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2.4. Plataforma Eleitoral do marechal Hermes da Fonseca

2.4.1. Discurso de Quintino Bocaiúva

No dia 26 de dezembro de 1909 realizou-se no Rio de Janeiro um jantar oferecido a Hermes da Fonseca e ao candidato a vice-presidente, Venceslau Brás, para que o marechal apresentasse sua plataforma eleitoral. Antes da apresentação das propostas do marechal Hermes, discursou Quintino Bocaiúva, que lembrou da importância que os militares tiveram no episódio da proclamação da República.

gêneros de primeira necessidade, que eles mesmos poderiam produzir.” Barbosa, Rui. Obras Completas. Vol. XVIII – 1891 – Tomo III. Rio de Janeiro: MEC, 1949, pp. 129/130.

114 “... o desenvolvimento da indústria não é somente, para o Estado, questão econômica: é, ao mesmo tempo,

uma questão política. No regime decaído, todo de exclusivismo e privilégio, a nação, com toda a sua atividade social, pertencia a classes ou famílias dirigentes. Tal sistema não permitia a criação de uma democracia laboriosa e robusta, que pudesse inquietar a bemaventurança (sic) dos posseiros do poder, verdadeira exploração a benefício de privilegiados. Não pode ser assim sob o sistema republicano. A República só se consolidará entre nós, sobre alicerces seguros, quando suas funções se firmarem na democracia do trabalho industrial, peça necessária no mecanismo do regime, que lhe trará o equilíbrio conveniente.” (Ibid., p. 143)

“Nós, republicanos, não podemos esquecer que foi graças à cooperação das classes armadas que a nação pode pacificamente realizar a transformação política, instituindo a República, organizando a federação dos Estados.” (O Estado de S. Paulo, 27/12/1909)

Além disso, o experiente político afirmou que maior ainda foi o papel representado pelos militares na manutenção das instituições republicanas.

“Maior, porém, que o reconhecimento pelos nossos serviços antes e depois de proclamada a República, maior é a gratidão pela abnegação do nosso patriotismo e inquebrantável lealdade da manutenção das instituições fundamentais.” (Ibid.)

Quintino Bocaiúva também fez a defesa da candidatura do marechal, afirmando, mais uma vez, que o fato de ser um militar não foi determinante na escolha do nome de Hermes da Fonseca.

“Não foi a circunstância de serdes um representante do Exército que determinou a escolha do vosso nome para serdes candidato à suprema investidura.” (Ibid.)

No entender de Quintino Bocaiúva, a espada do marechal Hermes da Fonseca nunca foi desembainhada senão para prestigiar a lei e defender o poder civil, portanto, bastaria que o povo ratificasse a indicação do marechal Hermes para que tivéssemos um presidente que seria o primeiro súdito da lei e que se localizaria acima das paixões e interesses de classes, de corporações e de indivíduos.

“Se o povo ratificar com o seu sufrágio a indicação que fizemos, devo advertir que, pelo programa republicano, o presidente é o primeiro súdito da lei. Nesse cargo só se poderá brandir a espada da justiça, ser superior às paixões e interesses de classes, corporações e indivíduo, só se deve ser mandatário fiel da Nação e abnegado servidor do povo.” (Ibid.)

É possível perceber que neste discurso Quintino Bocaiúva estava respondendo a Rui Barbosa que, como colocado acima, percebeu a candidatura e a eleição do marechal Hermes da Fonseca como repetição do período de arbitrariedades e perseguições típicas do Governo do marechal Floriano Peixoto. Ora, se Rui Barbosa se desencantou da presença dos militares na política, isso não aconteceu com Quintino Bocaiúva e nem mesmo com Pinheiro Machado. Quintino Bocaiúva, como o seu próprio discurso mostra, reconheceu a importância do Exército na proclamação e manutenção da República. O senador gaúcho, desde a Revolução Federalista, via com bons olhos a aliança com o Exército.

“Pinheiro Machado, em lua-de-mel com a glória conquistada na guerra civil, cioso da ascendência de seu Estado, mas desconfiado da hegemonia paulista, não se afasta da aliança com a força armada. As lágrimas derramadas em louvor a Floriano Peixoto anunciavam uma política futura, mesmo desaparecido o líder...” (Faoro, 2001, p. 633)

Agora, tanto Quintino Bocaiúva como Pinheiro Machado viam o Exército como um aliado na luta contra a hegemonia do Estado de São Paulo e, justamente por isso, ambos foram fiadores das propostas políticas apresentadas pelo marechal Hermes da Fonseca no dia 26 de dezembro de 1909.

No entanto, os partidários da candidatura Hermes da Fonseca nunca aceitaram a pecha de candidatura militar imposta pelos civilistas e o discurso do marechal é farto em declarações nesse sentido.

“A minha condição de soldado não emprestará uma feição militar ao meu governo, se eleito. De origem genuinamente civil, amparada pelos chefes situacionistas da quase unanimidade dos Estados e pelos seus opositores, a minha candidatura não irrompe do seio das classes armadas, cuja ação, aliás, não pode ser indiferente aos interesses políticos e sociais da nossa Pátria.” (O Estado de S. Paulo, 27/12/1909)

E mais:

“Ela traduz a não proscrição de militares dos direitos e garantias que a todos os brasileiros assegura a lei fundamental, mas não significa preferência por uma classe e menos ainda o desejo de seu predomínio na gestão dos públicos negócios.” (Ibid.)

E ainda:

“Não foi, pois, a minha posição profissional que influiu no vosso espírito para que em meu obscuro nome recaísse a honra da seleção, senão a certeza de que, afeito à obediência e à severidade no cumprimento do dever, me veríeis sempre adstrito à Constituição e às leis, na defesa de todos os direitos e de todas as liberdades por elas asseguradas.” (Ibid.)

É claro que nessas declarações o marechal Hermes da Fonseca procurou responder aos civilistas e principalmente a Rui Barbosa, que, ao longo de toda a campanha civilista, não desistiu de tratar a candidatura do marechal Hermes como um movimento essencialmente militar e não reconheceu que a mesma se insere na disputa dos Estados pelo domínio do Poder Central. Em contrapartida, não é possível afirmar, como faz o marechal Hermes no seu discurso, que o fato de ser um militar não influenciou na escolha do seu nome para candidato à Presidência da República. É claro que a posição profissional de Hermes da Fonseca foi importante, pois, como colocado acima, políticos como Pinheiro Machado viam no Exército um aliado político que já havia mostrado ser fundamental na proclamação e consolidação da República. Contudo, no pensamento de Pinheiro Machado, o Exército não devia ser o principal ator das ações, pelo contrário, deveria se submeter ao controle civil, ou melhor, ao controle do Poder Legislativo, que seria, por sua vez, controlado pelo próprio senador gaúcho, de tal forma que estaria descartada a possibilidade do país cair no militarismo.115