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A INCLUSÃO DE GÊNERO EM POLITÍCAS PÚBLICAS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA SOBRE O DIREITO

2 O DIREITO A ÁGUA NO BRASIL

No Brasil, além dos fatores econômicos, as conferências internacionais influenciaram o processo regulatório da água. O país assinou vários acordos internacionais que tiveram como tema os recursos hídricos e aos poucos o direito a água foi estabelecido na legislação.

As legislações sobre recursos hídricos brasileiras derivam das discussões internacionais, mas também de eventos e iniciativas nacionais. Tem como base o modelo de gestão das águas da França, que foi adaptado para a realidade brasileira (CAMPOS e FRACALANZA, 2010).

A primeira legislação brasileira que se referiu a água como objeto específico de lei foi o decreto 26.643 de 1934, denominado “O Código das águas”. Esse decreto foi criado devido a necessidade de uma maior utilização dos recursos naturais para a geração de energia elétrica e tratava o assunto de forma centralizada (CARVALHO, 2015). Em 1977, foi instituído o Decreto Federal nº 79.367, que definiu o Ministério da Saúde em conjunto com as secretarias de saúde como os órgãos competentes para elaborar normas e padrões de potabilidade da água para consumo humano.

Em 1988, a Constituição Brasileira deliberou a água como bem de propriedade de um ente político, tornando assim, todas as águas públicas. As águas são bens de domínio dos Estados e do Distrito Federal (art. 26, I) e da União (Artigo 20, inciso III). Foi estabelecida também, a competência legislativa e material para a água. O artigo 22, IV da CF estabelece a competência privativa da União para legislar sobre as águas. Já o artigo 23 da CF determina a competência material comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em relação as águas.

A Constituição de 1988 foi considerada como um novo paradigma em relação aos processos decisórios de caráter público. Com o advento dela surgiram novas práticas democráticas de participação, diminuindo a concentração do poder do Estado nas tomadas de decisão (2002, apud JACOBI, 2009). Houve várias referências à água no texto constitucional, mas, não uma previsão quanto ao direito à água.

Por volta de 1990, alguns estados (como São Paulo e Ceará) instituíram os seus primeiros planos estaduais de recursos hídricos (Leis Estaduais n° 7.663/91 e 11.996/92), com artigos ligados à problemática da água, seus usos e prioridades, e com base na gestão integrada, descentralizada e participativa. Outros estados (como o Rio de

Janeiro), só começaram a regulamentar dispositivos constitucionais relacionados a gestão das águas mais recentemente (MACHADO, 2003).

A Lei Federal n° 9.433/97 (Lei de Águas), foi criada para regulamentar o artigo 21 da constituição, que instituiu a obrigatoriedade da criação do Sistema Nacional de Recursos Hídricos (SNRH). Foi aprovada a Política Nacional de Recursos Hídricos e o

Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, que tem como fundamento uma visão participativa e democrática para o uso sustentável das águas e o objetivo de garantir o direito ao acesso aos recursos hídricos e o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água. O SNRH baseia-se nas seguintes premissas:

Artigo 1º A Política Nacional de Recursos Hídricos baseia-se nos seguintes fundamentos:

I - a água é um bem de domínio público;

II - a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico;

III - em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais;

IV - a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas;

V - a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;

VI - a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades (Lei n° 9.433/97).

Essa lei transformou a gestão das águas, pois rompeu com a gestão centralizada, voltada aos interesses do setor elétrico. Ela apresenta repetitivamente o termo participativo, incentivando a sociedade brasileira a participar da gestão da água através dos comitês de bacias hidrográficas que instituiu órgãos com papel consultivo e deliberativo. A implementação do modelo de gestão participativo é considerada um avanço no processo de democratização e um incentivo ao exercício da cidadania.

A Gestão da água passou a ser realizada através do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, que é o órgão responsável por decidir as grandes questões do setor e dirimir as disputas de maior relevância; pelos Comitês de Bacias Hidrográficas que são os órgãos onde há a participação dos usuários, das prefeituras, da sociedade civil organizada e dos demais níveis de governo, responsáveis pelas decisões no âmbito de cada bacia; as Agências de Água, destinadas a gerir os recursos oriundos da cobrança pelo uso da água; e as Organizações Civis de Recursos Hídricos, que são entidades que atuam no setor de planejamento e gestão do uso dos recursos hídricos e podem ter

importante participação no processo decisório e de monitoramento das ações sobre a água.

Em 2000, através da Lei nº 9.984, foi criada a Agência Nacional de Águas (ANA), o órgão gestor dos recursos hídricos de domínio da União. Em 2011, foi regulamentada a Portaria MS nº 2914 no Brasil, que exigiu um controle sobre a qualidade da água distribuída para o consumo humano (LUNA et al. 2014). A Lei 11.445, criada em 2007, estabeleceu Diretrizes Nacionais para o Saneamento Básico. O Decreto 7.217/2010 regulamentou a Lei do Saneamento.

De acordo com a legislação brasileira, a água é um bem público de uso comum, fundamental para a sobrevivência humana e de outras espécies. O acesso a água deve ser garantido a todos, como foi estabelecido no Código de Águas de 1934 e, posteriormente, na Constituição Brasileira de 1988.

Na legislação sobre a água, no Brasil, percebe-se a inclusão das ideias de descentralização e participação e que está bem estabelecido a importância do papel dos usuários para uma utilização sustentável da água. A legislação brasileira não tem explícito uma previsão acerca do direito à água como direito fundamental e também, ainda não estabelece nada em relação a gênero e água.