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O tema do abandono afetivo ainda é relativamente novo, não se tem uma resposta pacífica quanto ao cabimento de indenização por dano moral, visto que ainda não se tem embasamento legal específico que estipule punição a quem o pratique. No entanto, é um problema muito comum e presente em todas as classes sociais, não se trata apenas de garantir o básico, a sobrevivência da prole, mas sim, garantir que ela se desenvolva de forma saudável na esfera psíquica.

O abandono afetivo pode ocasionar dano na vida do menor, muitas vezes irreversível. Ainda assim, para o dano ser entendido como tal, é necessário que se preencham os requisitos legais para sua qualificação.

Diante disso, faz-se necessário a introdução sobre o que é a responsabilidade civil, conforme apontam diversos doutrinadores. A responsabilidade civil pode ser entendida como um dever jurídico sucessivo que nasce com a finalidade de restaurar um dano causado pela violação do dever jurídico originário, podendo resultar em obrigação pecuniária de reparar um dano causado a outrem, seja ele por ação ou omissão, através da indenização.

Os autores Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho conceituam responsabilidade como:

Responsabilidade, para o Direito, nada mais é, portanto, que uma obrigação derivada– um dever jurídico sucessivo – de assumir as consequências jurídicas de um fato, consequências essas que podem variar (reparação dos danos e/ou punição pessoal do agente lesionante) de acordo com os interesses lesados. (STOLZE; PAMPLONA FILHO, 2013, p.47).

Já para o autor Silvio Rodrigues “[...] A responsabilidade civil é a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio ou por fato de pessoa ou coisas que dela dependam. Dito isso, a responsabilidade é o direito que o agente lesionado tem de garantir seu ressarcimento do dano causado pelo agente causador.” (RODRIGUES, 2002, p.6).

Ainda segundo entendimento do doutrinador Carlos Alberto Bittar “[...] a responsabilidade civil é obrigação de indenizar, que compele o causador a arcar com as consequências advindas da ação violadora, ressarcindo os prejuízos de ordem moral ou patrimonial, decorrente de fato ilícito próprio, ou de outrem a ele relacionado.” (BITTAR,1994, p. 561).

Para que ocorra a responsabilidade civil deve haver a pratica de um ato ilícito, que resulte dano, e que tenha conectividade entre eles, resultando assim a obrigação de repará-lo. A responsabilidade Civil pode ser objetiva ou subjetiva, sendo necessário a estas, elementos que as qualifiquem e possibilitem o pleito dos direitos lesionados, desta forma, alguns doutrinadores conceituam ambas as categorias e quais os elementos necessários para sua caracterização. O autor Silvio Rodrigues define a reponsabilidade objetiva como:

Na responsabilidade objetiva, a atitude culposa ou dolosa do agente causador do dano é de menor relevância, pois desde que existia relação de causalidade entre o dano experimentado pela vítima, e o ato do agente, surge o dever de indenizar, quer tenha este último agido ou não culposamente. (RODRIGUES, 2002, p.10).

Já o autor Carlos Roberto Gonçalves define a responsabilidade civil subjetiva como “[...]a responsabilidade quando se esteia na ideia de culpa. A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável. Nessa concepção, a responsabilidade do causador do dano semente se configura se agiu com dolo ou culpa.” (GONÇALVES, 2007, p.22).

Quanto aos elementos que caracterizam a responsabilidade civil, citam-se quatro: ação ou omissão, ato ilícito, dano e nexo causal. Quando verificados os quatro se configura a responsabilidade civil, e poderá ser imputado ao autor do dano o dever de reparação, seja ele na obrigação em fazer ou na forma pecuniária. Em se tratando de dano à personalidade, não há como se restituir o bem a sua forma original, sendo assim, aplica-se a indenização pecuniária.

No caso do dano moral, é necessário que se preencham os requisitos para sua indenização, ademais, o dano moral não é passível de cálculo ou mensuração, visto que fere um direito imaterial, assim segue o dano ocasionado pelo abandono afetivo.

Segundo Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, citada por Álvaro Villaça Azevedo, “[...] o dano causado pelo abandono afetivo é, antes de tudo, um dano à personalidade do indivíduo, sendo assim, caracteriza-se um dano moral, pois fere o ser individual.” (AZEVEDO apud HIRONAKA, 2019, p. 251). O autor Eduardo Barbosa, citado por Dimas Messias de Carvalho, ressalta que:

[...] a responsabilidade civil no direito de família pode ser observada sob o aspecto da conjugalidade e da parentalidade. No caso da conjugalidade, compete ao cônjuge ou companheiro o dever de preservar a integridade física e psíquica afetiva do outro, enquanto na parentalidade compete especialmente aos pais criar e educar os filhos, promovendo o desenvolvimento de sua personalidade em razão do poder familiar. Ocorre o dever de indenizar na conjugalidade, a título ilustrativo, nas hipóteses de ofensas físicas, morais e à imagem do consorte, enquanto no parentesco ocorre, principalmente, nas hipóteses de abuso e abandono afetivo ou material. (BARBOSA apud CARVALHO,2020 p.147).

Ainda conforme o autor Álvaro Villaça Azevedo, a dor pelo não reconhecimento do amor é constante nos atos de nossa existência e necessitam de uma indenização, para penalizar a negligência, o descaso, o desamor, que deve ser medido de caso para caso, ainda que sua configuração material seja proforma, simbólica. O ser humano deve ser respeitado, essencialmente, como obra da

natureza, que precisa ser preservada, além das querelas e das fraquezas do ser humano. (AZEVEDO, 2019, p. 251).

Refere-se ainda, pelo entendimento do doutrinador Dimas Messias de Carvalho, que o dano moral no Direito das Famílias tem incidido especialmente no rompimento das relações afetivas entre cônjuges e companheiros, ocorrendo atos ilícitos, na violência doméstica e mais recentemente no abandono afetivo. Ressalta-se ainda que, “[...] o dano moral por inadimplemento alimentar merece atenção, porém não desqualifica o dano afetivo.” (CARVALHO, 2020, p.154).

No mesmo entendimento o doutrinador Carlos Alberto Bittar diz que “[...] havendo o lesionamento a elementos integrantes da esfera jurídica alheia acarreta ao agente necessidade de reparação dos danos provocados.” (BITTAR, 1994, p. 561).

Maria Helena Diniz aduz que “[...] o dano é como uma “lesão (diminuição ou destruição) que, devido a certo evento, sofre uma pessoa, contra sua vontade, em qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral”. (DINIZ, 2003, p.112).

Em análise aos entendimentos doutrinários se pode verificar que, o dano resulta da vontade do causador e com isso tem-se o resultado, dito isso, verifica-se que no abandono os pais têm a consciência de quão maliciosa é sua conduta no momento em que deixam de prestar assistência a prole, não sendo um dano culposo, mas sim doloso, pois este tem o conhecimento dos seus deveres como genitor.

No entendimento do doutrinador Carlos Roberto Gonçalves o dano moral é definido como:

Dano moral é o que atinge o ofendido como pessoa, não lesando seu patrimônio. É lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, intimidade, a imagem, o bom nome, etc., como se infere dos art. 1º, III, e 5º, V e X, 33 da Constituição Federal, e que acarreta ao lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação. (GONÇALVES, 2008, p.359).

Desta forma, o dano moral decorrente do abandono é um dano passível de indenização, visto que atinge a pessoa, fere a sua personalidade, e como já retratado anteriormente, o dano a personalidade pode ser reconhecimento como uma violação a dignidade da pessoa humana.

A autora Maria Berenice Dias define que na medida em que a ordem constitucional elevou a dignidade da pessoa humana a fundamento da ordem jurídica, houve uma opção expressa pela pessoa, ligando todos os institutos a realização de sua personalidade. Tal fenômeno provocou a despatrimonialização e a personalização dos institutos, de modo a colocar a pessoa humana no centro protetor do direito. (DIAS, 2009, p.61).

Portanto pode-se apontar que embora muitos tribunais não reconheçam o abandono afetivo como um instituto passível de indenização, este ainda assim possui requisitos que caracterizam o dano, uma vez que estão presentes o nexo causal, o agente e a vontade da parte em causar lesão ao outro, visto que os pais quando detentores de tal título, possuem capacidade de reconhecer seus deveres, bem como tem entendimento de que suas ações podem intervir na vida dos filhos.

3.3 ANÁLISE DE DECISÕES DO TJ/RS QUE TRATAM DE CASOS DE ABANDONO