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3 – INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM PARA A PROMOÇÃO DA AUTOEFICÁCIA NO TRABALHO DE PARTO

4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

No sentido de se conhecer os valores e preferências das grávidas relativos ao trabalho de parto, à preparação para o parto e à autoeficácia para lidar com o trabalho de parto, como referido anteriormente, efetuou-se um estudo exploratório, descritivo, de cariz misto. Os dados sociodemográficos permitiram perceber que as participantes eram, na sua maioria, portuguesas, tinham em média 31 anos de idade e eram casadas ou viviam em união de facto. De relevar, que apesar de um número significativo de mulheres (13,9%) ter apenas a frequência do ensino básico, a maioria das participantes tinham o ensino superior, o que difere dos dados do Instituto Nacional de Estatística (INE, 2012) que situa o número de mulheres, entre os 25 e os 65 anos, com ensino superior, nos 27,2%, mas similar ao encontrado no estudo de Vicente (2009). Uma das razões que pode estar na base desta situação é explicada por Furtado e Pereira (2010), que indicam que são as pessoas com um maior nível educacional que mais predisposição têm para utilizar os cuidados de saúde devido, essencialmente, a uma maior perceção da necessidade de utilização desses mesmos cuidados.

De acordo com a gravidez, a maioria era primigesta e planeou a gravidez. Estes resultados estão de acordo com as estatísticas do INE (2012) que, na

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caracterização da população feminina, revelam que as mulheres, casam mais tarde, têm cada vez menos filhos e são mães cada vez mais tarde, sendo a média de idade ao nascimento do primeiro filho de 30,6 anos.

A maioria referiu ter desconfortos na gravidez, sendo os mais vezes referenciados, a dor, a náusea e a pirose, o que corrobora os achados de outros autores (National Institute for Clinical Excellence (NICE), 2008; Montenegro & Rezende Filho, 2014).

Para que seja possível organizar intervenções de preparação para o parto eficazes, que respondam às necessidades das mulheres e as ajudem a sentir-se confiantes na sua capacidade para lidar com o trabalho de parto, evento tão marcante nas suas vidas, é necessário, em primeiro, lugar conhecê-las. Perceber que expetativas têm relativamente ao trabalho de parto, quais os seus medos, como idealizam a dor, que estratégias de coping costumam usar para lidar com situações stressantes e quais as expetativas para a preparação para o parto. Estes dados ajudam o enfermeiro de saúde materna e obstétrica a planear intervenções, individuais ou de grupo, mais eficazes.

Relativamente às expetativas com o trabalho de parto, a maioria das participantes desejava ter um parto normal - parto efetuado sem intervenção instrumental com ou sem episiotomia, espontâneo, de apresentação cefálica (INE; 1997), ou natural - parto de início e progressão espontâneos, culminando num nascimento espontâneo sem qualquer intervenção (Leite et al., 2012), e somente uma pequena percentagem revelou querer ter um parto por cesariana. Estes resultados confirmam os obtidos por outros investigadores, que, também, concluíram que poucas mulheres solicitam cesariana (Gamble & Creedy, 2001; Barbosa et al., 2003; Fenwick et al., 2005; Mazzoni et al., 2011; Karlström et al., 2011; Milhinhos, Lavaredas & Clode, 2012; Martin, Bulmer & Pettker, 2013). O facto da maioria das grávidas querer ter um parto normal ou natural é discrepante com a realidade da experiência de parto em Portugal, pois em 2012, como já referido, a taxa de cesarianas situou-se nos 35,9% (INE, 2012). Segundo Campos e col. (2010), Portugal é um dos países europeus com maior taxa de cesariana. Com exceção de Itália, que apresenta uma percentagem superior à nossa, os restantes países europeus tinham uma taxa de cesarianas, em 2007, que não ultrapassava os 30%. Fenwick e col. (2005) sugerem que esta discrepância entre as expetativas das mulheres e o número elevado de partos por cesariana ou instrumentados -17,5%, em 2012, de acordo com os dados da PORDATA (FFMS, 2014) está associada à

183 dificuldade que o sistema de saúde tem de prover cuidados na maternidade centrados na mulher.

As expetativas das grávidas com o trabalho de parto foram estudadas por vários autores, que pretendiam saber: o tipo de parto esperado (Tedesco et al, 2004; Kasai et al, 2010) a influência das expetativas na experiência e satisfação com o parto (Ip et al, 2003; Hauck et al, 2007) e o nível de dor esperado (Leventhal et al., 1989; MacLean, McDermott, & May, 2000; Gibbins & Thomson, 2001; Maggioni et al, 2006). No presente estudo, as grávidas revelaram esperar que o seu trabalho de parto decorresse sem intercorrências, e fosse o mais rápido e menos doloroso possível. Estes dados corroboram o encontrado por Gibbins e Thomson (2001) e Fenwick e col. (2005), que nos seus estudos identificaram que o maior desejo que as mulheres tinham para o parto era que este fosse rápido e pouco doloroso. Contudo, neste estudo, verificou-se que havia participantes que tinham expetativas, que se podiam considerar como demasiado elevadas, e por isso com potencial para induzirem sentimentos de frustração, podendo levar a uma pior perceção da experiência de parto, pois referiram “vou ter um parto rápido”, “vou ter um parto sem dor”. Segundo Fenwick e col. (2005) as expetativas das grávidas com o trabalho de parto são centrais para a experiência de parto, havendo autores que sugerem existir uma relação direta entre estas duas variáveis. Quando as expetativas das grávidas são realistas, são alcançadas e promovem uma melhor experiência de parto; quando são demasiado elevadas, e por isso, de difícil concretização, levam a uma pior perceção da experiência de parto (Heamen et al, 1992; Green, 1993; Fenwick et al, 2005).

Nesta pesquisa, também, se identificou que a figura de apoio durante o trabalho de parto que as mulheres preferiram é o marido/companheiro. A presença de uma pessoa significativa durante o trabalho de parto é, segundo Figueiredo e col. (2002) um aspeto valorizado pelas mulheres. O companheiro pode dar carinho, atenção e promover a confiança da mulher, tendo vários estudos comprovado o seu papel benéfico no processo de parto (Brüggemann, 2007; Perdomini & Bonilha, 2011).

A dor de trabalho de parto é referenciada, pela maioria das mulheres, como uma dor de intensidade elevada (Niven & Gijsbers, 1984). Conhecer a forma como as grávidas antecipam a dor de trabalho de parto e o significado que lhe atribuem, quais as estratégias de coping que habitualmente utilizam na gestão da dor, aguda ou crónica, e as características individuais que podem influenciar o seu uso durante o trabalho de parto é importante, pois, como referem Escott e col., (2009), permite

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planear intervenções adaptadas às necessidades, de forma a preparar melhor as grávidas para a gestão da dor de trabalho de parto. As grávidas deste estudo consideravam que a dor de trabalho de parto seria natural, difícil de suportar, altamente geradora de ansiedade e de sofrimento, o que está de acordo com os achados de diversos autores (Melzack et al., 1984; Green, Coupland & Kitzinger, 1998; Lowe, 2002; Madden et al., 2013). Referiram, ainda, que seria uma dor inevitável, necessária e gratificante. Algumas participantes atribuíram sentido à experiência de dor no trabalho de parto, achando que era necessária para a concretização do papel maternal, sendo este resultado, também, apontado por outros investigadores (Mander, 2000; Simkin, 2000; Costa et al., 2003; Davim et al., 2008; Escott et al., 2009).

A maioria das inquiridas não tinha experiência anterior de dor aguda ou crónica. Nas que mencionaram ter experiência anterior, o tipo de dor mais mencionado foi a dor músculo-esquelética, a dor vascular, a enxaqueca e a dismenorreia. As estratégias de coping que se desenvolvem com base em experiências anteriores de dor, e que se revelam eficazes, têm maior hipótese de serem mais vezes e mais facilmente usadas no trabalho de parto do que as habilidades recém-aprendidas (Salvetti & Pimenta, 2007; Escott et al., 2009). As parturientes gerem melhor a dor se tiverem treinado estratégias que coincidam com as suas preferidas (Niven & Gijsbers, 1996; Escott et al., 2004). As estratégias de coping que as participantes, habitualmente, utilizavam para a gestão da dor eram: a distração, os pensamentos positivos, o relaxamento, o isolamento, o repouso e a medicação. Estes resultados estão de acordo com os estudos de vários autores que indicam que as técnicas cognitivo-comportamentais e as farmacológicas são formas comumente utilizadas para lidar com a dor aguda ou crónica (Heyneman et al., 1990; DGS, 2001; OE, 2008; Quartana, Campbell, & Edwards, 2009).

A maioria das grávidas mencionou ter medo e estar ansiosa com o trabalho de parto, havendo uma percentagem significativa de mulheres que referiram ter muito medo do trabalho de parto (28%). Estes resultados estão de acordo com os de Fenwick e col., que num estudo efetuado em 2009, descobriram que 50% das mulheres sentiam um medo moderado do parto e 26% sentiam um medo intenso. Segundo Haines e col. (2011) a maior consequência do medo relacionado com o parto é o stresse emocional que põe em causa a saúde mental e o bem-estar da grávida. No entanto, há também outros efeitos nocivos, como o trabalho de parto prolongado, o risco de cesariana, o risco de aborto e o evitamento da gravidez (Larsson et al., 2000; Hildingsson et al., 2002; Johnson & Slade, 2002; Hofberg &

185 Ward, 2003; Saisto & Halmesmäki, 2003; Wax et al., 2004; Waldenström et al., 2006; Hildingsson, 2008; Rouhe et al., 2008; Fenwick et al., 2009). As causas de medo mais comuns, relatadas pelas grávidas do estudo, estavam relacionadas com as complicações que poderiam surgir durante o trabalho de parto, a perda de controlo percebida e os danos físicos. No que diz respeito ao feto/recém-nascido, as principais causas de medo relatadas estavam relacionadas com preocupações respeitantes à sua saúde e bem-estar. Uma pequena parte de participantes revelou, ainda, ter medo de morrer durante o parto. Estes resultados são sobreponíveis aos de outros investigadores (Klein, 2006; Lyberg & Severinsson, 2010; Salomonsson et al., 2010; Pereira et al., 2011; Haines et al., 2011). Eles evidenciam a necessidade de se intervir precocemente, na mulher grávida, de forma a minimizar os efeitos negativos que o medo provoca na experiência e satisfação com o parto. Ao identificarmos as causas de medo podemos atuar sobre elas no sentido de as minimizarmos. É importante que nas sessões de preparação para o parto, os enfermeiros de saúde materna e obstétrica trabalhem com as grávidas os seus medos, de forma a promover uma experiência de parto mais satisfatória e positiva.

O conhecimento sobre o processo de parto é considerado como essencial para a obtenção de uma experiência de parto mais positiva, uma melhor gestão da dor e para a diminuição do medo e da ansiedade relacionados com o parto (Drummond & Rickwood, 1997; Costa et al., 2003; Bruehl & Chung, 2004; Lang et al., 2006; Waldenström et al., 2006; Nilsson & Lundgren, 2007; Conde et al., 2007; Lamaze International, 2013; Fenwick et al., 2013). A maioria das inquiridas mencionou ter conhecimento geral sobre o trabalho de parto, sinais e sintomas de início do trabalho de parto, analgesia epidural e vinculação. É consensual aos autores relacionados com a PPP (Dick-Read, 1933; Lamaze, 1951; Bradley, 1965; ICEA, 1990; Nancy Bardacke, 1998), que o conhecimento é fundamental para que a mulher possa desenvolver capacidades de controlo e determinação (Pereira, Fernandes, Tavares, & Fernandes, 2011) e possuir a força necessária para tomar decisões (Kameda & Shimada, 2008).

No entanto, as participantes revelaram não ter conhecimento sobre anatomofisiologia do trabalho de parto, competência da mulher para parir, complicações que podem surgir no decurso do trabalho de parto e métodos não- farmacológicos de alívio da dor. Um pobre conhecimento sobre o processo de parto, sobre os eventos que podem ocorrer no seu decurso e sobre os métodos não- farmacológicos de alívio da dor faz com que a mulher fique refém das práticas que habitualmente as instituições de saúde disponibilizam, centradas num modelo de

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intervenção biomédico, cujos procedimentos invasivos levam a mulher à perda de autonomia e de participação no processo de parto (Schmalfuss, Oliveira, Bonilha, & Pedro, 2010). O desconhecido induz medo e ansiedade e um aumento da perceção dolorosa (Dick-Read, 1933; Lamaze, 1951), torna a mulher inativa, dificulta a tomada de decisão e promove a relação de agência. Estes resultados, como corroborado por Leite e col. (2012), podem explicar o grande número de pedidos de analgesia epidural, a manutenção das intervenções de rotina no trabalho de parto e a alta taxa de cesariana que se verifica nas nossas instituições.

No que se refere à preparação para o parto, as grávidas inquiridas tinham como expetativas adquirir conhecimento, capacidade e autoeficácia para lidar com o trabalho de parto. Estes resultados estão de acordo com vários autores que, ao estudarem a eficácia das aulas de PPP, verificaram que os casais desejam obter conhecimento sobre o parto e ter informação sobre relaxamento e gestão da dor de trabalho de parto, e que consideram a frequência das aulas satisfatória quando acham que o conhecimento adquirido ajudou a percecionar controlo sobre o processo de parto (Fabian et al., 2005; McMillan et al., 2009; Lindgren & Erlandsson, 2010; Martin & Robb, 2013).

Algumas expressaram expetativas elevadas, como esperar que as sessões as ajudassem a ter um parto rápido, sem dor e a ser competentes no exercício da parentalidade. Estes resultados indicam que é necessário que os enfermeiros de saúde materna e obstétrica ajudem as grávidas a estabelecerem expetativas realistas para a preparação para o parto, por forma a promoverem experiências mais positivas.

A autoeficácia, como visto anteriormente, caracteriza-se como sendo o mecanismo central das ações realizadas de forma intencional. Na gravidez e no trabalho de parto é importante, pois uma grávida com alta autoeficácia consegue, não só gerir a sua gravidez, como também tornar-se uma participante ativa no trabalho de parto podendo obter, assim, melhor experiência e satisfação com todo o processo (Kameda & Shimada, 2008).

Para avaliar a autoeficácia para lidar com o trabalho de parto foi utilizado o QAETP. As expetativas de resultado e de autoeficácia foram estudadas separadamente, como sugerido por Lowe (1993). Os resultados permitiram concluir que as participantes apresentavam uma elevada expetativa de resultado e de autoeficácia relativamente ao trabalho de parto.

A maioria das grávidas do estudo tinha exposto expetativas realistas para o trabalho de parto, apresentava-se motivada para a frequência da PPP, procurava

187 conhecimento e aquisição de competências para lidar com o trabalho de parto. Estes resultados sugerem que o facto de se ter encontrado uma alta perceção de autoeficácia, era um resultado previsível, pois está de acordo com o estudo de Berentson-Shaw e col. (2009) que referem que altas expetativas de resultado e de autoeficácia encorajam a mulher a procurar conhecimento acerca do processo de parto, a definir objetivos realistas e a aprender técnicas para o alívio da dor de trabalho de parto.

Esta pesquisa permitiu, ainda, concluir que relativamente às expetativas de resultado, foram as mulheres com experiência anterior de parto e com conhecimento sobre trabalho de parto que apresentaram valores mais elevados. Estes resultados corroboram os de Howharn (2008) que verificou que o conhecimento aumenta as expetativas de resultado, e comprova que a experiência anterior de parto é um forte determinante da autoeficácia para lidar com o trabalho de parto.

Quanto às expetativas de autoeficácia foram as grávidas com o ensino básico, as com experiência anterior de parto, as que se consideram mais confiantes, as menos ansiosas e as que esperavam que o marido/companheiro assistisse ao trabalho de parto que mostraram ter uma mais elevada expetativa de autoeficácia. Estes resultados estão de acordo com os de vários autores (Bandura, 1977; Drummond & Rickwood, 1997; Lowe, 1993; Salvetti & Pimenta, 2007) que verificaram que a experiência anterior e o conhecimento acerca do trabalho de parto prediziam as expetativas de autoeficácia.

As mulheres que se avaliaram como mais confiantes e menos ansiosas apresentaram uma expetativa de autoeficácia mais elevada, este resultado pode ser justificado, porque uma perceção positiva dos estados somáticos e emocionais é referenciada por diversos autores (Bandura, 1977; Drummond & Rickwood, 1997; Lowe, 1993; Salvetti & Pimenta, 2007; Salomonsson, Gullberg, Alehagen, & Wijma, 2013) como um determinante com influência nas expetativas de autoeficácia.

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7.

IMPLEMENTAÇÃO E AVALIAÇÃO DO PROGRAMA “CONSTRUIR

A CONFIANÇA PARA O PARTO”

Após a elaboração do programa Construir a Confiança para o Parto (CCpP), passou-se à etapa seguinte, que constou da sua implementação e avaliação.

Neste capítulo faz-se a descrição do tipo de estudo que se desenvolveu, relatam-se o material e os métodos, apresenta-se a análise dos dados e, por último, é exposta a discussão dos resultados.