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4. ANÁLISE SISTÊMICA

4.2. Estágio 2 – Identificação da situação problema

4.2.1. Dimensão: Internacionalização do etanol

A partir das informações obtidas no referencial teórico e entrevistas, observa-se que há uma perspectiva de crescimento da participação dos biocombustíveis no mercado mundial, em função do crescente número de países que instituem políticas de inserção de fontes renováveis em suas matrizes energéticas e mandatos de substituição de combustíveis fósseis por biocombustíveis (OECD/FAO, 2013; REN, 2013).

Contudo, a consolidação de um mercado internacional de biocombustíveis ainda enfrenta diversos entraves como a falta de padronização das especificações do etanol aceita por todos os países, tarifas de importação, resistência da indústria petrolífera, negociação em bolsa de mercadorias para facilitar a comercialização do produto, definição de critérios que

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garantam a sustentabilidade da produção dos biocombustíveis de maneira que reduzam os riscos de impactos ambientais, sociais e conflito com a produção de alimentos.

Entretanto, torna-se secundário discutir barreiras para a comercialização dos biocombustíveis diante do fato de que ainda não existe uma demanda de etanol em larga escala. Esse foi um dos principais pontos apontados pelos entrevistados no que tange a perspectiva de consolidação de mercado internacional. Isso se deve ao fato de que alguns países que estabeleceram mandatos para biocombustíveis buscam abastecer a demanda doméstica criada pelo mandato por meio de produção interna, sendo que alguns países cuja produção não é suficiente para abastecer a demanda interna estão revisando suas políticas.

Além disso, verifica-se que a situação atual do mercado internacional de etanol é marcada pelo impasse da demanda e oferta, ou seja, há uma resistência de diversos países para inserirem metas para a inclusão dos bicombustíveis em suas matrizes energéticas, pois entendem que estariam somente substituindo a dependência do petróleo em função do número restrito de países produtores de biocombustíveis (KOHLHEPP, 2010). Por outro lado, o investimento na produção de biocombustíveis é incipiente, porque não existe uma demanda consolidada para o produto.

A consolidação do mercado de etanol esbarra na falta de demanda em larga escala pelo biocombustível, sendo que o caminho para estimular a demanda é por meio da geração de mercado. No caso dos biocombustíveis, o mercado é criado a partir da definição de mandatos que determinam a substituição de combustíveis fósseis por biocombustíveis.

Dessa forma, é necessário o aumento de países produtores visando tanto o aumento da oferta de etanol de cana-de-açúcar e a consolidação de um mercado consumidor por meio da definição de mandatos. Nesse ponto surge a seguinte questão: por que o país estabeleceria um mandato que torna obrigatória a adição de uma porcentagem de biocombustível na gasolina? E quem abasteceria esse mercado?

Para responder a primeira pergunta, dentre os principais fatores que norteiam a decisão dos países na instituição de políticas de inserção de fontes renováveis e mandatos de substituição de combustível fóssil por biocombustível é a busca pela segurança energética, a redução da importação de petróleo, preocupação com as questões ambientais, geração de empregos, sendo que todos esses fatores contribuem para a competitividade do país (ROSILLO-CALLE; WALTER, 2006; BALAT; BALAT, 2009; IEA, 2010; LAMERS et al., 2011; OECD/FAO, 2013).

Já a resposta da segunda pergunta é mais complexa. Existem poucos países produtores de etanol em larga escala e se concentram basicamente nos EUA e Brasil, ou seja,

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há uma oferta reduzida desse biocombustível, principalmente pelo fato de que esses dois países destinam prioritariamente a produção para atender a demanda interna. Dessa forma, a opção da importação se torna inviável seja porque não existe oferta de etanol em larga escala para ser importada e também porque os países não querem substituir a dependência da importação de petróleo e se tornarem reféns da importação de etanol de um número ainda mais restrito de países produtores (LAMERS et al., 2011).

Por outro lado, tem-se a possibilidade de produzir internamente o biocombustível. Essa opção foi adotada pelos países que estipularam mandatos e políticas de inserção de fontes renováveis, ou seja, suprir o mercado consumidor por meio de produção interna, resultando em benefícios econômicos, sociais e ambientais para o país. Esse é o caso do Brasil, EUA e os países da União Europeia que estabeleceram metas e mandatos, ou seja, criaram mercado e os abasteceram preferencialmente por meio de produção interna (EUA, 2007; EU, 2009; EPE, 2010; LAMERS et al., 2011).

A necessidade de definição de marco regulatório está associada ao fato de o mercado internacional de etanol ainda está em estágio inicial, visto que não existe uma demanda em larga escala pelo biocombustível. Na tentativa de uma maior compreensão sobre o processo de internacionalização do etanol tendo como referência as informações obtidas no referencial teórico e entrevistas, busca-se fazer uma análise a partir da teoria do ciclo do produto de Vernon (Figura 15).

Ao longo da descrição, é possível verificar que o processo de internacionalização do etanol não adere totalmente à teoria, principalmente porque Vernon estrutura sua teoria para produtos associados a elevados níveis de renda e o produto em análise é um biocombustível (etanol), sendo que a renda não é fator determinante para o consumo. Além disso, a teoria foi desenvolvida na década de 1960, quando os EUA era líder em inovação de produtos em função da disponibilidade de recursos para P&D. Atualmente, verifica-se que a inovação de produtos não é monopólio das empresas dos Estados Unidos, sendo que novos produtos são introduzidos simultaneamente em diversos países (PESSOA; MARTINS, 2007)

Dessa forma, a partir da análise das entrevistas e referencial teórico foi possível fazer uma comparação com a Teoria do Ciclo do Produto que serve de direcionador para o entendimento dos processos que envolvem a commoditização do etanol.

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Figura 15: Etapas do processo de internacionalização do etanol. Fonte: Elaborado pela autora.

Na fase de introdução, existe uma baixa oferta do etanol, visto que existem poucos países produtores, sendo que a demanda é restrita ao mercado doméstico do país produtor, sendo gerada a partir da definição de marco regulatório que garante a inserção do biocombustível na matriz energética do país. Dessa forma, a demanda é abastecida por meio de produção interna. Também é uma fase em que não existe uma demanda internacional em larga escala. Além disso, essa fase é marcada pela falta de padronização das especificações do produto, tornando-se uma barreira não tarifária para a comercialização, caracterizando-se por discussões entre diversos países em relação a definição de culturas para produção e potencial conflito com alimentos, impactos ambientais e sociais da produção, bem como especificações químicas.

Já na fase de maturidade, verifica-se uma expansão dos mandatos de mistura. Em função disso, existe um maior número de países produtores, visto que se tornaram produtores para abastecer a demanda interna gerada a partir da definição dos mandatos. Nesse estágio, é possível observar a formação de mercados regionais e, consequentemente, uma maior comercialização de etanol. Além disso, verifica-se uma tendência de maior padronização das especificações do etanol, favorecendo a comercialização.

Por fim, chega-se na fase de commodity (ou padronização, conforme o modelo original de Vernon) marcada pela consolidação da demanda de etanol em larga escala, grande número de países produtores, uniformização da padronização das especificações e negociação do biocombustível em bolsa de mercadorias, consolidando a comercialização internacional do etanol.

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Diante do exposto, o Quadro 12 organiza as informações obtidas no referencial teórico e da visão dos entrevistados e sintetiza os principais entraves e fatores que estimulam a internacionalização do etanol.

Motivadores Barreiras

 Crescimento da participação dos biocombustíveis no mercado mundial  Aumento do número de instituem política

de inserção de fontes renováveis em suas matrizes energéticas

 Maior segurança energética  Ganhos ambientais

 Falta de padronização das especificações  Barreiras tarifárias e não tarifárias  Ausência de negociação em bolsa de

mercadorias

 Resistência da indústria petrolífera  Tendência de queda do preço do petróleo  Falta de certificação mundialmente aceita

que comprove a sustentabilidade da produção  Conflito com a produção de alimentos

 Número reduzido de países produtores  Ausência de demanda em larga escala

Quadro 12: Principais barreiras e fatores que favorecem à internalização do etanol. Fonte: Elaborado pela autora.

Portanto, a internacionalização do etanol encontra-se em estágio inicial e a perspectiva de consolidação de um mercado internacional está associada à formação de uma demanda em larga escala. Para tanto, é necessário um maior número de países regulamentando internamente a participação do biocombustível em suas respectivas matrizes energéticas.