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Desenvolvimento cognitivo e da linguagem

No documento As percepções e as práticas (páginas 44-49)

Cada teu suspiro Cai ao chão no pó… Canta o tiro-liro Tiro-liro-ló

José Régio

Os trabalhos mais recentes sobre o desenvolvimento cognitivo salientam

essencialmente os seguintes aspectos: a permanência do objecto, os factores que determinam a atenção, as capacidades de abstracção e a memória.

No que diz respeito à permanência do objecto, Mazet e Stoleru (1993: 61) afirmam que muitas pesquisas recentes sobre o desenvolvimento cognitivo precoce fazem intervir a noção de regras. O bebé parece procurar quais são as regras que orientam a ocorrência dos acontecimentos do mundo que o circunda.

Os autores citados referem que existem factores que vão determinar a atenção do lactente, como por exemplo, as características físicas e intrínsecas dos estímulos. A atenção é maior para objectos em movimento ou para estímulos caracterizados por tons de contraste, claros e sombrios.

Os dados recentes sobre a memória dos lactentes são essencialmente provenientes dos trabalhos que utilizam as técnicas de reconhecimento visual e aqueles que

utilizam a aprendizagem de uma resposta devido a um processo de condicionamento.

A compreensão do crescimento do poder cerebral para Sprinthall e Sprinthall (1990), mudou profundamente durante as últimas décadas. Anteriormente, a visão era a de

que a inteligência seria, para todos os objectivos práticos, determinada antes do nascimento. Não havia nada a fazer, a não ser aceitar como naturais as diferenças inatas e fornecer diversas experiências educacionais de acordo com o ritmo de aprendizagem da criança – lento ou rápido.

Segundo estes autores, Piaget deu uma contribuição significativa para a compreensão do desenvolvimento mental enquanto processo de interacção. Propôs que o desenvolvimento cognitivo se processa em estádios de desenvolvimento. Tal significa que tanto a natureza como a forma da inteligência mudam profundamente ao longo do tempo.

Para os mesmos autores, o trabalho de Piaget delimitou os vários sistemas cognitivos que as crianças usam em diferentes períodos das suas vidas. Cada novo sistema em evolução faz parte de uma transformação qualitativa fundamental.

Piaget (1947) definiu quatro estádios principais do desenvolvimento cognitivo: . sensório-motor (0-2 anos);

. intuitivo ou pré-operatório (2-7 anos); . operações concretas (7-11 anos); . operações formais (11-16 anos).

Vejamos algumas características do estádio sensório-motor, uma vez que o nosso estudo incide sobre a idade em que se processa este estádio.

3.1. Experiência sensório-motora – do nascimento aos dois anos

Os comportamentos que se observam durante as primeiras semanas de vida do indivíduo são, do ponto de vista biológico, de uma grande complexidade. Existem, por um lado, reflexos de ordem muito diferente que dizem respeito à medula, ao bolbo, às camadas ópticas, e mesmo ao córtex; por outro lado, do instinto ao reflexo só há uma diferença de grau. Paralelamente aos reflexos do sistema nervoso central, há os do sistema autónomo. Por fim, é difícil conceber a organização destes

mecanismos sem fazer referência aos processos endócrinos cujo papel foi invocado a propósito de tantas reacções intuitivas ou emocionais. (Piaget, 1947).

A actividade cognitiva durante este estádio baseia-se essencialmente na experiência imediata, através dos sentidos, segundo Sprinthall e Sprinthall (1994), enquanto que a actividade intelectual fundamental deste estádio consiste na interacção com o meio, ainda através dos sentidos.

Estes autores acrescentam que a organização mental está em estado bruto, de tal forma que a qualidade da experiência raramente é significativa. A aprendizagem no estádio sensório-motor é uma experiência em auge contínuo.

Piaget conclui que a assimilação própria da adaptação reflexa apresenta-se sob três formas: repetição cumulativa, generalização da actividade com a incorporação de novos objectos a este funcionamento, e, por fim, reconhecimento motor.

A máxima “nada substitui a experiência”, para Sprinthall e Sprinthall (1990), pode sintetizar este período sensório-motor do desenvolvimento cognitivo.

3.2. O desenvolvimento da linguagem

A análise da linguagem e do seu desenvolvimento deve ser contextualizada no âmbito da comunicação e da interacção mãe criança e pai criança. Assim, esta interacção vai para além da comunicação vocal, dizendo também respeito aos contactos físicos, às trocas de olhares ou aos gestos.

Sylva e Lunt (1994) salientam que o bebé, aos três ou quatro meses de idade, produz sons semelhantes à fala. O pico dos balbucios é atingido cerca dos nove, dez meses de idade. Por volta do primeiro ano de idade, o bebé passa a ocupar-se da articulação deliberada de palavras específicas.

Sprinthall e Sprinthall (1994) alegam que a linguagem é muito influenciada pela aprendizagem, tendo esta, contudo, uma base biológica. Cerca de um ano de idade, os bebés conseguem associar os sons aos objectos e começam a pronunciar as suas

primeiras palavras. Após a primeira palavra, nos meses que se seguem, o vocabulário aumenta lentamente.

Ainda para os mesmos autores, a linguagem é produto da hereditariedade, meio e tempo. Não é possível a aquisição normal da linguagem, se a estimulação do meio surge demasiado tarde.

Aos dois, três anos de idade, as crianças constroem frases curtas. Não têm palavras indicadoras de matizes, mas expressam uma diversidade de significados, entre os quais afirmações sobre posse e localização e inclusive sobre a não-existência (Sylva e Lunt, 1994).

Não se trata para a criança de aprender apenas a estrutura de uma língua, mas sim de aprender os processos que permitem a comunicação.

Vamos falar sucintamente sobre as diferentes fases da aquisição da linguagem de acordo com Mazet e Stoleru (2003).

Gritos e tagarelice

Os gritos têm um “significado” – manifestam a fome, a dor, o desconforto, etc. Durante os dois primeiros meses de vida, o bebé emite vocalizações que parecem comunicar as suas vivências de desconforto ou relaxação.

A tagarelice aparece a partir dos 2, 3 meses, com o aumento das vocalizações a nível da quantidade e da variedade. Essas emissões assumem os nomes de: tagarelice, gorjeios e lalações.

De acordo com Sylva e Lunt (1994), aos três ou quatro meses, o bebé produz sons semelhantes à fala. Os sons têm uma cadência ascendente e descendente, como se fossem pequenas frases que o bebé produz quando está sozinho ou acompanhado.

Embora estes primeiros balbucios não sejam considerados linguagem, eles podem ser uma fonte de comunicação. As mães e as crianças comunicam o prazer que têm uma com a outra, uma falando durante a brincadeira e a outra respondendo com lalações.

Alguns autores pensam que nos primeiros seis meses, o bebé apresenta um repertório de vocalizações tão vasto que contém todos os sons de todas as línguas humanas. Na segunda metade do primeiro ano a criança vai abandonar a produção de alguns sons para só emitir aqueles que pertencem à comunidade linguística à qual pertence.

Palavras

Jerome Bruner (1983) constatou que a comunicação pode ocorrer também em jogos com objectos e não só em “conversas” unilaterais. O jogo de toma-lá-dá-cá faz com que as crianças ganhem proficiência na habilidade de alternar as conversas. Por volta dos 12 meses, as crianças começam a inserir palavras onde antes havia acção.

Nem sempre é fácil identificar a primeira palavra pronunciada por uma criança. Os pais normalmente identificam como a primeira palavra, uma primeira associação de sílabas, como por exemplo, “pa-pa”. Esta identificação situa-se entre os 9 e os 18 meses, sendo a idade média pelos 12 meses. Um atraso importante acontece quando já passaram os 18 meses.

Por volta dos 18 meses, a criança compreende cerca de 20 palavras. A criança aos 2 anos tem um vocabulário entre 100 a 200 palavras.

As frases das crianças de dois anos de idade são curtas, expressando uma diversidade de significados, entre os quais tornam realce afirmações de acção, afirmação sobre posse e localização e até sobre a não existência (Sylva e Lunt,1994).

Bruner (1983) in Mazet e Stoleru (2003) refere que a mãe e o bebé estão desde o início empenhados em comum em diversas interacções ou “tarefas realizadas conjuntamente”.

No documento As percepções e as práticas (páginas 44-49)