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(2.1) é 104, 52 ± 0, 05°, mas no gelo Ih os oxigênios são arranjados obedecendo uma simetria

tetraédrica, de tal forma que o ângulo O-O-O é próximo de 109,47°. A molécula de água é um entidade bastante rígida e o ângulo H-O-H da molécula de água na estrutura do gelo Ih

é menor que o ângulo O-O-O. Resultados experimentais para o ângulo H-O-Hgelo apontam

para um valor de 106, 6 ± 1, 5° [6]. Este valor recentemente foi conrmado através de cálculos ab initio [79]. O fato da molécula de água ser um pouco mais fechada do que o ângulo tetraédrico impede que a ligação de hidrogênio seja uma linha reta que liga dois oxigênios vizinhos, ou seja, o ângulo da ligação de hidrogênio representada por O˘H · · · O não chega a ser 180°, no entanto, cálculos ab initio encontraram um valor de 177, 65 ± 0, 64° que é um valor bem próximo de 180° [79].

O trabalho experimental de Kuhs e Lehmann [95] revelou que o comprimento médio da ligação O-H é de 1, 007 ± 0, 002 Å para uma temperatura de 15 K e 1, 002 ± 0, 005 Å para uma temperatura de 223 K. Neste mesmo trabalho também foram obtidos valores médios para as distâncias entre dois oxigênios vizinhos O-O e os valores são 2, 750 ± 0, 002 Å para uma temperatura de 15 K e 2, 760 ± 0, 003 Å para uma temperatura de 223 K. Resultados obtidos através de métodos ab initio concordam muito bem com estes resultados experimentais citados acima, tanto para o comprimento da ligação O-H quanto para as distâncias O-O [79].

Nesta seção foram abordados os principais parâmetros que denem a rede cristalina do gelo Ih. Vimos que os sítios da rede são denidos pelas posições dos átomos de oxigênio e

que as posições dos prótons não apresentam correlação de longo alcance resultando em uma estrutura próton-desordenada. Esta última característica merece um pouco mais de atenção e será abordada na próxima seção.

2.4

Desordem protônica

2.4 Desordem protônica 30

protônica, sua hipótese foi formulada em 1935 [96] e apenas em 1957 é foi obtida a primeira evi- dência experimental com o trabalho de difração de nêutrons realizado por Peterson e Levy [97]. Pauling não somente propôs a desordem protônica mas também deu um ousado passo, supondo que as energias de todas as congurações possíveis do gelo Ih, desde que obedeçam as regras

do gelo, são tão próximas que não há nenhuma preferência de ordenamento dos prótons, ou seja, todas as congurações possíveis são igualmente prováveis [6]. A desordem protônica no gelo Ih desempenha um papel chave em várias propriedades do gelo [6, 79]. Uma propriedade

relevante de ser mencionada aqui é que apesar da molécula de água ser uma molécula polar, ou seja, com momento de dipolo não nulo, a estrutura do gelo Ih tem momento de dipolo

resultante muito próximo de zero. Além disso, esta desordem protônica inuencia fortemente os mecanismos de deformação do cristal uma vez que, como será visto nos próximos capítulos, tais mecanismos são mediados por deslizamento de planos atômicos que quebram as ligações de hidrogênio e a desordem protônica diculta a reconstrução destas ligações de hidrogênio quebradas.

O modelo de Pauling permite estimar a entropia de ponto zero para o gelo. Usando a relação de Boltzmann, S = kBlnW , pode-se relacionar a entropia de ponto zero S0 com o

número total de congurações possíveis W obedecendo as regras do gelo, onde kBé a constante

de Boltzmann. Para fazer este cálculo é preciso considerar um cristal formado por N moléculas grande o suciente de tal forma que as superfícies podem ser ignoradas. Neste cristal existem 2N ligações entre as suas moléculas com exatamente um próton em cada uma. Cada molécula pode assumir uma das 6 orientações mostradas na Figura (2.6) de tal forma que o número total de arranjos possíveis para um cristal com N moléculas é dado por 6N. Para satisfazer

as regras do gelo sabemos que a probabilidade de cada ligação ser formada corretamente é 1/2. Então a fração de 6N possibilidades na qual 2N ligações de hidrogênio serão formadas corretamente é (1

2)

2.4 Desordem protônica 31

do gelo é dado por:

W = 6N 1 2 2N = 3 2 2N , (2.1)

com isso, a entropia de ponto zero S0 é dada por:

S0 = N kBln

 3 2



≈ 3, 371 JK−1mol−1. (2.2)

Este resultado está em muito boa concordância com dados experimentais, baseados em calori- metria, de 3, 41±0, 19 JK−1mol−1[6,98]. Esta concordância sugere que o postulado de Pauling

de que todas as congurações obedecendo as regras do gelo são equiprováveis é consistente. Neste Capítulo discutimos os principais aspectos da estrutura de gelo Ih. A estrutura

cristalina do gelo Ih é uma estrutura hexagonal do tipo Wurtzita onde os sítios são denidos

pelas posições dos átomos de oxigênio. Além disso, a estrutura apresenta uma desordem protônica, tal que não há nenhum ordenamento de longo alcance nas orientações moleculares, sujeito apenas às regras do gelo. No próximo Capítulo discutiremos o papel dos defeitos cristalinos na deformação plástica em geral e os aspectos pertinentes ao caso especíco do gelo Ih.

Capítulo 3

Defeitos extensos na deformação plástica

3.1

Deformação plástica

Para ter uma descrição completa das propriedades mecânicas de um material é essencial entender os processos fundamentais de deformação. Em geral os materiais se deformam com a aplicação de uma tensão mecânica. Dependendo das características do material e da intensi- dade da tensão aplicada, a deformação provocada pode ser reversível ou irreversível. De fato, se a intensidade da tensão aplicada atingir um limite crítico uma falha drástica no material será causada, provocando uma ruptura do material [99101].

Há vários fatores que inuenciam os processos de deformação dos materiais e estes processos são relevantes em diversas áreas tecnológicas, desde materiais envolvidos em microeletrônica até as escalas da engenharia civil. A deformação de um material em função da tensão aplicada pode ser separada em dois estágios básicos. O primeiro estágio de deformação ocorre para valores relativamente pequenos de tensão para os quais a deformação é reversível, também chamada de elástica. Além de um ponto crítico de tensão (chamado de yield stress), a defor- mação alcança um segundo estágio onde passa a ser irreversível, conhecido como deformação plástica [100,102]. A Figura (3.1) mostra uma curva típica tensão-deformação (stress−strain) ilustrando estes dois estágios de deformação. É possível ver que no primeiro estágio, denotado

3.1 Deformação plástica 33

Figura 3.1: Uma curva típica tensão-deformação dos materiais ilustrando a sequência de estágios da resposta do material devido a aplicação de uma tensão. Fonte: http://www.doitpoms.ac.uk/

na Figura (3.1) pelo segmento 1, a resposta do material é linear, ou seja, governado pela lei de Hooke. Nesta fase a deformação ainda é reversível, ou seja, se a tensão externa for removida for a zero o material volta ao estado inicial. Depois da tensão atingir o valor crítico, denotado na Figura (3.1) pelo ponto 2, o material passa para o segundo estágio, denotado pelo segmento 3, onde a resposta do material já não é mais linear e a deformação passa a ser irreversível. A região 4 denotada na Figura (3.1) mostra que, ao reduzir a intensidade da tensão à zero, o material não volta ao estado inicial permanecendo com uma deformação irreversível conhecida como deformação plástica [100,103].

A Figura (3.2) mostra uma visão microscópica do comportamento já ilustrado na Figura (3.1). A parte (a) mostra uma sequência de 3 congurações atômicas ao longo de um processo de deformação elástica. O lado esquerdo mostra a conguração inicial, antes de aplicação de uma tensão externa. A conguração no centro mostra que a aplicação de uma tensão externa produz uma deformação elástica na qual as ligações estão esticadas comparadas àquelas no estado inicial. Finalmente a conguração à direita mostra a situação após a remoção completa

3.1 Deformação plástica 34

(a)

(b)

Figura 3.2: Diferença entre a deformação elástica e a deformação plástica em (a) mostra que na deformação elástica as ligações são esticadas mas podem voltar ao normal, enquanto que em (b) na deformação plástica o material não volta ao estágio inicial devido ao ao deslizamento de planos atômicos. Fonte: referência [104].

de tensão externa. As ligações voltam a ter o comprimento original e o material volta ao seu estado inicial.

Já a Figura (3.2(b)) mostra uma situação diferente. Neste caso, a tensão aplicada ultra- passa o limite elástico do material. Desta maneira, ou seja, a deformação no material será a soma de uma contribuição elástica e outra plástica. A conguração do meio mostra que, além das ligações esticadas houve também um deslizamento de planos atômicos. Nesta situação quando a tensão for retirada, as ligações voltam ao comprimento inicial mas o deslizamento

3.1 Deformação plástica 35

relativo dos planos atômicos permanece conforme a conguração da direita. Assim o material não volta ao estado inicial, sofrendo deformação plástica.

Com as guras anteriores percebe-se que a deformação plástica é medida por deslizamento de planos atômicos dentro do material. São justamente estes deslizamentos que fazem da defor- mação plástica uma mudança irreversível. A questão chave agora para entender a deformação plástica é entender como estes deslizamentos de planos atômicos ocorrem.

A Figura (3.3(a)) mostra uma rede cristalina cúbica simples perfeita em um estado inicial sem nenhuma deformação. Já a Figura (3.1(b)) mostra a mesma rede cúbica simples em um estado nal depois de ter sido deformada por um parâmetro de rede denotado pelo vetor b. A

Figura 3.3: Em (a) uma rede cúbica simples antes da deformação e em (b) esta mesma estrutura depois da deformação. Figura retirada da referência [63].

comparação entre as congurações inicial e nal possibilita imaginar o seguinte mecanismo de deformação: (1) desfazer simultaneamente todas as ligações dos átomos adjacentes ao plano A que separa a metade superior da metade inferior; (2) mover rigidamente a metade superior à direita por uma distância de um parâmetro de rede; (3) refazer as ligações entre os átomos adjacentes ao plano que ligam as duas metades novamente.