Nos últimos 15 anos vários estudos têm procurado investigar os benefícios do exercício
físico para indivíduos diabéticos tipo-2, onde a maioria desses estudos demonstram a
importância do exercício crônico (Eriksson et al., 1997; Honkola et al., 1997; Ishii et al., 1998;
Castaneda et al., 2002; Baldi & Snowling, 2003; Bruce & Hawley, 2004), com poucos
demonstrando os efeitos agudos do exercício no tratamento do diabetes tipo-2 (Minuk et al.,
1981; Delvin et al., 1987; Burstein et al., 1990; Fluckey et al., 1994). Além disso, pela carência
de estudos sobre exercício resistido nessa população à literatura tem sugerido com maior
freqüência à participação em exercícios aeróbios (Martins & Duarte, 1998; ADA, 1999; ACSM,
2000, Forjaz et al., 2002; Willey & Fiatarone-Singh, 2003; Bruce & Hawley, 2004). Em
contrapartida, poucos autores tem sugerido a prática de exercícios resistidos no tratamento do
diabetes, a maioria dos quais tem indicado essa prática apenas como complemento para um
programa de treinamento. Apesar disso, alguns estudos tem demonstrando dados positivos, tanto
cronicamente (Eriksson et al., 1997; Honkola et al., 1997; Ishii et al., 1998), quanto agudamente
(Fluckey et al., 1994), em relação aos benefícios do exercício resistido para portadores de
diabetes tipo-2
O exercício físico regular parece ter um papel importante na prevenção e no tratamento
dessa doença, aumentando a sensibilidade à insulina, possibilitando maior controle glicêmico,
melhora do perfil lipídico, redução da pressão arterial e melhora da capacidade cardiovascular
(Wallberg-Henriksson et al., 1998; ACSM, 2000). Além disso, o exercício aumenta o gasto
energético, o qual combinado com uma ingestão alimentar adequada pode contribuir para a
redução da gordura corporal, tendo em vista que a maioria dos portadores do diabetes tipo-2
Os possíveis mecanismos que explicam os benefícios do exercício para diabéticos estão
sendo estudados com maior profundidade nos últimos anos. Sabendo que a causa mais provável
da resistência à insulina encontra-se nos defeitos pós-receptores na via de sinalização da
insulina impedindo a translocação do GLUT-4, alguns estudos demonstraram em humanos
saudáveis (Greiwe et al., 2000), em modelo animal (Kawanaka et al., 1997) e em diabéticos
tipo-2 (Dela et al., 1994), o papel do exercício físico no aumento da expressão do GLUT-4.
Similarmente, outros estudos (Wallberg-Henriksson et al., 1998; Holmes & Dohm, 2004; Ivy,
2004) relatam o aumento da captação de glicose muscular em repouso estimulada por um
aumento da expressão do GLUT-4 muscular em decorrência da realização de exercícios. Assim,
os benefícios do exercício no controle glicêmico de indivíduos diabéticos tipo-2 parecem estar
relacionados a uma auto-regulação da expressão gênica e/ou atividade das proteínas envolvidas
na sinalização da insulina na musculatura esquelética, onde uma melhora da tradução dos sinais
dos IRS e PI 3-kinase podem contribuir para translocação do GLUT-4 e conseqüentemente
melhor controle da glicose sanguínea (Hawley & Houmard, 2004).
No estudo de Dela et al. (1994), sete diabéticos tipo-2 foram submetidos a um
treinamento de ciclismo por nove semanas a aproximadamente 70% do VO2máx com duração
de 30 min (6x/sem). Os sujeitos apresentaram melhoras significativas na expressão do GLUT-4
tanto em nível de proteína quanto em nível de RNA mensageiro (p<0,05), quando comparados
ao grupo controle não treinado.
Um estudo conduzido por Burstein et al. (1990) investigou os efeitos de 60 min de
exercício aeróbio em esteira sobre a captação de glicose, mediante dose-resposta de insulina em
indivíduos diabéticos tipo-2 obesos. Os resultados indicaram um efeito agudo benéfico na ação
da insulina relacionado com o exercício aeróbio, sugerindo que o exercício pode atenuar os
Delvin et al. (1987), na tentativa de investigarem a produção de glicose basal e,
conseqüente, remoção após infusão de insulina em diabéticos tipo-2 frente a realização de
exercícios intermitentes em cicloergômetro a 85% do VO2máx até a exaustão, relataram uma
redução nas concentrações glicêmicas em jejum com um significante aumento na utilização de
glicose durante infusão de insulina 12 a 16 h pós-exercício.
Similarmente, Poirier et al. (2000) comparando as mudanças nos níveis glicêmicos e
insulinêmicos em resposta à uma hora de exercício realizado a 60% do VO2pico, em indivíduos
diabéticos do tipo-2, em estado de jejum ou duas horas após alimentação, concluíram que a
alimentação prévia, seguida de exercício, melhorou a sensibilidade à insulina e atenuou a ação
de hormônios hiperglicemiantes, com conseqüente diminuição da glicemia.
Apesar dos exercícios aeróbios serem frequentemente mais recomendados no controle
glicêmico de diabéticos tipo-2, muitos diabéticos podem apresentar complicações associadas
como neuropatias periférica e autonômica, que respectivamente estariam limitando a realização
de exercícios aeróbios, devido tanto à menor sensibilidade nas extremidades dos membros
inferiores na sustentação da massa corporal, como por exemplo em uma caminhada ou corrida,
quanto no descontrole da freqüência cardíaca durante exercício contínuo, onde a realização de
exercícios resistidos seria uma alternativa interessante para esses praticantes.
Nesse sentido, Miller et al. (1984), ao avaliarem os efeitos de 10 semanas de treinamento
resistido na tolerância à glicose e resposta da insulina com administração de 100 g de glicose a
10% no segundo dia após a última sessão de exercício em 10 universitários saudáveis,
demonstraram que o exercício resistido reduziu o nível de insulina basal e potencializou a
resposta da insulina pós-ingestão de glicose sem alterar a tolerância à glicose. Além disso, nesse
estudo as respostas insulinêmicas correlacionaram-se inversamente com a massa livre de
Ishii et al. (1998) examinando o efeito de quatro a seis semanas de treinamento resistido
circuitado (40-50% de 1RM), por meio de medidas diretas da sensibilidade à insulina (técnica
de bloqueio hiperinsulinêmico-euglicêmico) em 17 diabéticos tipo-2 sedentários, demonstraram
que o programa de exercício utilizado melhorou a sensibilidade à insulina. Esses autores
discutem ainda a possibilidade do exercício resistido aplicado com intensidades moderadas e
alto volume poder estar contribuindo de maneira similar ao exercício aeróbio para uma melhora
do metabolismo aeróbio das fibras do tipo-2. Esta adaptação resultaria em uma melhor
capacidade oxidativa e densidade capilar, além da maior capacidade de expressão do GLUT-4,
resultando numa melhora da sensibilidade à insulina nos indivíduos diabéticos.
Um outro estudo de Honkola et al. (1997) avaliando os efeitos de cinco meses de
treinamento resistido em forma de circuito, duas vezes por semana, sobre o perfil metabólico em
indivíduos diabéticos tipo-2 comparado a sujeitos controle, evidenciou que o tipo de
treinamento aplicado pode reduzir o risco para complicações diabéticas futuras. Um importante
achado desse estudo foi à significância estatística quando comparada às diferenças entre grupos,
apontando um controle glicêmico, a partir da hemoglobina glicosilada (HbA1c), a longo prazo,
no grupo de diabéticos exercitados.
Similarmente, Eriksson et al. (1997) investigando o efeito de três meses de treinamento
resistido, duas vezes por semana, a uma intensidade estimada superior a 50% de 1RM, no
controle glicêmico de indivíduos diabéticos, constataram que apesar da glicemia em jejum não
apresentar variação, os valores de HbA1c demonstraram significante redução após período de
treinamento (8,8 para 8,2%, p<0,05). Esses autores sugeriram que esse tipo de exercício
também é importante para o aumento da densidade capilar e maior capacidade de estoque de
Devido à carência de estudos avaliando sobre os possíveis efeitos agudos do exercício
resistido nas disfunções metabólicas em humanos, Fluckey et al. (1994) investigaram o efeito de
uma sessão de exercícios resistidos de 50 a 100% de 10RM na tolerância à glicose e ação da
insulina em diabéticos tipo-2. Verificou-se que apesar de o programa com exercício resistido
não ter contribuído para uma queda nos níveis de glicose sanguína, foi possível observar uma
queda significativa nos níveis insulinêmicos até 18 horas pós-exercício. Esses resultados
indicam uma melhorada resposta insulinêmica para uma mesma carga de glicose no sangue.
Castaneda et al. (2002) submeteram 62 indivíduos, de ambos os sexos, com idade maior
do que 55 anos, portadores de diabetes do tipo-2, a um programa de exercícios resistidos de alta
intensidade por 16 semanas (semana 1-8 = 60 à 80% de 1RM obtida no início do estudo e
semana 10-14 = 70 à 80% de 1RM obtida na nona semana do estudo). Um aumento na massa
magra foi observado, bem como melhora da glicemia, redução no uso de medicações,
diminuição na adiposidade abdominal e redução na pressão arterial sistólica, além de aumento
na força muscular. Apesar desses autores sugerirem que as intensidades descritas no
treinamento resistido como sendo benéficas para essa população, fortes limitações colocaram
em risco essa investigação, dentre elas o não diagnóstico do estado de retinopatia, o que sob
altas intensidade de treinamento pode se agravar e desencadear elevação da pressão na retina
desses indivíduos (Willey & Fiatarone-Singh, 2003). Contudo, programas de exercícios
resistidos têm se mostrado benéficos no controle glicêmico de diabéticos do tipo-2. Baldi &
Snowling (2003), ao investigarem o efeito de 10 semanas de treinamento resistido, de
intensidade moderada, no controle glicêmico de indivíduos obesos diabéticos do tipo-2,
encontraram incrementos na massa muscular (importante na captação de glicose pelo músculo),
sobretudo na sessão transversal do quadríceps. Essa modificação foi inversamente
sugerindo que treinamentos que induzam a hipertrofia muscular parecem indicados para o
controle glicêmico nessa população.
Com relação às variáveis de freqüência, intensidade e duração do exercício, em se
tratando de exercícios aeróbios, a última posição do American College of Sports Medicine
(ACSM, 2000), preconiza um mínimo de três sessões semanais (uma vez que o efeito agudo de
uma única sessão de exercício geralmente é menor que 72 horas), com intensidade entre 40 e
70% do VO2máx, e duração inicial de 15 min progredindo para no mínimo 30 min ao longo das
sessões.
No entanto, a carência de informações relacionadas a prescrição de exercícios resistidos
em portadores de diabetes impossibilitam uma indicação mais criteriosa sobre o volume e a
intensidade adequados para essa população especialmente. Nesse sentido, existem alguns
estudos sugerindo a existência de um possível limiar glicêmico, e que a intensidade do exercício
correspondente a este limiar possa representar um equilíbrio entre a captação de glicose
muscular e a produção de glicose hepática. Acredita-se e que em intensidades supra-limiar
glicêmico ocorreria um aumento de hormônios hiperglicemiantes (especialmente catecolaminas)
inibindo as células beta do pâncreas, desencadeando glicogenólise hepática e concomitante
hiperglicemia.
Mizuta & Simões (2000), investigaram os efeitos de 25 min de exercício com
intensidades relativas ao limiar anaeróbio sobre o comportamento glicêmico após hiperglicemia
induzida, em 10 indivíduos jovens saudáveis, os autores relataram que a intensidade
correspondente a 90% do limiar anaeróbio provocou significativa redução da glicose sanguínea
em relação ao período pré-exercício, sugerindo que uma única sessão de exercícios pode
efeito agudo do exercício resistido no controle glicêmico de indivíduos diabéticos ainda merece
ser melhor investigado.