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Discussão & Análise dos Resultados

No documento Saúde e Qualidade de Vida: uma meta a atingir (páginas 143-149)

O quadro 1 permite uma análise comparativa dos estudos no que respeita ao tipo de estudo, objectivos, metodo- logias e resultados obtidos.

1. Os estudos encontrados inserem-se no quadro temporal dos últimos nove anos, tendo sido publicados entre 2000 e 2008.

2. Dois dos estudos foram realizados com amostras da população Norte Americana, dois do Reino Unido, um da Noruega e um de Espanha.

3. Todos os estudos abordam a temática dos maus-tratos contra crianças com disabilidades segundo uma me- todologia quantitativa, excepto o estudo de Hershkowitz, Lamb e Horowitz (2007) em que os autores recorrem à metodologia qualitativa com recurso a entrevista.

4. Três são estudos retrospectivos com recurso a bases de dados nacionais/locais e três são estudos compara- tivos, destes últimos dois fazem uma análise dos maus-tratos na generalidade das disabilidades (Kvam, 2000; Her- shkowitz, Lamb e Horowitz, 2007) e um dos quais (Briscoe-Smith e Hinshaw, 2006) estuda apenas a ocorrência de maus-tratos entre crianças com PHDA.

5. Quatro estudos abordam os maus-tratos no geral, um deles conclui que a negligência é o tipo mais prevalente entre as amostras de crianças com disabilidades.

6. Dois dos estudos estudam apenas a problemática do abuso sexual nas crianças com disabilidades concluindo que quanto mais severa foi a disabilidade de que são portadoras maior o risco de abuso sexual e maior a dificul- dade no reconhecimento da sua ocorrência quer pelas próprias quer pelos pais/cuidadores.

A fim de melhor compreenderem os resultados obtidos de seguida faremos uma breve descrição dos estudos e principais resultados obtidos em cada um deles.

Jaudes e Mackey-Bilaver (2008) realizaram a análise dos resultados com recurso a quatro modelos para melhor explicarem o tipo de maus-tratos a que estas são sujeitas entre os 0 e os 6 anos tendo em conta as variáveis de- mográficas e as disabilidades que a criança possui. As crianças que correm mais risco de serem maltratadas são as de etnia caucasiana (2 vezes, p≤0,001), este risco duplica se lhe forem diagnosticados problemas de comporta- mento e problemas mentais. Crianças com história de maus-tratos antes do 1º ano têm um risco de 8,95 (p‹0,001), se estes tiverem ocorrido entre o 1 e os 2 anos de vida de 33,07 (p‹0,001) e antes dos 3 anos o risco aumenta são de 5,43. A exposição de substâncias durante a vida intra-uterina aumenta o risco de maus-tratos entre os 3 e os 6 anos em 3,53 (p≤0,001) e 9,2 se acriança tiver sido maltratada antes dos 3 anos e posteriormente lhe tenha sido diagnosticado um problema mental de comportamento.

Quadro 1 – Dados dos diferentes estudos

Fonte Tipo de estudo Objectivos Variáveis Resultados F.1

Jaudes; Mackey-Bilaver (2008)

Longitudinal (1990-1996)

Examinar se e em que medida condições crónicas de saúde específicas contribuem para o risco de maus tratos.

Registo de maus-tratos; Doença crónica: Doença física; Atraso mental/atraso de desenvolvimento; Patologias mentais e do comportamento.

Problemas de comportamento ou mentais, idade inferior a seis anos foi o grupo com maior risco de maus-tratos e negligência, doença crónica física apenas aumenta ligeiramente esse risco.

F.2 Kvam (2000)

Comparativo Conhecer qual a percentagem de crianças Norueguesas com disabilidades são vítimas de abuso sexual e quais as características que as vulnerabilizam.

Abuso sexual; Tipo e grau de disabilidade; Idade e género.

Quando uma criança tem uma disabilidade severa os cuidadores parecem não reconhecer o abuso sexual antes que este seja muito evidente.

F.3 Gonzalvo (2001)

Retrospectivo transversal de 10 anos (1991-2001)

Determinar a prevalência de crianças com disabilidades maltratadas, as características demográficas, a frequência e o tipo de maus-tratos, o maltratante e factores de risco familiares, sociais e ambientais; Contribuir para o conhecimento da etiopatogenia dos maus-tratos.

Características demográficas; Frequência do tipo de maus-tratos, maltratante; Factores de risco familiares, sociais e ambientais.

Disabilidade mais frequente foi a psíquica, seguida da mista, da física e da sensorial. O tipo de maus-tratos mais frequente foi a negligência física e a mãe foi quem mais maltratou. Pelo menos um factor de risco familiar, social e/ou ambiental estava presente em 93,5% dos casos. 64,5% apresentavam mais que um factor de risco.

Kvam (2000) analisa retrospectivamente quais as disabilidades encontradas entre a população de crianças aten- didas nos hospitais noruegueses por suspeita de maus-tratos. Verificou que apenas 6% das crianças tinham uma disabilidade, sendo que 77% possuíam disabilidades leves e 23% disabilidades severas (Yates’ corrigido x2=7,8;

df=1, p=0,005). Os rapazes foram mais classificados como “provavelmente agredidos” que as raparigas (Pearson’s x2=4,72, p‹0,09). A média de idades dos rapazes é 2 anos superior à das raparigas o que pode indicar que os

rapazes são agredidos mais tarde ou que é mais difícil descobrir a agressão nos rapazes. As disabilidades severas encontradas foram o Atraso mental grave, Problemas de linguagem/discurso; MBD/problemas de concentração e autismo. Destas crianças 68% tinham entre 7 a 10 anos quando examinadas, com uma média das idades de 8,9 para as raparigas e 10,8 para os rapazes.

Os rapazes foram mais classificados como “provavelmente agredidos” que as raparigas (Pearson’s x2=4,72, p‹0,09).

A média de idades dos rapazes é 2 anos superior à das raparigas o que pode indicar que os rapazes são agredidos mais tarde ou que é mais difícil descobrir a agressão nos rapazes. As disabilidades severas encontradas foram o Atraso mental grave, Problemas de linguagem/discurso; MBD/problemas de concentração e autismo. Destas crianças 68% tinham entre 7 a 10 anos quando examinadas, com uma média das idades de 8,9 para as raparigas e 10,8 para os rapazes.

Gonzalvo (2001) analisou retrospectivamente as disabilidades entre uma população de crianças que deram en- trada nos centros de acolhimento em Saragosa por maus-tratos. 5,56% possuía uma disabilidade. As disabilidades encontradas foram atraso mental (35,5%), paralisia cerebral infantil (27,4%), SIDA sintomático (25,8%) e surd- omudez (11,2%). Os grupos etários mais frequentes 0-5 anos=43,5%, 6-11anos=25,8% e dos 12-17 anos=30,6%. O tipo de maus-tratos mais frequente foi negligência e abandono físico (82,2%), mas 16,2% das crianças apre- F.4 Spencer; Devereux; Wallace; Sundrum; Shenoy; Bacchus; e Logan (2005) Retrospectivo (1983-2001)

Estudar a relação entre disabilidades e registo por maus-tratos num coorte da população de nascimentos em 19 anos.

Registo de maus-tratos; Disabilidades: Paralisia Cerebral; Autismo; Distúrbio de conduta moderado/severo; Distúrbios psicológicos não de conduta moderados/severos; Distúrbios de linguagem e discurso moderados/severos; Dificuldades de aprendizagem moderadas/ severas (QI‹70) e distúrbios de visão e audição; Variáveis Confounding: Peso de nascimento; Idade gestacional; Idade materna; Status socioeconómico.

Crianças com disabilidades parecem estar em maior risco de registo por maus-tratos e negligência, no entanto o tipo varia dependendo do tipo de disabilidade.

F.5

Hershkowitz, Lamb; Horowitz (2007)

Qualitativo Com- parativo

Examinar as características dos maus-tratos relatados por crianças com disabilidades vítimas de maus-tratos durante entrevistas forenses.

Vítimas de abuso sexual; Disabilidades minor e severas; Desenvolvimento típico.

As crianças com disabilidades são alegadamente mais vítimas de abuso sexual que de maus-tratos físicos, estão mais sujeitas a ser abusadas pelos pais e sofrer maus-tratos físicos das quais resultem lesões corporais ou sexuais graves. Quanto mais severa for a disabilidade, maior o risco de abuso sexual As crianças com disabilidades reconhecem menos o abuso, ou reconhecem-no mais tarde.

F.6 Briscoe-Smith e Hinshaw (2006)

Comparativo Examinar se raparigas com PHDA têm um maior risco de terem histórias de maus-tratos e se a existência de história de abuso pode constituir um grupo distinto de jovens com PHDA.

História de maus-tratos; PHDA; Parent CBCL, TRF, observações de comportamentos externalizantes e rankins de agressão aos pares.

Existem significativamente maiores níveis de maus-tratos entre as raparigas com PHDA que no grupo de control. As raparigas com história de maus-tratos têm mais têm maiores níveis de comportamento externalizantes e rejeição pelos pares que as do grupo de control.

sentavam diversos tipos de maus tratos. Sendo estes infligidos pela mãe em 83,8%. Em 93,5% das crianças estava presente pelo menos um factor de risco familiar, social e/ou ambiental e em 64,5% estavam presentes mais que um factor de risco.

Spencer et al (2005) concluíram que todas as disabilidades, excepto o autismo e as de natureza sensorial estão significativamente associadas ao abuso físico (o risco é 3 a 4 vezes maior), no que à negligência diz respeito a probabilidade é semelhante. O risco de registo por abuso sexual era mais de 7 vezes maior nas crianças com prob- lemas de conduta; 6 vezes maior após ajustamento nas crianças com dificuldades de aprendizagem moderadas/ severas. O risco de abuso emocional após ajustamento era mais de 11 vezes maior para crianças com problemas de conduta; mais de 8 vezes maior para crianças com problemas psicológicos não de conduta; não se verificou alteração ao nível do risco de abuso emocional após ajustamento nas crianças com dificuldades de discurso e linguagem e dificuldades de aprendizagem.

Hershkowitz, Lamb e Horowitz (2007) realizaram entrevistas a crianças alegadamente vítimas de abuso sexual ou físico. Verificaram que quando agrupadas por categorias não se verificavam diferenças entre a associação da disabilidade e abuso, no entanto as crianças entre os 3 e os 6 anos de idade com disabilidade minor (DM) ou severa (DS) são mais susceptíveis de ser suspeitas de abuso físico (DM=27,9%; DS=25,1% e DT=23,4%). Os adolescentes entre os 11 e os 14 anos com DM ou DS são menos susceptíveis a serem vítimas de abuso físico DM = 25,1%; DS = 29,3% e DT= 31,2 % (X2(4)=49,32, p‹0,0001)). A análise Log-linear confirma as interacções entre disabilidade, género e idade na probabilidade relativa de suspeita de abuso sexual em oposição ao abuso físico X2(12)=108,986, p‹0,0001).

As crianças com disabilidades identificam menos o abuso que as crianças com DT quando se tem em conta a idade e o género, apenas 64,6% das crianças (n=26132) identificam o abuso. Quando ao tipo de abuso é adi- cionado a e idade e o género estes afectam a associação entre disabilidade e atraso na identificação do abuso (X2(42)=1824,525, p‹0,0001), verificando-se que esta associação é significativa para as raparigas mais velhas (11-

14 anos) mas não para as mais novas (3-6anos); raparigas com DM e DS demoram mais tempo a identificar o abuso mais que as raparigas com DT; as raparigas com 11-14 anos com DM e DS demoram mais identificar o abuso que crianças com TD da mesma idade.

As crianças com DM ou DS estavam mais aptas a relatar que foram maltratadas à força, No entanto esta asso- ciação só é significante para raparigas e crianças entre os 7 e os 14 anos de idade (X2(12)=94,309, p‹0,0001). Só as

raparigas e crianças mais velhas com disabilidades relatam mais vezes o uso de força pelos suspeitos. As crianças com DM e DS alegam significativamente ofensas mais sérias e estão mais aptas a reportar que são abusadas sexualmente repetidamente independentemente do género e da idade. As crianças com DM estão também mais aptas a reportar que sentiram prazer.

Em crianças com DM e DS eram significativamente mais capazes de identificar o os pais ou figuras parentais como abusadores sexuais X2(2)=41,19, p‹0,0001 (associação significante independentemente do género e idade da criança MD=9,9%; DS=21% e DT= 7,3%).

36,2% das crianças com DS não compreendem os motivos dos suspeitos e a natureza das interacções sexuais relatadas (X2(2)=6,237, p‹0,0001). Esta associação só é significativa para as raparigas e crianças dos dois grupos de idades mais velhas 7-10 e 11-14 anos (X2(12)=97,555, p‹0,0001).

Briscoe-Smith e Hinshaw (2006) estudaram a ocorrência de maus-tratos num tipo específico de disabilidade: a Perturbação de Hiperactividade com Deficit de Atenção (PHDA), 16 das 20 que foram maltratadas foram-no com idades ≤5 anos. A amostra com PHDA tem maiores taxas de ocorrência de maus-tratos em todos os tipos, no entanto os mais frequentes são a negligência (20%) e o abuso sexual (50%). Existe uma percentagem maior de crianças maltratadas com PHDA a viver apenas com um dos pais (X2(1, n=140)=4.44, p ‹0.05.)

Conclusões

Os estudos apresentados demonstram que os maus-tratos contra crianças com disabilidades são frequentes e têm repercussões graves no seu desenvolvimento, em algumas circunstâncias até mais graves que em crianças que não as possuem. Os enfermeiros ao realizarem estudos sobre maus-tratos infantis deverão incluir nos mesmos o tipo de disabilidade, qual a severidade da disabilidade, se esta interfere com as actividades de vida diária, qual a idade em que foi efectuado o diagnóstico da disabilidade, se a disabilidade já existia antes dos maus-tratos. Enfim clarificar se os maus-tratos são a causa da disabilidade ou a disabilidade a causa dos maus-tratos ou uma terceira variável que influencie ambos (Kendall-Tackett et al, 2004).

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Gravidez Subsequente a uma Interrupção Médica

No documento Saúde e Qualidade de Vida: uma meta a atingir (páginas 143-149)

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