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Grootaert e Bastelaer (2001) destacam que o capital social é distinguido em capital social cognitivo e estrutural e que o mesmo pode ser investigado a partir de três diferentes níveis de escopo: os níveis micro, meso e macro social. O nível macro inclui o ambiente social e político que modela a estrutura social e permite o desenvolvimento das normas sociais. Refere-se ao regime político, o Estado de direito, o sistema judicial e as liberdades civis e políticas, estruturas institucionais, etc. O nível de análise meso considera as relações entre os grupos socais, incluindo associações horizontais e verticais. E o nível micro refere-se aos processos de formação de redes horizontais de relação e de ação estabelecidas entre pessoas igualmente situadas nas hierarquias sociais, no interior das comunidades de referência do agente individual (GROOTAERT; BASTELAER, 2001).

Qualquer que seja o escopo da investigação (níveis micro, meso ou macro- social), o capital social envolve necessariamente, o capital social cognitivo e o capital social estrutural (GROOTAERT; BASTELAER, 2001).

O capital social cognitivo é constituído pelo conjunto de normas e valores localmente compartilhados e que promovem a confiança mútua, a solidariedade e a cooperação e que, portanto, refere-se às motivações que as pessoas têm para agir

coletivamente. Para os membros de qualquer comunidade agirem coletivamente, eles precisam ter certas motivações que os levem a isso, tais como identificação com o grupo ou comunidade, interesses compartilhados, confiança mútua, solidariedade, espírito de cooperação com os membros do grupo, sentimento de responsabilidade em relação ao futuro e a existência do grupo, avaliação positiva da própria capacidade de protagonizar ações coletivas e benéficas ao grupo, medo da sanção do grupo em casos de alheamento, entre outros (COSTA; ROMANO, 2007, p. 152).

Já o capital social estrutural envolve o conjunto de instituições e redes de instituições localmente existentes que facilitam o fluxo de informações, os processos de tomada de decisão e a ação coletiva; ou seja, os arranjos ou condições que permitem que as pessoas ajam coletivamente e que viabilizam ou fornecem uma estrutura logística para essa ação, tais como as relações de vizinhança, amizade, redes de colaboração, instituições representativas, canais de acesso a informações, canais de contato com agentes externos estimuladores, etc. (COSTA; ROMANO, 2007, p. 152).

Desde o início dos anos 1990, o capital social tem sido um tema trabalhado pelo Banco Mundial (World Bank) e pela Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OCDE), que passaram a sistematizar as informações existentes e estimular novos estudos, principalmente com relação ao desenvolvimento econômico e a redução da pobreza (SANTOS, 2003). A partir da formação de um grupo de trabalho o Banco Mundial buscou elaborar uma metodologia para medir ou avaliar capital social, através da análise de diferentes aspectos ou dimensões. Essa metodologia de trabalho de autoria de Grootaert et al (2003), intitulada “Questionário Integrado para Medir Capital Social (QI-MCS)”, destaca a necessidade de analisar seis dimensões básicas a que o capital social está associado, propondo a aplicação de um questionário contendo questões que possibilitam auxiliar na descrição de um quadro mais detalhado em relação ao capital social estrutural e cognitivo, existente em uma determinada comunidade. Conforme o QI-MCS as seis dimensões do capital social compreendem: (i) Grupos e redes; (ii) Confiança e Solidariedade; (iii) Ação Coletiva e Cooperação; (iv) Informação e Comunicação; (v) Coesão e inclusão social e (vi) Empoderamento e Ação Política.

i) Grupos e redes: redes e grupos constituem a base do que é considerado

capital social estrutural. As redes e organizações a que pertencem as pessoas, assim como as normas e valores subjacentes, contêm benefícios mensuráveis para esses

indivíduos e levam, direta ou indiretamente, a um maior nível de bem-estar social (GROOTAERT et al, 2003). Esta constitui a dimensão ou categoria mais comumente associada ao capital social, já que a natureza e a extensão da participação de um indivíduo em um grupo formal ou informal, pode trazer benefícios básicos para a sociedade, tais como a redução dos custos de transação, a disseminação de conhecimentos, informações e inovação, bem como a promoção da cooperação. Para Franco (2004) quanto mais redes e quanto mais democracia participativa houver, maior será o nível, o estoque ou o fluxo de capital social de uma sociedade; e quanto menos redes e processos democrático-participativos houver, menor será o capital social de uma localidade.

No QI-MCS essa dimensão pode ser analisada a partir da descrição das associações e grupos existentes em uma determinada comunidade ao longo de quatro dimensões fundamentais: a densidade de membros, a diversidade dos membros, a extensão do funcionamento democrático e a existência de conexão com outros grupos.

ii) Confiança e solidariedade: a confiança constitui um conceito abstrato, difícil de interpretar ou medir, mas que é um dos valores que dá corpo e sentido ao capital social, sendo, por sua vez a chave nos processos de intercambio de recursos que operam dentro das redes sociais (ARIAS; PÁEZ, 2006). A confiança constitui um canal de fluxo das redes de relações interinstitucionais e interpessoais que permitem ser articuladas no marco de um capital social dado (ARIAS; PÁEZ, 2006). Nesse sentido, a confiança e a solidariedade podem ser consideradas então, os motores da ação coletiva e da cooperação, pois em comunidades em que essas dimensões são fortalecidas, o capital social tem mais chances de ser mobilizado para o trabalho cooperativo e/ou associativo (GROOTAERT et al, 2003).

No QI-MCS essa dimensão é analisada através da percepção sobre a confiança em relação aos vizinhos, aos principais prestadores de serviços e em estranhos.

iii) Ação coletiva e cooperação: somente é possível ocorrer ação coletiva ou

cooperação voluntária quando há um nível significativo de capital social na comunidade (GROOTAERT et al, 2003). A ação coletiva consiste basicamente em atividades comunitariamente organizadas e a participação em projetos conjuntos ou em resposta a uma situação de crise (GROOTAERT et al, 2003).

Fukuyama (2000) ressalta que as normas de cooperação são o resultado da repetida interação comunitária; ou seja, ao interatuarem uns com os outros, repetidas vezes, os sujeitos criam um ambiente propício à cooperação. A habilidade de cooperação está assentada, portanto, no hábito e na prática (HIGGINS, 2005). A principal exceção ocorre no caso de sociedades totalitárias, onde o governo pode forçar as pessoas a trabalharem juntas em algumas atividades determinadas (HIGGINS, 2005).

No QI-MCS essa dimensão é abordada a partir de questões que buscam apreender se e como os membros de uma comunidade tem trabalhado em projetos comuns e/ou em resposta a situações de crise. Nesse sentido, sobre essa dimensão o QI-MCS busca obter informações sobre a extensão da ação coletiva, o tipo de atividades realizadas em conjunto e uma avaliação global do grau de disponibilidade para cooperar e participar em ações coletivas.

iv) Informação e comunicação: para conhecer o capital social disponível em

uma comunidade é necessário também conhecer as condições e os obstáculos para a geração e circulação de informações e conhecimentos, no âmbito das diversas formas de interação no território (ALBAGLI; MACIEL, 2004). O acesso à informação é cada vez mais reconhecido como central para ajudar as comunidades pobres a terem uma voz mais forte em questões que afetam o seu bem-estar (GROOTAERT et al, 2003). Assim, no QI-MCS as questões referentes a essa dimensão buscam identificar, de forma simples, quais os meios utilizados pelas pessoas e até onde possuem acesso às infraestruturas de informação e comunicação. A análise dessa informação no QI-MCS é bastante direta, buscando compreender variáveis geográficas e socioeconômicas, a fim de identificar se certas áreas possuem um pior ou melhor acesso à informação e comunicação em comparação à outras (GROOTAERT et al, 2003).

v) Coesão e inclusão: Grootaert et al (2003) destacam que um grau elevado de

capital social em uma determinada comunidade pode ser identificado pela ocorrência de frequentes interações sociais cotidianas, como por exemplo a participação em eventos comunitários e o habito de visitar vizinhos. Já a presença de conflito pode ser interpretada como um indicador de falta de confiança ou de capital estrutural apropriado para resolver conflitos ou como indicador de divisão interna (GROOTAERT

por várias formas de divisão e diferenças que podem levar ao conflito (GROOTAERT

et al, 2003).

No QI-MCS essa dimensão abrange desde percepções gerais sobre o sentimento de comunhão e unidade social em uma comunidade, até experiências com exclusão e conflitos.

vi) Empoderamento e Ação Política: os indivíduos são empoderados ao passo

que têm uma medida de controle sobre instituições e processos que afetam diretamente o seu bem-estar (GROOTAERT et al, 2003). Nesse sentido, o empoderamento pode ser definido mais precisamente como a habilidade para tomar decisões que afetam as atividades cotidianas e que podem mudar o curso de vida das pessoas, sendo um conceito mais amplo que o de capital social. Essa dimensão refere-se a expansão dos recursos e capacidades das pessoas em tomar decisões, negociar, influenciar, controlar e responsabilizar instituições que afetam suas vidas (GROOTAERT et al, 2003). A ação ou engajamento político por exemplo, dentro dessa dimensão é apenas uma das atitudes que podem ser tomadas para aumentar o empoderamento (GROOTAERT et al, 2003).

No QI-MCS as questões nesta seção buscam averiguar o sentimento de felicidade, eficácia pessoal e a capacidade das pessoas para influenciar tanto eventos locais como respostas políticas mais amplas.

Levando-se em conta essas dimensões, é possível identificar o capital social disponível em uma comunidade e as possíveis dificuldades de sua mobilização para a cooperação em torno de determinados objetivos, sendo uma ferramenta valiosa para entender o potencial de desenvolvimento endógeno de territórios.

Entretanto, Grootaert et al (2003) destacam que a ferramenta QI-MCS não deve ser considerado como um modelo pronto, como uma receita, mas sim, uma orientação, um instrumento, que pode ser utilizado em pesquisas que visam avaliar o capital social de determinados territórios ou comunidades. Além disso os autores (op.

cit.) destacam que dependendo do foco da pesquisa alguns módulos podem ser mais

importantes do que outros e que as questões contidas no QI-MCS podem ser adaptadas ao contexto/área pesquisada. Segundo os autores (op. cit.) existe muito interesse em informação acerca do capital social no contexto da elaboração e implementação de projetos de desenvolvimento, e o QI-MCS também serve para este propósito, podendo ser utilizado em combinação com outras bases de dados com o objetivo de levantar informações socioeconômicas.