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CAPÍTULO 4: AVALIAÇÃO DAS CONDIÇÕES SOCIOECONÔMICAS,

4.2. DIMENSÃO CULTURAL

A cultura popular se exterioriza em grande parte através de festas religiosas. As festas religiosas populares são ocasiões para o pagamento de promessas e momentos de lazer em que se desenvolvem laços de solidariedade nos meios populares. A festa religiosa ocorre em determinados momentos do calendário da comunidade e se repete periodicamente. Constitui oportunidade para expressar a capacidade de organização, a criatividade popular, a devoção, o lazer e para se constatar o sincretismo religioso. Nas festas a comunidade se revitaliza, se recria, se encontra e se vê como um todo. Em algumas regiões como no Nordeste do Brasil as

festas populares são importantes e freqüentes, ocorrendo ao longo de quase todo o ano civil (FERRETI, 1995).

As festas populares têm um significado especial para Agroecologia enquanto ativadora das relações humanas, pois produz a comunhão grupal ou comunitária em torno de motivações socialmente relevantes. Segundo Saraiva e Silva (2002), a festa enquanto articuladora de relações institucionais, desencadeia iniciativas de entidades enraizadas comunitariamente e antenadas coletivamente, que decidem o que celebrar, em que circunstâncias e com que parceiros.

A figura 37 mostra que 90% dos agricultores participam das festas religiosas, enquanto que 70% participam das festas típicas locais, no entanto, apenas 20% das famílias agroecológicas participam da organização destes eventos comemorativos. Geralmente as festas ocorrem nas igrejas, associações, sindicato, escolas municipais e praças públicas. Os principais eventos religiosos citados pelos agricultores são a festa de Nossa Senhora do Perpetuo Socorro, Padroeira de Lagoa Seca, e a festa de São João Batista, Padroeiro de Lagoa Seca. Estas festividades religiosas acontecem respectivamente no mês de novembro e junho com inúmeras programações sócio-culturais. Outras festividades bastante citadas foi a festa Estadual da Semente da Paixão, o Festival da Primavera, e as festas juninas das comunidades rurais e do Grupo de Mulheres Assistidas do CRAS – Centro de Referência de Assistência Social. 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

festas típicas eventos religiosos

% Sim Não 90% 10% 70% 30%

Figura 37. Participação do núcleo familiar em encontros comemorativos no município de Lagoa Seca-

Neste contexto, cabe destaque para a Festa Estadual das Sementes da Paixão, pois como já elucidado em outro momento deste capítulo, é um evento que vem se constituindo como um importante momento de troca de experiências e saberes entre as famílias camponesas do semi-árido, além de valorizar as ações que conservam o ecossistema e garante a segurança alimentar. O encontro procura estimular a reflexão na perspectiva da construção de um modelo de agricultura sustentável proporcionado por meio de um momento de formação política, tendo como foco o fortalecimento das ações da agricultura familiar camponesa nos seus processos e espaços de realização da agroecologia. Esta festividade vem sendo caracterizada como importante momento de reflexão sobre as ameaças impostas pelo modelo de desenvolvimento tecnológico baseado na monocultura, liberação dos transgênicos e no uso intensivo de agrotóxicos.

No que diz respeito à vida social, associada às práticas religiosas, a maioria das famílias revelou ir à missa assiduamente, além de destinarem parte de seu tempo para as pastorais da família e os Encontros de Casais com Cristo - ECC. Alguns chefes de família (20% dos entrevistados) ainda ressaltaram que participam de organizações comunitárias como o Conselho Municipal dos Idosos de Lagoa Seca, e o Clube das Mães de Lagoa Seca.

A diversidade de atividades atribuídas ao agricultor e sua família ganhou outra dimensão após o processo de transição agroecológica na região. Alguns agricultores afirmam que o ritmo da sua vida mudou completamente nos últimos tempos diante de uma agenda repleta de compromissos socioculturais e produtivos. Admitem que no início foi difícil administrar o seu tempo, mas que hoje não saberiam viver sem todas essas ocupações e sem o convívio com todos os atores do processo. Vejo que essa agenda social pode ser uma das razões para alguns acadêmicos afirmarem que o sistema agroecológico exige mais tempo do agricultor e que aumenta consideravelmente a intensidade do trabalho.

Um dos questionamentos feito aos chefes de família é se de fato o sistema agroecológico intensificou o trabalho do agricultor, tanto no aumento da carga (serviços mais pesados, repetitivos e com riscos a saúde) como da jornada de trabalho. A figura 38 mostra que 35% dos agricultores acreditam que o trabalho aumentou consideravelmente em relação a jornada de trabalho, 30% dizem não ter diferença, e os 35% restante acreditam ter diminuído significativamente tanto a carga como a jornada de trabalho. O argumento dado pelos agricultores que alegaram que a jornada de trabalho aumentou está relacionado a dois aspectos distintos, ao manejo complexo e as atividades não produtivas (cumprimento da agenda sociocultural). Em relação ao manejo do sistema agroecológico, eles esclarecem que precisam produzir seu composto orgânico, retirar manualmente algumas espécies tidas como

pragas da cultura alvo, sempre estão inovando em técnicas e práticas diversificadas, além dos experimentos que exigem cuidados e maior observação.

26 28 30 32 34 36 aumentou diminuiu sem diferença % 30% 35% 35%

Figura 38. Intensidade do trabalho após o processo de transição agroecológica no município de Lagoa

Seca. 2010.

Já o grupo dos que acredita ter diminuído o tempo e carga de trabalho alegam que no manejo agroecológico não necessitam capinar a terra e nem pulverizar as culturas com tanta freqüência, além da economia de tempo e mão de obra alcançada através da adoção de práticas e tecnologias mais eficientes conquistadas durante o processo de transição. Os agricultores enfatizaram o quanto era desgastante ter que recuperar o solo degradado após o uso intensivo de agroquímicos, pois é uma atividade que demanda muita mão de obra, recurso e tempo do agricultor, mas que felizmente foi excluída com a adoção do manejo agroecológico. O mais interessante é que a incorporação e intensificação destas tecnologias e práticas alternativas de produção são poupadores não só do tempo do trabalhador, mas principalmente do seu capital, pois um dos objetivos econômicos orientados pela Agroecologia é justamente a diminuição dos gastos inerentes ao sistema produtivo, como por exemplo, a independência do inputs externo.