul e no Sudeste – onde já havia uma estrutura agrícola exportadora em funcionamento, FURTADO não recomendada (vide in: BIELSCHOWSKY, Ricardo. Op.cit. 2004, p. 161)