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DESENVOLVIMENTO DA TEORIA FEMINISTA DO DIREITO

No documento Feminismo e direito penal (páginas 35-37)

Feminismo é o nome que se atribui ao movimento social que busca a melhoria da condição de vida das mulheres, de forma a eliminar as desvantagens em relação ao status alcançado pelos homens ao longo da história1.

Neste movimento, ainda que previamente à sua compreensão como tal, diversas pessoas, sobretudo mulheres, lutaram das mais variadas formas, muitas vezes ao custo de vidas, para que direitos básicos já assegurados aos homens fossem garantidos também às mulheres.

Todavia, foi a partir de 1970 que as discussões encadeadas por diversas teóricas e juristas feministas norte-americanas, seguidas pelas europeias, passaram a consolidar o que posteriormente veio a ser chamado de Teoria Feminista do Direito, cuja construção marcou essa fase efervescente do feminismo2.

A incorporação de temas feministas ao Direito deu-se como reflexo dos avanços que os estudos sobre a mulher alcançavam em outras áreas, tais como a História, a Sociologia, a Economia, a Psicologia e as Artes.

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Sobre a utilização genérica do termo feminismo, compartilha-se do mesmo entendimento exarado por Dahl, “mesmo aceitando que, historicamente, o feminismo assumiu diversas formas e acolheu filosofias e ideologias diversas, considero correto que este conceito seja utilizado em sentido lato para designar todos os movimentos e grupos de mulheres que, por esta ou aquela razão, num sentido ou noutro, se empenham na luta contra a opressão das mulheres e, de modo geral, pela melhoria da sua situação”. DAHL, Tove Stang. O

direito das mulheres: uma introdução à teria do direito feminista. Tradução de Teresa Pizarro Beleza.

Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1993, p. 14. 2

Como menciona Silveira, “Com evidente crescimento desde os anos 70, mas com momentos marcantes em épocas anteriores, como foi o caso, v.g., da Revolução Francesa ou das sufragistas inglesas e americanas do século XIX, pode ser considerado feminismo o movimento encarado, genericamente, como a crítica contraposta às teses de separação existentes entre homens e mulheres. (...) Procurando e almejando a quebra da estrutura consagrada do patriarcado, o feminismo visa, em suma, à igualdade dos direitos, já que as mulheres são vistas como reais perdedoras do jogo social”. SILVEIRA, Renato de Mello Jorge. Crimes

sexuais: bases críticas para a reforma do direito penal sexual. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 66. Sobre

a contextualização histórica do movimento feminista, esclarece DAHL, “Tal como os estudos sobre as mulheres, o Direito das Mulheres integra-se no novo movimento feminista nascido nos Estados Unidos, nos meados dos anos 1960. Os movimentos feministas, pelo menos nos dois últimos séculos, têm estado sempre presentes na história, mas nunca assumiram um dimensão tão vasta e profunda como o feminismo actual. A palavra feminismo teve origem no contexto político francês do século XIX para designar os diferentes grupos que, de uma maneira ou outra, tentaram melhorar a situação das mulheres”. DAHL, Tove Stang. Op. cit., p. 13.

O início desse processo de consolidação da Teoria Feminista do Direito foi também resultado da crescente participação das mulheres no mundo jurídico, tendo sido estas as principais responsáveis pelo destaque que os temas associados aos direitos das mulheres passaram a receber3.

Todavia, neste princípio, as discussões estavam mais voltadas à realidade prática, tal qual esta se apresentava nos casos levados às Cortes, de forma que era ainda prematuro concluir que uma nova teoria do direito estivesse surgindo4. Foi apenas na década posterior que os debates ganharam espaço no meio acadêmico inaugurando, então, os cursos de Teoria Feminista do Direito nas faculdades de Direito do mundo ocidental.

Nesse processo, as feministas assumiram diferentes posicionamentos acerca das principais questões que envolvem a relação entre Direito, gênero e as mulheres5. Conforme seus argumentos foram sendo formulados, surgiram dilemas cujas soluções abriram perspectivas para novas abordagens.

Assim, tornou-se possível demarcar o processo de elaboração da Teoria Feminista do Direito em estágios6, os quais evoluíram a partir das lacunas existentes na corrente teórica desenvolvida na fase anterior.

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Sobre a importância da participação das mulheres no mundo jurídico para o processo de consolidação da Teoria Feminista do Direito, Chamallas, “As women became more established on law faculties, some chose to write about issues of gender discrimination and slowly began to bring firsthand account of the issues to a legal audience. Not surprisingly, there is a close connection between the sexual integration of the legal academy and the development of feminist legal theory. CHAMALLAS, Martha. Introduction to feminist

legal theory. 2ªed. New York: Aspen Publishers, 2003, p. 36. Sobre o mesmo fenômeno, Smart, “nuestras

teorías de género y de derecho han avanzado, pero ha habido outro desarrollo importante. La llegada de feministas al mundo del derecho ha convertido a éste en el lugar de lucha, en vez de considerarlo solamente como un instrumento de lucha. Pero el aumento en el número de feministas especializadas en derecho y abogadas ha (irónicamente) llevado a lo que yo considero consecuencias contradictorias. La primera – y la aplaudo – es un refinamiento de nuestras teorías del derecho, especialmente en relación al método normativo y lógico. La segunda, que quizá es más problemática, es un vigor renovado en el intento de utilizar el derecho para la causa de las mujeres”. SMART, Carol. La mujer del discurso jurídico. In: LARRAURI, Elena

Mujeres, Derecho penal y criminología. Madrid: Siglo XXI de España Editores, 1994, p. 168. 4

Nesse sentido, Chamallas, “During the Equality Stage, the impetus for legal change came primarily from feminist practitioners. Many of the major scholars often associated with the Equality Stage and liberal feminism were not only “academic” feminists in the sense that they made their reputations solely through writings in law journals. Rather, their experiences in courtrooms or legislative hearings provided the material for their later scholarship. (…) The women´s rights scholarship of the 1970s also had a distinctively practical bent. It was too soon to theorize extensively either about the significance of reforms already made or the shape that feminist challenges should take in the future”. CHAMALLAS, Martha. Op. cit., p. 35.

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Sobre as diversas perspectivas feministas, assinala Bodelón, “Dentro de la denominada “teoria legal feminista” encontramos diferentes análisis y puntos de vista sobre las relaciones entre gênero y derecho. En este sentido, se puede afirmar que no existe um intento de construir una teoria legal global, sino diversas perspectivas para comprender la relación entre el género y el derecho. BODELÓN, Encarna. Relaciones peligrosas: género y derecho penal. RBCCrim nº 29, 2000, p. 238.

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É pacífica a visão acerca da multiplicidade de correntes feministas, o que não encontra unanimidade é a forma de classificá-las. Neste trabalho, toma-se como base as classificações elaboradas por Martha Chamallas, pela clareza com que soube expor o encadeamento dialético entre as escolas.

Essa possibilidade de estratificação não obscurece a linha que costura e une a construção teórica: qualquer que seja a escola feminista em análise haverá sempre um denominador comum mínimo, o qual, nos dizeres de Baratta7, é a “demolição do modelo androcêntrico da ciência e a reconstrução de um alternativo”8.

No documento Feminismo e direito penal (páginas 35-37)