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CAPÍTULO 3: PRÁTICAS AGROECOLÓGICAS E SUA IMPORTÂNCIA NA

3.3. PONTOS CRÍTICOS EM PROPRIEDADES AGROECOLÓGICAS DE

3.3.3. Disposição dos resíduos sólidos orgânicos e inorgânicos

Embora essa pesquisa tenha evidenciado ações que demonstram à disposição correta dos resíduos sólidos de natureza orgânica e inorgânica, os valores apresentados através das entrevistas ainda não são satisfatórios se considerarmos que em propriedades agroecológicas o

“lixo” deveria ser um aspecto bastante trabalhado e discutido. Segundo Darolt (2002), a realidade mostra que a questão do lixo na zona rural ainda é pouco discutida e estudada nos dias atuais, sendo dedicado poucos recursos específicos para busca de estratégias que minimizem tal problema.

O termo popular “lixo” é o designativo daquilo que os técnicos, genericamente, denominam “resíduos sólidos”, e se antes eram entendidos como meros subprodutos do sistema produtivo, passam a ser encarados também como responsáveis por graves problemas de degradação ambiental. Os “resíduos sólidos” diferenciam-se do termo “lixo” porque, enquanto este último se compõe de objetos que não possuem qualquer tipo de valor ou utilidade, porções de materiais sem significação econômica, sobras de processamentos industriais ou domésticos a serem descartadas, enfim, qualquer coisa que se deseje jogar fora, o resíduo sólido possui valor econômico agregado por possibilitar o reaproveitamento no próprio processo produtivo.

O lixo tem composição extremamente variada, dependendo basicamente da natureza de sua fonte produtora. Além de suas origens, o lixo também varia qualitativa e quantitativamente com as estações do ano, com as condições climáticas, com os hábitos e o padrão de vida da população (DAROLT et. al., 1996). Em suma, podemos dizer que os resíduos sólidos representam o fiel retrato da sociedade que os geram, e quando expostos nas vias públicas ou nas propriedades rurais, mostram o nível de competência das pessoas ou empresas responsáveis por sua administração. Cabe destacar que no caso das propriedades agroecológicas e orgânicas uma disposição inadequada do lixo rural pode causar a perda do credenciamento junto à entidade certificadora ou até mesmo de recursos advindos de instituições financiadoras.

Além de todos os tipos de lixo normal, que incluem a matéria orgânica do dia-a-dia, restos de alimentos, o material reciclável (vidros, latas, papel e plásticos), entre outros mais comuns, alguns tipos não despertam cuidados e podem causar sérios danos ao ambiente da propriedade, principalmente por conter elementos químicos na forma iônica que são absorvidos e acumulados pelo organismo. São elementos presentes em pilhas e baterias, que lança níquel e cádmio no ambiente; nas lâmpadas que possuem mercúrio, um metal pesado e tóxico que pode contaminar solos e a água; nas pastilhas e lonas de freios, que contém amianto e se acumula nos pulmões; nos adubos químicos, que são ricos em fósforo; nas embalagens de agrotóxicos e produtos veterinários, além de dejetos de suínos e aves (DAROLT, 2002).

Embora não se evidencie a presença de embalagens de agrotóxicos e a utilização de agroquímicos nas propriedades agroecológicas de Lagoa Seca, é importante destacar que essas propriedades não estão totalmente livres desse tipo de contaminação, uma vez que através das enxurradas muitos elementos químicos contaminantes provenientes das propriedades convencionais circunvizinhas são carreados até o seu solo e manancial. Daí a necessidade de um trabalho efetivo e permanente - por parte dos agricultores agroecológicos e das instituições engajadas no processo de transição agroecológica na região - em conscientizar os agricultores convencionais da importância em absorver os ensinamentos da Agroecologia e adotar os manejos ecológicos, ainda mais se tratando de uma localidade onde as condições geomorfológicas (em especial, o declive extremamente acentuado do solo) só facilitam o processo de escoamento de partículas.

0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 alimento de animais

céu aberto coletores de lixo compostagem % 40 25 0 35

Figura 10. Disposição do lixo orgânico em propriedades agroecológicas de Lagoa Seca, Paraíba.

2010.

Os resíduos sólidos orgânicos provenientes da atividade doméstica e dos restos de culturas vegetais têm diversos destinos nas propriedades estudadas, inclusive a compostagem orgânica com 35% dos agricultores entrevistados (figura 10). Porém o maior percentual verificado ficou por conta da alimentação dos animais como galinha e porcos. Um dos pontos preocupantes é o lixo que é depositado a céu aberto (25% dos casos investigados), uma vez que pode trazer uma série de conseqüências ambientais, desde contaminação de solos e mananciais até a proliferação de insetos e roedores causadores de doenças ao homem.

0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50

céu aberto coletores de lixo

enterra queima reaproveita

%

10 10 10

45

25

Figura 11. Disposição do lixo inorgânico em propriedades agroecológicas de Lagoa Seca, Paraíba.

2010.

Em relação ao lixo inorgânico observa-se que a maioria dos agricultores queima (45%), como demonstrado na figura 11, mesmo existindo a coleta de lixo pela prefeitura em algumas das localidades investigadas. Esses dados concordam com os de Santos et al. (2006), ao afirmar que os resíduos sólidos em propriedades rurais convencionais de Lagoa Seca, em sua maioria, são queimados apresentando o maior percentual de 50% dentre as demais alternativas mencionadas, no entanto, percebe-se uma diferença importante em relação ao presente estudo, na verdade, verifica-se que os agricultores agroecológicos já separam o lixo de natureza orgânica do inorgânico, demonstrando potencial interesse e habilidade para melhor destinar os resíduos sólidos gerados em sua propriedade. Alguns agricultores afirmaram que reaproveitam o lixo inorgânico como as garrafas pets para armazenar sementes e extratos vegetais, assim como empilham as sacolas plásticas para posterior reutilização. Mas vale destacar que práticas como a queima, a disposição a céu aberto e sob o solo é inviável ambientalmente, sendo desaconselhadas pelos ensinamentos da Agroecologia, uma vez que o processo de combustão libera substancias tóxicas no ar, enquanto que o acumulo desse material no ambiente vai causar sérios desastres ambientais se pensarmos na quantidade de tempo que poderá levar a natureza para decompô-lo.

É imperativo esclarecer que os 25% dos resíduos orgânicos que são dispostos a céu aberto serão decompostos liberando gás carbônico e metano na atmosfera e poluindo o solo e os lençóis freáticos com o chorume - líquido escuro altamente tóxico que escorre do lixo - e microorganismos causadores de doenças como leptospirose, leishmaniose, cólera,

salmonelose e desinteria. Somado a todos esses problemas, o acumulo de lixo nessas propriedades levará a proliferação de vetores, como moscas, baratas, ratos, pulgas e mosquitos por serem ambientes propícios a alimentação e reprodução desses animais.

Durante as visitas percebeu-se que nas propriedades que não destinava corretamente o lixo inorgânico (10% a céu aberto), a estética da propriedade estava comprometida, pois é notório que o lixo causa aspecto ruim de desleixo e degradação, deixando mais feios, fétidos e sujos os lugares onde vivemos e por onde passamos. Com o passar dos anos, esses resíduos poderão se acumular nos fundos de lagos e rios da região provocando o assoreamento desses mananciais, assim como causar a erosão do solo por desviarem o caminho natural da água.

Embora o lixo seja considerado uma grande ameaça à vida quando disposto de forma inadequada, verifica-se que é possível minimizar seus impactos, ao se adotar medidas preventivas, abandonando práticas de consumo exagerado ou então, conscientizando a população, seja em relação ao destino ou às formas de reciclagem do lixo gerado. Algumas propriedades agroecológicas de Lagoa Seca demonstraram que é possível gerenciar os seus resíduos com atitudes simples orientadas por técnicos de diversas entidades comprometidas com a saúde ambiental. As práticas mencionadas por alguns agricultores agrocecológicos de Lagoa Seca como alimentação de animais, compostagem e reaproveitamento não só reduziram o volume de resíduos produzidos diariamente, mas também permitiram o exercício de reuso, culminando numa melhor economia para famílias envolvidas.

Diante do exposto, espera-se que os bons exemplos prestados por um pequeno grupo de agricultores agroecológicos de Lagoa Seca sirvam de incentivo e modelo para as demais propriedades rurais da região e até mesmo para outras comunidades circunvizinhas, a fim de alcançar um destino final mais adequado da grande quantidade e diversidade de resíduos que são produzidos diariamente.

As práticas agroecológicas identificadas neste trabalho de pesquisa demonstram o grande potencial dessas propriedades em alcançar seu total redesenho, pois são exemplos concretos que a cultura, a ciência e o saber popular podem juntos alcançar a viabilidade ambiental de qualquer agroecossitema. Assim, ao contrário das teorias convencionais que defendem a idéia de que o desenvolvimento é fruto de uma mudança sociocultural e tecnológica introduzida desde fora das sociedades e grupos sociais, o enfoque agroecológico entende que a busca do desenvolvimento deve partir de uma estratégia centrada no “desenvolvimento endógeno”, mas não isolado da sociedade maior. Neste sentido, a Agroecologia defende a necessidade de que as estratégias de desenvolvimento rural considerem o potencial endógeno, tanto ecológico como humano, assim como suas relações com os sistemas socioeconômicos, políticos, éticos, institucionais, etc.