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Detalhes da constituição da SOMISA e da DINIE

SOMISA estava contemplada na lei 12.987 (lei Savio), de 1947, que foi a base do Plan Siderurgico Argentino. O plano previa a oferta de aço a partir de uma usina siderúrgica integrada e o fomento à instalação de indústrias transformadoras de aço (laminação, por exemplo). A realização do plano coube à DGFM, que já havia iniciado, em 1945, a produção de ferro-gusa com a Altos Hornos de Zapla. Com a demanda em alta da indústria de laminação apoiada pelo decreto 14.630 e as dificuldades de importação por causa da escassez de divisas, o governo peronista obteve empréstimos do EXIM-BANK para construir a planta siderúrgica. A usina foi inaugurada em 1961, quatorze anos depois da lei de Savio. Ainda em 1961, a planta industrial respondeu por cerca de 30% da produção nacional e teve uma influencia notória sobre o desenvolvimento da indústria siderúrgica do país (ALTIMIR; SANTAMARÍA; SOURROUILLE, 1966, p. 96-99).

DINIE surgiu em 1945, após a declaração de guerra aos países do Eixo (Japão, Alemanha, Itália) e a intervenção do Estado em mais de 30 empresas pertencentes às multinacionais dos países do Eixo. Os ativos de firmas alemãs foram adquiridos por meio do decreto 1.921, sob o argumento de que o país não estava preparado para o desaparecimento das empresas. O decreto 18.991, de 1947, instituiu a Dirección Nacional de Industrias del Estado (DINIE), que recebeu autorização para investir em indústrias de interesse nacional e constituir empresas mistas. Fábricas Nacionales de Envases Textiles, Fábrica Nacionales de Resistencia, Huaico y Hondo, Corporación Argentina de Tejeduría Doméstica, Fábrica Nacional de Productos Químicos, entre outras, foram transferidas à DINIE. Desde o início, DINIE apresentou resultados positivos, sobretudo com as empresas construtoras e elétricas, mas as empresas têxteis e químicas não tiveram bom desempenho. Entre os principais êxitos, temos: produção de vacinas de febre aftosa, equipamentos de eletromedicinas, produção de aços especial com Crifen e abastecimento do Estado (construção de diques, usinas, turbinas hidráulicas, vagões tanque, linhas de alta tensão, armazéns etc.). Porém, a promoção de novas indústrias – soda cáustica, negro de fumo etc. - fracassou. As empresas de DINIE desfrutaram do acesso privilegiado de licenças de importação junto ao Banco Central, sobretudo para o abastecimento das próprias necessidades do Estado (que respondeu por 60% das vendas do grupo), o que resultou numa maior participação das receitas provenientes da comercialização do conjunto das empresas DINIE. Durante o governo peronista, DINIE se autofinanciou, principalmente com a criação da empresa Comercial, Inmobiliaria y Financiera Empresa Nacional (CIFEN) - que lhe proporcionou a liquidez necessária. Somente 30% dos recursos procederam do Banco Industrial (BELINI, 2001).

Para Belini (2001), “el desempeño de Di.N.I.E evidencia claramente los limites de la política industrial peronista [...] el estado no se veía sino accidentalmente como productor directo [...] su desempeño se vio marcado por el privilegio de los otros objetivos de la política económica oficial, a saber, asegurar el pleno empleo de la mano de obra, la provisión de los insumos básicos para la industria privada y colaborar en la contención de la inflación” (BELINI, 2001, p. 98). Para ele, “la experiencia de las industrias del Estado pone de manifiesto en pragmatismo de la estrategia económica peronista” (BELINI, 2001, p. 117). Como seus maiores êxitos ocorreram nas áreas de maior atuação da iniciativa privada, DINIE

“nos brinda un ejemplo de lo conflictivo de las relaciones entre el gobierno peronista y los industrialistas” (BELINI, 2001, p. 118).

A queda de Perón, em 1955, marcou o retorno às políticas liberais com o governo da revolução libertadora de Aramburu (1955-1958) e o reestabelecimento dos vínculos com os círculos financeiros internacionais, a liberalização das importações e eliminação das restrições ao comércio, o desmantelamento do aparato intervencionista, a privatização dos depósitos bancários, o enfraquecimento do poder sindical e fortalecimento das classes sociais prejudicadas pelo peronismo (FERRER, 2010). As atividades da Di.N.I.E foram racionalizadas (eliminação da linha de produção de motores a diesel), a Cifen perdeu o monopólio de importação e as atividades industriais previstas fracassaram; de fato, Di.N.I.E. estava sendo desmantelada (tabela 6).

Tabela 6: Empresas liquidadas, nacionalizadas e criadas durante a revolução libertadora

Empresa Atividade Forma de investimento Controle Ano

IAPI Comércio exterior Liquidado Estatal -

Empresa Nacional de Energia Geração e distribuição Liquidado Estatal - Empresa Nacional de transportes Transportes Liquidado Estatal -

Di.N.I.E Diversificado Liquidado Estatal

Alea Radiodifusão Nacionalizada Estatal 1955

LS 82 TV Canal 7 Radiodifusão Nacionalizada Estatal 1955

Forja S.A. Peças forjadas Nacionalizada Estatal 1955

Administración General de Puertos Portuária Novo Estatal 1956 Empresa Servicios Eléctricos del Gran

Buenos Aires Distribuição de energia Novo Misto 1958

Seguro Aeronáutico Empresa del Estado Seguro Novo Estatal 1958 Fonte: Ugalde (1983).

Org: Leandro Bruno Santos, 1983.

Com o fim da guerra, a resolução do futuro da DINIE tornou-se premente, porque a entrada do país no regime multilateral de pagamentos e comércio e nas instituições multilaterais dependia do acordo com a Alemanha, detentora de 40% da dívida argentina na Europa. Em 1957, o acordo Bonn instituiu a devolução de marcas e patentes às empresas alemãs e a venda dos ativos, que ocorreu em 1958: sete empresas foram recuperadas pelas antigas proprietárias, cinco por capitais argentinos e a maioria (Electrodinie, Crisoldinie, Ferrodinie, Metaldinie, Química Bayer etc.) pela própria DINIE. Frondizi resolveu o imbróglio com a Alemanha, devolveu a Mercedes Benz à Daimler, estabeleceu acordos com Compañía Argentina de Electricidad e American and Foering Power Co. e restituiu os ativos que haviam sido confiscados do grupo Bemberg (BELINI, 2006).

Sob os auspícios do desequilíbrio externo causado pelas importações de insumos básicos, a expansão da produção descansaria na atração de capitais estrangeiros e na

poupança interna (via inflação). Foram promulgadas medidas para estimular os investimentos - diminuição dos impostos sobre importação de bens de capital, elevação da proteção à indústria, lei de investimentos externos (tratamento igual ao das empresas locais, permissão para repatriar lucros)70, contratos de exploração com petroleiras multinacionais. Paralelamente, ocorreu uma política de investimentos em indústrias básicas e em infraestruturas (FERRER, 2000, 237-238). A lei 14.630 foi revogada e substituída pela lei 17.781. Em termos setoriais, aprovaram-se leis de apoio à instalação de unidades produtivas nas indústrias siderúrgica (lei 5.038), petroquímica (lei 5.039) e celulose (lei 8.141)71.

Apesar da criação das empresas mistas Tamden (motores a diesel) e Distribuidora de Frutas Argentinas (DFA), DINIE não recebeu aportes de capitais do Estado. Em 1961, deu-se início à liquidação dos ativos restantes e de sua financeira (Cifen). Após a venda das firmas Anildinie, Destilería Alcohol Anidro, Fandet, Fábrica Argetina de Envases Textiles Corporación Argentina de la Tejeduría Doméstica, liquidaram-se outras 15: sete absorvidas pelos trabalhadores e por PME. A forma de pagamento acordada baseou-se em partes anuais ou semestrais a longo prazo e juros de 7% ao ano (BELINI, 2006)72.

Os controles de preços e as restrições quantitativas ao comércio foram eliminados, desvalorizou-se a moeda e adotou-se uma dura política salarial. Apesar do crescimento do PIB e do investimento, logo a política econômica de expansão da capacidade produtiva em setores estratégicos demonstrou suas debilidades, devido ao viés antiexportador, ao estrangulamento externo, ao número excessivo de empresas em setores que exigem concentração, à expansão da poupança via compressão do consumo. Esses aspectos desataram a pugna pela distribuição dos lucros e a inflação dos custos (FERRER, 2000).

Em 1962, a queda de Frondizi abriu o caminho para a instauração de uma política liberal em sua forma mais pura - desvalorização cambial, diminuição das retenções de exportações tradicionais, restrição à emissão monetária e ao gasto público. À custa de desemprego e das quedas da atividade econômica, a balança de pagamentos recebeu um alívio e houve a geração de saldos positivos. Tal melhora levou o governo radical de Illia (1963- 1966) a evitar desvalorizações massivas, a estabelecer controle sobre as transferências de capital e a seguir uma política de expansão da demanda (oferta monetária, gasto público). A ação de maior destaque “fue la recuperación de un sentido de autonomía en el trato con los

70 A lei 1.594 estabeleceu um sistema de apresentação de propostas para a instalação de empresas estrangeiras no país e o decreto 2.384, de 1958, criou o Departamento de Inversiones Extranjeras, que analisou as propostas. 71 Entre 1959-1962, o país recebeu ao redor de US$ 570 milhões de dólares em investimentos estrangeiros, dos quais US$ 150 milhões tiveram como destino a indústria automobilística, mediante o uso de dispositivos legais da lei 17.781 e do decreto lei 3.693 (1959), de apoio à indústria automobilística (SCHVARZER, 1987).

centros financieros y organismos internacionales y el énfasis en los factores internos con pilares del desarrollo del país” (FERRER, 2000, p. 248)73.

Entre 1955 e 1966, os empréstimos do Banco Industrial basearam-se em critérios mais sintonizados com a política industrial e o desenvolvimento regional, dado o apoio creditício a bens de capital, a metais e aparatos técnicos etc. A alteração da lei orgânica, em 1957, autorizou a tomada de empréstimos internacionais e, em 1958, o Exim-Bank concedeu créditos para a compra de bens de capital estadunidenses. Contudo, os créditos de curto prazo formaram a maior parte dos recursos emprestados. Em 1966, o Banco Industrial possuía 160 milhões de ações em 391 empresas, sendo que em nove (Aceitera y Algodonera del Litoral, Arizu, Cura Hnos, Dubarry, Estrada, Orus, Selaco, SIAM e Suixtil) o controle ultrapassava o limite de 20%. O banco, junto com a Caja Nacional de Ahorro Postal (CNAP, depois denominada de Caja Nacional de Ahorro y Seguro - CNAS), detinha 17% do capital em ações das firmas na bolsa de valores (ROUGIER, 2012a).

Com a queda do governo radical, em 1966, o regime militar levou a cabo a política econômica amparada pelos setores tradicionais, mas a oligarquia pampeana ficou à margem dos benefícios diretos. Os principais beneficiários eram as grandes empresas multinacionais, o setor financeiro e as empresas estatais. Entre as políticas adotadas, temos: a desvalorização cambial, o aumento das tarifas sobre serviços públicos, o acréscimo dos salários por etapas, a diminuição dos impostos à importação e aumento dos encargos sobre as exportações, a busca pelo equilíbrio fiscal (via aumento dos impostos).

As empresas estatais criadas contemplaram a geração de energia - Hidroeléctrica Norpatagónica (1967) e usina nuclear Atucha I (1968), a siderurgia - Aceros Ohler S.A., em 1967, fruto da associação entre D.G.F.M. e a alemã Ohler - e a mineração - Hierro Patagónico de Sierra Grande S.A. (HIPASAM), em 1969, resultado da parceria entre D.G.F.M., Banco Industrial e Província de Río Negro. Em 1967, o decreto lei 17.318 institui o regime de sociedade anônima com maioria estatal - as empresas públicas passam a ser regidas pelas mesmas normas aplicadas às sociedades comerciais, e a lei 17.505 (reabilitação das empresas) permitiu a troca de dívidas fiscais por ações preferenciais sem direito a voto74.

Até finais da década, a implementação de medidas e reformas organizacionais transformou o Banco Industrial numa entidade chave de desenvolvimento, já que lhe coube a função de captar recursos internos provenientes da poupança nacional e

73 No governo de Illia, rompeu-se o acordo stand by com o FMI e os contratos de exploração de petróleo. 74 Foram beneficiadas por essa lei 187 empresas. Com a acentuação dos problemas das companhias, as ações em mãos do Estado se tornaram ordinárias e algumas empresas passaram para o controle estatal.

promover a indústria básica. Entre 1967 e 1969, o Banco Industrial agiu como um banco de desenvolvimento, pois parte importante dos empréstimos foram realizados a médio e longo prazos e “también se hizo amplio uso de avales y líneas de crédito del exterior, que facilitaban la incorporación de maquinarias importadas para los planes de instalación, ampliación o requipamiento de las empresas” (ROUGIER, 2004, p. 520).

No Brasil, em 1945, por meio de golpe militar patrocinado por civis e militares, Getúlio Vargas é retirado do poder. Sob o governo de Eugênio Gaspar Dutra (1945- 1950), ocorre a reelaboração das condições de dependência e o fim do capitalismo nacional. Os capitais estrangeiros lograram maiores facilidades de entrada e saída e as funções econômicas do Estado diminuíram para atender aos interesses da iniciativa privada. Foram criados os seguintes órgãos estatais: Conselho Nacional de Economia (CNE), de 1946, mas regulamentado em 1949; a Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA) foi constituída no governo seguinte (lei 1.806), em 1953; a Comissão do Vale do São Francisco (CVSF)75 resultou de interesses de parlamentares da Região Nordeste (IANNI, 1971).

Segundo Ianni (1971), Dutra enfrentou quatro problemas relacionados à economia. Primeiro, com a adoção de medidas liberais, as divisas minguaram e levaram à adoção de uma política de racionamento de divisas e licença prévia76. Segundo, a fim de coordenar os gastos públicos (saúde, alimentação, transporte e energia), criou-se o plano SALTE77, proposto por vários ministérios e coordenado pelo DASP. Terceiro, a Comissão Mista Brasileiro-Americana (1948) diagnosticou os pontos de estrangulamento da economia, mas o resultado final não resultou na elaboração de um plano de ação do Estado senão na proposição de diretrizes que permitissem o ingresso de capitais externos. Quarto, por meio do arrocho salarial, ocorreu uma redistribuição regressiva a favor da acumulação de capital.

Getúlio Vargas retornou ao poder pela via democrática em 1951, porém, a estrutura social havia se tornado mais complexa, com a distinção dentro da burguesia industrial (pequena, grande e internacional) e o fortalecimento da classe média urbana e do proletariado industrial. Durante o seu governo, ganhou importância o planejamento geral e a criação de grupos executivos (para política setorial). O projeto de industrialização esteve concentrado na Assessoria Econômica (composto por técnicos especialistas em planejamento e política industrial) e no Ministério da Fazenda. Coube ao primeiro desempenhar o papel de

75 SPVEA e CVSF contavam com recursos garantidos na constituição de 1946 (3% da renda tributária da União). 76 A Carteira de Exportação e Importação (CEXIM) manejou as licenças e as prioridades de importação.

secretaria informal de planejamento e de assessoria do gabinete presidencial e ao segundo, elaborar projetos de industrialização e infraestrutura energética (LEOPOLDI, 1996).

O Ministério da Fazenda patrocinou a formação da Comissão Mista Brasil – Estados Unidos (CMBEU)78 e da Comissão de Desenvolvimento Industrial (CDI). A CMBEU recomendou 41 projetos voltados à modernização da infraestrutura (transportes e geração de energia), para o qual nenhuma empresa possuía recursos suficientes. O programa de investimento, chamado de Plano para Reaparelhamento Econômico, contaria com apoio financeiro do Exim-Bank e do Banco Mundial. Para tanto, o governo buscou aprovar no congresso os fundos domésticos para o investimento, a garantia do tesouro aos empréstimos estrangeiros às firmas privadas e a criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), para coordenar os investimentos.

Entre 1952 e 1956, os empréstimos realizados pelo BNDE apresentaram vários percalços, tais como a interrupção dos recursos do Exim-Bank e do Banco Mundial, a escalada da inflação, o atraso no recebimento dos recursos. Com isso, a participação do banco na formação de capital fixo esteve ao redor de 3% e menos de 10% das operações tiveram como destino a iniciativa privada. Os investimentos foram distribuídos em 68.3% aos transportes, 19.5% à energia, 9.8% à indústria e 2.7%, outros79. O banco desempenhou um papel importante na garantia de empréstimos externos contraídos por empresas locais e uma proporção crescente de seu corpo de técnicos passou a se dedicar às atividades de pesquisa sobre a economia brasileira (BAER; VILLELA, 1980).

A Assessoria Econômica também desempenhou papel importante na realização de reformas administrativa e fiscal que foram essenciais à criação da Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobrás) (caixa de texto 6) e da Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobrás), ainda que esta última tenha sido inaugurada apenas em 1961. Na produção de aço, o Banco do Brasil assumiu o controle da ACESITA, em 1951, após vários empréstimos e o aumento dos custos da obra. Em 1954, fundou-se o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), a fim de suprir créditos de curto e longo prazos.