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7. DISCUSSÃO

7.1 Determinação do Limiar Anaeróbio em Cicloergômetro por Diferentes Métodos

As intensidades correspondentes aos limiares identificados por diferentes métodos

permaneceram entre 72,2±23,7 W (LL[Lac]/W) e 83,8±25,7 W (LVVE/W) (tabela 25). Em um

estudo de Kunitomi et al. (2000) investigando 56 indivíduos diabéticos tipo-2 e 56 indivíduos

sem a doença, constatou-se intensidades correspondentes ao LV em torno de 62±14 W para os

diabéticos e 74±13 W para os não diabéticos sedentários.

A identificação dos limiares (LL, LV e IGT - figura 9 e 13) foi bem sucedida em 15 dos

19 participantes do presente estudo, pois 4 voluntários não apresentaram um ponto distinto que

representasse o equilíbrio entre a produção e a captação de glicose no sangue. Assim, a

incidência do IGT em diabéticos tipo-2 foi de 79% em nosso estudo.

Os resultados do presente estudo demonstrando a identificação do IGT em

cicloergômetro estão de acordo com estudos anteriores conduzidos por Simões et al. (1998,

1999, 2003), Campbell et al. (1998) e Souza et al. (2003) em indivíduos saudáveis, e de

Baldissera et al. (2000) em pacientes diabéticos. Estes autores demonstraram não haver

diferenças entre respostas glicêmicas, lactacidêmicas e ventilatórias para a determinação de

constatarem um comportamento semelhante da glicemia em intensidades acima do LA

determinado em corrida. Campbell et al. (1998) e Simões et al. (2003) identificaram a glicemia

mínima em cicloergômetro, onde os participantes, após oito minutos de recuperação de um

exercício supramáximo (teste de Wingate), realizaram séries incrementais de exercício

produzindo uma cinética de glicemia semelhante a do presente estudo (figura 9, 25 e 28), vindo

a corroborar com a fundamentação e utilização de variáveis glicêmicas na avaliação funcional.

A identificação do LL e LV em exercícios aeróbios já está bem estabelecida na literatura

(Wasserman et al., 1964; Wasserman et al., 1967; Wasserman et al., 1973; Skinner & McLellan,

1980; Davis, 1985; Beaver et al., 1986; Weltman et al., 1990; Svedahl & MacIntosh, 2003). Em

uma dada intensidade de exercício a [Lac] e íons H+ começam a se acumular, indicando a

ocorrência de acidose metabólica. Inicialmente essa acidose é tamponada pelo HCO3- (Beaver et

al., 1986a) e o resultado é um aumentado VCO2 devido a dissociação do ácido carbônico

(H2CO3) em CO2 e H2O na tentativa de compensar a acidose metabólica por uma alcalose

respiratória. Essa alcalose vem induzida por estímulos do CO2 e H+ aumentados sobre o centro

respiratório, com conseqüente hiperventilação (Skinner & McLellan, 1980). A combinação de

aumentos na [Lac], VCO2 e VE possibilitam a identificação do LL pelo aumento

desproporcional da concentração de lactato no sangue, bem como do LV pelas respostas do

VCO2, da VE e dos VE/VO2 e VE/VCO2, como demonstrado no presente estudo, em que o LV

foi identificado como sendo o momento em que ocorreu um desproporcional aumento no

VE/VO2 em relação ao VE/VCO2. Similarmente a outros estudos, nenhuma diferença fora

observada entre os protocolos para os diabéticos do presente estudo.

No presente estudo foi possível a identificação do LL em cicloergômetro a partir da

inflexão da curva de lactato no sangue (figuras 1 e 9) e do LV pelo aumento desproporcional do

comportamento semelhante suportando a determinação das intensidades correspondentes ao LA

como a VE (figuras 2 e 10) e o VCO2 (figuras 3 e 11) corroborando com os achados de Davis

(1985).

Quando analisados os valores da taxa de troca respiratória (RER) em cicloergômetro

constatou-se valores correspondentes ao LL em torno de 0,94±0,06 corroborando com o estudo

de Skinner & McLellan (1980) que relataram valores de RER em torno de 0,89 a 1,00

correspondentes ao LA descrito por Wasserman et al. (1973). Além disso, quando analisadas em

conjunto, as variáveis VE, VO2, VCO2 e RER, apresentaram comportamento semelhante ao

relatado por Wasserman et al. (1973), ou seja, aumentaram desproporcionalmente em

intensidades supralimiar anaeróbio determinado por variáveis ventilatórias.

Variáveis ventilatórias e lactacidêmicas em cicloergômetro possibilitaram ainda a

identificação das intensidades limiares a partir da razão VE/W (QVE) e [Lac]/W (QLac)

aplicando o modelo matemático da função polinomial de segunda ordem. Outros autores vêm

empregando o ajuste polinomial na resposta do lactato sanguíneo (ex. protocolo do lactato

mínimo) com sucesso (MacIntosh et al., 2002; Pardono, 2005; Simões et al., 2005). No presente

estudo foi possível identificar o LVVE/W e o LL[Lac]/W como exemplificado nas figuras 6 e 7 para

um voluntário, não sendo diferente e apresentando altas correlações com outros métodos

empregados (tabela 25 e 26).

Quando analisado o comportamento do QVE e QLac para todos os participantes (figura

14 e 15) pode-se observar um comportamento da curva em forma de ˝U˝, onde em intensidades

até o LA ocorreu um declínio e a partir desse ponto um comportamento inverso da curva,

possibilitando a aplicação da função polinomial, em todos integrantes da amostra, para

identificação de uma intensidade a partir da qual a [Lac] e a VE aumentam

pode ser justificada com o aumento da intensidade do exercício propiciando maior ativação de

receptores articulares, estimulando o centro respiratório com conseqüente aumento da VE,

sendo que, em um dado momento, esse aumento desproporcional ao padrão de incremento da

carga passa a ocorrer devido ao acúmulo de metabólitos, possibilitando a determinação do LA

através do comportamento do QVE e do QLac. Este efeito compensatório do organismo

hiperventilando pode ser explicado pela maior ativação da glicólise anaeróbia, com conseqüente

aumento na produção de lactato sanguíneo.

A utilização das metodologias anteriormente citadas em cicloergômetro tem importante

aplicação prática, principalmente em relação ao LVVE/W por ser um método não invasivo e não

necessitar dos protocolos tradicionais para determinação do LV, que requerem análises gasosas

específicas (VO2 e VCO2), sendo necessários equipamentos de alto custo, difícil acesso e no

mínimo dois especialistas para interpretação dos dados, enquanto que para o LVVE/W a análise

torna-se independente da variação gasosa e levando em consideração o comportamento de uma

única variável (VE - QVE), sendo ainda um procedimento de menor custo para obtenção devido

os equipamentos disponíveis no mercado (ex. ventilômetro).

Em relação a FC, alguns estudos (Simões, 2002; Mattern et al., 2003; Pardono, 2005)

tem relatado valores percentuais correspondentes às intensidades de obtenção do LA em

cicloergômetro. No presente estudo pode-se constatar que a amostra em média atingiu

intensidades correspondentes ao LL a 79,5% da FCmáx atingida no momento da exaustão do

teste. Mattern et al. (2003) obtiveram valores correspondentes a máxima fase estável de lactato

(MFEL) em torno de 76,2% da FCmáx numa amostra de indivíduos treinados com idade média

de 64,6±2,7 anos. Por outro lado, no estudo de Pardono (2005) os percentuais no momento do

LA foram 85% da FCmáx em jovens ciclistas, enquanto que no estudo de Simões (2002) o LA

exaustão do teste. Além disso, quando analisada a intensidade do exercício (Watts)

correspondente ao LL obtida nos participantes diabéticos verificou-se resultados entre 36,4 e

75,0% da Pmáx, já no estudo de Simões (2002) esses valores foram entre 70,6 e 78,1% da

Pmáx.

A possível explicação para valores relativos reduzidos entre 5 e 9% de FC com relação a

FCmáx no momento do LA no presente estudo e no estudo de Mattern et al. (2003) quando

comparados aos estudos de Pardono (2005) e Simões (2002), bem como do valor percentual da

Pmáx de obtenção do LA entre o presente estudo e o estudo de Simões (2002), pode se justificar

pelos impactos marcados pelo envelhecimento, tendo em vista as diferenças nas idades entre as

amostras desses estudos serem consideráveis.

Um estudo de Ferrari et al. (2003) relata que a idade está associada a uma complexa

mudança na estrutura e função do aparelho cardiovascular, onde indivíduos mais idosos

começam a ser menos responsivos ao sistema nervoso simpático, com conseqüente menor

contratilidade miocárdica durante o exercício, podendo ter significantes implicações na

dinâmica circulatória.

Pollock et al. (1997) investigando a potência aeróbia em uma amostra com idade média

de 70,4±8.8 anos após acompanhamento longitudinal de 20 anos, evidenciou redução no

VO2máx em 22% nos praticantes de exercício a 60-85% da FC de reserva mais uma

sessão/semanal de exercício no LA; redução de 25% nos participantes de programas a 60-80%

da FC de reserva e redução de 46% nos indivíduos que realizavam exercícios como caminhada e

corrida abaixo de 70% da FC de reserva. Esses resultados indicam possíveis efeitos do processo

de envelhecimento, como destacado por Ferrari et al. (2003), mesmo com manutenção de uma

atividade física sistematizada. Contudo, um menor efeito deletério na potência aeróbia foi

sessão semanal no LA. O estudo de Pollock et al. (1997) nos remete a destacar a aplicação

prática do LA na prescrição de exercícios para populações especiais incluindo diabéticos tipo-2,

sem complicações cardiovasculares associadas, vindo ao longo dos anos a minimizar os

possíveis impactos da idade sobre a potência aeróbia.

No presente estudo foi possível identificar a intensidade correspondente ao LL nos 19

participantes diabéticos em 67,2% do VO2máx. Novamente fazendo essa mesma relação para os

15 participantes escolhidos o LL foi identificado a 66,5% do VO2máx. Mattern et al. (2003)

subdividindo a amostra de atletas de seu estudo em grupos com mesmo padrão de intensidade e

duração de treinamento, porém, com idades diferentes (GI=25,9±1,0; GII=43,2±1,0 e

GIII=64,6±2,7 anos), identificaram intensidades correspondentes a MFEL em torno de 82%,

75% e 70% do VO2máx para GI, GII e GIII, respectivamente, vindo a aproximar os valores em

%VO2máx do GIII com a amostra investigada em nosso estudo. Além disso, Mattern et al.

(2003) encontrou uma correlação inversa entre %VO2máx na intensidade de MFEL e a idade em

anos (r= -0,68; p<0,05), que apesar de ser uma redução independente do VO2máx apresenta

conformidade com os estudos de Ferrari et al. (2003) e Pollock et al. (1997), parecendo essas

variações existirem devido às diferenças tanto na idade quanto no nível de aptidão física dos

indivíduos.

Outra análise realizada no presente estudo foi a partir da escala de Borg de 15 pontos

(Borg, 1982) para mensuração da percepção subjetiva de esforço (PSE) nos testes incrementais

em cicloergômetro. Como observado (tabela 17 e figura 16), o comportamento médio da PSE

apresentou-se semelhante ao da FC nos momentos relativos para todos os voluntários. Vale

destacar que o valor médio de FC para os 19 voluntários da amostra foi 118,1±19,2 bpm no

momento do LL, enquanto que nesse mesmo momento a PSE apresentou-se numa média de

Borg (1982) relata que a escala de PSE poderia estar refletindo relações diretas com a

FC (ex. 13 na escala = 130 bpm) para indivíduos de 30 a 50 anos de idade. Contudo, os valores

de FC podem estar influenciados por outros fatores como idade, ambiente e estado de ansiedade,

como visto no estudo de Ferrari et al. (2003) a respeito da variação do padrão cardiovascular

com a idade.

Apesar de, no presente estudo, a amostra de diabéticos ter apresentado uma idade média

(tabela 1) um pouco acima dos participantes descritos por Borg (1982), os valores absolutos de

FC e PSE tenderam a se aproximar até em intensidades correspondentes ao LL (tabelas 16 e 17

e figura 16), podendo-se considerar que essas são intensidades que teoricamente o indivíduo

apresenta um estado de equilíbrio para realização de exercícios.

Estudos em cicloergômetro, com sujeitos jovens e fisicamente ativos (Simões, 2002;

Pardono, 2005), têm encontrado valores de PSE no momento LA entre 13 e 14 pontos.

Kunitomi et al. (2000), em seu estudo investigando três grupos de diabéticos tipo-2 com idade

média de 45,0±3,0; 54,0±3,0 e 63,0±2,0 anos, encontraram valores médios de PSE

correspondentes ao LV de 12,7±1,4; 12,6±0.9 e 11,8±2,0 respectivamente, vindo ao encontro

dos achados do presente estudo que apresentaram em média o valor de 12,7±1,7 pontos na

intensidade correspondente ao LL.

Quando comparadas as variáveis FC e VO2, no momento de obtenção do LA, entre os

diferentes métodos estudados em cicloergômetro, não foram constatadas diferenças

significativas (tabela 25), sugerindo a utilização destes protocolos para determinação do LA em

diabéticos tipo-2.

No presente estudo foi observada a relação entre PSE e FC (figura 16) bem como entre

estudo de Skinner & McLellan (1980), sugerindo que a FC e o VO2 respondem

proporcionalmente à intensidade do exercício.

Simões et al. (2003) também demonstraram relações semelhantes entre as respostas

destas variáveis durante o teste incremental do lactato mínimo (LM), entretanto, a PSE parece

que não apresentou relação direta com a [Lac] e pH, uma vez que após indução da

hiperlactatemia com conseqüente queda do pH o comportamento tanto da FC quanto da PSE

não apresentou diferença quando comparado ao teste do “individual anaerobic threshold” (IAT)

realizado neste mesmo estudo. Contudo, nesses dois estudos (Simões et al., 2003; Pardono,

2005), bem como no presente estudo sugere-se a utilização da PSE para estimativa do LA,

corroborando com outros estudos (ACSM, 2000; Guyton Hornsby & Albright, 2002) que

recomendam a utilização da PSE no monitoramento de programas de treinamento para

diabéticos tipo-2. Entretanto, novos estudos devem ser realizados sobre a utilização da PSE para

predição do LA em populações especiais como diabéticos tipo-2.

As [Lac] correspondente ao LL determinado em cicloergômetro, bem como aos outros

métodos propostos no presente estudo, também, em cicloergômetro, foram entre 2,2±0,7 e

2,7±1,0 mM (tabela 19), vindo ao encontro do LA determinado por Wasserman et al. (1973) que

detecta o início do acúmulo de lactato no sangue a partir da análise ventilatória durante teste

incremental. Weltman et al. (1990), investigando a validade de um teste incremental com

estágios de três minutos em sujeitos saudáveis (27,2±8,2 anos) para a determinação do LA a

partir do LL e a partir das concentrações fixas de 2,0; 2,5 e 4,0 mM, encontrou altas correlações

destes protocolos (> r= 0,85) com a MFEL, sugerindo que todos protocolos são válidos e

confiáveis na determinação da aptidão aeróbia.

A utilização do protocolo com concentração fixa de 4 mM para determinação da MFEL

estudo com sujeitos saudáveis e corredores de longa distância com idade média de 29,8±6,0

anos. Nesse estudo a MFEL ocorreu numa concentração média de 4,02±0,7 mM em teste de

esteira. Na amostra de diabéticos do presente estudo o LL, em cicloergômetro, ocorreu numa

concentração de 2,2±0,7 mM. A diferença nas concentrações de lactato da amostra de Heck et

al. (1985) com a amostra do nosso estudo pode ser em função de uma possível variabilidade do

tipo de exercício solicitado. Svedahl & MacIntosh (2003), revisando os métodos para

mensuração do LA atribuem alguns fatores que afetam a produção e a distribuição do lactato no

organismo, descrevendo que a massa muscular em atividade pode influenciar nas [Lac] no

momento da obtenção do LA.

Como observado na tabela 25 ocorreram diferenças significativas (p<0,05) entre as

concentrações de lactato correspondente ao LVVE/W e LV, podendo ser explicada pela utilização

dos ajustes matemáticos que levam em consideração os pontos do QVE e do polinômio

referente a esses pontos, não apresentando um alto coeficiente de determinação (R²) e

conseqüentemente tendenciando a subestimar as intensidades de limiar obtidas pelos métodos

visuais (LL, LV e IGT), como exemplificado para um voluntário (figuras 1, 5, 6 e 7), ou

superestimar essas mesmas intensidades para todos os voluntários quando comparado LV e o

LVVE/W (tabela 18). Esses achados podem também explicar as correlações apenas

moderadamente altas entre o LL[Lac]/W com os outros métodos empregados (tabela 26).

Semelhante aos resultados da [Lac], diferenças significativas foram observadas para a

RER e PSE entre o LV e LVVE/W (tabela 25), acredita-se que, de forma similar, as diferenças

possam ser justificadas a partir da explicação anterior a respeito da utilização da função

polinomial, que em nossa opinião merece mais estudos na tentativa de identificação da melhor

7.2 Determinação do Limiar de Lactato e Glicêmico em Exercício Resistido por Diferentes