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OS DEVERES DOS PAIS EM GARANTIR A EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS BÁSICOS DE CRIANÇAS E ADOLESCDENTES

Aos pais, como detentores maiores do poder familiar, é atribuída a obrigação de prestar toda a assistência necessária à sua prole. São deles os deveres de garantir saúde, alimento e afeto, contribuindo assim para seu melhor desenvolvimento. Nessa relação é quesito importantíssimo o afeto, pois, é a partir do afeto paternal que a criança desenvolve suas percepções e caráter, em outros termos, as ações da criança são frutos de sua criação.

Ao que concerne aos direitos da criança e do adolescente, titulares de direitos fundamentais, previstos na Constituição Federal, em virtude de estarem em fase de desenvolvimento, a autoridade parental exerce papel essencial para a realização do projeto constitucional. A Constituição entendeu serem eles merecedores de tutela prevalente, o que foi corroborado, também, pelo art. 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. Seu melhor interesse, nesse sentido, deve ser promovido e potencializado. (TEIXEIRA; TEPEDINO,2020, p. 284). Prevê o artigo 6º do Estatuto:

Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento. (BRASIL,1990).

Considerando as crianças e adolescentes como pessoas em desenvolvimento, sobressai a importância do papel dos pais enquanto educadores. Eles têm, na autoridade parental, grande valor educativo, pois, sua função é, entre outras, a de promover as potencialidades criativas dos filhos.

As relações parentais são compreendidas como a soma de direitos, poderes e deveres atribuídos aos genitores em relação à educação, representação e

administração dos bens dos filhos, bem como sua subsistência e instrução. Também é muito importante para a formação saudável do filho, que ele se sinta amado. Nesse sentido o afeto passa a ter maior importância e reconhecimento no mundo jurídico. Quando ocorre a supressão de um direito da prole, diga-se o afeto, sendo dever dos pais garantir-lhes este, incorre em desrespeito a um direito referente a pessoa humana, porque fere a personalidade do menor, acarretando em danos psicológicos, muitas vezes irreversíveis.

A dignidade da pessoa humana é umas das cláusulas pétreas constantes na CF/88. Os direitos inerentes à criança e ao adolescente se relacionam diretamente com tal princípio, estando, portanto, protegidos constitucionalmente. É o que se pode concluir da leitura do artigo 7º do ECA: “A criança e o adolescente têm direito à proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.” (BRASIL, 1990).

O artigo 229 da CF/88 reforça a obrigação dos pais e estabelece a reciprocidade, no sentido de os filhos também ter o dever de assistir os pais idosos, carentes ou enfermos: “Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.” (BRASIL, 1988).

Aos pais, independentemente de serem casados ou não, cabe a assistência aos filhos. Cada genitor deve agir para garantir a boa formação dos filhos. Trata-se de um dever recíproco, em que os pais cuidam dos filhos para que no futuro os filhos cuidem dos pais. Aos filhos compete dar aos pais o mesmo amparo que receberam quando menores. O Estado não pode obrigar os pais a serem pais, pode somente obrigar a pagar alimentos e a estipular as relações e os deveres destes com os menores. Não é possível compelir alguém a amar o filho, o que consequentemente pode levar a impunidade do abandono afetivo.

Para os autores Ana Carolina Broxado Teixeira e Gustavo Tepedino, o dever de criar antecede ao nascimento, abrangendo os cuidados da fase da gestação, conforme se verifica da Lei 11.804/2008, que trata dos alimentos gravídicos, até o nascimento e perdura como dever jurídico até que o filho alcance a maioridade. (TEIXEIRA; TEPEDINO, 2020, p. 284).

A criação do menor está diretamente ligada ao suprimento das suas necessidades biopsíquicas, vinculada à assistência, ou seja, à satisfação das suas necessidades básicas, tais como cuidados na enfermidade, orientação moral, apoio psicológico, manifestações de afeto e cuidado: o vestir, o abrigar, o alimentar, o acompanhar física e espiritualmente. (TEIXEIRA; TEPEDINO, 2020, p.285).

Caetano Lagrasta Neto, citado por Alvaro Villaça Azevedo, institui que “[...] Guardar é, antes de tudo, amar; estar presente, na medida do possível, comparecer a atos e festividades escolares, religiosas, manter diálogo permanente e honesto com o filho sobre as questões familiares, sobre arte, religião, lazer, cultura, esporte, política.” (NETO apud AZEVEDO, 2019, p. 231).

Deste modo, embora os pais sejam os garantidores de direitos referentes a subsistência dos menores, a eles cabe também a obrigação de se fazer presentes na vida dos filhos, dando a estes o suporte necessário para sentirem-se acolhidos e protegidos dentro de seus lares, e, além de afeto, é dever destes, participarem da vida dos seus filhos.

Embora o abandono afetivo ainda não esteja previsto expressamente em lei, e amar não seja obrigação, encontram-se vários elementos no ordenamento jurídico que o caracterizam, abrindo precedência para que este seja objeto de reparação por dano moral ao ofendido, uma vez comprovado um dano real à personalidade do filho em virtude dessa situação.

Ainda, percorrendo diversos textos que legislam sobre os direitos das crianças e dos adolescentes e o dever dos genitores em garantir-lhes a melhor forma de criação, tem-se as disposições do ECA, Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que regulamenta esses direitos em diversos artigos, dentre eles os artigos 3º, 4º e 19º:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

[...]

Art. 19. É direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral. (BRASIL, 1990).

Em análise aos artigos acima citados, verifica-se mais uma vez que o cuidado é dever dos pais, na falta dos pais caberá ao Estado e à sociedade prestar esse cuidado. Diante de tais previsões, ainda que não se encontre previsto expressamente o abandono afetivo, ele se caracteriza pela privação da atenção necessária para o desenvolvimento integral do menor, pois em virtude do abandono afetivo, este poderá apresentar traumas em seu desenvolvimento, devido à falta de uma relação familiar saudável, onde houve a supressão de cuidado por um dos genitores.

Alguns casos de abandono afetivo são justificados pelo fato de os pais viverem em lares diferentes e não estarem em constante contato com seus filhos, e estes deixam de procurar recursos que venham contornar tal situação. O Código Civil estipula e regula a guarda compartilhada a fim de sanar tal problema e tornar a convivência da criança com seus pais mais acessível.

A guarda compartilhada encontra previsão no artigo 1.583, §1º do Código Civil, que preceitua os requisitos da guarda, esta pode ser unilateral ou compartilhada, onde a primeira é atribuída a apenas um dos genitores ou a alguém que o substitua, já a segunda, é o exercício conjunto dos pais para garantir os direitos de seus filhos, mesmo que eles não vivam sob o mesmo teto, é atribuído a ambos o poder familiar dos filhos comuns. ( BRASIL, 2002).

A Lei Nº.13.058/2014, que estipulou novas definições quanto a guarda compartilhada, estabeleceu em seu art. 2º, §2º, que na guarda compartilhada o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e o pai, respeitando as condições fáticas e os interesses dos filhos. (BRASIL, 2014).

Para Álvaro Villaça Azevedo, a guarda compartilhada é um estágio bem avançado de educação conjunta de filhos por seus pais separados. É preciso um grau de compreensão muito grande por esses pais, que dividem decisões, procurando melhor vida educacional, social, e bem-estar dos seus filhos. (AZEVEDO, 2019, p. 232).

Ante o exposto, é de suma importância que os pais, mesmo que separados, exerçam com responsabilidade seus deveres com seus filhos. Mesmo que não haja a oferta de afeto, é dever dos pais garantirem os cuidados quanto à educação de seus filhos, devendo assim, dedicarem-se a proporcionar o melhor ambiente para

eles, com a finalidade de prepará-los e orientá-los quanto aos desafios diários de convivência.

Segundo os autores Ana Carolina Brochado Teixeira e Gustavo Tepedino, a assistência, criação e educação estão diretamente associados à formação da personalidade do menor. O escopo de realizar os direitos fundamentais dos filhos, seja em que seara for, caberá aos pais e ao Estado. O direito à educação, além deste aspecto geral, também se reporta ao incentivo intelectual, para que criança e adolescente tenham condições de alcançar sua autonomia, pessoal e profissional. (TEIXEIRA; TEPEDINO, 2020, p.285).

Quando os pais deixarem de cumprir com suas obrigações para com seus filhos, a estes poderá resultar a perda do poder familiar, poder este que possui natureza personalíssima, por essa razão é irrenunciável e indelegável, porém se constatada a negligência por parte destes, poderá o Estado intervir e destitui-los desse poder, conforme preceitua o art.24 do ECA:

Art. 24. A perda e a suspensão do pátrio poder familiar serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22. (BRASIL,1990).

Conforme cita Valdemar Pereira da Luz, não há que se confundir o exercício do poder familiar com o exercício da guarda, porquanto o fato de um só dos cônjuges deter a guarda dos filhos, no caso de estarem os pais separados ou divorciados, não modificará os direitos e deveres de ambos em relação aos filhos, mantendo-se íntegro o poder familiar, detendo o pai ou a mãe, a quem não for conferida a guarda também o poder familiar. (LUZ, 2009, p.259).

Portanto, o Estado como garantidor da efetivação dos direitos dos menores, tem a função de fiscalizar e aplicar as penalidades aos pais que deixarem de cumprir seu papel, já que o dever de cuidar é responsabilidade destes. Aos pais não cabe a obrigação de amar, mas de zelar pela vida dos filhos, garantindo-lhes melhores condições de vida, não só na questão financeira, mas também no seu desenvolvimento pessoal. Por isso, é necessário a abordagem quanto a responsabilização dos pais referente ao não cumprimento dos seus deveres, tema que se passa a tratar no próximo título.

2.3 A POSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO DOS PAIS PELO NÃO